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Sentidos e significados das imagens e palavras de alunos do ensino fundamental no cotidiano escolar

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Academic year: 2021

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Universidade Estadual de Campinas

Faculdade de Educação

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

SENTIDOS E SIGNIFICADOS DAS IMAGENS E

PALAVRAS DE ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL

NO COTIDANO ESCOLAR

Autora: Maristela Marçal

Orientadora: Profª Drª Ana Maria Falcão de Aragão

Dissertação de Mestrado apresentada à Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação, na área de concentração de Ensino e Práticas Culturais.

CAMPINAS 2011

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© by Maristela Marçal, 2011.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da Faculdade de Educação/UNICAMP

Bibliotecário: Rosemary Passos – CRB-8ª/5751

Marçal, Maristela.

M324s Sentidos e significados das imagens e palavras de alunos do ensino fundamental no cotidiano escolar / Maristela Marçal. – Campinas, SP: [s.n.], 2011.

Orientador: Ana Maria Falcão de Aragão.

Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação.

1. Cotidiano escolar. 2. Interação escolar. 3. Imagem. 4. Narrativas. I. Aragão, Ana Maria Falcão de. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.

11-037/BFE

Título em inglês: Meaning and significance of images and words of students from elementary education in their everyday school

life

Keywords: Everyday school life; School interactions; Image; Narratives Área de concentração: Ensino e Práticas Culturais

Titulação: Mestre em Educação

Banca examinadora: Profª. Drª. Ana Maria Falcão de Aragão (Orientadora)

Prof. Dr. Guilherme do Val Toledo Prado Profª. Drª. Laura Noemi Chaluh Profª. Drª. Eliana Ayoub

Data da defesa: 25/02/2011

Programa de pós-graduação: Educação e-mail: estrelamarcal@hotmail.com

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Dedico este trabalho

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AGRADECIMENTOS

Aos meus queridos e queridas Alunos, Alunas e a todos os profissionais da EMEF Padre Francisco Silva que participaram com muita generosidade dessa minha caminhada tão sonhada.

À professora Drª Ana Aragão na orientação tão carinhosa, parceira, e confiante em meu trabalho, a minha amizade sincera.

À minha família:

À minha mãe Francisca (in memoriam) e a meu pai por juntos serem o alicerce da minha vida. À Márcia, minha irmã querida, sempre a me incentivar, e ao meu irmão Júnior pelo olhar cuidadoso na leitura de meu texto, com sugestões preciosas. À minha cunhada Beth e às sobrinhas Fernanda, Juliana e Patrícia por suas presenças em minha vida.

Aos colegas e professores do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Continuada (GEPEC) pela companhia, por nossas significativas conversas e pelas muitas experiências trocadas.

Ao Prof. Dr. Guilherme do Val Toledo Prado por suas palavras de estímulo de modo tão carinhoso e compartilhando os seus ricos conhecimentos.

O meu carinho e respeito à Profª Drª Laura Noemi Chaluh, à Profª Drª. Yara Maria de Carvalho e à Profª Drª Eliana Ayoub pela disposição, atenção e sugestões que muito me enriqueceram na realização desse trabalho.

À professora Adriana Pierini que partilha de sua amizade e foi grande estimuladora dessa minha caminhada e ao professor Admir Soares, um amigo recente, que também colaborou nessa trajetória.

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Aos amigos e amigas pelo convívio e pelas conversas, motivando-me no percurso de meu trabalho: Ítala, Patrícia, Paula, Stela, Roberto, Edna, Nina, Isabel, Cleusa, Gisele, Leandro, Mabel, Clarice, Rosana, Irmã Teresa, Rosina, Gilson, Marta, Fernando...

Às amigas Grazia e Maria, pela amizade, por terem me ajudado na revisão do texto e ensinado do universo da escrita.

A todos os amigos um pouco mais distantes que também fizeram parte da minha história.

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Resumo

A fotografia não se limita apenas ao registro de uma imagem, mas constitui-se em um elemento revelador de pensamentos, memórias passadas, sentidos e fatos vividos. A narrativa foi o modo de transmitir as experiências do espaço escolar. Este estudo teve como objetivos: identificar e analisar as experiências de alunos do 3º e 4º ciclos do ensino fundamental, bem como perceber os significados e sentidos das imagens e palavras utilizadas por eles no cotidiano escolar e suas implicações para as relações estabelecidas entre as pessoas, os espaços e tempos e os objetos. A pesquisa foi desenvolvida na Escola Municipal de Ensino Fundamental Padre Francisco Silva, da cidade de Campinas. Foram analisados registros fotográficos e relatos (narrativas) do cotidiano escolar. Os resultados mostraram que os aspectos significativos destacados pelos alunos e alunas estão relacionados principalmente com a interação com o outro, com os colegas, os professores, os funcionários; esses relacionamentos foram considerados importantes na constituição pessoal dos estudantes, na percepção dos dilemas e das descobertas da adolescência, nas experiências no contexto escolar, que revelaram aspectos pedagógicos e educativos da sala de aula e fora dela, na estrutura pessoal da instituição, nas relações entre os sujeitos na dinâmica do cotidiano da escola.

Palavras-chave: cotidiano escolar, interações, imagem, narrativa.

Abstract

Photographies aren’t limited to the registration of an image, they constitute themselves as revealers of thoughts, past memories, meanings and experiences lived before. The narrative was the way chosen to transmit these experiences of the school environment. This study had as aims: identify and analyze experiences from students of the third and fourth cycles of an elementary school, as well as perceive the meanings of the images and words used by those students in the school daily routine and the implications of those in the relationships established between people, space and time and objects. This research was developed an elementary government school “Padre Francisco Silva”, in the city of Campinas-SP. Narratives and pictures related to the school routine have been analyzed. The results obtained show that meaningful aspects pointed by the students are related to the interaction with others, being them school colleagues, teachers and

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employees. These interactions were considered fundamental in the personal constitution of the students, in the perception of dilemmas and discoveries typical in teenagers and in experiences related to the school context, which reveal educational and pedagogical aspects from the classroom and external ones, particular institutional aspects, in the personal structure of the institution and in the establishment of relationships among the subjects involving the dynamics of the school routine.

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ÍNDICE

Introdução: Uma trilha ou várias trilhas? ... 01

Capítulo I: Tempo, tempos

Momento, momentos ... 09

Capítulo II:

Meu caminho sou eu, são os outros. ... 21

Eu e outros ... 23

O lugar: A escola ... 26

De onde eu falo: a EMEF... 28

O cirandar das relações ... 32

A arquitetura de um novo tempo ... 39

Somos nós no caminho ... 43

Os adolescentes ... 50

Capítulo III:

Zoom repentino... mais perto... ou longe de uma escola ... 59

Zoom repentino.... a escola: ... 61

A fotografia e a narrativa ... 62

Capítulo IV: Os Sentidos e Significados

das imagens e palavras de alunos. ... 79

Imagens e Narrativas das relações Interpessoais ...81

Imagens e Narrativas dos Espaços ... 93 Imagens e Narrativas

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dos Objetos ... 121

Capítulo V: A conversa quase final ... 129

A conversa ... 131

Um convite... 144

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Não, não tenho caminho novo.

O que tenho de novo

É o jeito de caminhar.

Aprendi

(o caminho me ensinou)

A caminhar cantando

como convém

a mim

e aos que vão comigo,

pois já não vou mais sozinho.

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INTRODUÇÃO

UMA TRILHA OU VÁRIAS TRILHAS?

A idéia inicial para o estudo do tema que abordarei sobre os sentidos e significados das experiências escolares discentes estruturou-se a partir das minhas experiências com as escolas municipais e também em clubes, praças públicas esportivas, hotéis e empresas, principalmente na área da recreação e do lazer. Nessas oportunidades, relacionei-me com pessoas de várias faixas etárias, crianças, adolescentes, adultos e idosos. Foram momentos de trabalhos com a educação física, durante a minha formação na graduação e, após ela, recém formada. Conheci, durante este período, as diversas possibilidades do campo de atuação profissional que havia escolhido. No entanto, a minha escolha em ser professora, não ocorreu de modo tão tranqüilo. Em minha trajetória, ocorreram fatos e encontros com pessoas, no trabalho, e fora dele, que muito me ensinaram. Compreendo que a ação profissional/pessoal exige muito da nossa própria dimensão humana, da cognição, dos sentidos, dos sentimentos e da emoção, no relacionamento com outros sujeitos, no processo da educação, como também, da vida. Nestas tantas experiências fui me enxergando e me formando como profissional, saindo da posição inicial de estudante, embora, na verdade, sempre haja muito por buscar e aprender. A sensação é de ser uma aprendiz permanente. Neste sentido, aproximo meus pensamentos das reflexões de Freire (1998) que nos apresenta a idéia do inacabamento do ser humano ou da sua inconclusão que é próprio da experiência vital. Onde há vida, existe o inacabamento.

Das muitas experiências, seja no plano pessoal ou profissional, destaco o retorno ao papel de estudante. Fato ocorrido durante o curso de Especialização em Educação Física Escolar, em que abordei o tema da agressividade no contexto da escola em meu trabalho de final de curso. Para compreender a realidade social em que lecionava, busquei subsídios em áreas como a Biologia e a Psicologia. Naquela ocasião, a relação entre os alunos era marcada por muita agressividade. Atualmente, lembrando e tentando decifrar aquela situação, percebo que os alunos manifestavam, por meio dessa agressividade, as carências sociais, econômicas e afetivas, entre outras dificuldades das suas vidas. Aquele estudo me ajudou, mas ainda tinha muitas incertezas do que vinha realizando como professora.

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As escolas por onde passei também foram significativas. Eu realizava as minhas aulas em quadra e/ou nos vários espaços da escola, incluindo pátios e corredores, além de utilizar áreas externas como ruas, praças e terrenos. Procurava, em minha prática docente, enfatizar a dinâmica das relações interpessoais, a dimensão afetiva nas estratégias, nas metodologias e nos princípios que orientavam as aulas. Entendia que era necessário valorizar em meu trabalho, na aula e na escola, a dimensão da afetividade, principalmente na interação entre os alunos, e também minha com eles. Isto contribuiu para eu ter essa concepção como base de minha docência. Ainda que achasse que emoção, sentimento e afetividade tivessem o mesmo significado, busquei uma compreensão mais ampla desta temática.

[...] uma emoção é um conjunto das alterações no estado do corpo associadas a certas imagens mentais que ativaram um sistema cerebral específico, a essência do sentir de uma emoção é a experiência dessas alterações em justaposição com as imagens mentais que iniciaram o ciclo. Em outras palavras, um sentimento depende da justaposição de uma imagem do corpo propriamente dito com uma imagem de alguma outra coisa, tal como a imagem de um rosto ou auditiva de uma melodia. (DAMÁSIO, 2000, p.175)

Araújo (2003) esclarece que a emoção e os sentimentos são componentes constitutivos da dimensão afetiva. A afetividade seria o termo genérico que dá qualidade ao que é afetivo, dando significado ao conjunto de afetos, ao que sentimos em relação a nós mesmos e aos demais, à vida, à natureza, etc. Embora não sejam os únicos, os valores também estão presentes. Então, devem-se considerar as experiências individuais dos sujeitos em interação com outros, o que dá a possibilidade de significar as experiências da própria vida e compreender o meio que nos cerca, a sociedade, o mundo.

Com este entendimento, procurava propiciar momentos de relações e de interações na singularidade dos sujeitos, fazendo com que os alunos experimentassem, durante minhas aulas, um processo de auto-reconhecimento, mas que, também, percebessem os outros, em um contexto de sociabilidade, que considerassem as diferenças, as semelhanças, as identidades, entre tantos aspectos da condição humana. Dessa forma, o tema da relação interpessoal e da afetividade tornou-se um foco em meu trabalho e tema de interesse e de estudo. Fui ampliando e descobrindo este conhecimento nas leituras e experiências, aprendendo com outras pessoas, mas sabia que ainda tinha muito para compreender da relação entre a teoria com a prática. Isso porque muitos de meus princípios, das ações aplicadas em aula vêm daquilo que constato do contexto de

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trabalho, do aspecto profissional e também de minha vida. Como bem apontam Sadalla et all (2002), a discussão a respeito da relação teoria com a prática vai além da mera transposição de teorias e princípios científicos à prática pedagógica, pois envolve as necessidades dessas mesmas teorias serem resignificadas pelo professor, por meio de suas crenças e valores, de um modo complexo e articulado com as situações educativas presentes na prática.

Com estas idéias em mente apresentei, para participar do processo seletivo do mestrado, o projeto de proposta inicial de pesquisa acerca das dimensões afetivas das vivências coletivas escolares.

A partir das conversas com minha orientadora, das discussões em nosso Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Continuada – GEPEC - e também do meu próprio entendimento sobre o processo de uma pesquisa científica, o meu estudo foi se delineando. No início da reestruturação do projeto fiquei um pouco desestabilizada, pois achava ter perdido o foco sobre o tema que tanto me motivava. A partir das discussões no grupo, fui, entretanto, descobrindo, para minha surpresa e aprendizado, que o delineamento foi se tornando mais preciso, e a temática da afetividade, das interações e do cotidiano escolar se mostraram presentes na experiência vivida pelos alunos durante a pesquisa.

O presente trabalho traz o meu olhar e entendimento sobre a escola e seu cotidiano. Cabe lembrar que é a minha visão de escola, partindo das minhas experiências e da realidade que presencio. Discorro sobre a escola em que leciono e como a percebo, no contexto pedagógico e educativo das relações interpessoais. A elaboração da pesquisa teve a parceria e o olhar dos alunos sobre as dimensões das interações e relações. Os adolescentes trouxeram os seus significados e sentidos em relação ao cotidiano a partir de suas lembranças, de fatos e situações, do entendimento e percepção de suas experiências e saberes relacionados com as pessoas, com os espaços/tempos e com os objetos. Como enfatiza Najmanovich (2001, p.99) ―[...] como tudo o que é significativo surge na interação das pessoas com o mundo, passam a sê-lo em linguagens e práticas específicas e estão embebidos das interações‖.

Como poderia desvendar esses olhares acerca da realidade escolar? Utilizando como recurso metodológico a fotografia e a narrativa, que se transformaram nos instrumentos e materiais de análise, tomei-os de maneira integrada para identificar e compreender os sentidos e significados dos alunos a respeito de suas experiências escolares cotidianas. Eles serão os participantes da pesquisa, que, em movimento, registraram, por meio da fotografia, imagens que

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mais os tocam, lhe fazem sentido. Em seguida, refletindo e pensando sobre as imagens, eles se expressaram, através da narrativa, comentando suas escolhas. Foram também utilizadas as informações surgidas nos diálogos comigo durante a investigação.

Para Prado e Soligo (2005), a narrativa supõe uma sucessão de acontecimentos, é um tipo de discurso que nos presenteia com a possibilidade de dar à luz o nosso desejo de os revelarem. Podemos dizer que a narrativa comporta dois aspectos fundamentais: uma seqüência de acontecimentos e uma valorização implícita dos acontecimentos relatados. E o que é interessante, particularmente, são as muitas direções que comunicam as suas partes com o todo. Os acontecimentos narrados de uma história tomam, do todo, os seus significados. Entretanto, o todo narrado é algo que se constrói a partir das partes selecionadas. Essa relação entre a narrativa e o que nela se revela faz com que suscite interpretações e não explicações: não é o que explica que conta, mas o que, a partir dela, se pode interpretar.

A fotografia, para mim, e acredito que para muitos de nós, nos acompanha. As ações de fotografar e admirar fotos podem ser experiências expressivas, comunicativas, dos diversos momentos de nossas vidas. Dos acontecimentos e etapas pessoais, da infância, das cenas familiares, das celebrações, das viagens, entre outros momentos. Os registros e os processos fotográficos, desde a sua invenção, passaram por variadas transformações, o que alterou a nossa relação no modo de operar um equipamento fotográfico, a forma de preservar as imagens, e até mesmo a forma de realizar a fotografia. Pode-se observar que, com o advento da máquina digital, um equipamento de fácil acesso e manuseio, o álbum foi substituído por arquivos digitais. A espera da revelação de um filme foi substituída pelo simples clicar de um botão que, na própria máquina fotográfica, mostra a imagem produzida, que nos revela, de imediato, o resultado de nosso olhar, expresso na foto. Como esclarece Vicente (1998), a fotografia, como outros meios de expressão e comunicação, apresentou as transformações das inovações tecnológicas, em especial da eletrônica, na automação e informatização, na geração e tratamento da imagem. As transformações divulgadas e tidas por técnicas operacionais acontecem no âmago de complexos processos culturais, e também estéticos e ideológicos. Altera-se não somente o modo de fazer, mas em especial os modos de pensar.

Emprego a fotografia como um recurso, que não se limitou apenas a registrar e documentar fatos de uma realidade. As imagens, que revelaram um instante, uma cena produzida pelos alunos, contaram algumas experiências vividas por eles através dos espaços, das pessoas e

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dos objetos escolhidos. A percepção, o sentido, as memórias que foram despertadas de um instante real. Segundo Kossoy (1998, p.44) “A fotografia funciona em nossas mentes como uma espécie de passado preservado, lembrança imutável de um certo momento e situação, de uma certa luz, de um determinado tema, absolutamente congelado contra a marcha do tempo‖.

A narrativa foi o modo como eu e os alunos contamos esse trabalho revelando os pensamentos, as idéias de um determinado espaço e tempo. Recordações evocadas pela memória, a visão particular, que se estrutura e se forma partindo-se da experiência individual, e também coletiva, de um contexto. Nós, eu e os alunos, apresentamos nossas experiências significativas escolares. Para CANÁRIO (2005) é, precisamente, na medida em que a produção das práticas profissionais é atravessada, não apenas pela dimensão biográfica - fatores individuais - mas também por uma dimensão contextual - fatores organizacionais - que o exercício profissional pode ser compreendido a partir a articulação entre fatores de disposição e fatores de situação, o mesmo docente age de maneira diferente em tempos e lugares diferentes. A impossibilidade de dissociar a dimensão coletiva e a individual da ação profissional permite pensar o funcionamento da organização escolar como um processo coletivo de aprendizagem, do qual emergem competências profissionais numa dimensão dupla: a individual e a coletiva.

Apresento os olhares do cotidiano escolar dos alunos não como uma descrição ou uma ilustração. Há uma multiplicidade de olhares dos sujeitos em relação ao mesmo ambiente, de um modo diversificado, com leituras do espaço e tempo, com o entendimento de si próprio, do outro(s) e da realidade.

A minha opção foi de estabelecer o diálogo de meus pensamentos com meus interlocutores durante o transcorrer do texto. Trago como referência teórica a abordagem histórico-cultural de Vygotsky na concepção de ser humano em sua totalidade corpo-mente, o ser humano biológico, social e histórico. Freitas (2002) analisa a produção de autores nesta abordagem teórica, como Luria, Bakhtin e Vygotsky, e aponta que essa abordagem sócio-histórica foi a tentativa de superação da visão reducionista das concepções empiristas e idealistas. Esse aspecto fica evidente, em sua época, no que Vygotsky sinalizou da crise da Psicologia, quando ocorreram debates entre os defensores dos modelos que privilegiavam ora a mente e os aspectos internos do indivíduo, ora o comportamento externo. Vygotsky elaborou o que denominou de uma nova Psicologia que deveria refletir o indivíduo em sua totalidade, articulando dialeticamente os aspectos externos com os internos, considerando a relação do

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sujeito com a sociedade à qual pertence. Havia, ainda, a sua necessidade encontrar métodos de entendimento do indivíduo.

Assim, sua preocupação é encontrar métodos de estudar o homem como unidade de corpo e mente, ser biológico e ser social, membro da espécie humana e participante do processo histórico. Percebe os sujeitos como históricos, datados, concretos, marcados por uma cultura como criadores de idéias e consciência que, ao produzirem e reproduzirem a realidade social, são ao mesmo tempo produzidos e reproduzidos por ela. (FREITAS, 2002, p.1).

Depois dessa introdução, relatei sobre a origem do tema de estudo e optei em organizar a escrita da pesquisa em capítulos. Devo ressaltar que não elaborei um capítulo específico de quadro teórico. A base para o meu diálogo com a teoria estará destacada no decorrer do texto.

- O primeiro capítulo — Tempo, tempos... Momento, momentos...— eu situo-me sobre os caminhos por onde andei. Em uma volta ao tempo passado, conto as lembranças da infância, da adolescência. Foram fases importantes que me trouxeram as referências do meu percurso da vida. Já em um tempo mais recente, resgato as memórias das experiências que me auxiliaram na minha formação e na constituição de docente.

- No capítulo dois — Meu caminho sou eu, são os outros — apresento reflexões sobre a escola, o seu cotidiano em diálogo com as referências teóricas que deram o suporte para contextualizar os temas abordados e mostro às características da escola onde foi realizada a pesquisa. Relato também as experiências dos profissionais com trabalhos coletivos em parcerias da Universidade e instituições de pesquisa, as ações e conhecimentos educativos, pedagógicos vindos dessas vivências. Nessa trajetória trago alguns pensamentos a respeito de nossos alunos, os adolescentes.

- No capítulo três — Zoom repentino... Mais perto... ou longe de uma escola:

caminhos da pesquisa. Após as reflexões acerca do cotidiano escolar, apresento o delineamento

do caminho na pesquisa: o problema e objetivo do estudo, as orientações metodológicas que permitiram o processo de investigação, os alunos que me auxiliaram na produção dos dados. Em

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específico, trago os interlocutores teóricos em relação à imagem, a fotografia e a narrativa. Para a análise dos dados tive como base os princípios do Paradigma Indiciário de Ginzburg.

- No capítulo quatro — Os sentidos e significados das imagens e palavras de alunos. Mostra-se a produção do material, as imagens e as narrativas dos alunos. Eles apresentaram as suas interpretações desses registros atribuindo-os sentidos e significados das experiências escolares. O modo que eles analisaram a escola, as suas relações com as pessoas, o espaço e o tempo e os objetos. Com base nesses dados eu faço a análise, a interpretação e discussão do estudo.

- Capítulo cinco — A conversa quase final. Será o fim?— tratando-se do cotidiano escolar, acredito que não. Apresento algumas reflexões, depois das várias fases de realização da pesquisa, que não são as finais. Com o material elaborado pelos alunos, ampliei o meu entendimento e resignifiquei o contexto da escola. Espero que outros possam aproveitar-se desse estudo, e sintam estimulados a pesquisar, refletir e contar das suas experiências do cotidiano. Para quase finalizar a minha conversa, partilho com todos algumas das lições aprendidas, da estudante, da professora,...Com as passadas, o caminho se faz. E se refaz dia a dia.

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Capitulo I: Tempo, tempos

Momentos, momento.

Roda lembrança,

o tempo avança,

a infância na memória

muita história quer contar.

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Tempo, tempos....

Momento, momentos

A gente quer ter voz ativa. No nosso destino mandar. Mas eis que chega a roda viva E carrega o destino pra lá. Roda mundo, roda-gigante. (Chico Buarque)

A letra desta música me inspira a iniciar minha narrativa, dando-me a sensação do movimento, de fluidez e de inconstância. As canções contam sobre a vida. Identifico-me com a letra e a música deste compositor. Já apresento algo de mim, de que eu gosto muito, a música. Envolve a palavra, o ritmo, a harmonia, um modo de expressão. Desperta sensações e lembranças.

A vida, em seus percursos e fases. Os momentos, as pessoas, os sonhos, as marcas do que mais me toca. As buscas. O equilíbrio... os instantes de desequilíbrio que promovem a mudança de rumo. Em quais direções e sentidos? Podem ter sido muitos ou poucos, depende das experiências, do modo como os desequilíbrios foram percebidos e me mobilizaram.

Escrever sobre as situações que me tocaram, em minha história pessoal e profissional, que são tão interligadas, trouxe-me à memória fases próximas e distantes, em um ir e vir, que se mistura como em um caleidoscópio. Compondo várias imagens, cenas e cenários, preenchidos das pessoas que fizeram os momentos terem vida.

Para contar um pouco de mim, quais são os fatos, as cenas, as pessoas a escolher? A opção das memórias e das idéias que agora me conduzem na elaboração deste texto serão as letras, as palavras escolhidas em frases que transmitirão um pouco de quem fui, sou e do meu eu que ainda será, o futuro a desvendar-se.

Aproprio-me das palavras de Barros do poema Despalavra. “Hoje eu atingi o reino das imagens, o reino da despalavra. Daqui vem que todas as coisas podem ter qualidades humanas”. (BARROS, 2000, p.23)

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Procuro um auxílio para me localizar nas minhas imagens registradas, além da memória. Elas estão presentes nas fotografias que contam os meus trajetos, vou à busca das imagens que, no silêncio da cena fixada, estão impregnadas de mim e de outros que fizeram parte dela.

Em direção ao local onde guardo os álbuns de fotografias, encontro as fotos registradas em papel, reveladas em preto e branco e também as coloridas. Os álbuns estão abertos em minha frente. Por onde começar? As revelações das cenas familiares, as viagens, os amigos, as festas, os momentos marcantes em minha família e da vida... são fotos que simplesmente têm um pouco de tudo. Para (KOSSOY, 1998, p.45) “[...] os homens colecionam esses inúmeros pedaços congelados do passado em forma de imagens para que possam recordar, a qualquer momento, trechos de suas trajetórias ao longo da vida”. Em meio a tantos registros, fico a pensar... Além dos cenários, das pessoas que estão presentes nas fotos, meus pensamentos se perdem nas outras pessoas que estiveram atrás da lente da câmera, registrando os meus momentos, contando a minha história. Eu me lembro de algumas dessas imagens e quem foram os meus familiares, amigos, conhecidos e desconhecidos que as registraram. As mais recentes, fui eu quem as captei. São variadas as sensações, os sentimentos, estou perdida em tantas lembranças, numa emoção, às vezes serena, em outros momentos agitava-me o coração, num misto de tristezas e saudades. Alegrias.

Quando percebo já se passaram algumas horas da minha viagem, num tempo mostrando-me os mostrando-meus vários percursos, em alguns momostrando-mentos serenos, em outros com algumas quedas e as ascensões, necessitando a reorganização do trajeto. Algumas direções e sentidos acertados, outros ainda em curso. Passo a passo.

Já atordoada, buscando o começo. Resolvo. O início, a partir da fotografia da apresentação de uma peça teatral chamada - “A floresta encantada”. Ela foi escrita e dirigida por meu irmão e com participação de todos os meus amigos, moradores de minha rua. Recorro a ela, pois esta revela a transição da infância e adolescência/juventude, fase das fortes influências de quem sou. E da minha percepção de que aquele momento iria passar e outras fases viriam. Foi um período marcante. A rua onde cresci não era uma rua qualquer, foi nela que tive as referências com as pessoas, as situações da vida cotidiana, os conflitos, as aprendizagens. E, hoje, avalio como estas experiências foram significativas. No entanto, o suporte essencial, nessas fases certas e incertas, me foi dado por minha família, meu pai, meu irmão e minha irmã e, principalmente, o amor e a sabedoria de minha mãe Francisca. A mãe que, em sua simplicidade, me ajudou a

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desvendar a vida. Deixando-nos voar, mas sempre ali tentando nos amparar em nossas decolagens e aterrissagens. A minha estrutura familiar foi e é fundamental em minha formação e constituição pessoal que é marcada pelas vivências, as experiências no grupo social, os vizinhos, a escola...

Meus pensamentos são interrompidos, as pequenas coincidências, os acontecimentos. Quando vou guardar alguns de meus achados fotográficos, meu tesouro histórico, e cai à frente, diante de meus olhos, uma foto minha de criança com minha mãe, no quintal de casa. Um espaço meu e de meus irmãos, todo nosso, trazendo-me as recordações da infância, registradas com muita felicidade. Deixo, neste instante, que meus pensamentos me levem.

Eram longas as nossas aventuras e descobertas que vinham das brincadeiras, das festas, das travessuras em nossos quintais, na rua, sempre ocupada com muitas crianças em diferentes faixas etárias, nossos espaços e tempos de convivências. Tínhamos, em alguns momentos, a companhia das mães, que nos acompanhavam, ora inventando situações para nossas atividades, ora nos observando de longe, nos deixando caminhar, correr, dando os nossos saltos, tropeços, mas ali, sempre próximas.

Aconteciam, com freqüência, os momentos de encontros coletivos, nas festas juninas, de aniversários, ainda comemorados nas casas das pessoas. Havia a participação de toda a vizinhança na organização das festas juninas. Marcadas, principalmente, pela presença das nossas rezadeiras, Dona Isabel, Dona Luzia e Dona Julia, e os seus padroeiros, respectivamente, Santo Antônio, São João e São Pedro. As famílias combinavam passeios conjuntos que eram realizados de trem, ônibus, ou, então, se lotavam os poucos carros e seguíamos viagem ao Zoológico de São Paulo, pic-nics em parques, ou mesmo caminhadas a pé nos bairros do entorno da rua, entre tantas outras realizações.

Nós, as crianças e adolescentes, organizávamos atividades que chamávamos de festivais: a nossa dança, teatro nas garagens, torneio de ping-pong, bets (taco), o tempo de fazer maranhão (pipa). E também, as idas ao clube e ao Sesc (espaço sócio-cultural) para assistir peças teatrais, ver exposições.

A adolescência chega.

Aquela rua teve outra dimensão. O grupo de crianças, adolescentes, que cresceram juntos se transformara e, sem perceber, já não éramos os mesmos. Alguns se mudaram para outras ruas. Os interesses de cada um se modificaram. Estávamos crescendo. O vínculo das relações infantis

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tornara-se tênue; quando nos demos conta, o tempo transcorrendo e o distanciamento entre nós havia aumentando. Alguns relacionamentos se mantiveram, outros se perderam. São as rupturas do caminho.

Eu tive, na adolescência, muitos momentos de indagações a respeito de mim mesma, do que não entendia e queria saber do mundo. Mas sempre com a orientação presente e paciente de minha mãe, em minhas rebeldias e porquês. Nos estudos, o meu percurso teve sempre o incentivo de minha família, além de que gostava de ir à escola e estudar. Acredito que o gosto por conhecer algo novo tem forte influência dos meus momentos caseiros e familiares. Originados das histórias contadas e lidas por minha mãe, como também, o acesso a variados tipos de livros, gibis, a música, as nossas criações lúdicas com barro, papel, sucatas, tantos outros recursos utilizados, para as brincadeiras, as experiências vividas por nós.

O meu ciclo escolar, da 1ª série ao 3º ano colegial, foi todo realizado no ensino público na Escola Estadual de 1º e 2º Graus Dom João Nery. Lembro-me que, na escola, não tive muitas dificuldades de aprendizagens e quando ocorriam as nossas complicações, minha mãe era a nossa professora. Ela possuía somente a formação do ensino primário, e como ela dizia, em sua época, se ensinavam as quatro operações de matemática, a leitura/escrita, o caderno de caligrafia e as ciências da natureza. Na ocasião não existia a quantidade de livros didáticos que tivemos. Quando algum conhecimento não estava ao seu alcance, achava uma solução.

Para mim e meus irmãos, o estudo foi um meio de se ter uma formação pessoal e profissional. A referência para atingir o ensino superior veio de meu irmão. Ele acabara de ingressar em uma universidade pública, eu e minha irmã pretendíamos seguir o mesmo caminho. Com muita empolgação e com o firme propósito de cursar uma universidade.

Enfrentei, na época para ingressar na faculdade, uma longa maratona de estudos. Fazia simultaneamente o colegial, atual ensino médio, e o curso pré-vestibular. A minha escola começava a apresentar alguns problemas do ensino público, como as greves da categoria, a rotatividade de professores, principalmente na área de exatas, que era a minha maior dificuldade. Para conhecer o processo seletivo do vestibular, quando estava 2º colegial, prestei o concurso para Pedagogia, passando na 1ª fase. Ainda não tinha a definição da escolha profissional, nem pensava em ser professora. No ano seguinte, prestei o concurso para Engenharia de Alimentos, e para o recém iniciado curso de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas -

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Unicamp. Como gostava de práticas corporais, resolvi tentar mais uma possibilidade de freqüentar uma universidade pública.

Em 1986, ingressei no curso de Educação Física na Unicamp. Acredito que naquele momento, uma nova professora começou a se formar. Inicialmente, foi um deslumbre, pois estava na universidade, um espaço de estudo que já freqüentara com meu irmão, causando-me um grande fascínio e já me imaginava circulando no campus, nas bibliotecas, laboratórios, etc. Eram poucas as minhas lembranças e referências da escola básica sobre a educação física, costumo dizer que as minhas vivências corporais, com o movimento e a ludicidade ocorreram em minhas aventuras na rua. Em meus primeiros dias de aula na faculdade, perguntaram a nós, os alunos, sobre o nosso conhecimento e desejo em relação à educação física. Meu pensamento e primeiro projeto era ser professora de ginástica; mas na verdade não tinha muita firmeza desta decisão. Tudo era novidade, uma situação nova conquistada no lugar que desejara estudar e havia conseguido. Passada a euforia inicial, alguns dilemas começaram a surgir.

Fui descobrindo uma nova perspectiva do que estava estudando, e justamente em um momento particular da área, com surgimento das novas concepções sobre a educação física que também desconhecia. Em minha formação como estudante, tive a oportunidade de relacionar-me com professores-pesquisadores que, hoje, são considerados referências acadêmicas nesta área de conhecimento. Entretanto, eu tinha muitas dúvidas sobre o que havia escolhido, em um misto de incertezas, se realmente era aquilo que gostaria de fazer, mesmo com as oportunidades que a universidade me oferecia para a minha formação. Procurava conhecer a área que estava estudando. Participei, durante os quatro anos do curso, de monitorias no curso das disciplinas biologia celular e handebol. Envolvi-me com o centro acadêmico. Em meus feriados e férias realizava atividades recreativas, de lazer em hotéis, clubes e empresas. Trabalhava, após as aulas, no horário noturno, em um curso pré-vestibular. Foram anos de aprendizados em outros espaços, além da universidade. As experiências em variadas interações, espaços e tempos que me ajudaram a romper com certa insegurança, nesta fase, mas ainda não me empolgava a idéia de ficar na área.

Em 1989, decidida a terminar o curso de Educação Física, me preparava para um novo vestibular para o curso de Biologia. Participei de um processo seletivo para trabalhar na prefeitura municipal de Campinas, nas praças públicas de esportes. Fui escolhida. Era um contrato temporário, com um salário inesperado, para uma recém formada. A proposta do

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trabalho era de integração dos equipamentos públicos: as praças esportivas, as escolas, os postos de saúde, os centros de cultura, entre outros, em atividades dirigidas à educação, à saúde e à qualidade de vida.

Este projeto, durante um ano e meio, de fato ocorreu de modo articulado com todos os equipamentos públicos. O nosso trabalho não se restringiu à educação física, mas também em interação com o dia a dia de uma comunidade da periferia da cidade. Eu e meus colegas de trabalho tivemos o contato direto com as pessoas, as lideranças comunitárias, em um cenário de grandes dificuldades e carências sociais, econômicas, educacionais, a pobreza, a violência, entre outras. A cidade se apresentava numa outra realidade, até então visto pela TV ou pelo jornal, um pouco distante para mim e meus amigos. Esta experiência foi mobilizando, em mim, outra perspectiva pessoal da minha escolha profissional. Eu já não era mais a estudante deslumbrada.

Encontrei, neste momento, um sentido de minha possível ação na área que escolhera ou “fora escolhida”. Fortalecia a minha identificação com Educação Física, principalmente no sentido dos trabalhos com as crianças, adolescentes e idosos em aulas que ocorriam em diferentes espaços, nas quadras, piscinas, nos campos, na rua, nas semanas recreativas de férias.

Fui designada a trabalhar em outra praça esportiva, outro contexto social, menos sofrido, separando-me do grupo inicial de amigos. Tudo me direcionava, cada vez mais, para o meu processo e constituição da professora. Prestei, assim mesmo o vestibular, passando na 1ª fase, e na mesma ocasião meus amigos me informaram sobre o concurso seletivo na rede municipal de educação da cidade. E por que não? Como contratada, minha situação era instável. Continuava a fazer trabalhos recreativos nas férias, o que me proporcionou experiências em atividades com grande público, nas diferentes realidades sociais. Conheci também a dinâmica de trabalho em academia e clube, decidindo não querer este universo de atuação da minha profissão.

Além do profissional, a vida pessoal, dos afetos, também foi se compondo... Algumas viagens, pois gosto muito de conhecer lugares e pessoas, as festas, as alegrias e algumas tristezas com perdas significativas. Sonhos realizados e outros por se realizarem, alguns encontros e outros tantos desencontros...

Um breve salto no tempo... tempo... tempo...

Em 1992, efetivei-me como professora de educação física na prefeitura municipal de Campinas. Lecionei em quatro escolas de diferentes regiões da cidade, em cada uma delas tive relações que me auxiliaram no plano pessoal/profissional. Foram interações com pessoas que

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muito me ensinaram das relações, prefiro citar as de confiança, respeito e amizades, também com as crianças e adolescentes, o motivo de nossa existência como profissionais da educação. Ainda com alguns dilemas em relação à minha decisão profissional, já “respirava” o ambiente escolar com mais significado. Estava atuando em outro universo, aplicando e transformando o que aprendera na faculdade, aliada à experiência das praças esportivas. Era a professora na nova realidade: a escola.

Os primeiros impactos do novo ambiente. A falta de estrutura e espaço físico adequado para as aulas de educação física, a divisão do local com o intervalo, ou mesmo com outros colegas de área. Em minha primeira escola, dava aula num metro quadrado, barrancos, terrenos sem estrutura ou espaços abertos disponíveis. Havia poucos recursos materiais disponíveis, requerendo do meu tempo e criatividade para as adaptações, seja do material, como da dinâmica das atividades. Foram os desafios, mas nem por isso deixando o compromisso que tinha assumido de fazer o melhor e o possível.

Mas aconteceu um fato que me conquistou de vez a ser professora. Foi durante o meu segundo ano de docência em uma realidade social permeada por muitas carências. Os alunos apresentavam comportamentos agressivos, indisciplinados, com dificuldades nas relações entre eles. Isto me tocou muito. Voltava para casa e não me desligava de algumas situações vividas na aula e da qual fazia parte. Pensava e me questionava como poderia fazer que minhas aulas os auxiliassem, pelo menos em parte, a terem outra visão da vida e outro modo de lidar com ela. Das experiências vindas em um jogo, na brincadeira, numa palavra dada, num gesto, num olhar, que desse um sentido de humanidade, dos afetos, sentimentos e emoções na vivência daquelas crianças e adolescentes, mesmo que apenas por alguns instantes. Consegui algumas realizações neste sentido, em outros não, ainda mais quando se trata de interações humanas. Foi um momento de grande conflito, pois eu tinha as minhas referências de valores, princípios, que se chocaram com outro modo de compreender a realidade, principalmente das ações e atitudes vindas dos alunos, das famílias. Mesmo passado algum tempo, esse aspecto continua forte no meu dia a dia de trabalho. Tenho consciência que minha ação é uma parte ínfima no todo, tratando-se de relações humanas e do mundo que nos cerca. Ainda assim, busco a reflexão e a compreensão do que venho realizando como professora.

De acordo com Sadalla (1998), o cotidiano do professor é constituído de uma sucessão de microdecisões, as quais, algumas vezes, levam-no a deparar-se com situações a serem

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administradas de imediato, tendo tempo insuficiente para a reflexão simultaneamente à ação. Assim, a releitura da situação pode favorecer uma modificação de atitude, a reorganização de procedimentos, a percepção de suas contradições e das existentes entre o que posteriormente pensa que deveria ter realizado e o que efetivamente fez naquele momento preciso.

Vivendo a realidade profissional, sentia a necessidade de voltar aos estudos. Queria encontrar auxílio e novas orientações para compreender as minhas dúvidas cotidianas, em comunicação e diálogo com outras pessoas. Em 1993, cursei a especialização em Educação Física Escolar, na Unicamp. O meu trabalho de final do curso tinha como tema o comportamento agressivo no contexto escolar que eu trabalhava.

Nesses anos, depois de formada, percebo como é importante o contato com as realidades de atuação profissional, pois na formação inicial, na universidade, são poucas as experiências no campo de trabalho real. Seriam vivências que nos ajudariam na formação e na constituição da docência. Como também, o impacto da falta de estrutura das escolas, o nosso próprio preparo corporal para enfrentar a rotina de trabalho, as exigências em aula que estão além das dimensões pedagógicas, o nosso papel docente e da escola na formação da criança e adolescentes, com realidades tão diversas, que muitas vezes passam por situações de carências alimentares, físicas e emocionais. Em alguns momentos, não me encontrava preparada para lidar com estas situações.

Ainda com o desejo de ampliar os estudos e relacionar a vivência prática com a teoria, tentei o curso de pós-graduação. O meu retorno à universidade, naquele momento, parecia distante. Optei, em 1995, em fazer a complementação pedagógica na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ouro Fino. Estava cada vez mais envolvida com educação.

Nas unidades escolares, fiquei períodos bem regulares, estabelecendo vínculos com a comunidade escolar, que entendo serem fundamentais na realização do trabalho com o grupo. Realizei muitas parcerias de trabalho, com professores, coordenadores, diretores, funcionários que, em suas individualidades e subjetividades, me ajudaram a ter a paciência, a curiosidade, o saber prático com o teórico, os desafios da docência, a resistência quando necessária, o trabalho coletivo, a troca de conhecimentos do que não sabia. Aprendi muito na coordenação interna das unidades em projetos pedagógicos da rede municipal: saúde do escolar, informática, arte-educação, danças populares. Nessa ocasião, recebi convites para trabalhar junto às coordenações da secretaria, conciliando com as aulas. Mas não quis me distanciar da escola, o que foi providencial, pois o seu cotidiano já era o meu tempo e espaço como professora.

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Nas primeiras unidades, lecionava para crianças. É uma faixa etária com a qual me identifico. No entanto, desejava mudanças, aulas com turmas de 5ª a 8ª séries, atual ciclo III e IV, e também, por motivo de saúde (cirurgias nas cordas vocais), em decorrência das exigências nas aulas. São as surpresas inesperadas, infelizmente.

Neste período, ocorreram muitas mudanças repentinas para mim, pois, além da mudança de local de trabalho, tive a perda de minha mãe que me afetou profundamente. Aproprio-me do início de um poema “...MÃE nome sagrado...”. Ela que sempre foi meu aconchego e amparo. Foi um momento de muito abalo pessoal. O trabalho me ajudou a retomar o meu caminho.

Ao transferir-me, em 1999, para a minha quarta escola, EMEF “Padre Francisco Silva”, deparei-me com outra comunidade e com o grupo de alunos que desejava: os adolescentes. No princípio, senti as alterações, estranhei, inicialmente, a pouca afetividade dos alunos, pois nas unidades anteriores, acho que pelas carências sociais e econômicas daqueles outros contextos, as crianças eram mais próximas. Atualmente, este quadro já é bem diferente, fui semeando meu espaço, que foi sendo ampliado.

Foi na EMEF “Padre Francisco Silva” que tive a felicidade de mais um encontro com um grupo de profissionais compromissados na busca de uma escola pública em movimento de transformação e qualidade. Nela a oportunidade em participar de dois projetos em parceria entre a FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo) com a Universidade Estadual de Campinas. A primeira dessas experiências foi o Programa de Ensino do Projeto “Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo” (1998-2001). A segunda experiência foi a realização do projeto “Escola Singular: Ações Plurais” (2003-2008). Cada um deles teve suas especificidades, objetivos e dinâmicas de trabalho. Mas ambas as experiências foram muito significativas, dando-me a possibilidade de relacionar-dando-me com pessoas que são importantes em minha vida pessoal/profissional intimamente interligada. Na formação, o processo de reflexidade docente, nas facilidades/dificuldades, um conhecimento do que é o trabalho em coletividade e parcerias em variadas interações. É difícil trabalhar de outra forma, tendo passado por estas vivências.

E nesta viagem do meu tempo, estou agora participando do programa de pós-graduação da Faculdade de Educação da Unicamp. Tem sido outro importante momento, principalmente por ter a possibilidade de voltar à universidade, como profissional e também estudante, um novo aprendizado. Encontrei no Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada – GEPEC - a abertura, o diálogo, a comunicação: nós, os professores da educação básica, e a universidade. O

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grupo de pesquisa tem como referências a formação docente, a pesquisa em educação, os saberes e práticas docentes no/do/com o cotidiano escolar. Cunha e Prado (2007) nos esclarecem ao apresentar algumas perspectivas de pesquisa e metodologias utilizadas na investigação da educação, destacando que o discurso do/a professor/a – pesquisador da escola básica se faz valioso porque é um diálogo consigo próprio e com a realidade de seu trabalho, com a produção acadêmica que alimenta seus dilemas e impõe contradições que o obrigam a querer ver ainda mais de perto, com as múltiplas instâncias matérias e culturais de seu contexto. Sua pesquisa é importante para a comunidade escolar e fora dela que podem vir a compreender melhor a riqueza e a complexidade escolar e também para os/as professore/as pesquisadores/as acadêmicos que são pares legítimos dos/as professore/as da escola básica, no sentido em que estão interessados na democratização das relações e do conhecimento produzido com, sobre e a partir da escola.

Essa etapa é mais uma das conquistas, trilhadas lá atrás, no caminho. E trilhas outras virão, algumas viagens, encontros, alegrias e sonhos por se realizarem. Gostaria de ter passado em minhas palavras um pouquinho desta minha trajetória, ora num movimento contínuo, ora num espiral na roda viva que nos conduz a um destino, um rumo, mas fico com as palavras do poeta Paixão que tão bem expressa “[...] as palavras, mesmo sem a gente perceber, ajudam a colocar emoções em movimento.” (PAIXÃO, 2002, p.45)

O meu amor, carinho e respeito a todos que estão comigo, os que passaram e passarão pela minha vida...

E todo o meu início:

Sou filha de pai mineiro, Oswaldo, e mãe paulista, Francisca. A caçula de três filhos. Sou campineira e paulista.

Adoro café com pão de queijo.

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Capítulo II: Meu caminho sou eu, são os outros.

Portinari- Ronda infantil

(...) rodopia, rodopia.

no ritmo do rodeio,

meia volta,

volta e meia

recomeça o rodeio...

redemoinho de crianças,

um abraço, uma dança

gira, gira, aliança,

não há liderança,

a ordem é circular...

na roda líder não há

É dar as mãos e brincar!

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EU E OS OUTROS

Ao iniciar a narrativa sobre a pesquisa desenvolvida com os alunos, relaciono esse percurso com o de um caminhante em trilhas, para situar-me na trajetória escolar. A palavra trilhar, de acordo com o dicionário Aurélio (1995), tem o sentido de abrir caminhos, marcar com passadas, seguir trajetos em direções que também podem apresentar vários atalhos. É com a idéia de percurso marcando os meus passos que encontrei, nas escolas, as minhas ações e pensamentos conduzindo-me a direções e a certos caminhos da minha prática pedagógica e educativa.

Os adeptos de caminhadas entendem a sensação provocada pela experiência de percorrer trilhas nas matas, colinas ou praias. Há o preparo para o início da jornada. O caminho e o caminhar em si. As descobertas em cada passo dado, o ritmo individual ou em acompanhamento a um grupo. Caminhos em terrenos desconhecidos onde encontramos obstáculos variados, às vezes pedras que nos machucam, a chuva que alivia o cansaço, mas também esfria o corpo, um riacho a ser cruzado e que encharca nossos pés, alterando a passada... Mas a despeito das dificuldades ou facilidades, nos mantemos no percurso. Superamos o desconhecido porque há uma chegada, não importando a distância e o tempo presente que são dimensionados de modo muito individual. O fim do caminho terá uma compreensão e uma perspectiva sentida, de acordo com as experiências vividas particularmente, de um instante que existiu de fato. Pode representar um acontecimento especial para uns e para outros não. Alguns poderão até desistir ou então irão se admirar com as possíveis descobertas no caminho e se surpreenderem, outros considerarão importantes somente a reta final, para o descanso. A chegada do trilhar terá diferentes impressões, ora para apreciar os cenários e deparar-se com uma linda paisagem para contemplar, ora uma cachoeira, o mar e mergulhar fundo só neste instante. O desconhecido se desvenda e torna-se conhecido, com a possibilidade de outras experiências serem vividas.

Trilho minhas palavras fazendo a relação da ação da caminhada com o meu trajeto nas escolas pelas quais passei. O trilhar nos caminhos escolares da minha constituição de professora. Caminhei a passos largos, muitas vezes, em busca de respostas rápidas para as dificuldades surgidas no dia a dia do trabalho. Queria chegar depressa à solução, como se fosse ao final do trajeto. Houve momentos em que respeitei o meu próprio ritmo e, em outros, tentei acompanhar o grupo com quem trabalhava. Caminhos que me proporcionaram alguns aprendizados: nas relações com os alunos e os demais profissionais, na atuação docente que necessita formas

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diferenciadas de organizar a escola, nas práticas e saberes dos processos educativos e pedagógicos frente à realidade da sociedade.

Conto a caminhada na perspectiva de pesquisa no/do/com o cotidiano. Concordo com Ferraço (2003) ao afirmar que o que existe, no fundo, é uma busca por nós mesmos, apesar de se pretender explicar os outros, estamos nos explicando. Esclarece, ainda, ao refletir sobre os sujeitos em interação no/do/com o cotidiano:

- eu penso o cotidiano enquanto me penso;

- eu faço parte desse cotidiano que eu penso; eu também sou esse cotidiano;

- eu não penso ―sobre‖ o cotidiano, eu penso ―com‖ o cotidiano; - esses momentos, movimentos, processos, tentativas, possibilidades de me pensar, possibilitam que eu me conheça ao mesmo tempo que busco conhecer outros.

- mas eu também sou esses outros;

- sou todos aqueles que ali estão e também aqueles que já não estão; - sou parte ausente de uma história passada recontada pelos sujeitos de hoje;

- mas também sou parte de uma história presente ainda por ser contada pelos que virão. (FERRAÇO, 2003, p.160).

Desta forma, nesse estudo, narro a minha experiência que reflete a minha trajetória, caminhante que ainda sou. Tenho a companhia fundamental dos alunos que também trazem as suas experiências que serão contadas. Quando faço um relato, ao contar, não transmito somente a minha história. Elas são enriquecidas pelas variadas vivências que tive com os outros e pelas histórias contadas pelos outros, os alunos e alunas que fazem parte desta narrativa.

É preciso, pois, que eu incorpore a idéia que ao narrar uma história, eu a faço e sou um narrador praticante ao traçar/trançar as redes dos múltiplos relatos que chegaram/chegam até mim, neles inserindo, sempre, o fio do meu modo de contar. Exerço, assim, a arte de contar histórias, tão importante para quem vive o cotidiano do aprender/ensinar. Busco acrescentar ao grande prazer de contar histórias, o também prazeroso ato da pertinência do que é científico.

(ALVES, 2002, p.32). Segundo (GARCIA, 2003, p.204), nas suas reflexões sobre as pesquisas com o cotidiano, esclarece que é importante aprender cotidianamente a reaproximar prática e teoria até que se confundam e voltem a ser o que um dia hão de ter sido, apenas práticateoriaprática, sem divisões

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ou hierarquias. Mergulhar na prática com as práticas, encontrar a riqueza da teoria em movimento que se atualiza no cotidiano. Enriquecida pelo que a cada dia se mostra como novo. O cotidiano como um espaço rico na elaboração de conhecimentos. As professoras como sujeitos de conhecimentos e as crianças, sujeitos de saberes. E a escola como o locus de saberes diferentes que dialogam dialeticamente, contribuindo de modo efetivo para a mudança das vidas de quem nela chega e por ela passa grande parte da vida.

O sentido dado às vivências diárias do trabalho, em essência, deveria, também, ser direcionado ao que se faz e se pensa dele. Em um lugar e tempo diário que pode trazer algo novo na construção de conhecimentos. No entanto, requer a interferência das nossas ações e atitudes: concordando, resistindo e rompendo, às vezes, com um sistema que já está estabelecido, nas diretrizes ou nas normas da educação. Sendo que é no fazer ou não das pessoas, nos relacionamentos, na convivência do dia a dia, que se pode proporcionar, além de uma mudança no fazer do profissional, também o senso de pertencimento ao espaço e ao grupo de trabalho.

Certeau (1985) não analisa as práticas cotidianas apenas enquanto elementos de informação sobre a vida social e econômica das pessoas. Refere-se a elas como a uma arte, justamente a arte que tem como característica essencial ser uma arte de fazer, isto é, que não se traduz num discurso, mas sim em um ato. Apresenta a perspectiva das práticas cotidianas restaurando três componentes fundamentais ou um triplo aspecto dessas práticas, a saber: um caráter estético, um caráter ético e um caráter polêmico. O aspecto estético trata-se de uma arte de fazer, como a maneira de contar uma história, um modo de usar a rua, o espaço do habitat, como nos servimos do vocabulário da vida cotidiana e dos sistemas de representação, por exemplo. Dessa visão estética considera que o aspecto de base é do estilo. Trata-se de uma questão de difícil análise ao nível literário. Contudo o estilo consiste em um modo de utilizar, de manejar uma ordem lingüística imposta. Há ainda o caráter ético, as práticas cotidianas constituem um modo de o agente se recusar a ser identificado à ordem tal como ela se impõe, porque de toda forma, existe uma ordem que não pode ser alterada. Segundo Certeau (1985, p.8) ―[...] O ético é a recusa à identificação com a ordem ou a lei de fatos. É o abrir de um espaço. Um espaço que não é fundado sobre uma realidade existente, mas sobre uma vontade de criar alguma coisa‖. Assim, na multiplicidade das práticas cotidianas, essas transformadoras da ordem imposta, existe um componente ético. Isto é, uma vontade histórica de existir, o que também deve ser restaurado como realidade histórica das práticas cotidianas. O terceiro caráter é o polêmico.

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Nesse aspecto o autor diz que a cultura é fundamentalmente uma polemologia, e que muitas vezes, enquanto sociólogos estiveram alienados em uma perspectiva de observação que considere uma sociedade diferente, um bairro, como um objeto que constitui um sistema. Isso faz esquecer que todas as práticas cotidianas são defesa para a vida, se inscrevem como intervenções em um conflito permanente, em relação de força. O caráter polêmico constitui uma arte de pessoas fracas tendo em vista reencontrar, através da utilização das forças existentes, um meio de se defender ante a posição mais forte.

Relaciono as práticas cotidianas com o fazer educacional, tanto as práticas docentes quanto as discentes referentes aos aspectos éticos, estéticos e enfatizo também os valores. Porque estamos construindo a história nos acontecimentos do cotidiano escolar, somos os sujeitos históricos e sociais que interferem no contexto. Isto se efetiva por meio de nossas atitudes, de escolhas individuais, podendo integrar-se ou não com a dos outros sujeitos. Determinando o momento do presente e do futuro que desejamos como educadores.

O que não é possível é estar no mundo, com o mundo e com os outros, indiferentes a uma certa compreensão de por que fazemos o que fazemos, de a favor de que e de quem fazemos, de contra que e contra quem fazemos o que fazemos. O que não é possível é estar no mundo, com o mundo e com os outros, sem estar tocados por uma certa compreensão de nossa própria presença no mundo. Vale dizer, sem uma certa inteligência da História e do nosso papel nela. (FREIRE, 2000, p.125).

O lugar: A ESCOLA

Na sociedade as transformações sociais, políticas e econômicas são intensas e a escola, como uma instituição integrante deste contexto, também tem seu papel sócio-histórico e cultural. Em sua origem, ela tinha entre seus vários princípios, a educação formal, a transmissão de conhecimentos sistematizados, a formação do ser humano. Mas em seu percurso histórico, apresentou alterações no campo das idéias que orientam sua forma e funcionamento nos aspectos institucional e legal. O sistema escolar já não tem mais a exclusividade em relação à apropriação do conhecimento, já que neste movimento de mudanças temos outras formas de acessos a ele.

Para Canário (2006), a escola atual não corresponde à mesma instituição que marcou a primeira metade do século XX. Durante este período, podem-se conhecer três escolas. A

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instituição sofreu mutações, sintetizadas em uma breve fórmula: a escola passou de uma realidade de certezas, para um contexto de promessas, e na atualidade encontra-se inserida em um contexto de incertezas.

A escola das certezas, da primeira metade do século XX, a partir de um conjunto de valores intrínsecos e estáveis, funcionava como uma ―fábrica de cidadãos‖, dando as bases para a introdução na divisão social do trabalho, constituindo um apoio central do estado-nação. A instituição funcionava em um registro elitista que tornava possível a alguns a ascensão social, permanecendo isenta de responsabilidades na produção das desigualdades sociais. Ela aparecia como um estabelecimento justo em um mundo injusto.

A passagem da escola elitista para a de massas, em uma fase pós-Segunda Guerra Mundial, corresponde à transição da escola de certezas para a das promessas. Há, nesta fase, a expansão quantitativa dos sistemas escolares que coincide com um otimismo associando ―mais escola‖ a promessa de desenvolvimento, mobilidade e igualdade social. O malogro dessas promessas, que justificava a transição da euforia ao desencanto, se deu a partir dos anos 70. A democratização escolar, paradoxalmente, comprometeu-a com a produção das desigualdades sociais.

A escola tinha deixado de ser vista como justa em uma sociedade injusta, passando a acentuar planos de desencanto e frustração, marcando a sua entrada na era das incertezas. Essa fase, que emerge no contexto dos cruzados efeitos do acréscimo de qualificação, de desigualdades, desemprego estrutural de massas, precariedade do trabalho e a desvalorização dos diplomas escolares; estes últimos tornam-se, simultaneamente, imprescindíveis e menos rentáveis. Para cada um, o sucesso supõe o relativo insucesso dos concorrentes.

O modo como o futuro da educação poderá vir a se configurar depende da resposta que for dado ao dilema imposto aos sistemas educativos: o de continuarem a se orientar segundo critérios de subordinação instrumental relativamente a uma racionalidade econômica que cada vez está na raiz dos nossos graves problemas sociais ou, ao contrário, apostar nas virtualidades emancipatórias e de transformação social da ação educativa. (CANÁRIO, 2006, p.17).

Integrada, como tantos educadores, ao dia a dia de uma realidade, influenciamos e somos influenciados pelo contexto das transformações da sociedade, exigindo um repensar contínuo do trabalho. Nesses tempos em que vivemos com a diversidade, a pluralidade dos sujeitos, com as

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formas diversas de conhecimentos, as variadas linguagens e expressões comunicativas e também a crescente influência tecnológica em nossas vidas, deve ser destacada a dimensão da cidadania na prática social e política do movimento diário escolar, articulada e extensiva à esfera da comunidade e da sociedade. Segundo Candau (2002), os processos educativos desenvolvem-se a partir de diferentes configurações. Deve ser reconhecida e promovida a pluralidade de espaços, tempos e linguagens. A educação não pode ser enquadrada em uma lógica unidimensional, aprisionada numa institucionalização específica. É energia de vida, de crescimento humano e de construção social. O fundamental é o seu horizonte de sentido: formar pessoas capazes de ser sujeitos de suas vidas, conscientes de suas opções, projetos de referências e valores, atores sociais responsáveis com um projeto de sociedade e humanidade.

Considero ser fundamental reconhecer que nas práticas docentes e discentes, nos espaços e tempos, encontramos as diferenças, a diversidade. Em um ambiente que necessita tanto das parcerias e da interação do grupo, as práticas não deveriam ser centradas no individualismo ou no isolamento. Os relacionamentos entre as pessoas deveriam ser direcionados ao movimento de coletividade, interações que não acontecem somente nas salas de aula ou nas reuniões, mas em atividades extra–sala, nos projetos, nos eventos festivos, nos torneios, partilhando experiências e conhecimentos originados na escola e fora dela. Estes momentos, que também são pedagógicos e educativos, possibilitam descobertas de outros saberes sobre a escola, proporcionando novos sentidos e transformações.

[...] a escola é o espaço não só de acolhimento das diferenças humanas e sociais encarnadas na diversidade de sua clientela, mas fundamentalmente o locus a partir do qual se engendram novas diferenças, se instauram novas demandas se criam novas apreensões acerca do mundo já conhecido. Em outras palavras, escola é, por excelência, a instituição da alteridade e do estranhamento, marcas indeléveis da medida de transformabilidade da condição humana [...]

(AQUINO, 2000, p.39).

De onde falo: a EMEF

1

Entendo ser válido, ao situar o ambiente escolar, o locus onde foi desenvolvida a pesquisa, apresentar alguns momentos de importantes alterações na sua forma e na organização,

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