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PUC-RIO DEPARTAMENTO DE LETRAS INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA (LET 1804)

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(1)

PUC-RIO

DEPARTAMENTO DE LETRAS

INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA

(LET 1804)

Professora

HELENA FERES HAWAD

(2)

Cronograma de atividades

no. DATA CONTEÚDO / ATIVIDADE

1 2ª f. - 01/03 Apresentação do curso

2 4ª f. - 03/03 Confronto entre a postura da Linguística e a da Gramática Tradicional 3 2ª f. - 08/03 Confronto entre a postura da Linguística e a da Gramática Tradicional 4 4ª f. - 10/03 Propriedades diferenciadoras das línguas naturais

5 2ª f. - 15/03 Propriedades diferenciadoras das línguas naturais

6 4ª f. - 17/03 Linguagem humana vs. sistemas de comunicação animal 7 2ª f. - 22/03 Linguagem humana vs. sistemas de comunicação animal 8 4ª f. - 24/03 A linguagem e suas funções

9 2ª f. - 29/03 O que significa saber uma língua 10 4ª f. - 31/03 O que significa saber uma língua 11 2ª f. - 05/04 O que significa saber uma língua

12 4ª f. - 07/04 Discussão de BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 2009.

13 2ª f. - 12/04 Linguagem, língua e Linguística

14 4ª f. - 14/04 Níveis e unidades de análise linguística; Discussão de PETTER, Margarida. Linguagem, língua, Linguística. In: FIORIN (2002), p.11-24.

2ª f. - 19/04 FERIADO 4ª f. - 21/04 FERIADO

15 2ª f. - 26/04 SEM AULA NO ZOOM - Resolução da prova de G1 (entrega até 27/4)

16 4ª f. - 28/04 A diversidade linguística: dialetos, registros, idioleto 17 2ª f. - 03/05 A diversidade linguística: dialetos, registros, idioleto 18 4ª f. - 05/05 A diversidade linguística: dialetos, registros, idioleto

19 2ª f. - 10/05 Discussão de BELINE, Ronald. A variação linguística. In: FIORIN (2002), p.121-140.

20 4ª f. - 12/05 A mudança linguística 21 2ª f. - 17/05 A mudança linguística

(3)

22 4ª f. - 19/05 Discussão de CHAGAS, Paulo. A mudança linguística. In: FIORIN (2002), p.141-163.

23 2ª f. - 24/05 Línguas em contato: pidgins e crioulos

24 4ª f. - 26/05 Língua e pensamento / língua e cultura; Discussão do texto "O retorno da hipótese de Sapir-Whorf" (Revista Ciência Hoje)

25 2ª f. - 31/05 SEM AULA NO ZOOM - Resolução da primeira prova de G2 (entrega até 1/6)

26 4ª f. - 02/06 A linguagem e o cérebro 27 2ª f. - 07/06 A linguagem e o cérebro 28 4ª f. - 09/06 A aquisição da linguagem

29 2ª f. - 14/06 Discussão de SANTOS, Rachel. A aquisição da linguagem. In: FIORIN (2002), p.211-226.

30 4ª f. - 16/06 Saussure e o início da Linguística moderna 31 2ª f. - 21/06 Saussure e o início da Linguística moderna

32 4ª f. - 23/06 Discussão de PIETROFORTE, Antônio Vicente. A língua como objeto da Linguística. In: FIORIN (2002), p.75-93.

33 2ª f. - 28/06 SEM AULA NO ZOOM - Resolução da segunda prova de G2 (entrega até 29/6)

34 4ª f. - 30/06 AULA DISPONÍVEL PARA REPLANEJAMENTO 35 2ª f. - 05/07 AULA DISPONÍVEL PARA REPLANEJAMENTO

Livros de leitura obrigatória:

BAGNO, M. Preconceito Linguístico - o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 2009.

FIORIN, José Luiz (org.) Introdução à Linguística – I. Objetos Teóricos. São Paulo: Contexto, 2002.

(4)

Sumário

UNIDADE 1: Linguagem, língua e Linguística

O que é Linguística – Linguística e Gramática Tradicional ... 6

Algumas propriedades diferenciadoras das línguas naturais ... 11

Linguagem humana e sistemas de comunicação animal ... 14

O que significa saber uma língua: conhecimento da estrutura e conhecimento do uso da língua ... 21

A linguagem e suas funções ... 29

Linguagem, língua e Linguística ... 33

Níveis de análise linguística ... 37

Exercício de revisão para G1 ... 39

UNIDADE 2: A linguagem na sociedade A diversidade linguística: idioleto, dialetos, registros ... 41

Para saber mais: Variação regional do português do Brasil – os atlas linguísticos ... 50

A mudança linguística ... 52

Línguas em contato: pidgins e crioulos ... 60

Língua e pensamento / língua e cultura ... Exercício de revisão para G2 (Unidade 2) ... 67 71 UNIDADE 3: A linguagem humana e a espécie humana A linguagem e o cérebro ... 73

A aquisição da linguagem ... 83

UNIDADE 4: A Linguística moderna O Estruturalismo europeu: a contribuição de Ferdinand de Saussure ... 90

(5)

UNIDADE 1

(6)

O QUE É LINGUÍSTICA / LINGUÍSTICA E GRAMÁTICA TRADICIONAL

A Linguística é o estudo científico da linguagem humana.

A Linguística e a Gramática Tradicional têm posturas diferentes em face dos fenômenos linguísticos. A Gramática Tradicional assume a postura normativa, enquanto a Linguística assume a postura descritivo-explicativa.

A postura normativa A postura descritivo-explicativa

Vale-se de critérios não linguísticos (isto é, critérios externos à língua) para estabelecer o “certo” e o “errado”: critérios sociais, históricos, literários, políticos, culturais.

Não emite juízo de valor sobre as formas linguísticas (ainda que reconheça os juízos de valor que vigoram na comunidade de fala).

Reconhece apenas uma variedade da língua como válida, isto é, desconsidera a variação linguística. Assim, opera uma redução do objeto de estudo.

Reconhece que todas as variedades da língua são sistemáticas e são funcionais para seus usuários e que, portanto, todas são passíveis de estudo, todas são objeto de interesse científico.

É prescritiva – estabelece as formas “corretas” para “falar e escrever bem” – e, por conseguinte, é “proscritiva”, já que desqualifica e rejeita certas formas de uso corrente entre falantes nativos. Nesse sentido, apresenta a língua “como ela deveria ser”.

É descritiva – procura conhecer a língua tal como ela se apresenta no uso real de seus falantes nativos – a língua “como ela é”.

É também explicativa – procura descobrir e formular princípios gerais que possibilitem entender a natureza e o funcionamento das línguas.

A variedade linguística representada na gramática normativa brasileira não corresponde perfeitamente à variedade nativa efetivamente usada por nenhum grupo social ou região do país. Por isso se faz necessário distinguir entre língua culta real – aquela usada de fato pelos falantes mais cultos, e reconhecida pela comunidade falante como sendo a variedade de prestígio – e língua culta ideal – aquela representada na gramática normativa como sendo a variedade culta. Devido a essa diferença, Marcos Bagno, no livro Preconceito linguístico, evita o termo “norma culta” (que, sendo ambíguo, pode dar margem a mal-entendidos), e prefere usar, respectivamente,

variedades prestigiadas e norma padrão.

Alguns exemplos de divergência entre a língua culta real e a língua culta ideal:

REAL IDEAL

pronomes pessoais nós, vocês, eles nós, vós, eles

pronome objeto Eu vi ele. Eu o vi.

(7)

Conceitos de gramática:

1. Gramática é um conjunto de regras para falar e escrever corretamente. (GRAMÁTICA NORMATIVA)

2. Gramática é um conjunto de regras que um falante nativo tem armazenadas em sua mente, e que são efetivamente empregadas para produzir e compreender enunciados toda vez que o falante usa a língua. (GRAMÁTICA INTERNALIZADA)

3. Gramática é um modelo teórico elaborado por um linguista para descrever (representar, explicitar) a gramática internalizada. (GRAMÁTICA DESCRITIVA)

Diferentes conceitos de regra correspondem a essas diferentes acepções de gramática:

1. Na gramática normativa, regra é uma prescrição para “falar e escrever bem”. Por exemplo:

 Não se diz “assistir um filme”, e sim “assistir a um filme”.  Não se diz “eu encontrei ele”, e sim “eu o encontrei”.  Não se diz “chegar em casa”, e sim “chegar a casa”.

2. Na gramática internalizada, regra é um mecanismo geral de organização das frases, necessário para formar qualquer frase da língua. Por exemplo:

 Artigos antecedem os substantivos a que se referem (p.ex. “a bola”, “um doce”, mas não

“bola a”, “doce um”).

 Adjetivos concordam em gênero com o substantivo a que se referem (p.ex. “criança

esperta” / “cachorro esperto”).

3. Na gramática descritiva, regra é uma representação, em linguagem científica, da regra no sentido 2 acima.

Exercícios

1. Levando em conta o texto abaixo, extraído de um site da internet, explique o que são a

língua culta real e a língua culta ideal (também chamadas, por Marcos Bagno, de variedades prestigiadas e norma padrão, respectivamente).

Dicas de português: pisar a grama ou pisar na grama?

Àqueles que usam essa placa “Não pise na grama”, pelo amor de Deus, passou da hora de mudá-la.

O correto é: “Não pise a grama”.

Exemplo: Não pise a grama, disse o zelador do prédio. Não pise na grama: Evitem-na.

Até a próxima e cuidado ao pisar a grama.

Professor Rafael Vieira

(8)

2. Explique por que a crença corrente de que os brasileiros com pouca escolaridade falam sem seguir regras gramaticais é infundada.

3. Leia a carta de leitor abaixo, publicada no jornal O Globo em 11/10/11, e comente a atitude que se manifesta nela em relação à língua portuguesa. Fundamente o comentário com trechos da carta.

4. Leia o fragmento abaixo, extraído de uma gramática normativa, e faça o que se pede em seguida, nos itens a e b.

Preferir

Como bitransitivo (preferir uma coisa A outra coisa) significa querer antes, escolher uma

entre duas ou várias coisas. Exemplos:

“Capitu preferiu tudo ao seminário.” (Machado de Assis)

“Mas eu preferia todas as brutalidades à sua indiferença.” (Coelho Neto) Não se diz preferir uma coisa que ou do que outra.1

1 Se bem seja sintaxe usual na língua falada, preferir...do que não alcançou estabilizar-se nem na língua literária dos

Modernistas de vanguarda, entre os quais só apareceu esporadicamente.

(LIMA, Carlos Henrique da Rocha. Gramática Normativa da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1980. p.408. Fragmento adaptado.)

a. Identifique o critério implícito nesse fragmento para o estabelecimento do uso dito correto. b. Comente o emprego desse critério, apontando a diferença entre tal postura e a da Linguística.

(9)

O gigolô das palavras

Luís Fernando Verissimo

Quatro ou cinco grupos diferentes de alunos do Farroupilha estiveram lá em casa numa mesma missão, designada por seu professor de Português: saber se eu considerava o estudo da Gramática indispensável para aprender e usar a nossa ou qualquer outra língua. Cada grupo portava seu gravador cassete, certamente o instrumento vital da pedagogia moderna, e andava arrecadando opiniões. Suspeitei de saída que o tal professor lia esta coluna, se descabelava diariamente com suas afrontas às leis da língua, e aproveitava aquela oportunidade para me desmascarar. Já estava até preparando, às pressas, minha defesa ("Culpa da revisão! Culpa da revisão!"). Mas os alunos desfizeram o equívoco antes que ele se criasse. Eles mesmos tinham escolhido os nomes a serem entrevistados. Vocês têm certeza que não pegaram o Veríssimo errado? Não. Então vamos em frente.

Respondi que a linguagem, qualquer linguagem, é um meio de comunicação e que deve ser julgada exclusivamente como tal. Respeitadas algumas regras básicas da Gramática, para evitar os vexames mais gritantes, as outras são dispensáveis. A sintaxe é uma questão de uso, não de princípios. Escrever bem é escrever claro, não necessariamente certo. Por exemplo: dizer "escrever claro" não é certo mas é claro, certo? O importante é comunicar. (E quando possível surpreender, iluminar, divertir, comover... Mas aí entramos na área do talento, que também não tem nada a ver com Gramática.) A Gramática é o esqueleto da língua. Só predomina nas línguas mortas, e aí é de interesse restrito a necrólogos e professores de Latim, gente em geral pouco comunicativa. Aquela sombria gravidade que a gente nota nas fotografias em grupo dos membros da Academia Brasileira de Letras é de reprovação pelo Português ainda estar vivo. Eles só estão esperando, fardados, que o Português morra para poderem carregar o caixão e escrever sua autópsia definitiva. É o esqueleto que nos traz de pé, certo, mas ele não informa nada, como a Gramática é a estrutura da língua mas sozinha não diz nada, não tem futuro. As múmias conversam entre si em Gramática pura.

Claro que eu não disse isso tudo para meus entrevistadores. E adverti que minha implicância com a Gramática na certa se devia à minha pouca intimidade com ela. Sempre fui péssimo em Português. Mas – isso eu disse – vejam vocês, a intimidade com a Gramática é tão dispensável que eu ganho a vida escrevendo, apesar da minha total inocência na matéria. Sou um gigolô das palavras. Vivo às suas custas. E tenho com elas exemplar conduta de um cáften profissional. Abuso delas. Só uso as que eu conheço, as desconhecidas são perigosas e potencialmente traiçoeiras. Exijo submissão. Não raro, peço delas flexões inomináveis para satisfazer um gosto passageiro. Maltrato-as, sem dúvida. E jamais me deixo dominar por elas. Não me meto na sua vida particular. Não me interessa seu passado, suas origens, sua família nem o que os outros já fizeram com elas. Se bem que não tenha também o mínimo escrúpulo em roubá-las de outro, quando acho que vou ganhar com isto. As palavras, afinal, vivem na boca do povo. São faladíssimas. Algumas são de baixíssimo calão. Não merecem o mínimo respeito.

Um escritor que passasse a respeitar a intimidade gramatical das suas palavras seria tão ineficiente quanto um gigolô que se apaixonasse pelo seu plantel. Acabaria tratando-as com a deferência de um namorado ou a tediosa formalidade de um marido. A palavra seria a sua patroa! Com que cuidados, com que temores e obséquios ele consentiria em sair com elas em público, alvo da impiedosa atenção de lexicógrafos, etimologistas e colegas. Acabaria impotente, incapaz de uma conjunção. A Gramática precisa apanhar todos os dias para saber quem é que manda.

(10)

Roteiro de leitura de BAGNO, M. A mitologia do preconceito linguístico. In: Preconceito Linguístico – o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 2009.

Capítulo I. p. 23-92.

1. O que distingue, hoje em dia, o preconceito linguístico de outras formas de preconceito?

2. Explique a afirmação “(...) existem milhões de brasileiros sem língua.” (p.29) 3. Por que “monolinguismo” não se confunde com “homogeneidade linguística”?

4. Em que sentido os estrangeirismos oferecem um exemplo de correlação entre fatos linguísticos e fatos culturais?

5. Dê um exemplo de diferença entre o português do Brasil e o de Portugal, dentre os que aparecem no texto.

6. Que exemplo o autor apresenta para comprovar que a ideia de que os portugueses obedecem rigorosamente à gramática normativa é falsa?

7. Como o autor explica a perpetuação do mito de que “português é muito difícil”?

8. Explique a afirmação de Gnerre, citada na p.62, de que a propaganda da suposta dificuldade da língua é “o arame farpado mais poderoso para bloquear o acesso ao poder”.

9. Relacione os exemplos do rotacismo e da palatalização à afirmação “o problema não está naquilo que se fala, mas em quem fala o quê.” (p.67)

10. Por que as tentativas de atribuir a qualquer comunidade de falantes “o melhor” ou “o pior” português devem ser abandonadas?

11. Explique o que o autor chama de “inversão dos fatos históricos” no segundo parágrafo da p.94.

Capítulos II e III. p. 93-168.

12. Quais são os “quatro elementos” analisados no capítulo II, e de que forma contribuem para alimentar o preconceito linguístico?

13. Por que o autor não considera que a proliferação dos chamados comandos paragramaticais seja “saudável”?

14. Na seção 1 do capítulo 3, o autor aponta três problemas que dificultam o acesso a formas prestigiadas de falar. Quais são eles?

15. Explique por que se pode afirmar que “não existe erro de português” (p.176).

16. A seção 5 do capítulo III se intitula “Então vale tudo?”. Responda a essa pergunta-título, na perspectiva das ideias defendidas no livro.

17. Explique o seguinte fragmento:

“(...) não nos parece nem um pouco ‘inadmissível’ a existência de dúvidas e hesitações (...) no momento de escrever.” (p.194)

18. Na cisão número 10 (p.202), há um jogo de palavras: “aulas/jaulas”. No que diz respeito ao ensino do português, em que sentido as aulas podem ser consideradas “jaulas”?

(11)

ALGUMAS PROPRIEDADES DIFERENCIADORAS DAS LÍNGUAS NATURAIS

1.MULTIPLICIDADE DE FUNÇÕES: as línguas naturais realizam múltiplas funções, não se limitam

à função comunicativa. Exercem, entre outras, uma função cognitiva (de organizar o pensamento), uma função conativa (de influenciar o comportamento do destinatário), uma função fática (de estabelecer o canal de comunicação) etc.

2.INDEPENDÊNCIA DE ESTÍMULOS EXTERNOS: As línguas naturais permitem ao homem recriar e reclassificar a realidade ou a experiência, a partir de representações que substituem a experiência (função simbólica ou representativa). Na linguagem animal, as mensagens são dependentes de estímulos externos; a transmissão da informação depende da experiência. Nas línguas naturais, o enunciado que alguém profere em uma dada situação é, em princípio, não predizível, e não pode ser concebido como uma resposta a um estímulo (linguístico ou não linguístico), como proposto pela teoria behaviorista da linguagem.

3.ARBITRARIEDADE: “Uma propriedade da linguagem humana (em oposição às propriedades de

alguns sistemas semióticos) pela qual as formas linguísticas aparentemente não apresentam nenhuma correspondência física com as entidades do mundo real a que se referem.” (Dicionário de Linguística e Fonética, de David Crystal)

Algumas palavras da língua podem ser icônicas, isto é, é possível recuperar uma conexão não arbitrária entre forma e significado; p.ex. onomatopeias: tique-taque, ronronar, piar. Contudo, as onomatopeias não são idênticas quando se comparam línguas.

4.PRODUTIVIDADE: “Termo geral em Linguística com referência a uma capacidade CRIATIVA* dos usuários da língua de produzir e entender um número indefinidamente grande de sentenças. Opõe-se particularmente aos sistemas de comunicação não-produtivos dos animais.” (Dicionário de Linguística e Fonética, de David Crystal)

As línguas naturais são compostas de unidades discretas, destituídas de significado em si mesmas, mas capazes de gerar um número infinito de mensagens.Lobato (1986,p.41) observa que as mensagens, além de ilimitadas em número, também o são, teoricamente, em extensão – “não existe a maior frase de uma língua. (importante distinguir gramaticalidade e aceitabilidade)

* Não se deve confundir a acepção técnica do termo criativo, empregado em Linguística, com a acepção encontrada em contextos artísticos e literários, em que o termo é relacionado às noções de imaginação e originalidade.

5. DUALIDADE DE ESTRUTURA: “Considerada uma propriedade da linguagem humana (em oposição às propriedades de outros sistemas semióticos), vê as línguas como organizadas estruturalmente em termos de dois níveis abstratos.” (Dicionário de Linguística e Fonética, de David Crystal)

 Dupla-articulação – expressão usada por André Martinet, linguista francês, para se referir aos dois níveis de estrutura em que uma língua está organizada: 1a articulação, que compreende formas significativas (morfemas, palavras, sintagmas, sentenças, etc.) e a 2a articulação, formada por unidades sonoras, sem significado próprio (os fonemas).

(12)

Exercícios

1. Em certa brincadeira de salão, os participantes se sentam em círculo, e um deles começa dizendo algo como: “Eu vou ao piquenique e vou levar sanduíches”. O seguinte continua dizendo algo como: “Eu vou ao piquenique e vou levar sanduíches e maçãs”; o terceiro prossegue com algo como “Eu vou ao piquenique e vou levar sanduíches, maçãs e uma bola”, e assim por diante. Os que erram vão se retirando da roda, até que reste só um, que será o vencedor do jogo.

Usando essa brincadeira como exemplo, explique o que são as propriedades da produtividade e da independência de estímulos externos, características das línguas naturais.

2. As placas abaixo compõem um sistema de sinais com finalidade de comunicação. Compare esse sistema com as línguas naturais no que diz respeito à produtividade e à arbitrariedade.

Fontes das imagens: http://www.freeimages.com/assets/9/89733/girls-and-boys-2-321776-m.jpg http://www.freeimages.com/assets/9/89733/girls-and-boys-1-321775-m.jpg

3. Entre as funções das línguas naturais, podemos destacar a de veicular informações e a de expressar atitudes e emoções. Usando o enunciado abaixo como exemplo, mostre que essas duas funções podem se realizar simultaneamente, isto é, na mesma mensagem.

(13)

4. As placas abaixo fazem parte de um sistema de comunicação: a sinalização de trânsito. Compare esse sistema com a linguagem humana no que diz respeito à propriedade da dupla articulação.

(14)

LINGUAGEM HUMANA E SISTEMAS DE COMUNICAÇÃO ANIMAL

Obs.: O material a seguir foi reproduzido de Pimenta-Bueno, M. do N. Apostila do curso de

Introdução à Linguística. Mimeo, e sofreu acréscimos.

Pinker, S. O instinto da linguagem: como a mente cria a linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2002 (copyright 1994)

Pergunta básica: A linguagem é uma propriedade exclusiva da espécie humana ou não?  A comunicação animal pode ser natural ou artificial.

Exemplos de comunicação animal natural:

AKMAJIAN, Adrian.; DEMERS, Richard A., colab.; HARNISH, Robert, M. colab. Linguistics : an introduction to language and communication /. Cambridge : MIT 1979. 357p.

1. A comunicação das abelhas (dados de von Frisch, 1967, apud AKMAJIAN, DEMERS & HARNISH, 1979: 9-19):

Ao encontrar uma fonte de alimento, uma abelha retorna à colmeia e recruta outras para a coleta por meio de movimentos corporais conhecidos como “dança”.

1.1 A abelha austríaca preta: (1) Realiza dois tipos de dança:

a dança circular (the round dance), cujas funções principais são as de:  sinalizar que a fonte de alimento se encontra a até 10 m da colmeia;

 informar o grau de riqueza da fonte de alimento, o que é feito mediante a intensidade da dança, em termos de sua velocidade e tempo de duração; e

 indicar o tipo de fonte de alimento que as abelhas recém-recrutadas devem procurar, o que é feito mediante o cheiro exalado pela abelha dançarina.

a dança “abanando a cauda” (the tail-wagging dance), cujas funções principais são as de:  indicar distâncias mais longas da fonte de alimento (superiores, inclusive, a 100m);  indicar a direção da fonte em relação à posição do sol;

 indicar a riqueza da fonte.

Quanto mais tempo gasto na parte reta da dança, abanando a cauda, menos vezes a abelha repetirá o padrão completo por unidade de tempo. Quanto menos circuitos por tempo, mais longe fica a fonte. Por exemplo: 9 a 10 circuitos por 15s  fonte a 100m; 6 circuitos pr 15s  fonte a 500m; 4 circuitos por 15s fonte a 1.500m.

(2) Transmite os seguintes tipos de informação por meio das danças que executa: (a) distância do alimento da colmeia  tipo de dança;

(b) vivacidade da dança  qualidade do alimento; (c) cheiro na abelha  tipo de alimento;

(d) orientação da parte reta da dança  direção do voo, em relação ao sol.

(15)

1.2. A abelha italiana:

(1) Realiza três tipos de dança:

(a) a dança circular, cuja função principal é a de indicar que a fonte de alimento está a até 10 m da colmeia, mas que tem, também, as demais funções referidas no caso da dança circular das abelhas austríacas pretas;

(b) a dança em forma de foice, cuja função primordial é a de indicar que a fonte de alimento está entre 10 e 100 m da colmeia, sendo que o centro da “foice” aponta a direção da fonte; e

(c) a dança “abanando a cauda”, cujas funções principais são as mesmas da das abelhas austríacas pretas, ou seja, as de:

 indicar que a fonte de alimento está a mais de 100 m da colmeia (até a distância de 11 km);  indicar a direção da fonte em relação à posição do sol;

 indicar a riqueza da fonte. Observações importantes:

- A abelha italiana dança mais lentamente que a austríaca preta.

- Quanto à aquisição, observa-se que a habilidade para dançar e navegar é inata, mas a precisão da dança melhora com o tempo.

- As abelhas híbridas herdam os padrões de dança do ancestral (pai ou mãe) com que se parecem fisicamente.

A linha do alto mostra o padrão de dança executado pela abelha para informar aos outros membros da colmeia a distância e direção em que se encontra a nova fonte de alimentos.

(16)

2. A comunicação dos primatas mais altos: 3.1. Características gerais dos sinais emitidos:

(a) sinais dependentes do contexto;

(b) sinais multimodais, com vários canais sensoriais simultâneos.

3.2. Comunicação predominantemente visual (posturas e gestos, incluindo expressões faciais) a pequenas distâncias.

3.3. Comunicação vocal: poucos sons (cerca de 36), relacionados a poucas situações diferentes, com poucas mensagens.

Exemplos: chamados de alarme (ajuntamento contra cobras; contra predador aéreo; contra predador terrestre).

3.4. Quanto à aquisição: base inata; detalhes aprendidos; produção inata; compreensão adquirida.

3.5. Foram constatadas algumas diferenças entre os hemisférios cerebrais em algumas espécies de macacos, diferenças essas localizadas especificamente na região de seu hemisfério esquerdo relacionada à sua capacidade comunicativa

Exemplos de comunicação animal artificial (animais submetidos a experimentos)

1. O chimpanzé-fêmea Viki: Foi “adotada” pelo casal de pesquisadores Keith and Catherine Hayes, que moraram com ela como se fosse um bebê humano. Após intenso treinamento, que incluiu a manipulação de seus lábios e mandíbula pelos pesquisadores, conseguiu vocalizar apenas quatro palavras (mama, papa, cup e up). O experimento ocorreu entre o fim da década de 1940 e o início da década de 1950.

2. O chimpanzé-fêmea Washoe: uso da Língua de Sinais Americana. (American Sign

Language – ASL) Projeto conduzido por Allen e Beatrice Gardner, na universidade de Nevada, a

partir de 1966. Washoe morreu no Chimpanzee and Human Communication Institute em 2007, aos 42 anos de idade.

Washoe inventou um sinal para babador e, ao invés de usar o sinal relativo a pato para cisne, combinou os sinais de pássaro e água para tal: cisne = pássaro + água.  uso criativo da linguagem? Pinker: os chimpanzés utilizariam os mesmos sinais para se referir a objetos e a qualquer aspecto da situação em que o objeto estivesse envolvido (ex. escova de dente – objeto escova de dente, pasta de dente, escovar o dente, quero minha escova de dente, etc. (problema da interpretação dos pesquisadores)

Roger Fouts, outro pesquisador do projeto Washoe, afirmou que uma comunidade de chimpanzés falantes de ASL (incluindo Washoe) estaria usando de forma espontânea essa língua para estabelecer comunicação. Um dos filhotes adotivos de Washoe, Loulis, teria aprendido a ASL diretamente dos outros chimpanzés desse grupo. – não comprovado / parece que Loulis aprendeu a usar não mais do que 5 sinais.

(17)

- Comentários do único deficiente auditivo que integrava a equipe que acompanhava Washoe:

Cada vez que o chimpanzé fazia um sinal, tínhamos de anotá-lo no registro... Eles sempre se queixavam porque no meu registro não havia muitos sinais. Todas as pessoas ouvintes apresentavam registros com longas listas de sinais. Sempre viam mais sinais que eu... Eu observava com muito cuidado. O chimpanzé movimentava as mãos sem parar. Talvez eu tenha deixado de perceber alguma coisa, mas acho que não. Eu simplesmente não via sinais. Os ouvintes anotavam qualquer movimento que o chimpanzé fazia como um sinal. Cada vez que ele punha o dedo na boca, eles diziam: “Oh, ele está fazendo o sinal de beber”, e eles lhe davam leite... Quando o macaco se coçava, registravam isso como um sinal de coçar... Quando [os chimpanzés] querem algo, eles pegam. Às vezes [o treinador] dizia: “Oh, que interessante, veja isso, é exatamente como o sinal em ASL para dar!” Não era. (Pinker, 2002, p.433)

3. O chimpanzé-fêmea Sarah: Experimento desenvolvido de 1967 a 1987 por David e Ann Premack. Uso de sinais arbitrários, de vários formatos, tamanhos e cores, com ímãs. No processo, Sarah:

 demonstrou certa capacidade para a metalinguagem;  demonstrou capacidade para a mendacidade;

 demonstrou dar atenção à ordem das palavras (regras de sintaxe), exibindo a capacidade de entender frases estruturadas, mas não a capacidade de produzi-las;

 não se revelou capaz de lidar com estruturas complexas e que envolvessem ambiguidades estruturais (Ex.: Sarah, coloque maçã balde banana prato.);

 não iniciava conversações, nem fazia perguntas;

 necessitou de instrução explícita para adquirir o sistema de comunicação que foi capaz de desenvolver, diferentemente do que ocorre com crianças, em sua fase de aquisição linguística;  colocada em contato com outros chimpanzés, não transmitiu aos mesmos o sistema de

comunicação (baseado na linguagem humana) que adquirira.

4. O chimpanzé Nim Chimpsky (trocadilho com o nome do linguista Noam Chomsky) Estudo conduzido na universidade de Colúmbia com o pesquisador Herbert S. Terrace, a partir do início da década de 1970, na tentativa de replicar resultados obtidos pelos Gardners, a partir de condições mais controladas de aprendizado da ASL (American Sign Language):

Project Nim / Laura-Ann Petitto sinalizando com Nim

(18)

 Teria aprendido algo em torno de 125 sinais (os quais, no entanto, em estudo mais cuidadoso, poderiam ser reduzidos a 25).

 Uso estritamente pragmático da linguagem; ausência de uso espontâneo.

 Jane Goodall (etologista): sinais de Nim seriam bastante similares aos produzidos pelos chimpanzés em estado selvagem – “os chimpanzés estariam se amparando muito mais nos gestos de seu repertório natural do que aprendendo os sinais arbitrários da ASL”(Pinker, p.433).

 Exemplos de frases produzidas por Nim: Nim eat Nim eat; Drink eat me Nim; Me gum Me gum; Tickle me Nim play, etc. Maior frase produzida: Give orange me give eat orange me eat orange give me eat orange give me you.

Crítica dos Gardners ao tipo de treinamento realizado – situações de laboratório, emprego de muitos assistentes diferentes.

5. O chimpanzé pigmeu (ou bonobo) Kanzi; emprego de lexogramas (símbolos visuais em uma prancheta portátil):

 Pesquisas conduzidas por Sue Savage-Rumbaugh e Duane Rumbaugh indicariam que esse chimpanzé teria um desempenho na aprendizagem de símbolos e na compreensão da linguagem falada melhor do que chimpanzés comuns.

- Kanzi teria aprendido os símbolos gráficos sem treinamento intensivo, apenas teria observado o treinamento (malsucedido) de sua mãe (iniciado no começo da década de 1980).

- Kanzi empregaria símbolos não apenas para pedir (embora apenas 4% das vezes) e usaria frases compostas de três símbolos.

Sue Savage Rumbaugh com Kanzi em 2003

Fonte da imagem: https://linguistlist.org/blog/2013/08/research-colloquium-2013-discussion-of-non-human-primates-and-the-human-language/ Acesso em 11/2/14

http://www.iowagreatapes.org/bonobo/meet/kanzi.php# http://www.iowagreatapes.org/bonobo/language/

(19)

Traços não distintivos entre a linguagem humana e os sistemas de comunicação animal

LINGUAGEM HUMANA COMUNICAÇÃO ANIMAL

1. Uso da linguagem como sistema de comunicação.

1. Uso de sistemas de comunicação por muitas espécies animais.

2. Aspecto vocal-auditivo / gestos dos surdos.

2. Capacidade de vocalização, por parte de algumas espécies animais, como os papagaios e os mainás.

3. Arbitrariedade a priori / motivação a

posteriori.

3. Presença de aspectos não arbitrários em alguns sistemas de comunicação animal (ex.: o grau de vivacidade da dança das abelhas está associado ao grau de qualidade do alimento).

Traços distintivos entre a linguagem humana e os sistemas de comunicação animal

LINGUAGEM HUMANA COMUNICAÇÃO ANIMAL

1.É aberta, criativa; composta de unidades discretas, destituídas de significado em si mesmas, mas capazes de gerar um número infinito de mensagens.

1. São limitados; são compostos seja de pequeno número de sinais discretos e que geram um número reduzido de

mensagens (ex.: os primatas mais altos), seja de variação contínua dentro de uma ou de algumas poucas dimensões, gerando, portanto, apenas variantes de uma única mensagem (ex.: as abelhas). 2. Independe de estímulos externos. 2. Requerem estímulos externos ou físicos. 3. Permite referência a realidades

imaginadas.

3. Não permite referência a realidades imaginadas.

4. Possui funções linguísticas isoláveis, inclusive em uma mesma mensagem.

4. Não possuem funções linguísticas isoláveis em uma mesma mensagem.

(20)

O que aconteceu na Revolução Cognitiva?

(cerca de 70.000 anos atrás)

Nova habilidade Benefícios

Capacidade de transmitir maiores

quantidades de informação sobre o mundo à volta do Homo sapiens

Planejamento e realização de ações

complexas, como evitar leões e caçar bisões

Capacidade de transmitir grandes

quantidades de informação sobre as relações sociais dos sapiens

Grupos maiores e mais coesos, chegando a 150 indivíduos

Capacidade de transmitir grandes

quantidades de informação sobre coisas que não existem de fato, tais como espíritos tribais, nações, companhias de

responsabilidade limitada e direitos humanos

a. Cooperação entre números muito grandes de estranhos

b. Rápida inovação do comportamento social

HARARI, Yuval Noah. Sapiens: uma breve história da humanidade. Tradução Janaína Marcoantonio. 25. ed. Porto Alegre, L&PM, 2017. p.45.

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O QUE SIGNIFICA SABER UMA LÍNGUA:

CONHECIMENTO DA ESTRUTURA E CONHECIMENTO DO USO DA LÍNGUA REFERÊNCIA: Pimenta-Bueno, M. do N. Apostila do curso de introdução à Linguística

Saber uma língua envolve dispor de uma série de habilidades linguísticas, dentre as quais se destacam as seguintes:

A. NO QUE SE REFERE À ESTRUTURA DA LÍNGUA:

1. Ser capaz de emitir e compreender frases nunca produzidas ou ouvidas antes.

Exemplo: Se você encontrar aquele rinoceronte que estava andando ainda há pouco aqui no

corredor, não se esqueça de oferecer a ele uma empadinha.

2. Saber o que é e o que não é parte da língua: (a) em termos de enunciados inteiros

Exemplo: o livro do professor está na mesavs. *da mesa na professor livro está o

(b) em termos de sons isolados Exemplos: [] - thick (inglês)

[y] - rue (francês).

(c) em termos de sequências de sons Exemplos: [sl] - slide (inglês)

[dv] - Dvorjak.

(d) em termos da posição de sons em palavras ou sílabas.

Exemplo: [r] vibrante múltipla ápico-alveolar – ocorre no início de palavra (rua), no meio onde se escreve –rr (carro), no final de sílaba (mar).

3. Saber reconhecer anomalias semânticas em frases. Exemplos: # A maçaneta nasceu.

# João quebrou a carta. # Aquele solteirão é casado.

4. Saber identificar anomalias sintáticas em frases. Exemplos: *Ela morreu a barata.

* Eu sei que ela venha hoje. vs. Eu sei que ela vem hoje. * Eu quero que ela vem hoje. vs. Eu quero que ela venha hoje. * Eu acho que ela venha hoje. vs. Eu não acho que ela venha hoje.

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5. Saber identificar ambiguidades semânticas e sintáticas, e ser capaz tanto de usá-las voluntariamente, quanto de desfazê-las.

Exemplos de ambiguidade semântica (lexical):

Mas que manga enorme! (manga – roupa; fruta)

Essa conta é realmente enorme! (conta – pedra, operação matemática, nota a pagar)

Exemplos de ambiguidade sintática (estrutural):

Meninas e meninos adolescentes são muito sensíveis. Mateus escondeu o brinquedo do irmão.

A mulher do missionário está cozinhando. O frango está pronto para comer.

6. Ser capaz de reconhecer a classe de uma palavra desconhecida (inventada ou pouco familiar). Exemplos:

Essa é a primeira vez que eu como [sinolone]. N Ele [trapelou] o pedido de Maria.

V

Maria anda muito [sinolona] ultimamente. Adj

Ulysses Guimarães morreu [nosiladamente]. Adv

7. Ser capaz de segmentar um enunciado em termos de suas partes estruturalmente relevantes. Exemplos:

- João e Maria foram à praia. - Quem foi à praia?

- João e Maria.

- João e Maria foram à praia.

- Quem foi mesmo à praia com João? - Maria.

- Pedro comprou um carro importado. - O que foi que Pedro comprou? - Um carro importado.

João matou o lobo / O lobo matou João.

Pedro e a noiva, que estuda na PUC, vão viajar no feriado. Pedro e a noiva, que estudam na PUC, vão viajar no feriado.

(23)

8. Ser capaz de reconhecer palavras e frases relacionadas. Exemplos com palavras:

 música / musical / musicalmente

 twitter / tuiterificação (encontrada em notícia de jornal em fevereiro de 2017) Exemplos com frases:

 O príncipe pediu um bolo e a princesa o fez. (OU: ...e a princesa fez.)  A princesa fez o bolo que o príncipe pediu.

 O bolo que o príncipe pediu foi feito pela princesa. 9. Ser capaz de parafrasear palavras e frases.

Exemplos:

 O marido de minha irmã estudou Direito. / Meu cunhado estudou Direito.  Ele disse que era capaz de vir. / Ele disse que talvez viesse.

10. Saber reconhecer diferenças linguisticamente relevantes e ignorar diferenças linguisticamente irrelevantes.

Exemplos:

[p] / [b] pato / bato

[h] / [R] Rio

[t] / [t] tio (PE) / tio (Rio)

11. Ser capaz de reconhecer semelhanças e identidades linguísticas:

(a) homônimos (som igual; sentido diferente): Exemplos:

 comprar algo / comprar alguém

 este copo quebrou / esta firma quebrou  dobrar algo / dobrar alguém

(b) sinônimos. Exemplos:

garoto / menino menino Jesus / garoto Jesus. jogo / brincadeira jogo de tênis / brincadeira de tênis

brincadeira de roda / jogo de roda

(Inexistência de uma sinonímia perfeita; condições pragmáticas distintas associadas aos termos linguísticos.)

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12. Saber fazer correlações trans-oracionais de tempo e de modo. Exemplos: Eu queria que ela viesse hoje.

Eu quero que ela venha hoje.

13. Saber as exigências estruturais dos verbos: se têm ou não sujeito, se têm ou não objeto, quantos objetos têm, de que tipo são o sujeito e os objetos.

Exemplos:

Sujeito:

 chover, nevar  não tomam sujeito  comer, fingir  tomam sujeito lexical

 ocorrer, constar  podem tomar sujeito oracional (Ocorreu-me que ele ainda era criança naquela época. / Constava(-me) que ele era um homem perigoso.)

Objeto:

 beijar 

ver (sensorial): Eu vi João   Maria.  beijando 

ver (intelectual): Eu vi que João amava Maria.

comer um sanduíche/ comer *que....

dizer uma palavra / dizer que ...

14. Saber as exigências de dependência vigentes na língua. Exemplos:

João trata Maria como um escravo. |_____________________|

João trata Maria como uma escrava. |____________|

15. Saber identificar relações de co-referencialidade. Exemplos:

João j prometeu a Pedro p levá-lo p,t ao cinema.

(25)

B. NO QUE SE REFERE AO USO DA LÍNGUA:

1. Saber se o enunciado é ou não apropriado ao contexto extralinguístico em que é produzido.

Exemplo:

Calouro se dirigindo ao Reitor: - O que é que há, cara?

- Tudo bem, brou?

2. Ser capaz de produzir e entender metáforas

Exemplo:

A princesa estava elegantíssima no mais recente casamento na família real.

A princesa aqui quer tudo na mãozinha, não se digna sequer a pegar, ela mesma, um copo d’água pra beber.

Efeito do uso sobre o sistema linguístico: incorporação de metáforas muito usuais ao significado de certas palavras. P. ex. pé da mesa; orelha do livro; orelhão (cabine telefônica).

3. Ser capaz de levar em conta elementos da situação para interpretar o sentido dos enunciados e cooperar adequadamente na interação.

Exemplos:

 Você tem um lápis?  Você tem relógio?

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4. Saber usar conhecimentos extralinguísticos, de natureza pragmática, na interpretação de enunciados.

Exemplos:

 Pelé jogava muito bem. [futebol]  Guga jogava muito bem. [tênis]

 We sell alligator shoes. / We sell horse shoes.

 Vendemos bolsas de crocodilo. / Vendemos comida de cachorro.  pau  Eu gosto de tomar sopa com uma colher de  pimenta .

 chá

5. Saber valer-se dos gestos audíveis e dos gestos visíveis, culturalmente aprendidos, usados (para) linguisticamente.

Exemplos de gestos audíveis:

 Shhhhh!  Psiu!  Tsk,tsk,tsk.  Oh, oh...

 Exemplos de gestos visíveis:

 Mover a cabeça para cima e para baixo. [Sinal de aprovação].  Mover a cabeça de um lado para o outro. [Sinal de desaprovação].  Colocar o dedo polegar para cima. [Sinal de aprovação].

 Colocar o dedo polegar para baixo. [Sinal de desaprovação].

 Levar a mão ao ouvido com o dedo polegar e o dedo mínimo estendidos e os demais flexionados [Referência a um telefonema]

6. Ser capaz de reconhecer gêneros textuais e relacioná-los a suas situações de uso, bem como de selecionar as estruturas de gênero adequadas a cada situação.

Exemplos:

Ao telefone, empregar “Então tá” para encaminhar o encerramento da conversa (ou reconhecer, pelo emprego dessa expressão, que o interlocutor pretende encerrar a conversa).

Iniciar uma compra na feira ou em uma loja com a expressão “Me vê meio quilo de X / Me vê um Y” ou “Tem tal produto?”.

(27)

COMPETÊNCIA LINGUÍSTICA E COMPETÊNCIA COMUNICATIVA

Competência (Chomsky 1965): Conjunto de regras internalizado pelo falante nativo e que constitui o seu saber linguístico. Essa gramática internalizada explica a capacidade do falante de produzir e de compreender um número infinito de frases, e também sua capacidade de fazer um juízo de gramaticalidade sobre enunciados (intuição linguística). (Opõe-se ao desempenho –

performance –, que corresponde à atuação do falante ao usar concretamente a língua, e está

sujeito a outros fatores além do conhecimento do sistema de regras.) (Dubois et al. Dicionário de

Linguística)

Competência comunicativa (Hymes 1979):

“Antropólogo de formação, Hymes (1979) foi o primeiro a incorporar a dimensão social ao conceito de competência. Ao acrescentar comunicativo ao termo competência, demonstrou claramente estar preocupado com o uso da língua. Assim, para Hymes, não é bastante que o indivíduo saiba e use a fonologia, a sintaxe e o léxico da língua para caracterizá-lo como competente em termos comunicativos. É preciso que, além disso, esse indivíduo saiba e use as regras do discurso específico da comunidade na qual se insere. O indivíduo demonstra possuir

competência se sabe quando falar, quando não falar, e a quem falar, com quem, onde e de que

maneira. Deve-se a Hymes (1978) igualmente, a ampliação do conceito de competência para incluir a ideia de “capacidade para usar”, unindo desta forma as noções de competência e

desempenho que estavam bem distintas na dicotomia proposta por Chomsky em 1965. A partir de

Hymes, e aparentemente inspirados por ele, vários autores enfrentaram a difícil tarefa de conceituar competência comunicativa.”

(SILVA, Vera Lucia Teixeira da. Competência comunicativa em língua estrangeira: Que conceito é esse? Disponível em http://www.filologia.org.br/soletras/8sup/1.htm Acesso em 3/3/09)

Exercícios

1. Considere os enunciados abaixo e responda às questões que seguem. i. A roupa da Cinderela virou um vestido de baile.

ii. A roupa da Cinderela ficou linda.

iii. A roupa da Cinderela ficou um vestido de baile. iv. A roupa da Cinderela virou linda.

a. Todos esses enunciados são frases possíveis em português? Caso algum(ns) não seja(m), marque-o(s) com um asterisco sobrescrito à esquerda.

b. Refletindo sobre seu julgamento desses enunciados, procure explicar o que você sabe, como falante nativo do português, sobre os verbos ficar e virar.

(28)

2. Considere a seguinte situação:

Duas jovens estudantes estão tomando café na cantina da universidade. Uma colega de ambas se aproxima e diz:

– Meninas! Vocês não sabem da novidade! Esse ano eu vou sair de rainha da bateria! Após um breve diálogo, a colega se retira, e uma das duas que estavam inicialmente à mesa comenta:

– Rainha da bateria... Essa aí tá mais pra ala das baianas...

a. De que forma a interlocutora deve ter, provavelmente, interpretado o último comentário acima?

b. Para essa interpretação, ela empregou apenas seu conhecimento da língua portuguesa? Em caso afirmativo, justifique sua resposta. Em caso negativo, explicite que outro(s) conhecimento(s) estaria(m) em jogo.

3. Em português, é comum escrever a frase “Não pise na grama” em placas que são afixadas nos jardins públicos. A placa usual equivalente em inglês diz “Keep off the grass”, o que, traduzido literalmente, corresponderia a “Mantenha-se fora da grama”.

Com base nesse exemplo, explique por que, para aprender uma língua estrangeira, não basta desenvolver a competência linguística.

Fontes das imagens:

https://encrypted-tbn3.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcS6md8AI2GdGfWk-AcBeKU1a3QOGI-N3cxE6qFnc5brU8rUHhiQWfcpSTc

(29)

A LINGUAGEM E SUAS FUNÇÕES

 A concepção de Karl Bühler (psicólogo austríaco do Círculo Linguístico de Praga) – 1934 (a) Função representativa: é a função característica da língua, pois é através da língua que podemos “representar” os elementos que existem na realidade. (centrada na 3a pessoa do discurso)

(b) Função de manifestação (ou exteriorização) psíquica: é a que nos permite manifestar, através da linguagem, estados de alma, estados interiores, emoções, sentimentos etc. (centrada na 1a pessoa do discurso)

(c) Função de apelo ou atuação social: é aquela mediante a qual atuamos sobre os outros na vida social. (centrada na 2a pessoa do discurso)

- Kainz, um dos discípulos de Bühler, propôs uma alteração na classificação de Bühler, substituindo a função de representação pela de informação. Segundo Kainz, a função de representação estaria presente em todo ato linguístico.

 A concepção de Roman Jakobson

O modelo das funções da linguagem de Jakobson foi fortemente influenciado pelos desenvolvimentos da área de telecomunicações durante a segunda guerra mundial. O modelo se funda no modelo da comunicação, em que se procura caracterizar os elementos envolvidos em um sistema de comunicação: remetente, destinatário, contexto, código, mensagem, canal.

Funções da linguagem destacadas por Jakobson:

Função emotiva ou expressiva, centrada no remetente; Função conativa, centrada no destinatário;

Função referencial, denotativa ou “cognitiva”, centrada no contexto; Função fática, centrada no canal ou no contato;

Função metalinguística, centrada no código; e Função poética, centrada na mensagem.

- Para Jakobson, “a linguagem deve ser estudada em toda a variedade de suas funções, cuja compreensão implica uma breve análise dos fatores constitutivos de todo processo linguístico, de todo ato de comunicação verbal.”

- As mensagens verbais dificilmente preenchem uma única função, existindo em cada ato de fala uma hierarquia de funções. A diversidade das mensagens verbais decorre não da exclusividade de uma das funções, mas sim de diferentes ordens hierárquicas de funções.

CONTEXTO

REMETENTE MENSAGEM DESTINATÁRIO —————————————————————————————————

CONTATO OU CANAL

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Exemplificação:

1) ÔNIBUS DESTROÇADO NA RODOVIA: 13 MORTOS.

2) Poema tirado de uma notícia de jornal (Manuel Bandeira)

João Gostoso era carregador de feira-livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número

Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro Bebeu

Cantou Dançou

Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

3) Olha, eu não aguento mais viajar de avião. Cada dia fico mais estressado. São horas de atraso, mala extraviada. Estou danado da vida; já perdi um monte de oportunidades de negócios. Agora só viajo de ônibus. Chega!

4) Tomou Doril, a dor sumiu./ Vote certo, vote em Alberto Roberto.

5) Cena de aproximação em festa:

- Oi. Tudo bem? - Tudo.

- Eu não te conheço de algum lugar? - Não sei...

- Festa bacana, não? - É, bem animada!

- Faz tempo que não vou a uma festa assim. - É, eu também...

- Bebida boa, gente bonita, música bacana... - Verdade...

6) aleivosia. S.f. 1. Traição, perfídia, deslealdade. 2. Dolo, fraude. 3. Falsa acusação; calúnia, injúria. [Sin. ger.: aleive.] (Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fonteira, 1986).

(31)

7)

Tecendo a manhã (João Cabral de Melo Neto)

Um galo sozinho não tece uma manhã: ele precisará sempre de outros galos. De um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro; de um outro galo que apanhe o grito de um galo antes e o lance a outro; e de outros galos que com muitos outros galos se cruzem os fios de sol de seus gritos de galo, para que a manhã, desde uma teia tênue, se vá tecendo, entre todos os galos. E se encorpando em tela, entre todos, se erguendo tenda, onde entrem todos, se entretendendo para todos, no toldo (a manhã) que plana livre de armação. A manhã, toldo de um tecido tão aéreo que, tecido, se eleva por si: luz balão.

Exercícios

1. Explique a seguinte afirmação de Roman Jakobson:

“É a hierarquia funcional e não a exclusividade funcional que dá conta da diversidade das mensagens linguísticas”.

Ilustre sua resposta com exemplos.

2. Dê um exemplo de uma mensagem no português em que, segundo o modelo de funções da linguagem proposto por Roman Jakobson, predomine a função conativa da linguagem.

Justifique sua resposta, indicando em que elemento do modelo de comunicação está centrada a mensagem.

(32)

3. Em cada um dos textos abaixo, identifique qual a função da linguagem predominante, segundo o modelo de Jakobson.

SINAL FECHADO a Olá, como vai?

Eu vou indo, e você, tudo bem? Tudo bem, eu vou indo, correndo, pegar meu lugar no futuro. E você?

Tudo bem, eu vou indo em busca de um sono tranquilo, quem sabe?

Quanto tempo … Pois é, quanto tempo … Me perdoe a pressa

é a alma dos nossos negócios … Oh! não tem de quê,

eu também só ando a cem, Quando é que você telefona, precisamos nos ver por aí. Pra semana, prometo, talvez nos vejamos, quem sabe? Quanto tempo …

Pois é, quanto tempo … Tanta coisa que tinha a dizer, mas eu sumi na poeira das ruas. Eu também tenho algo a dizer, mas me foge a lembrança. Por favor telefone; preciso beber alguma coisa rapidamente. Pra semana …

O sinal …

Eu procuro você … Vai abrir, vai abrir … Prometo, não esqueço.

Por favor, não esqueça, não esqueça, não esqueça. Adeus …

Paulinho da Viola. “Sinal Fechado”, no. 6349 1122 - Phillips, 1974. b Melhoral, Melhoral, é melhor e não faz mal.

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LINGUAGEM, LÍNGUA E LINGUÍSTICA

REFERÊNCIA: Pimenta-Bueno, M. do N. Introdução. In: Uma breve introdução aos estudos

linguísticos. Livro em preparação, inédito, 2004.

DISTINÇÃO ENTRE OS CONCEITOS DE LÍNGUA E LINGUAGEM.

O sentido técnico do termo linguagem, conforme usado na Linguística, é diferente do conceito não técnico de linguagem, empregado correntemente (p.ex. a linguagem da música, a linguagem das cores, a linguagem das flores, a linguagem dos pássaros ou das formigas, as linguagens de última geração dos computadores, a linguagem do cineasta tal ou qual, ou do escritor tal ou qual, a linguagem do amor, a linguagem corporal, a linguagem dos gestos e assim por diante).

“Linguagem e língua não são a mesma coisa. Linguagem é o termo aplicado para designar o sistema universal de princípios e condições que constituem propriedades do conjunto das diferentes línguas humanas. Já o termo língua diz respeito a uma manifestação desse sistema, a uma configuração específica dele, que é usada por comunidades humanas tanto como um sistema de comunicação, quanto como um sistema mediante o qual o seu pensamento se organiza, ou, em outras palavras, mediante o qual elas pensam, concebem, organizam e estruturam os fatos do mundo, a realidade extralinguística.” (p.2)

- As línguas operam com dois tipos de materiais – sons (produzidos pelo aparelho fonador) e significados (concebidos pela mente humana). Toda língua humana consiste em um mecanismo que permite a falantes acoplarem sons e significados de uma maneira específica. (Ou gestos e significados, no caso das línguas dos surdos.) Pode-se definir uma língua humana como “uma forma específica de, a partir de certos princípios universais, combinar sons e significados”. O resultado dessa combinação é um sistema de sinais (os signos linguísticos).

- Cada língua apresenta um repertório próprio de fonemas e certas oposições de sons existentes em duas línguas diferentes podem remeter a distinções de significado em uma, mas não na outra. (pronúncia da palavra dia por falantes cariocas e recifenses vs. pronúncia do som inicial das palavras jay e day em inglês)

- Som e letra são entidades distintas (ex. som [s] sapo, cela, taça, passa)/ letra x – sons [ks] táxi; [z] exército; [] eixo).

- As línguas humanas costumam diferir quanto ao modo como organizam o plano dos sentidos (as línguas não são isomórficas no plano lexical) – Exs.: Palavra banco (“assento”) em português — inglês stool (banco de bar); bench (banco de jardim); pew (banco de igreja); palavra rio em português — francês fleuve (rio que desemboca no mar) e rivière (rio que desemboca em outro rio); verbos ser e estar em português – verbo to be em inglês.

(34)

Fontes das imagens: http://www.freeimages.com/assets/18/178511/stool-1128341-m.jpg http://www.freeimages.com/assets/182988/1829874579/park-bench-1-1041646-m.jpg https://encrypted- tbn1.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcRlKbxNhN0dXOUrdbXXIhLsNOJUbWlgFhh1Y3lt2Go8oWIBTwjh

- As línguas não são gramaticalmente isomórficas com respeito a categorias semanticamente relevantes. Certas distinções gramaticais podem ser obrigatórias em uma língua e podem não ser em outra. (Russo não faz gramaticalmente uma oposição artigo definido e indefinido; categoria gênero no inglês, etc.)

A Linguística se ocupa da linguagem humana e das manifestações dessa linguagem – as línguas humanas.

Vertentes da Linguística:

1. A Linguística que focaliza a linguagem sobretudo como um produto da evolução biológica da espécie humana e se interessa pelas línguas enquanto instrumentos do pensamento, em sua relação com a mente e o cérebro humanos. Esta vertente da Linguística, ao se voltar sobre as diferentes línguas humanas, e ao procurar descrever e explicar sua estrutura interna e seu funcionamento, o faz em busca da identificação do que elas têm em comum, visando a uma melhor caracterização do que seriam os princípios e condições regentes da linguagem humana, ou seja, a essência dessa capacidade abstrata, específica à espécie humana.

2. A Linguística que focaliza a linguagem sobretudo como produto cultural e se interessa pelas línguas como instrumentos de interação social. Esta vertente, voltando-se para o uso da língua em situações concretas de interação entre seres humanos, busca identificar os princípios gerais que regem tal uso e caracterizar as influências que as línguas sofrem das culturas a que pertencem e em que estão inseridas.

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Linguisticamente

Sérgio Rodrigues

A linguística, nascida no século 19 e amadurecida no 20, revolucionou o mapa do nosso entendimento sobre as línguas. Até então a cartografia do verbo tinha duas estradas principais, a normativista e a enciclopédica.

O normativismo é, como diria o Chico, “bedel e também juiz”. Dita regras de bom uso do idioma, pautadas num distante ideal fixado por escritores clássicos, e fica bravo se discordamos. É o que costuma cair em provas, muitas vezes na forma de ridículas pegadinhas.

O maior símbolo dessa visão que divide o mundo em certo e errado é aquele tijolo temido pelos estudantes do meu tempo, a gramática normativa.

Até hoje o normativismo pauta o senso comum. “Português é tão difícil! A língua está decadente! Será que pode escrever assim?”

O enciclopedismo é menos carrancudo. Como um colecionador de borboletas, espeta expressões —com destaque para as pitorescas— em compridos murais de cortiça que formam corredores a perder de vista.

Tem como símbolo um tijolo maior ainda, o dicionário, que hoje já quase ninguém tira da estante porque funciona melhor online.

A linguística abriu uma terceira via nesse mapa, rumo a amplas regiões inexploradas —a do olhar científico aplicado à língua.

Um linguista não está interessado em como a língua deveria ser nem na catalogação de palavras em sua quase infinita variedade.

O que deseja saber é como essa poderosa máquina de fazer sentido, moeda simbólica de toda sociedade humana, se estrutura e se manifesta.

Trata-se de uma ideia simples, indiscutível até. A língua existe na vida real, material, fora do âmbito de nossos desejos, e está condicionada apenas à história.

O que podemos fazer por ela vai muito além do beletrismo militante e da obsessão colecionista —tentar compreender como funciona. O afluxo de estudiosos para as estradas normativa e enciclopédica caiu muito desde então.

Por algum tempo, a descrição dos fascinantes mecanismos internos das línguas ocupou as melhores atenções dos linguistas. Mas essa autoestrada tinha muitas pistas, cada uma delas dando em novas ramificações.

Inaugurada nos anos 1960 e de presença ainda vigorosa nas faculdades de letras brasileiras, a sociolinguística se ocupa do que se passa não dentro da língua, mas na fronteira entre ela e a sociedade.

Aponta por exemplo um fato que, num país tão violentamente desigual como o Brasil, é luz nas trevas: que quem fala “nós vai” não o faz por ser menos capaz ou inteligente do que quem fala “nós vamos”.

Trata-se de duas gramáticas igualmente funcionais. A distinção de prestígio entre elas —devida a fatores socioeconômicos, exteriores à língua— é usada para reforçar e replicar mecanismos sociais de inclusão e exclusão.

O senso comum ainda torce o nariz para o peixe fresco que a linguística tenta lhe vender. Para a maioria dos falantes leigos, discorrer sobre a língua é uma completa perda de tempo, com duas exceções.

Há grande interesse em dicas para não errar, não contrariar as patrulhas normativas. E um razoável interesse em curiosidades e histórias divertidas —ainda que falsas— em torno das palavras.

(36)

Ou seja: após mais de um século de linguística na veia dos estudos sobre a língua, é para as velhas estradas normativa e enciclopédica que o grande público continua a afluir.

Que descompasso é esse? Serão os linguistas ruins de comunicação ou será que outros fatores entram na conta? Continuo na semana que vem.

Folha de São Paulo. 3/2/2021.

https://www1.folha.uol.com.br/colunas/sergio-rodrigues/2021/02/linguisticamente.shtml

Roteiro de leitura de

PETTER, Margarida. Linguagem, língua, linguística. In: FIORIN (2002), p. 11-24.

ATENÇÃO – Antes de responder a este questionário, faça a seguinte retificação no texto do livro:

No último parágrafo da página 14, substitua “linguagem” e “linguagens” por “língua” e “línguas”, respectivamente.

1. Qual é a relação entre os conceitos de “língua” e “linguagem”? 2. Qual é a definição de língua para Saussure e para Chomsky?

3. Para Chomsky, a linguagem é uma capacidade inata da espécie humana. Que argumento é apresentado no texto para justificar essa ideia?

4. Releia o último parágrafo da seção 2. Com base nele, correlacione as perspectivas de Saussure e de Chomsky às duas grandes vertentes dos estudos linguísticos.

5. Aponte uma característica que diferencia a linguagem humana dos sistemas de comunicação animal, segundo o texto.

6. Explique o que é a “redução do objeto de análise” (p.19) operada pela gramática tradicional.

7. Apresente resumidamente a diferença entre a abordagem descritiva e a abordagem normativa da língua.

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NÍVEIS DE ANÁLISE LINGUÍSTICA

Fonologia, morfologia, sintaxe, semântica

Numa tentativa de equacionar a imensa complexidade da estrutura das línguas, os linguistas estabeleceram diversos “níveis de análise”, definidos pelos vários pontos de vista sob os quais se pode encarar os fenômenos gramaticais. Por exemplo, ao estudar uma frase como

(33) Ana desprezou Ricardo.

pode-se assumir o ponto de vista do estudo da pronúncia. Nesse caso, serão estudadas regras de pronúncia como a que nos obriga a pronunciar o primeiro a de Ana como uma vogal nasal, por ser tônico e estar logo antes de uma consoante nasal (o n); ou a que nos obriga a pronunciar a vogal final de Ricardo como um u e não um o etc. A esse estudo das regras de pronúncia de uma língua se dá o nome de fonologia.

Mas a mesma frase pode ser estudada de outros pontos de vista: por exemplo, descrevendo a constituição interna das palavras. Desse ponto de vista, podemos observar que a palavra desprezou é formada de mais de um elemento: a sequência desprez- mais a sequência -ou. A primeira aparece também em outras formas relacionadas, como desprezo (tanto o substantivo como a forma verbal), desprezível, desprezamos, desprezado etc.; mais a sequência -ou, que ocorre em outras formas verbais, como amou, desmanchou etc. Existem também regras que governam a associação dessas partes de palavras (denominadas morfemas), e que impedem a formação de palavras como *desprezi, *Ricardou ou *Ricardível. O estudo do morfema e de suas associações se denomina morfologia.

Voltando à frase (33), podemos ainda definir outro ponto de vista, que leva em conta as maneiras como se associam as palavras para formar frases. Assim, podemos observar que existe uma regra pela qual a terminação de desprezou de certo modo depende do elemento que se coloca no lugar de Ana; tanto é assim que, se em lugar de Ana colocarmos nós, desprezou terá de se transformar em desprezamos. Podemos, além disso, notar que na frase (33) o elemento que governa a forma de desprezou ocorre em primeiro lugar na frase, e que modificações no último elemento da frase (Ricardo) não alteram a forma de desprezou. Uma terceira observação é que existe um pequeno número de palavras que só podem ocorrer no lugar de Ana, e outras, em

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número igual, que só podem ocorrer no lugar de Ricardo: eu, nós etc. só ocorrem no lugar de

Ana, e me, nos, só no lugar de Ricardo. Todas essas observações têm a ver com a estruturação

interna da frase, e constituem um estudo denominado sintaxe.

Finalmente, podemos levar em conta o significado transmitido por (33). Por exemplo, podemos observar que Ana provavelmente designa uma mulher, e Ricardo um homem; que a pessoa desprezada é Ricardo, e não Ana; que o fato de Ana desprezar Ricardo aconteceu no passado, e assim por diante. Traços de significado como esses são, em parte, o resultado da aplicação de certas regras, que integram a semântica.

Chamamos a essas disciplinas que se ocupam dos diferentes aspectos das expressões linguísticas os componentes da gramática. Assim, a gramática de uma língua inclui os seguintes componentes: a fonologia, a morfologia, a sintaxe e a semântica dessa língua.

É importante notar que esses quatro componentes não esgotam tudo o que se pode estudar a respeito de uma língua. Não tratam, por exemplo, da história das formas da língua, nem do uso das mesmas em diferentes situações sociais, nem do uso feito pelos falantes de seu conhecimento geral do mundo para ajudar a compreender as frases, nem de muitos outros aspectos importantes. A fonologia, a morfologia, a sintaxe e a semântica (mais o léxico [...]) constituem o estudo da estrutura interna de uma língua – aquilo que a distingue das outras línguas do mundo, e que não decorre diretamente de condições da vida social ou do conhecimento do mundo.

Referências

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