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A VIDA COMO PROCESSO DE TRANSFIGURAÇÃO POÉTICA: UMA OBRA DE ARTE

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Academic year: 2021

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A VIDA COMO PROCESSO DE TRANSFIGURAÇÃO POÉTICA: UMA OBRA DE ARTE

Autor: Antônio Micael Pontes da Silva1, Orientador: Ivan Maia de Melo2

Resumo: Este trabalho visa problematizar a concepção da estética da existência em Friedrich Nietzsche, na perspectiva da vida como obra de arte. Tem como objetivo analisar a subjetividade concebida como processo de metamorfose do sujeito, partindo da perspectiva daquele que se dedica a poetizar sua existência, elucidando o modo como, para o filosofo Nietzsche, em seus processos de subjetivação, alguém pode tornar-se poeta da própria vida. Isto é, fazer da vida uma poesia, envolvendo-se com a experiência corporal que pode tornar-se poesia, possibilitando a experiência artística na vida como transfiguração poética: uma obra de arte. O método utilizado foi a hermenêutica genealógica de interpretação perspectivista, a partir da qual o filosofo elabora, ao longo de suas obras, a concepção estética da existência em termos de “fazer da vida uma obra de arte”, “tornar-se poeta da própria vida” e “a justificação estética da existência”. Desse modo, é possível pensar o processo de subjetivação como a criação de um modo de vida criativo-reflexivo e transformativo. Isto conduz à elaboração de um trabalho que envolve uma epistemologia, uma estética, uma ética (da vontade de potência, valorização da vida e do corpo), uma poética trágica e uma prática de pesquisa. Estimulando um olhar crítico e simultaneamente poético sobre a realidade.

Palavras-chave: estética da existência; metamorfose do sujeito; poesia; corpo.

1 Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, Instituto de Humanidades e Letras (IHL), e-mail: mickaelpontessilva@aluno.unilab.edu.br

2 Professor Adjunto II do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Milton Santos da Universidade Federal da Bahia. Membro do Colegiado do Bacharelado Interdisciplinar em Artes da UFBA. Membro do Corpo Docente do Mestrado Interdisciplinar em Humanidades da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), e-mail: ivan.maia@unilab.edu.br

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INTRODUÇÃO

Na obra O Nascimento da Tragédia, Nietzsche nos propõe encararmos a vida como os músicos – ou poetas ditirâmbicos, modo como o filosofo encara os artistas – criam suas obras. Assim como os músicos cultivam de forma perspicaz as tonalidades sonoras, e desse modo, conseguem penetrar nos labirintos da subjetividade humana, ora revelando suas almas sofridas, ora espíritos alegres ou histórias contidas no corpo, deveríamos esculpir a existência como os músicos se dedicam a sua obra. Se temos como foco a vida como criação de uma obra de arte, é possível analisarmos o processo de subjetivação como a criação de um modo de vida, tendo como chave interpretativa a poesia, e como alguém se tornam poeta de sua própria vida, tal como pensou Nietzsche em A Gaia Ciência.

Desse modo, este trabalho tem como objetivo analisar a subjetividade como a criação de um modo de vida poético que é criativo-reflexivo e transformativo, envolvendo-se com a experiência corporal que pode tornar-se poesia, possibilitando viver da experiência artística no corpo e na poesia-corpo como transfiguração poética dançante.

O seguinte estudo se justifica para (re)pensarmos na contemporaneidade os desafios e implicações de como alguém formula o caráter estética da sua existência, propiciando na formação de uma estética, uma ética (valorização da vida, da vitalidade), valorização do corpo e uma poética trágica, compartilhando desse modo a subjetividade enquanto processo de transfiguração e afirmação de uma arte de viver. O objetivo prático interligado aos estudos realizados, pretendendo-se fazer da vida uma obra arte, como elaborou Nietzsche.

METODOLOGIA

A metodologia de pesquisa se desenvolve numa hermenêutica genealógica, levando adiante a interpretação perspectivista ao modo formulado por Nietzsche, compreendendo-se a concepção sobre estética da existência nos seguintes termos: “fazer da vida uma obra de arte”, “tornar-se poeta da própria vida” e “a justificação estética da existência”, tal como aparece nas obras: O Nascimento da Tragédia; Sobre a Verdade e a Mentira no Sentido Extra-Moral e A Gaia Ciência.

Deve-se ressaltar que na perspectiva hermenêutica nietzschiana todo conhecimento é interpretação, cuja história precisa ser interpretada através de um processo não totalizador da realidade. A realidade interpretada a partir de uma certa singularidade. Desse modo, a hermenêutica como arte de interpretar e investigativa que assume o perspectivismo e a

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genealogia. A genealogia como espécie histórica-avaliativo, sendo necessário examinar genealogicamente as perspectivas que se apresentam sobre a história da humanidade. Tanto o perspectivismo e a genealogia caracterizam dessa maneira a hermenêutica nietzschiana, na medida em que todo conhecimento está condicionado pela perspectiva que o produz.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Em Nietzsche a vida deve ser criadoramente vivida, pois o viver, na mais complexa compreensão dos conceitos, deveria significar para o filosofo como arte de transfiguração poética: “[...] transformar continuamente em luz e flama tudo o que somos, e também tudo o que nos atinge” (NIETZSCHE, 2012, p. 12). Este fazer da vida uma arte teria como meta uma atividade de constante criação de si, partindo da perspectiva daquele que se dedica de corpo e alma e de forma ambiciosa e dolorosa a sua criação, escrevendo com sangue e pathos as suas vontades como arte. Mas para que isso ocorra, conforme Rosa Dias, deveríamos experimentar a nós mesmo no decorrer da vida, portanto: “A vida deve ser pensada, querida e desejada tal como um artista deseja e cria sua obra, ao empregar toda a sua energia para produzir um objeto único”. (DIAS, 2011, p. 13). E pensar a existência é reconhecer na vida as angústias, as dificuldades, as aflições, as dores, os prazeres. Já dizia Nietzsche: pensá-la tragicamente é afirmar a existência.

Nesse jogo de aflições, os gregos reconheciam na poesia e no ser poeta uma tarefa épica e uma metáfora estética do ser, que era vivida em um estado de sonho – imagens oníricas – e se entregando à vontade criadora, com seus impulsos, paixões, pavores e prazeres, sendo assim, um indivíduo capaz de construir uma poética trágica, entre sofrimento e beleza. De tal modo o poeta assume ser poeta contemplando de modo penetrante aqueles que lhe são próximos. Como diz Nietzsche, “[...] o poeta só é poeta porque se vê cercado de figuras que vivem e atuam diante dele e em cujo ser mais íntimo seu olhar penetra”. (NIETZSCHE, 1992, p. 59).

Nesse processo de criação artística onde sentimos o fervor diante da obra de arte criada é possível moldar-se a si como arte, e o corpo assume um papel fundamental em tal construção, tal como nos explana Ivan Maia:

O corpo é pensado filosoficamente por Nietzsche como o ser próprio a partir do qual surgem pensamentos e sentimentos, e cuja vontade reúne e coordena a multiplicidade de impulsos, pulsões, instintos, desejos e inclinações do ser humano. O corpo, considerado assim como o ser próprio, é o criador do espírito, da alma, do eu e da razão, que Zaratustra chama “pequena razão”, por

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oposição ao corpo, que ele chama “grande razão”. [...] Ou seja, através do espírito a vontade é exercida, expressando-se por meio das linguagens criadas pelo corpo, que ele chama “corpo criador”. (MAIA, 2012, p. 78).

É diante dessa realidade que o corpo – segundo Nietzsche, “[...] fonte de todas as interpretações que, inversamente, revelam o estado do corpo interpretante” (WOTLING, 2011, 27) – se encontra em constante metamorfose, reinventando-se, tal como nos explica Monga:

Essa maneira de reinventar as técnicas do eu revela um modo de existência e um status do sujeito filosófico, que já não é uma instância determinada a

priori, mas sim uma realidade livremente elaborada segundo formas

específicas de subjetividade. (MONGA, 2010, p. 150).

Nesse percurso desafiador de fazer da vida uma arte o processo de subjetivação resulta numa escrita de si, já refletida por Foucault, possibilitando cantar em versos o caráter trágico e vivaz da sua existência, resultando na criação da sua própria estética da existência; narrando suas peripécias e modos de ser: brotando modos de pensar, sentir e agir na vida como atividade criadora. Fazendo uma analogia da poesia negra urbana cada lado da janela de Alex Ratts da coletânea Ogum’s Toques Negos, o poeta encara o corpo na última estrofe como: “uma carta de liberdade / em cada lado da janela / traz um poema entrelinhado” (Alex Ratts, cada lado da janela, 2014, p. 30).

CONCLUSÕES

Conclui-se que o processo de subjetivação como modo transformativo e criativo-expressivo-reflexivo, elucidando na perspectiva daquele que se torna artista da própria vida, é possível estetizar e poetizar a existência, assim, potencializando a força vital e possibilitando múltiplas formas de expressar e problematizar a realidade.

Nesse processo transfigurador de estetizar e poetizar a existência cria-se uma ruptura epistemológica que toma o corpo na vida como fio condutor para elaboração de um modo de ser criador; conduzindo na elaboração de uma estética, uma ética (da vontade de potência e valorização da vida), uma poética trágica e valorização do corpo e uma prática de pesquisa. Nesse jogo é possível afirmarmos e construirmos uma ética e uma estética livre que valorize aquilo que há de singular em nós. Estimulando um olhar crítico e simultaneamente poético sobre a realidade, denunciando por meio da arte algumas tiranias das convenções sociais e valores que retardam a nossa consciência de fazermos da própria vida, como propôs Nietzsche, uma obra de arte.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço pela orientação do poeta, filosofo e professor Ivan Maia de Mello, que se dedicou na elaboração de um trabalho que envolvesse uma profunda relação entre teoria e prática. A minha família que amo. E aos poetas dançarinos-músicos da existência.

REFERÊNCIAS

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