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Partilha de conhecimento Uma oportunidade! Sharing of knowledge an opportunity!

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Vol.4 – Novembro 2012

Editorial

Partilha de conhecimento – Uma oportunidade!

Sharing of knowledge – an opportunity!

Ao fim de três anos de publicação e com um balanço bastante motivador, gostaríamos de reiterar a

necessidade urgente de partilha de saberes nas Ciências da Saúde.

O feedback dos autores dos artigos publicados na nossa revista é francamente positivo, e a

motivação com que se pronunciam sobre a vontade cada vez mais crescente de investigar,

submeter e publicar é por si só muito motivadora para nós.

Ultrapassado o impasse da retirada da gaveta daquilo que se investiga, e desmistificado o receio da

revisão por pares, que se pretende enriquecedora e não destrutiva, os nossos autores partilham o

sentimento crescente do “vício” da investigação e com ela o gosto da publicação numa revista

científica.

A partilha é sempre multiplicadora de conhecimento. A partilha através da publicação em revistas

científicas é também, para além de multiplicadora de conhecimento, gratificante para os autore s

que percebem o seu contributo direto no engrossar do corpo de saberes da área das Ciências da

Saúde.

Terminamos este editorial reiterando a ideia que partilhámos convosco há três anos atrás.

Apenas a publicação dá vida à ciência. De muito pouco vale o conhecimento que não é partilhado,

publicado.

Esperamos pelos Vossos trabalhos!

Sandra Alves

1

1

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Vol.4 – Novembro 2012

Artigo de Opinião

O trabalho emocional em Enfermagem como foco de

investigação e reflexão

The Nursing emotional labour as a focus of research and reflection

Paula Diogo

1*

1 Escola Superior de Enfermagem de Lisboa.

A área da saúde tem vindo a reconhecer como característica os seus "aspetos emocionais" e o importante contributo da competência de gestão emocional como uma dimensão do processo de cuidar em Enfermagem. Pam Smith (1992, 2011) é a pioneira dos estudos sobre o trabalho emocional na Enfermagem e defende que os enfermeiros têm que gerir as emoções como parte do seu trabalho, que decorrem das situações problemáticas vividas pelos clientes, da relação de cuidados e das relações profissionais/institucionais. O trabalho emocional em Enfermagem carece de mais investigação emergente da prática e da sua exploração enquanto foco de uma prática reflexiva.

The health sector has been being recognizing the "emotional aspects" and the important contribution of the emotional management competence as a nursing dimension of caring. Pam Smith (1992, 2011) is considered the pioneer of studies on the nursing emotional labour and argues that nurses have to manage the emotions as part of their work. These emotions arise from problematic situations experienced by customers, from the relation of care and from the professional/institutional relationships. Nursing emotional labour requires more research deriving from the practical experience.

PALAVRAS-CHAVE: Cuidar em Enfermagem; dimensão emocional; trabalho emocional; investigação; prática reflexiva.

KEY WORDS: Nursing Care; emotional dimension; emotional labour; research; reflective practice. Submetido e aceite em 25 setembro 2012; Publicado em 30 novembro 2012.

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Cuidar em Enfermagem e a sua dimensão

emocional

Na atualidade defende-se que Cuidar é um processo relacional. Basto (2009) defende o cuidar de Enfermagem enquanto ações que se constroem sobre a interação enfermeiro-cliente, com a intenção de contribuir para o bem-estar ou diminuir o sofrimento da pessoa. A ideologia do cuidar é simultaneamente humanista e cientifica e envolve uma visão e compreensão da experiência humana na saúde-doença e, por isso, para Watson (2005), a ciência do cuidar não pode permanecer desligada e indiferente às emoções humanas. Nesta lógica, se todo o cuidado tem subjacente uma relação interpessoal e intersubjetiva, e se nesta relação está omnipresente a experiência das emoções, logo o cuidado é também um meio de comunicação e libertação de sentimentos humanos. De facto, já não se defende uma neutralidade emocional na prática de cuidados de E Enfermagem. Assim vejamos: Morse, Solberg, Neander, Bottorff, Johnson (1990) enaltece o Cuidar como um afeto; Swanson (1993) defende que Cuidar é estar com, é estar emocionalmente aberto para o Outro; Ersser (1997) refere-se ao Cuidar como ligação emocional que se origina da relação enfermeiro-cliente; Boykin e Schoenhofer (2001) designam Cuidar enquanto altruísmo e expressão ativa de amor e Watson (2003) professa o Cuidar humano com amor. Esta dimensão emocional do Cuidar é defendida ainda na conceção de Collière (2003), na qual a Enfermagem incorpora complexidades científicas, artísticas, humanísticas, éticas e técnicas, o que oferece “avenidas” para múltiplas dimensões dos cuidados – a estética, a fisiológica, a relacional, a ética, a espiritual, a cultural, a experiencial, incluindo a emocional. Já Freshwater e Stickley (2004) salientam o equilíbrio entre a dimensão racional e a dimensão emocional nas intervenções de Enfermagem.

Cuidar e a dimensão emocional na Enfermagem são conceções intrinsecamente relacionadas na atualidade, frequentemente denominadas de the

emotional dimension of caring (Mazhindu, 2009). A

autora defende ainda que esta dimensão emocional é multifacetada e importante em questões como

retenção de profissionais, satisfação no trabalho, satisfação do cliente, desenvolvimento profissional e prestação de cuidados. Não obstante, verifica-se ainda um reduzido reconhecimento dos aspetos emocionais da Enfermagem, o que é um paradoxo dado a carga emocional da experiência de cuidar (Maunder, 2008). A investigação sobre as emoções no cuidar de Enfermagem revela que o trabalho emocional é essencial na relação de cuidados, é uma dimensão da prática dos enfermeiros para que consigam mostrar sensibilidade afetiva e compreensão pelo Outro e lidar, simultaneamente, com a influência das emoções na sua pessoa (Diogo, 2012).

Mas existem outros argumentos que preconizam a dimensão emocional do cuidar. Quanto ao atual paradigma da Enfermagem – unitário-transformativo –, as conceções de Enfermagem enfatizam como central na intervenção dos enfermeiros uma ação dirigida à diversidade de respostas humanas do cliente, associadas aos fenómenos de saúde-doença. Este incorpora a pessoa como ser unitário, o holismo, a relação interpessoal e o cuidar enquanto conceitos de destaque. É também neste paradigma que a experiência humana das emoções tem lugar, em contextos de cuidados de Enfermagem a crianças, jovens, adultos e idosos, e estes aspetos emocionais da prática de Enfermagem dizem respeito aos sujeitos em interação: clientes e enfermeiros.

Noutra ótica, aprender a perceber emoções e sentimentos tanto dos prestadores de cuidados como das pessoas cuidadas, é uma fonte incomensurável de saberes na prática de Enfermagem (Collière, 2003). Nesta perspetiva da aprendizagem experiencial, Benner e Wrubel (1989) sugerem que a gestão das emoções na Enfermagem está ligada a um nível de experiência e perícia dos enfermeiros, e aqueles que são peritos tendem a se envolver com os clientes e a dar uma grande importância às emoções na sua prática. Estando, então, reconhecida a competência emocional dos enfermeiros, esta pode ser desenvolvida e aperfeiçoada no âmbito da formação inicial e pós-graduada. Assim, a dimensão emocional parece ser tão importante como outra dimensão dos cuidados de Enfermagem. Não obstante, permanece

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O trabalho emocional em Enfermagem como foco de investigação e reflexão

Salutis Scientia – Revista de Ciências da Saúde da ESSCVP Vol.4 Novembro 2012 www.salutisscientia.esscvp.eu 4 pouco explorada e por vezes desvalorizada.

Investigação sobre as emoções em

enfermagem

O entendimento sobre o mundo das emoções implica a sua compreensão numa perspetiva transdisciplinar. Vários são os subsídios de diferentes disciplinas (Biologia, Neurologia, Psicologia, Sociologia, Antropologia) mas os estudos mais antigos são oriundos da Filosofia, na era antes de Cristo onde se destaca Aristóteles e, já no séc. XVII, Descartes e Espinosa. É de salientar que muitos dos estudos da atualidade derivam diretamente das ideias destes filósofos, como, por exemplo, os estudos de António Damásio.

A Enfermagem também necessita de estudar as emoções de acordo com um quadro de referência próprio, mas igualmente complementar a outras perspetivas. O estudo das emoções na Enfermagem encontra lugar, como já foi referido, nas conceções do cuidar humano de Watson e do atual paradigma unitário-transformativo, mas a sua investigação tem seguido diferentes linhas.

Os enfermeiros ao adotarem os valores do holismo, parceria e proximidade procuram conhecer o cliente enquanto pessoa, mas experienciam as respostas emocionais do seu sofrimento, e têm que lidar com tais emoções como parte do seu trabalho, tornando-se então necessário a gestão das suas emoções para conseguirem cuidar. Estudos de Morse, Bottorff, Anderson, O`Brien, Solberg (2006) constituem um contributo para a compreensão do processo de envolvimento/distanciamento emocional na relação enfermeiro-cliente, mas Benner e Wrubel (1989) alertam para que a distância na relação com o cliente pode constituir uma barreira que causa ainda mais

stress.

Estudos de Travelbee (1971) sobre o uso terapêutico do Self, dão contributos importantes para a compreensão das capacidades dos enfermeiros para lidarem com situações emocionalmente intensas da prática de cuidados, para prevenir a exaustão emocional, tendo consciência de que o seu Self afeta

os outros, por isso é necessário aliviar esse stress, cuidar de si e investir no autoconhecimento.

Outra perspetiva do estudo das emoções em Enfermagem é a do trabalho emocional. O conceito

Emotion Labour é originário da Sociologia e é

apresentado por Hochschild (1983). Este implica uma postura profissional imposta para lidar com muitas emoções de tonalidade negativa, que surgem como fonte principal de conflito interno. Pam Smith, enfermeira e investigadora, é a pioneira dos estudos sobre o trabalho emocional na enfermagem, no início da década de 90. Defende que o trabalho emocional é de natureza especializada e tem de ser aprendido. Chama a atenção que os enfermeiros lidam com muitas emoções perturbadoras que geram conflitos internos, mas há que ter em conta a sua vocação, a missão da profissão, a satisfação pelo altruísmo, fazer o bem e ajudar as pessoas, o que gera sentimentos de contentamento, orgulho e gratificação. Concluindo, assim, que os enfermeiros não só experienciam emoções que os afetam, mas também usam conscientemente as emoções para prover e melhorar os cuidados. Isto é, fazem um trabalho das emoções com centralidade não só em si mas também no cliente.

A linha de investigação sobre o trabalho emocional tem vindo a destacar-se nas últimas décadas. Não obstante as suas raízes na Sociologia, Pam Smith (1992, 2011) expandiu o conceito de trabalho emocional à luz da disciplina prática de Enfermagem. Dos conceitos similares e associados ao conceito de trabalho emocional em Enfermagem (trabalho das emoções, cuidados emocionais, inteligência emocional,…), este último encontra-se num caminho de clarificação e agregação dos restantes mas carece de mais investigação. A linha de investigação "Emoções em Saúde" da UI&DE, criada em 2011, visa contribuir para o desenvolvimento deste conceito e a sua apropriação enquanto orientação para a prática.

Estudo do trabalho emocional em

enfermagem

O conceito Emotional Labour foi identificado pela socióloga Hochschild (1983) enquanto indução ou

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supressão das emoções para produzir, nos outros, sentimentos de bem-estar e de um ambiente seguro. Pam Smith (enfermeira e investigadora) é a pioneira dos estudos sobre o trabalho emocional em estudantes de Enfermagem no final da década de 80, tendo expandido o estudo do conceito à prática de Enfermagem no início dos anos 90. Chama à atenção que os enfermeiros não só experienciam emoções que os afetam mas também usam conscientemente as emoções na sua prática. O trabalho emocional envolve habilidades pessoais mas também um treino de respostas no sentido de fazer a gestão das emoções dos clientes no desempenho diário. Implica a consideração sobre o modo dos enfermeiros gerirem as suas emoções e as dos clientes. O trabalho emocional implica a gestão de sentimentos negativos de modo a que estes se transformem numa experiência não perturbadora (que minimiza o sofrimento) ou com resultados positivos para os sujeitos (Fineman, 2000). Significa mobilizar competências que, muitas vezes, são invisíveis tais como, dar suporte e tranquilidade, delicadeza e amabilidade, simpatia, animar, usar o humor, ter paciência, aliviar o sofrimento, conhecer o cliente e ajudar a resolver os seus problemas (Smith, 1992). Significa cuidar dos clientes transmitindo tranquilidade e calma mas também segurança, criando um ambiente positivo, de modo a que este se sinta cuidado e confiante. James (1989) define

trabalho emocional como o trabalho de lidar com os sentimentos dos outros, cujas componentes centrais são a regulação das emoções, as capacidades de gestão emocional e a regulação da expressão das emoções no domínio público. McQueen (2000) argumenta que o trabalho emocional contribuiu para estabelecer as relações e é uma simbólica expressão da preocupação com os aspetos emocionais no cuidar, que promove nos clientes o sentimento de segurança e de confiar nas intenções da ação dos enfermeiros. Este conceito, emergindo de forma transdisciplinar na literatura (Fineman, 2007), é definido como processo humano produzido no encontro pessoa-pessoa, que envolve energia intensa da parte do profissional, no sentido de apresentar uma disposição emocional que conduz à transformação de emoções perturbadoras e promoção de bem-estar no recetor. Também Diogo (2012), num estudo de Grounded Theory, revela como os enfermeiros mobilizam estratégias transformadoras das experiências emocionais perturbadoras, procurando gerir positivamente as suas próprias emoções e manter o envolvimento emocional com os clientes, i. e., fazem a regulação da disposição emocional para cuidar (Figura 1).

A dupla centralidade do trabalho emocional é enfatizada por Diogo (2012) tendo em conta que os enfermeiros de um serviço de internamento de

Figura 1 – Estratégias de regulação da disposição emocional para cuidar (síntese esquemática em formato de pirâmide).

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O trabalho emocional em Enfermagem como foco de investigação e reflexão

Salutis Scientia – Revista de Ciências da Saúde da ESSCVP Vol.4 Novembro 2012 www.salutisscientia.esscvp.eu 6

Figura 2 - Diferentes conceitos com significado similar ou associado ao conceito de “Trabalho Emocional”

Pediatria, além da regulação da sua disposição emocional para cuidar, promovem um ambiente seguro e afetuoso, nutrem os cuidados com afeto, gerem as emoções dos clientes e constroem a estabilidade na relação. Não obstante, numa análise concetual realizada por Huynh, Alderson, Thompson (2008), este conceito refere-se unicamente à regulação interna das emoções do sujeito no local de trabalho. Já num estudo de Stayt (2009) é destacado o trabalho emocional de cuidar os familiares em contexto de cuidados intensivos.

Outros estudos revelam que o trabalho emocional apresenta diferentes significados: como um trabalho sobre si, como empenho, como trabalho stressante, como produto e também como processo. Os diferentes significados atribuídos, tal como os conceitos similares ou associados (Figura 2), devem ser considerados quando do seu uso, acentuando a necessidade de clarificação concetual.

Nos últimos anos verificou-se um incremento teórico e de evidência científica que expande a compreensão do conceito de trabalho emocional em enfermagem,

mas a terminologia associada ou conceitos similares ainda são usados para mencionar qualquer e toda a intervenção que integre a dimensão emocional (Hunter & Smith, 2007; Huynh et al., 2008). Este facto pode conduzir a um desvio do estudo sobre estratégias específicas necessárias para regular as próprias emoções e as emoções dos outros.

No entanto, os desenvolvimentos da investigação trouxeram à luz um Modelo de trabalho emocional em cuidados de saúde (Mann, 2005) e a uma Teoria de médio-alcance do trabalho emocional (Huynh et al., 2008). No que respeita à quantificação e avaliação do trabalho emocional também já estão disponíveis escalas e questionários: Inventário de trabalho emocional para enfermeiros (Katayama, Ogasawara, Tsuji, Imura, Nagayama, 2005); Questionário Holandês de trabalho emocional (Briët, Näring, Brouwers, van Droffelaar, 2005); Questionário de avaliação do trabalho emocional em contexto de cuidados de saúde (Moreno-Jiménez, Herrer, Rodriguez-Carvajal, Hernandez, 2010).

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experiência emocional dos clientes (a emocionalidade da vivência nos processos de saúde-doença) e também a experiência emocional de cuidar, dos enfermeiros, tendo em conta que a situação problemática que os clientes vivem expressa-se através de emoções com as quais os enfermeiros têm que lidar no decurso dos cuidados e em cada interação. É igualmente premente estudar as ações/interações específicas e os resultados evidentes na modificação benéfica do estado de saúde das pessoas (o potencial terapêutico do desempenho do trabalho emocional), e ainda estudar o desempenho do trabalho emocional em diferentes contextos de cuidados de saúde, tal como as barreiras do trabalho emocional (género, cultura institucional, políticas de saúde). Numa lógica mais global, a investigação deve incidir sobre o cuidar em Enfermagem como fundamental, destacando a identificação de resultados sensíveis aos cuidados e de indicadores desses resultados (Basto, 2009). E continuando a alargar esta lógica, os estudos devem visar o saber prático dos enfermeiros, o saber construído na sua prática diária que, por vezes, está pouco sistematizado, mas nem por isso é menos central no desenvolvimento da disciplina de enfermagem. Mas como devolver os resultados da investigação sobre o trabalho emocional à prática de cuidados?

Prática reflexiva e desempenho do

trabalho emocional

Investigações de Allcock & Standen (2001); Hunter e Deery (2005) e Huynh et al. (2008) revelam que os estudantes e os enfermeiros iniciados necessitam de melhor preparação para lidar com as exigências emocionais da prática. Das estratégias mais

recomendadas e profícuas para a

formação/desenvolvimento do desempenho do trabalho emocional salienta-se a prática reflexiva assente na evidência científica.

O ato de rotina é, sobretudo, guiado pelo impulso, tradição e autoridade. A pessoa que não é reflexiva aceita automaticamente o ponto de vista normalmente dominante numa dada situação. A ação reflexiva implica uma consideração ativa, persistente e cuidadosa daquilo em que se acredita ou que se

pratica, à luz dos argumentos que a justificam e das consequências a que conduz. A reflexão é uma maneira de encarar e responder aos problemas (Dewey, 1933). Uma prática reflexiva conduz à (re)construção de saberes e tem por base a construção de uma circularidade em que a teoria ilumina a prática e a prática questiona a teoria. Isto pressupõe a apropriação dos saberes da experiência através de um processo de ação e reflexão contínua (Kolb, 1983). A diversidade de ferramentas de reflexividade privilegia a mobilização, a exploração e análise de situações concretas da prática de cuidados, uma vez que a capacidade reflexiva envolve um questionamento sistemático da própria prática, de modo a melhorar essa prática e a aprofundar o próprio conhecimento. Esta reflexão sobre as práticas implica como abordagens a análise individual ou em grupo com recurso a um modelo estruturado e apropriado, tendo como ponto de partida um artigo, um registo de reflexão ou a narrativa de uma situação vivida. A reflexão sobre experiências que envolvem trabalho emocional contribuiu, por um lado, para uma melhor consciencialização e integração do conceito na orientação para a prática de Enfermagem explicitando a sua intencionalidade terapêutica, por outro lado, para uma gestão emocional interna, para um crescimento e conhecimento próprio, promovendo o desempenho deste trabalho emocional. Permite ainda clarificar o campo de ação dos enfermeiros promovendo o cuidar humano. Mann (2005) salienta como estratégias formativas para o desempenho do trabalho emocional: a análise das práticas no local de trabalho com enfermeiros experientes; o treino de competências emocionais “centradas no cliente”; o treino centrado no autoconhecimento; a aprendizagem reflexiva (na formação e na supervisão clínica).

E, deste modo, é defendida a necessidade de tornar mais explícito o trabalho emocional que os enfermeiros desempenham na sua prática em diferentes contextos de cuidados, desenvolvendo o conceito por via da investigação e de uma prática reflexiva. Tornar o trabalho emocional mais explícito e mais visível proporciona aos enfermeiros melhores possibilidades de desenvolverem competências para lidar adequadamente com a pressão emocional,

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O trabalho emocional em Enfermagem como foco de investigação e reflexão

Salutis Scientia – Revista de Ciências da Saúde da ESSCVP Vol.4 Novembro 2012 www.salutisscientia.esscvp.eu 8 situações de stress e na mobilização de estratégias de

gestão emocional nos cuidados ao cliente.

REFERÊNCIAS

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Boykin e Schoenhofer (2001). Nursing as caring: A model for transforming practice. Sudbury, Canada: Jones and Bartlett Publishers.

Briët, Näring,, Brouwers, e van Droffelaar (2005). Emotional Labor: Ontwikkeling en validering van de Dutch Questionnaire on Emotional Labor (D-QEL). Psychologie & Gezonheid, 33(5), 221-228.

Collière (2003). Cuidar… A primeira arte da vida Loures, Portugal: Lusociência.

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Hunter, e Deery (2005). Building our knowledge about emotion work in midwifery: Combining and comparing findings from two different research studies. Evidence based midwifery, 3(1), 10-15.

Hunter, e Smith (2007). Emotional labour: Just another buzz word? International Journal of Nursing Studies, 44(6), 859-861. Huynh, Alderson, e Thompson (2008). Emotional labour underlying caring: An evolutionary concept analysis. Journal of Advanced Nursing, 64(2), 195-208.

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Morse, Bottorff, Anderson, O'Brien, e Solberg (2006). Beyond empathy: Expanding expressions of caring. Journal of Advanced Nursing, 53(1), 75-87.

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Travelbee (1971). Interpersonal aspects of Nursing. Philadelphia, United States of America: FA Davis.

Watson (2003). Love and caring: Ethics of face and hand - an invitation to return to the heart and soul of nursing and our deep humanity. Nursing Administration Quarterly, 27(3), 197-202. Watson (2005). Caring science as sacred science. Philadelphia, United States of America: F. A. Davis Company.

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Vol.4 – Novembro 2012

Artigo de Revisão de Literatura

Avaliação e potencialidades da tomossíntese digital

da mama nas distorções do parênquima mamário,

massas e microcalcificações

Evaluation and potentialities of digital breast tomosynthesis in

parenchyma distortions, masses and microcalcifications

Rita Marques

1,2*

, Luís Janeiro

1

, Lurdes Orvalho

3

1 Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa 2 Montepio Rainha D. Leonor

3 Hospital da Luz

A tomossíntese digital da mama é um exame imagiológico tomográfico que reduz o problema decorrente da sobreposição das estruturas constituintes da mama. Permite obter um volume 3D da mama, composto por múltiplas imagens reconstruídas de elevada resolução espacial, oferecendo maior visibilidade de determinadas lesões da mama, podendo também ser utilizada para excluir lesões suspeitas.

Na literatura, entre as vantagens da tomossíntese que habitualmente são referidas, destaca-se uma maior sensibilidade e especificidade, nomeadamente quando está em causa a deteção de lesões e definição dos respetivos contornos, visualização de ductos dilatados, vasos (especialmente os mais tortuosos), nódulos linfáticos, identificação de lesões na pele, microcalcificações e distorções do parênquima, especialmente em mamas com parênquima denso.

Da revisão da literatura efetuada constata-se que esta técnica tem vantagens em múltiplas situações, podendo vir a ser utilizada como complemento da mamografia digital (MD) em pacientes referenciadas, não se excluindo até, no futuro, a sua utilização como método de rastreio do cancro de mama.

The digital breast tomosynthesis (DBT) is an imaging technique that overcomes the overlap of the breast tissue. The obtained 3D volume of the breast provides greater visibility of certain breast lesio ns.

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arising from the sharpness of the lesions, improvement on the definition of their borders, visualization of ducts, dilated vessels, lymph nodes, identification of skin lesions, calcifications and distortion of parenchyma, especially in dense breast.

From the literature review we are strongly convinced that this technique might be advantageous for certain clinical tasks.

PALAVRAS-CHAVE: Mama; tomossíntese digital da mama; mamografia digital; distorção; parênquima mamário;

microcalcificações; massas.

KEY WORDS: Breast; digital breast tomosynthesis (DBT); digital mammography; architectural distortion; parenchymal

distortion; microcalcifications; masses.

Submetido em 26 julho 2012; Aceite em 9 outubro 2012; Publicado em 31 março 2012.

* Correspondência: Rita Marques. Email: ritamarques84@hotmail.com

INTRODUÇÃO

O cancro de mama é um problema de saúde pública, sendo a probabilidade de a mulher o desenvolver durante a vida de 9-10% (Teertsra et al, 2010). A sua maior incidência é em mulheres com mais de 60 anos. No entanto, também surgem casos de cancro de mama em mulheres mais jovens, sendo estes mais difíceis de detetar devido à constituição do parênquima mamário, que é mais denso. É, portanto, necessário investir nas técnicas de imagem para obter melhores resultados em fases mais precoces da doença, diminuindo assim a mortalidade por cancro da mama (Park, Franken, Garg, Fajardo, Niklason, 2007).

A Tomossíntese Digital da Mama (TDM) é uma técnica de imagem baseada na reconstrução de vários planos tomográficos, diminuindo o problema da sobreposição dos tecidos mamários (verificada na Mamografia Digital-2D) e aumentando, consequentemente, o desempenho na deteção de lesões, especialmente em mulheres com parênquima denso (Sidky et al, 2009; Förnvik et al, 2010; Gennaro et al, 2010).

Este exame é realizado num mamógrafo com possibilidade de rotação do braço. A diferença reside no fato de, por se tratar de uma técnica tomográfica, ser feito um determinado varrimento angular, o qual depende do fabricante. A título de exemplo, o

Mammomat Inspiration, da Siemens, percorre um

arco de - 25° a + 25°, adquirindo 25 projeções.

Todavia, consoante o fabricante, assim pode variar quer a cobertura angular, quer o passo entre as diferentes projeções.

Estas projeções, depois de recolhidas, são submetidas a um processo de reconstrução de imagem com recurso a algoritmos adequados, resultando daqui um volume que contém vários planos (imagens) empilhados ao longo de um eixo. Esta é a razão pela qual se fala numa técnica tomográfica: adquirem-se projeções 2D, obtendo-se no final um volume 3D (Sidky et al, 2009).

As imagens assim reconstruídas podem ser observadas individualmente ou sequencialmente, em modo cine-loop, podendo ainda ser manipuladas

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Avaliação e potencialidades da tomossíntese digital da mama nas distorções do parênquima mamário …

Salutis Scientia – Revista de Ciências da Saúde da ESSCVP Vol.4 Novembro 2012 www.salutisscientia.esscvp.eu 12 algebricamente (Park et al, 2007).

Relativamente aos parâmetros de aquisição, é usado um procedimento idêntico ao da mamografia digital, recorrendo-se a um sistema de exposição automática, para o que é habitualmente adquirida uma primeira imagem a 0º. Todavia, enquanto que na mamografia digital simples se adquire apenas uma imagem num intervalo de tempo de 1 a 2 segundos, o varrimento angular que carateriza a TDM obriga a recolher várias imagens, razão pela qual o exame se torna mais demorado (cerca de 20 segundos).

Utilização da técnica: Questões e

potencialidades

A TDM levanta um conjunto de questões relacionadas com a aquisição, operacionalidade, eficácia, treino do observador (médico radiologista), armazenamento no

Picture Archiving and Communication Systems (PACS)

e dose de radiação, que precisam de ser avaliadas e otimizadas antes de se estabelecer uma rotina na prática clínica (Dobbins, Godfrey, 2003; Zuley, 2010). Mais fundamental é, porém, a seguinte questão: foi esta técnica desenvolvida para rastreio ou para aplicação num grupo proveniente de rastreio; para aferição ou para diagnóstico? (Park, 2007).

Na literatura surgem evidências de que a TDM é importante como complemento da MD em casos específicos: suspeita da presença de lesões; avaliação dos contornos dos tumores (Teertstra et al, 2010; caracterização das microcalcificações (Sidky, Reiser, Nishikawa, Pan, 2008); evidência das distorções do parênquima mamário (Förnvik et al, 2010), das dimensões dos tumores e na deteção de lesões não identificadas por mamografia digital, dando um contributo no estadiamento intramamário numa avaliação pré-operatória (Förnvik et al, 2010).

Vários autores têm estudado o potencial acrescido da TDM relativamente à MD. Nos estudos (Teertstra et al, 2010; Gennaro et al, 2010; Gur et al, 2009) foi analisado o potencial da tomossíntese em mulheres com sintomas clínicos ou com lesão suspeita visualizada na mamografia de rastreio e profilaxia,

tendo-se concluído que a TDM pode ser usada como técnica adicional em mulheres referenciadas, com sintomas clínicos.

No estudo de Teertstra et al (2010), a sensibilidade de deteção de lesões em mulheres referenciadas foi de 92%, em ambas as técnicas (MD e TDM).

Ainda neste estudo, verificou-se que a TDM, relativamente à MD, permitiu obter melhores resultados em massas com elevado contraste e nas áreas de distorção de parênquima. Quanto às microcalcificações, estas foram visualizadas em diferentes projeções (Teertstra et al, 2010). A TDM consegue delinear melhor os contornos dos tumores, podendo transmitir maior confiança na tomada de decisão diagnóstica (Förnvik et al, 2010). Park et al (2007) refere que, no caso de massas, nomeadamente quanto ao número e aos contornos, aos ductos dilatados e microcalcificações à volta da massa, são melhor detetados nas imagens de TDM, especialmente em mamas com parênquima denso. Neste mesmo artigo são referenciadas as seguintes vantagens da TDM: melhor visualização da distorção de parênquima; planeamento cirúrgico; visualização de vasos, especialmente os mais tortuosos; nódulos linfáticos (em todo o tipo de parênquima) e, ainda, identificação de lesões na pele (Park, et al, 2007). É ainda apontado como vantagem da TDM, e consequência da redução do impacto da sobreposição de estruturas mamárias que a técnica tomográfica permite, o facto de ser possível uma redução da compressão mamária em cerca de 12,5%, mantendo-se a dose sensivelmente a mesma e sem com isso diminuir a conspicuidade1 da lesão (Gennaro et al, 2010; Tingberg, 2010). Entende-se por conspicuidade da lesão a combinação do grau de confiança na presença de uma lesão com o grau de confiança associado à tomada de decisão.

Um aspeto que pode ser considerado como desvantagem da TDM é o número elevado de imagens (diversas projeções segundo vários ângulos e a pilha final), de elevada qualidade, que o médico radiologista tem para analisar (Park et al, 2007).

(13)

Ainda segundo Park (2007 et al, 2007) e Tingberg (2010), o tempo de leitura da TDM é 70% superior relativamente à MD, sendo este um aspeto que contribui para que alguns médicos radiologistas ofereçam resistência ao uso clínico e de rastreio da TDM.

Distorções do parênquima mamário

A distorção do parênquima mamário (DPM) é definida no Breast Imaging-Reporting and Data System (BI-RADS2), como “a arquitetura normal da mama distorcida sem uma massa definida, incluindo espículas que irradiam de uma zona central podendo coexistir retração focal” (Banik, Rangayyan, Desautels, 2011).

Segundo Ayres e Rangayyan (2003), a DPM é a causa mais frequente de erros em rastreios e de falsos-negativos na profilaxia e diagnóstico. Cerca de 12% a 45% de áreas de distorção mal interpretadas na mamografia, resultaram em casos de cancro de mama (Banik et al, 2011). A distorção pode estar associada ao cancro de mama resultante da infiltração do tumor alterando a arquitetura do parênquima, previamente à constituição de uma massa (Samardar, de Paredes, Grimes, Wilson, 2002). As imagens da DPM são particularmente difíceis de reconhecer nas mamas densas e heterogeneamente densas (Digabel-Chabay, Allioux, Labbe-Devilliers, Meingan, Couprie, 2004).

Avaliação imagiológica da distorção do

parênquima: Mamografia vs TDM

A mamografia é a técnica de imagem utilizada no rastreio do cancro de mama. Diversos estudos clínicos têm demonstrado que esta técnica reduz a mortalidade por cancro de mama (Karellas, Vedantham, 2008).

Embora a mamografia seja uma técnica poderosa na deteção inicial e posterior seguimento de lesões suspeitas, apresenta algumas limitações tais como a obtenção de apenas duas aquisições diferentes de cada mama (nas projeções Craneo-Caudal [CC] e Oblíqua Médio-Lateral [MLO]) e características do

contraste (menor), o que se pode refletir na deteção de lesões muito subtis, especialmente na presença de mamas densas (Karellas, Vedantham, 2008).

Isto é, a mamografia não é o exame ótimo para caracterizar as alterações subtis do padrão mamário, pois são adquiridas apenas duas incidências. Pelo contrário, na TDM são realizadas várias projeções segundo vários ângulos (Teertstra et al, 2010).

Gennaro et al (2010) conclui que a TDM oferece maior visibilidade das margens da lesão, proporcionando uma qualidade de imagem superior à MD, com o consequente aumento da conspicuidade da lesão comparativamente à MD. Conclui ainda que a TDM com uma incidência (Obliqua Médio-Lateral) não é inferior à MD com duas incidências.

No estudo de Timberg et al (2010), que tinha como objetivo avaliar deteção de lesões com ambas as técnicas (MD e TDM), constatou-se que lesões com mais de 1 mm podem ser mais visíveis na TDM do que na MD, enquanto lesões com 0,2 mm são melhor visualizadas com MD, utilizando a mesma dose de radiação. Este autor refere ainda que na deteção de lesões de tamanho superior (1; 8 e 25 mm), a MD necessita de um sinal 2,5 vezes superior para o mesmo nível de deteção da TDM.

Relativamente à identificação de tumores, num outro estudo (Förnvik et al, 2010) foi medido um número maior de tumores através da TDM, referindo-se, adicionalmente, que esta técnica pode ser superior à MD no estadiamento pré-operatório das mesmas. Timberg et al (2010) afirma que é importante o uso complementar da TDM, devido às suas múltiplas projeções de elevada resolução espacial e, sobretudo, ao volume final reconstruido, também de elevada resolução, que proporciona maior nitidez na visualização e caracterização de pequenas lesões, distorções na arquitetura do parênquima mamário, permitindo o esclarecimento de dúvidas deixadas pela mamografia, oferecendo um diagnóstico preciso e precoce.

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Avaliação e potencialidades da tomossíntese digital da mama nas distorções do parênquima mamário …

Salutis Scientia – Revista de Ciências da Saúde da ESSCVP Vol.4 Novembro 2012 www.salutisscientia.esscvp.eu 14 sensibilidade e especificidade (Gur et al, 2009),

conseguindo evidenciar características do parênquima sugestivas de cancro de mama (Kontos et al, 2009).

Calcificações/ microcalcificações

As calcificações mamárias, benignas e malignas, classificam-se segundo a sua morfologia e distribuição (Nalawade, 2009). A identificação de microcalcificações na mamografia é especialmente importante na deteção do carcinoma ductal in situ (CDIS). Este tipo de tumor é o mais prevalente (Das, Gifford, O`Connor, Glick, 2009) e com melhor prognóstico. Das et al (2009), refere ainda que cerca de 89% a 95% dos CDIS foram diagnosticados apenas com base em microcalcificações. As calcificações, nomeadamente as microcalcificações, devem ser caracterizadas consoante o seu número, morfologia, dimensão, distribuição e outros achados mamários (nódulos), devendo ser examinados e caracterizados isoladamente (Park et al, 2000).

Segundo Tse, Tan, Cheung, Chu, Lam (2008), uma calcificação isolada não é indicador preciso de malignidade. Quando existe associação de características como pleomorfismo, ramificação, distorção arquitetural e aumento de densidade da massa, aumenta o valor preditivo positivo de malignidade. Harvey, Nicholson, Cohen (2008) referem que as microcalcificações, quando associadas a outros achados imagiológicos, nomeadamente a uma assimetria focal, aumentam a probabilidade de corresponder a carcinoma ductal in situ. Quando as microcalcificações têm alguma suspeição de malignidade torna-se imperativa a avaliação histológica, que deverá ser pré-terapêutica e através de biopsia dirigida por imagem (p. ex.: estereotaxia), pois não têm tradução clínica (Akita, Tanimoto, Jinno, Kameyama, Kuribayashi, 2009).

Avaliação

imagiológica

das

microcalcificações: MD vs TDM

Na MD existe uma sobreposição dos tecidos mamários. Este problema é solucionado pela tomossíntese da mama, na qual a sobreposição é

quase nula.

No entanto ainda se encontram em estudo a sensibilidade e especificidade da tomossíntese, relativamente à MD nas diferentes expressões imagiológicas da patologia mamária (Park et al, 2007). A taxa de tumores detetados por MD, com base nas microcalcificações, foi de 35%, representando 83% de todos os tumores invasivos (Weigel et al, 2010). Segundo Park et al (2007), a extensão da lesão com microcalcificações, os bordos da massa e as distorções do parênquima são melhor despistados na TDM do que na MD. No entanto, Spangler et al (2011) referem que a MD é mais sensível, relativamente à tomossíntese, na deteção de calcificações, não diminuindo significativamente a performance

diagnóstica, quando se usa a classificação BI-RADS. O estudo de Das et al (2009) considera a tomossíntese inferior, relativamente à MD, na caracterização de microcalcificações.

Sidky et al (2009) descrevem no seu estudo um algoritmo (adaptive steepest descent- projection onto

convex sets: ASD-POCS) que foi desenvolvido para a

reconstrução de imagem em TDM com o objetivo de controlar a regularidade da imagem, reduzindo o ruído, concluindo que este é muito útil quando aplicado nas microcalcificações.

Taourel et al (2009) afirmam que a TDM é limitada na caracterização das microcalcificações, devido ao facto de poder haver menor visibilidade dos seus contornos, como resultado de um conjunto de características, tais como, a sua geometria, número reduzido de projeções e ainda a reconstrução de múltiplas projeções.

Segundo Ho, Tromans, Schnabel, Brady (2010), a geometria e as múltiplas projeções da TDM melhoram a sensibilidade e especificidade na deteção das microcalcificações, fornecendo informações para uma estimativa da sua topografia em 3D, facilitando assim a sua classificação. Este estudo demonstra mesmo a viabilidade da TDM na classificação de agrupamentos de microcalcificações em 3D.

(15)

A TDM é uma técnica que complementa a MD, podendo aumentar a capacidade de deteção de lesões que não se traduzem apenas por calcificações (Hakim et al, 2010).

Massas

O termo “massa” está definido pelo Academic College

of Radiology (ACR) como “uma lesão ocupando

espaço visualizada nas duas diferentes projeções”. Se uma potencial massa é visualizada apenas numa projeção deve ser designada por “densidade”, até esta ser confirmada por imagem 3D (D`Orsi et al, 1998). As massas, segundo a ACR, são classificadas consoante a sua forma, margens e densidade (Bassett et al, 1998).

A densidade é definida pela atenuação dos raios-x na lesão, relativamente à atenuação expectável num igual volume de uma massa fibroglandular (Bassett et al, 1998).

A avaliação da densidade é importante na maioria dos cancros de mama, que formam uma massa visível de densidade igual ou superior a um volume idêntico de tecido fibroglandular. É raro (mas não impossível) que o cancro de mama tenha uma densidade menor (Bassett et al, 1998).

Avaliação imagiológica das massas: MD

vs TDM

Na avaliação imagiológica são utilizadas várias técnicas já abordadas neste trabalho (MD, Ecografia, RM e TDM), que podem detetar massas e caracterizá-las. A mamografia é reconhecida como o método mais eficaz e reprodutível na deteção precoce do cancro da mama (Smith et al, 2004). A ecografia assume também um papel importante na imagem da mama, não só como complemento da MD (avaliação de massas palpáveis e impalpáveis benignas e malignas), como também na orientação de biopsias (Holloway et al, 2010).

O estudo de Förnvik et al (2010) concluiu que a TDM

consegue visualizar um maior número de massas, relativamente à MD, permitindo uma melhor caracterização, especialmente em mamas densas.

CONCLUSÃO

Depois de efetuada uma revisão de literatura sobre a Tomossíntese Digital da Mama, constatou-se que, embora ainda em estudo, é uma técnica de imagem, que pode trazer algumas vantagens na deteção de lesões mamárias subtis (maior nitidez), tais como distorções, massas e microcalcificações, na exclusão de lesões, nomeadamente nas mamas de parênquima denso, pois diminui a sobreposição de tecidos mamários, aumentando assim a sensibilidade e especificidade e, por conseguinte, podendo contribuir para um diagnóstico mais preciso. Contudo, tal como qualquer outra técnica, também apresenta as suas desvantagens, sendo elas: o aumento do tempo de exposição (devido ao número de projeções adquiridas); o consequente aumento da dose de radiação, se bem que permaneça próximo daquilo que é a dose envolvida nas duas incidências da MD; aumento do tempo de leitura do exame; e armazenamento no PACS (devido à quantidade de imagens obtidas).

A mamografia continua a ser o método de exame de primeira linha no rastreio/diagnóstico do cancro de mama, o que faz com que a tomossíntese dificilmente venha a ser uma ferramenta de rastreio a curto prazo. Atualmente, desempenha um papel complementar à mamografia digital, tal como a ecografia, proporcionando mais informação ao médico Radiologista.

Notas

1. “Conspicuity was defined as the combination of the confidence in the presence of a given lesion with the confidence in decision making based on lesion detectability” (Gennaro et al, 2010, p. 16).

2. BI-RADS é um atlas que descreve as características dos achados mamográficos, isto é, distorções do parênquima, microcalcificações, calcificações (classificação das mesmas) e massas (características

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Avaliação e potencialidades da tomossíntese digital da mama nas distorções do parênquima mamário …

Salutis Scientia – Revista de Ciências da Saúde da ESSCVP Vol.4 Novembro 2012 www.salutisscientia.esscvp.eu 16

benignas, malignas), servindo como um guia abrangente que fornece a terminologia de imagens da mama e que permite facilitar o relatório/classificação diagnóstico ao médico (Smith, Hall, Marcello, 2004).

REFERÊNCIAS

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Vol.4 – Novembro 2012

Artigo de Revisão de Literatura

Staphylococcus aureus resistente à meticilina

(MRSA): um pesadelo para a saúde pública

Methicillin-resistant Staphylococcus aureus (MRSA): a public health

nightmare

Marta Aires de Sousa

1*

1 Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa

O primeiro isolado de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) surgiu no início da década de 1960. A notável capacidade para desenvolver resistência a múltiplas classes de antibióticos tornou o S. aureus num dos principais agentes patogénicos a nível mundial. Na Europa, a prevalência global de MRSA a nível hospitalar atinge os 24%, verificando-se diferenças significativas entre os diversos países: a prevalência é consistentemente mais baixa (< 5%) na Escandinávia e Holanda e mais elevada (> 25%) no Sul da Europa e Europa de Leste. Portugal permanece o único país europeu com uma taxa superior a 50%. Até à década de 1990, o MRSA manteve-se confinado ao ambiente nosocomial. No entanto, mais recentemente conquistou novos reservatórios disseminando estirpes altamente virulentas na comunidade e na pecuária. Apesar de a batalha estar longe de ser ganha, alguns países têm conseguido reduzir as taxas de MRSA através da implementação de políticas e programas rígidos de controlo de infeção. Estes distinguem-se pela existência de guidelines e respetiva atualização periódica, isolamento dos doentes MRSA positivos em quartos individuais, rastreio de doentes e profissionais de saúde e descolonização dos portadores.

The first methicillin-resistant Staphylococcus aureus (MRSA) isolate emerged in the early 60s. Its remarkable ability to develop resistance to different classes of antibiotics turned it into a major human pathogen. In Europe the nosocomial MRSA prevalence reaches 24%. However there are significant differences between countries, the prevalence being consistently lower (< 5%) in Scandinavia and The Netherlands and higher (> 25%) in Southern and Eastern Europe. Portugal remains the only European country that exceeds 50%. Until the 90s, MRSA isolates remained confined to the hospital setting. However, this extremely versatile pathogen has been establishing new reservoirs, namely disseminating highly virulent strains to the community and livestock. Although the battle is far from being won, some

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countries have been able to reduce the MRSA prevalence by implementing policies and strict programs of infection control that include the introduction of updated guidelines , isolation of MRSA positive patients in private rooms, screening of patients and health care workers, and decolonization of carriers.

PALAVRAS-CHAVE: Staphylococcus aureus; MRSA; saúde pública; controlo de infeção.

KEY WORDS: Staphylococcus aureus; MRSA; public health; infection control. Submetido e aceite em 12 novembro 2012; Publicado em 30 novembro 2012.

* Correspondência: Marta Aires de Sousa. Email: msousa@esscvp.eu

INTRODUÇÃO

O Staphylococcus aureus é uma bactéria Gram positiva responsável por uma grande variedade de infeções com localização e gravidade muito distintas: (i) infeções simples da pele e tecidos moles; (ii) toxinoses (intoxicações alimentares, síndroma da pele escaldada e síndroma do choque tóxico); e (iii) infeções potencialmente fatais, como septicémias, pneumonias, osteomielites, endocardites e meningites.

Uma das características biológicas fundamentais do S.

aureus é a sua aptidão para colonizar a população

saudável de forma assintomática. Apesar de colonizar diferentes zonas do corpo humano, as fossas nasais são o nicho ecológico preferencial, estimando-se que na população saudável existem 30% de portadores nasais (Peacock, de Silva, & Lowy, 2001). Para além do risco acrescido de contraírem uma infeção, os portadores de S. aureus constituem um importante reservatório e veículo de transmissão (Kluytmans, van Belkum, & Verbrugh, 1997).

O S. aureus tem revelado uma extraordinária capacidade de aquisição de resistências aos agentes antimicrobianos, destacando-se o S. aureus resistente à meticilina (MRSA, do inglês methicillin-resistant S.

aureus). As estirpes MRSA são atualmente resistentes

a múltiplas classes de antibióticos o que limita drasticamente as opções terapêuticas disponíveis.

Pretende-se com este artigo alertar para as proporções alarmantes de MRSA a nível mundial, para a sucessiva acumulação de resistências aos antibióticos e para a disseminação de estirpes altamente virulentas fora do ambiente hospitalar que tornam o MRSA num dos principais agentes patogénicos a nível mundial. Descrevem-se ainda as diferentes medidas de controlo de infeção que têm tido sucesso nos países com prevalências de MRSA mais baixas.

PREVALÊNCIA

DE

MRSA

A

NÍVEL

MUNDIAL

Europa

O European Centre for Disease Prevention and Control – ECDC (www.ecdc.europa.eu), publica anualmente o relatório do European Antimicrobial Resistance

Surveillance Network (EARS-Net), sistema europeu de

vigilância de resistências antimicrobianas, incluindo a prevalência de MRSA em isolados de hemocultura. O relatório de 2010 estimou uma prevalência global de MRSA na Europa de 24,4% (ECDC, 2011). No entanto, verificam-se diferenças significativas entre os diversos países, sendo a prevalência consistentemente mais baixa (< 5%) na Escandinávia e Holanda, e mais

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Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA): um pesadelo para a saúde pública

Salutis Scientia – Revista de Ciências da Saúde da ESSCVP Vol.4 Novembro 2012 www.salutisscientia.esscvp.eu 20 elevada (> 25%) no Sul da Europa e Europa de Leste

(Figura 1). Em 2010, apesar da prevalência de MRSA ser superior a 25% em oito países europeus, os valores estabilizaram ou diminuíram mesmo em alguns países, como foi o caso na Áustria, Chipre, Estónia, França, Grécia, Irlanda e Reino Unido. Preocupante é o facto de em 2010, Portugal ser o único país que mantem uma taxa de MRSA superior a 50% (52,2%) quando a prevalência global na Europa tem vindo progressivamente a diminuir desde 2006, ano em que se registou o valor máximo de 41,9% (Health Protection Surveillance Centre [HPSC], 2012). Inversamente, no nosso país, a prevalência de MRSA tem seguido uma tendência crescente, entre 2003 e 2010, à exceção do ano 2009 em que se observou uma ligeira redução (Figura 2).

Figura 2 – Evolução da prevalência de MRSA em Portugal entre 2003 e 2010.

Figura preparada a partir dos dados do relatório anual do ECDC (ECDC, 2011).

Figura 1 - Prevalência de MRSA na Europa em 2010. Figura cedida pelo European Centre for Disease Prevention and Control (ECDC, 2011, p. 31).

(21)

Outros continentes

Nos Estados Unidos da América (EUA), um estudo realizado em 2006, envolvendo 187.058 doentes internados em 1.237 hospitais americanos, estimou uma prevalência global de MRSA de 46,3 por cada 1.000 doentes (Jarvis, Schlosser, Chinn, Tweeten, & Jackson, 2007). Em 2010, um novo estudo realizado pelos mesmos autores, atualizou a prevalência global de MRSA em 66,4 por cada 1.000 doentes (Jarvis, Jarvis, & Chinn, 2012).

Dados do SENTRY Antimicrobial Surveillance Program estimam uma prevalência de MRSA de 36% nos EUA, 29% na América Latina, 23% na Austrália e 67% no Japão (Bell, Turnidge, SENTRY APAC Participants, 2002; Moet, Jones, Biedenbach, Stilwell, & Fritsche, 2007).

Apesar da grande quantidade de trabalhos dedicados ao estudo dos MRSA nos países desenvolvidos, pouco se sabe ainda quanto à sua prevalência em países em vias de desenvolvimento. Em África, os estudos existentes concentram-se principalmente nos países mediterrânicos (Borg et al., 2006) e na África do Sul (Moodley, Oosthuysen, Dusé, Marais, & South African MRSA Surveillance Group, 2010). Estudos nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa e em Timor-Leste são praticamente inexistentes.

Na Figura 3 apresenta-se o panorama da prevalência mundial de MRSA, por país, excluindo a Europa, adaptado do estudo de Grundmann e colaboradores (Grundmann, Aires-de-Sousa, Boyce, & Tiemersma, 2006).

Figura 3 – Prevalência mundial de MRSA por país, excluindo os países europeus. Adaptado de

(Grundmann et al., 2006), com autorização dos detentores dos direitos de autor.

Sem dados 5-10% 10-25% 25-50% >50% Não incluído Hong Kong Singapura Trinidade

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