• Nenhum resultado encontrado

Um beato lider: narrativas memoráveis do caldeirão

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Um beato lider: narrativas memoráveis do caldeirão"

Copied!
7
0
0

Texto

(1)

-

tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

,

UM BEATO LIDER:

NARRATIVAS M EM ORÁVEIS DO CALDEIRÃO

DE DOMINGOS SÁVIO DE ALMEIDA CORDEIRO

D

qponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

écada de 30 do século

passado, região sul do

Ceará (Ca r iri): um

Beato lidera um movimento

messiânico que se tornou

conhecido como o "Caldeirão" e mobilizou diferentes visões de mundo e formas de exer-cício do poder em torno de

um fenômeno através do qual se revelam

importantes questões sociais.

No livro em foco, Sávio Cordeiro discorre

sobre essa experiência grupalliderada pelo Beato

José Lourenço, fundamentando-se em narrativas

laboriosamente colhidas e interpretadas, reunindo

um rico material que se constitui nas falas de

"remanescentes" - do Caldeirão e de outras

comunidades organizadas pelo Beato - e de

"contemporâneos" sobre fatos lembrados. Esses

"informantes", no esforço de recordar, teceram

suas versões e, de cena forma, "negociaram" a

realidade social (VELHO, 2003) em face de outros

relatos. Os "rema-nescentes", sobretudo,

apresentaram outras possibilidades de leitura em

relação aos registros oficiais e da imprensa que,

no auge das perseguições aos moradores do

Caldeirão, alimentaram o preconceito e agiram

no sentido de legitimar a truculência do Estado

na condução do poder vigente à época.

Apoiado nessas falas e numa vasta literatura

sistematizada a partir do estudo de outras

pesquisas já realizadas sobre o Caldeirão e o

Beato, Sávio Cordeiro orienta-se por uma

perspectiva fecunda, indo além do que poderia

se constituir como mera releitura dos fatos no

tempo e no espaço hodiernos: as memórias

evoca das pelos entrevistados são repletas de

significados e significações

e soam como vozes de uma

história intimamente vivida

ou, pelo menos, vista de

perto, que vão de encontro

aos ecos de relatos oficiais

Fortaleza: Imprensa Universitária Universidade Federal do Ceará, 2004. 236p.

POR ANTÓNIO GEORGE LOPES PAUlINO

autoritários e

intencio-nalmente equivocados.

As narrativas

apre-sentadas no livro de Sávio Cordeiro põem o leitor

em contato com um material muito interessante,

especialmente para quem entende a memória

como um sistema que evoca saberes locais

compartilhados, saberes que encontram suas

significações em seu próprio contexto simbólico

e prático. Nesse sentido, o autor manteve-se firme

quanto ao propósito de identificar as diferentes

visões de mundo, os

VUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

e t h o s (GEERTZ, 1978) que

subjazem às falas dos distintos sujeitos que

escutou em sua pesquisa de campo. Assim, a

figura do Beato José Lourenço é o referente que

irá aproximar versões e contrapor discursos,

desafiando então o raciocínio sociológico no que

concerne à necessidade de estabelecer a

mediação histórica entre a fala de um sujeito

particular e o contexto social em que se produz

essa mesma fala.

No primeiro capítulo do livro, intitulado

Trajetória do Beato José Lourenço, o autor

reconstitui os principais fatos da vida do

protagonista do Caldeirão, desde o seu nascimento

como filho de negros alforriados, até sua chegada

a juazeiro, quando se tornou discípulo de Pe.

Cícero e entrou para uma ordem de penitentes

que praticavam o autoflagelo como forma de

purificação do espírito.

°

capítulo segue

discorrendo sobre as experiências do Beato em

Doutorando, aluno do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFC.

PAULlNO, ANTÔNIO GEORGE LOPES.

139

(2)

diferentes agrupamentos rurais comunitários por

ele organizados, relatadas nos tópicos: O

VUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

S í t i o

B a i x a D a n t a s e a E p o p é i a d o B o i M a n s i n h o ,

O C a l d e i r ã o d a S a n t a C r u z d o D e s e r t o , M a t a

C a v a l o s -

tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

OC a l d e i r ã o n a C l a n d e s t i n i d a d e e S í t i o U n i ã o - O S o s s e g o F i n a l . Concluindo a primeira

seção do livro, o autor apresenta ainda os itens:

M o r t e d o L í d e r e C r o n o l o g i a d e u m a l i d e r a n ç a .

°

segundo capítulo é intitulado Recordações

do Caldeirão. Aqui, embora atento aos diferentes

sinais que caracterizam o Caldeirão como uma

vivência de produção igualitária, Sávio Cordeiro

ressalta não somente os aspectos positivos

observados na experiência do Beato e de seus

seguidores. Um aspecto negativo é registrado a

partir de um

"c. ..)

enfoque que reconhece uma

hierarquia de gêneros situando os homens numa

posição prioritária" (CORDEIRO, 2004: 85).

Todavia, o autor chama a atenção para o fato de

a utopia igualitária ter maior expressividade no

Caldeirão do que no movimento de Canudos,

desenvolvido na Bahia sob a liderança de Antônio

Conselheiro, cuja destruição sangrenta ocorreu

através de um massacre protagonizado por forças

do Estado no ano de 1897.

Nos relatos colhidos, o autor observa: a tese

materialista que reduz as motivações da ação do

homem ao atendimento de suas necessidades

materiais não se confirma na experiência do

Caldeirão, haja vista que no local, ricos fazendeiros do Rio Grande do Norte e de outros estados do

Nordeste, por opção, "trabalhavam e viviam sob

a mesma disciplina que os demais" (op. cit., p.86). Segundo Cordeiro, o messianismo com ares de vida comunitária, que teve lugar no Caldeirão,

configurou-se não como urna ideologia política

explícita, mas sim, como uma profissão de fé,

significada em princípios religiosos. Não obstante,

a dimensão política não fica ausente desse

processo, por tratar-se de uma experiência grupal

que, como acontece em todos os agrupamentos

sociais, contextualiza-se em estruturas de poder

sócio-culturalmente determinadas. Este fato

constitui um desafio posto às ciências políticas

que, em seu tradicional racionalismo, muitas

140

REVISTA DE CIÊNCIAS SOCIAIS v.35 N. 1

vezes deixam escapar à compreensão, as

manifestações simbólicas do poder.

Quanto à relação observada entre os

campos da religião e do trabalho, o livro em

foco analisa o simbolismo que se constrói acerca

dos frutos da produção coletiva, materializada

pela fartura na mesa. Num ambiente que se torna

hostil, sobretudo nas fases de estiagem, como é

o caso da região Nordeste, esse simbolismo da

mesa farta reforça-se em torno da categoria da

caridade, que é recorrentemente citada pelos

informantes de Sávio Cordeiro, quando se

referem à bondade e à caridade como traços do

comportamento do Beato em face dos mais

necessitados que o procuravam no Caldeirão.

Quando discorre sobre a ação violenta do

Estado que destruiu o Caldeirão no ano de 1937,

o autor compreende que a coragem do Beato e

de seus seguidores resulta de uma experiência

coletiva cujos significados não se encerram num

fervor puramente religioso nem em uma

organização puramente econômica do trabalho:

A m e d i d a d a v i o l ê n c i a é d i m e n s i o n a d a p e l a d e s t r u i ç ã o d o s b e n s d e p r o d u ç ã o ,

e s t o q u e d e a l i m e n t o s , m o r a d i a s e o r g a n i z a ç ã o c o m u n i t á r i a p a r a o

t r a b a l h o , e x p r e s s o s c o m o v a l o r e s d o g r u p o

(op. cit., p. 96).

Diferentes motivações e atitudes são

analisadas pelo autor, na perspectiva de mapear

os diversos interesses sociais vinculados :1

distintas relações de poder que se confrontaram

em torno das experiências lideradas pelo Beato.

Sobretudo, Sávio Cordeiro destaca a coragem e

resistência pacífica dos moradores do Caldeirão

frente ao terrorismo ideológico e policial do

Estado. M ovidos pela força da fé e da obediência

religiosa, tinham esse campo simbólico como

única "arma" para se defenderem contra

diferentes eixos de interesse e acusação.

Em 1921, quando estava no Sítio Baixa

Dantas, José Lourenço recebe de Pe. Cícero um

touro que lhe fora presenteado por Delmiro

(3)

-

qponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

Gouveia, um industrial alagoano. Como o boi

pertencia ao Pe. Cícero, que pelo povo já era

considerado santo, tornou-se também objeto de

adoração, ainda que tal reverência não fosse

recomendada ou incentivada pelo Beato. Este fato

vai culminar em versões depreciativas sobre a

comunidade e seus moradores, veiculadas pela

imprensa cearense. Na ocasião, o Beato foi preso

e o boi sacrificado. Com a intervenção de Pe. Cícero,

José Lourenço ganhou liberdade e voltou para o

Baixa Dantas, onde ficou com seu povo até o

ano de 1926, quando o sítio foi vendido, não

recebendo o Beato nenhuma indenização ou

coisa do gênero.

Assim, em terras pertencentes ao Pe. Cícero,

o Beato funda a comunidade do "Caldeirão da

Santa Cruz do Deserto", localizada na Chapada

do Araripe. Trata-se de uma comunidade

camponesa que existiu durante 10 anos, onde

habitaram, aproximadamente, l.700 pessoas, cujo

estilo de vida voltava-se para a reza e para o

trabalho coletivo. O lugar chegou a ser referência

para romeiros e retirantes da seca, que lá

buscavam acolhida.

Novamente, o Beato e seus seguidores

"incomodarão" as principais forças do poder

local: os grandes fazendeiros opor-se-ão a essa

experiência comunitária, em face do temor

pela perda da mão-de-obra de seus latifúndios;

o governo e a imprensa apoíar-se-ão numa

pretensa defesa da ordem contra a "ameaça" do

comunismo que, supostamente, disseminava-se

a partir do Caldeirão; e a Igreja Católica bradará

com intolerância e ciúme em face do catolicismo

popular que se difundia na vivência dos

moradores do Caldeirão. Ademais, a Igreja

Católica também comparece nesse processo com

a sua fatia de poder, através do interesse nas

terras trabalhadas e beneficiadas pelo Beato e

seu povo, deixadas de herança por Pe. Cícero

aos padres salesianos.

Nesse processo, diferentes e interligadas

forças expressam sua oposição a José Lourenço

e seus seguidores, culminando com a "Chacina

do Caldeirão", em II de maio de 1937, através

de ataque executado pelas tropas do Governo,

com o uso de metralhadoras e bombardeio aéreo.

Não obstante a repressão constantemente

materializada contra o Beato, sua capacidade de

liderança e organização é impressionante, haja vista

que, até a fundação da comunidade do Sítio União,

em Pernambuco, onde morreu no ano de 1946,

sempre investiu na reconstrução do estilo de vida

comunitária sob o qual conduzia a sua gente:

VUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

V o l t a r d e n o v o p r a t o m a r c o n t a e t r a b a l h a r ,

e s t a p a r e c e t e r s i d o a s i n a d e J o s é L o u r e n ç o ,

c o n t i n u a m e n t e r e t o m a n d o u m p o n t o

d a h i s t ó r i a i n t e r r o m p i d o , r e s g a t a n d o

-o e r e c o n s t r u i n d o - o Copo cit., p. 108).

Prosseguindo em sua análise, Sávio

Cordeiro assinala as diferentes repercussões

ideológicas que a experiência do Caldeirão

suscitou na sociedade: nos anos 1930/40,

destacam-se a imprensa e suas versões

pejorativas; nos anos 60, o movimento é

ressignificado como uma referência da causa

socialista; nos anos 80, torna-se referência para

movimentos sociais, evocando a luta pelos

direitos humanos e pela reforma agrária; nos anos

1990/2000, emerge uma máquina reprodutora do

passado com finalidades de exploração turística,

bem como se intensifica o interesse acadêmico

e científico pela temática em foco. Ressalta-se

ainda, a identificação do movimento popular com

o Caldeirão, em virtude da dimensão pedagógica

vivenciada na relação do Beato, enquanto mestre

e conselheiro, com seus seguidores.

Logo no início do terceiro capítulo, que

traz o título Versões de um passado, Sávio

Cordeiro afirma: "OB e a t o J o s é L o u r e n ç o n ã o fo i

u n a n i m i d a d e " Cp.123). Ao evocar a teoria da

memória de grupo trabalhada por HALBW ACHS

(990), o autor refere-se aqui aos conflitos de

narrativas ou choques de memória que, durante a

pesquisa, observou em diferentes relatos.

Refletindo acerca da importância do

sentimento de pertença ou de identidade grupal,

Sávio Cordeiro classifica as representações sobre

tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

PAULlNO, ANTÔNIO GEORGE LOPES.

141

(4)

o "Caldeirão da Santa Cruz" em torno de duas

categorias, os "remanescentes" - compreendidos

como sendo os "de dentro" da experiência - e

os "contemporâneos", aqueles que falam como

sendo os "de fora" de uma história realmente

vivida. Assim, novamente o autor confronta

visões de mundo distintas, sob as quais subjazem

diferentes valores morais e representações

sociais.

Nesse paralelo de visões de mundo, os

relatos apresentam-se muitas vezes como

dispares, não importando para o autor, entretanto,

o estabelecimento de critérios de verdade, mas

sim, a necessidade de relacionar as falas dos

sujeitos pesquisados aos campos de apropriação

simbólica e prática que as contextualizam: a

vivência concreta de situações; o "conhecimento"

de situações e fatos a partir dos relatos de

terceiros; e o desdobramento subjetivo, através

dos relatos de memória, de afirmações e

interrogações cuja continuidade e/ou

trans-formação situam-se no plano da oralidade, dos

boatos e das interpretações intertextuais.

Desse modo, Sávio Cordeiro deparou-se

com uma profusão de afirmações e interrogações

em oposições acerca do comportamento do Beato

e de seus seguidores: a moral sexual do Beato

caracterizou-se pela castidade ou havia, no

Caldeirão, um harém pertencente a José

Lourenço? O Beato condenava os vícios, mas

ingeria bebida alcoólica? Era um exemplo

humanitário de liderança no trabalho ou um

oportunista e explorador da mão-de-obra de

sertanejos miseráveis e fanáticos? Era um

explorador do trabalho alheio ou o seu trabalho

se concretizava no ofício de administrador de

uma comunidade camponesa?

Neste aspecto, os informantes

"contempo-râneos" do Caldeirão manifestam seu espanto em

face de relações de trabalho não condicionadas

ao pagamento em dinheiro, espanto do qual não

compartilham os "remanescentes", para os quais

a vida de oração, de trabalho e de fartura na mesa,

representa uma construção terrena para a vida

plena no Céu.

142

tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

REVISTA DE CIÊNCIAS SOCIAIS v.35 N. 1

M as as afirmações e interrogações não

param por aí: o trabalho infantil, à luz da

experiência do Caldeirão, representa um valor

moral ou configura um caso de exploração e

degradação da condição humana? O Beato andava

bem vestido e perfumado, enquanto seus

seguidores vestiam somente roupas pretas suadas

e fedidas? A obediência religiosa, no caso do

Caldeirão, era fruto de uma liberdade caracterizada

pela opção individual por um estilo de vida ou

era assegurada em face do autoritarismo e do

fanatismo messiânico?

Para melhor entender o sentido das

oposições de valores, o autor buscou em LE

GOFF (990) a noção de que entre a memória

de grupo e o pensamento individual observa-se

a produção de choques de memória que, no

campo de interesse da pesquisa, "vão apontando

o caminho de valores distintos e diversificados"

(CORDEIRO, p. 151). A partir desta perspectiva,

Sávio Cordeiro compreende que os

"remanes-centes" por ele entrevistados vêem o signo do

comunismo como uma marca posta a partir de

leituras feitas de fora da comunidade do

Caldeirão, mas que não é aceita por eles, os

quais não compartilham da tese materialista,

percebendo, portanto, como incompatíveis o ser

comunista e o ser crente.

No quarto capítulo,

VUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

M e m ó r i a d e l i d e r a n ç a ,

o autor aborda os distintos aspectos que se

configuram em torno do personagem do Beato,

o qual, "nas narrativas, é tido pelos 'remanescentes'

ora como padrinho, compadre, mestre, líder, ora

como santo" (p. 153). Aqui, Sávio Cordeiro analisa

diferentes concepções teóricas acerca do carisma

ao confrontar os pensamentos de M ax W eber,

Émile Durkheim e Pierre Bourdieu, chegando à

síntese de que

DCBA

( . . . ) ép r e c i s o c o n s i d e r a r a r e l a ç ã o e n t r e

op r o fe t a e os d i s c í p u l o s l e i g o s c o m o u m c a s o p a r t i c u l a r d a r e l a ç ã o q u e s e e s t a b e l e c e e n t r e u m g r u p o e s e u s í m b o l o s r e l i g i o s o s ( . . . ) (CORDEIRO. p. 155).

(5)

Compreendendo o carisma não somente

como um atributo subjetivo do profeta, o autor

refere-se à pessoa do Beato como sendo um

ponto catalisador de diferentes tipos de capital

simbólico (BOURDIEU, 1989), a saber: a

bondade, citada como uma prática corriqueira

de José Lourenço e como um valor fundante

do grupo; o exercício profissional da religião

- o ofício de rezas e cânticos; a fama de bom

vizinho (vizinhança é tida aqui como uma rede

social de significativa importância no âmbito

das problemáticas relacionadas à pobreza rural

na região Nordeste) e o Beato mito. Vários feitos

fantásticos lhe são atribuídos, como por

exemplo: "Ninguém pegava ele. Ele sabia

quando a tropa ia chegar lá", diz um

"contem-porâneo" (CORDEIRO, p. 167). O autor afirma

ainda:

VUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

E n t r e

tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

osa t o s d o B e a t o q u e c o n s t a m n a s c o n v e r s a s c o r r e n t e s a s e u r e s p e i t o , e s t ã o

o u t r o s fe i t o s fa n t á s t i c o s . D i z - s e q u e e l e s e ' e n u u l t a u a ' , t o r n a v a - s e a s s o m b r a ç ã o , v i s a g e m , i n v i s í v e l ( p.166).

Neste capítulo, novamente o autor expõe

distintas versões que se manifestam sobre a figura

e o comportamento do Beato: o homem de cor

negra, cuja origem racial incomodou muita gente,

mas que, pacificamente, driblou os preconceitos

racistas, dentre outras formas de discriminação;

o Beato de cor negra, cuja condição racial

tornava-se eufêrnica, pelo fato de que José

Lourenço tinha trânsito livre entre determinados

segmentos da elite, portando-se sempre elegante,

bem vestido e perfumado; quanto ao seu perfil

de liderança, em Pernarnbuco, o Beato era

considerado um líder progressista e, no Ceará,

era tido pelas elites como sendo um transviado,

um fanático.

Finalizando esta seção, Sávio Cordeiro

refere-se à influência de Pe. Cícero sobre o Beato,

considerando que o primeiro teria representado

a "escola de santidade" deste. Assim, o autor

tece o fio entre a cultura messiânica e a

intertextualidade que, em diferentes leituras da

realidade e nos domínios da oralidade no

catolicismo leigo e popular, cruzam as figuras

de Pe. Cícero, do Beato José Lourenço e do

representante maior do mundo cristão, Jesus

Cristo: "José Lourenço não existe sozinho para

os narradores" (p.174).

Assim, a herança simbólica dos que

conviveram com o Beato tem suas significações

essenciais na adoração à "Santa Cruz", instituída

como principal objeto sagrado cultuado no

Caldeirão. Quanto ao comportamento dos

seguidores da "Santa Cruz", conserva-se entre

os narradores um conjunto de valores morais:

ter fé, transformar o sofrimento em penitência,

ter a certeza de ser digno da benção divina

materializada no alimento e na moradia como

frutos do trabalho e conservar a esperança de

um dia ter uma entrada garantida na porta do

Céu.

Na conclusão do

DCBA

l i v r o , Sávio Cordeiro

sintetiza algumas considerações sobre memória

e esquecimento, enfatizando que o ato de não

lembrar tem suas razões e seus significados,

sendo as entrelinhas do silêncio pistas também

importantes para o trabalho do pesquisador.

Nas palavras do autor,

T o d a s a s m e m ó r i a s s e r e fe r e m a e t h o s e v i s õ e s d e m u n d o : c r e n ç a s , s a b e d o r i a s , v a l o r e s , d e s e j o s , m i t o s e u t o p i a s , t r a n s -fo r m a d o s e m l e m b r a n ç a s i d e n t i fi c a d a s

n a q u e l a s v i v ê n c i a s ( p.198-199).

Retoma, ainda, na conclusão o objetivo

central do seu trabalho de investigação

sociológica, que culminou na dissertação de

mestrado, ora publicada na forma de l i v r o ,

relatando também algumas especificidades do

trabalho de campo e ressaltando o fato de que,

desde sua origem até o atual contexto

sócio-histórico, o Caldeirão e o Beato José Lourenço

têm sido objeto de diferentes significações e

resignificações em torno das categorias: liderança,

religião/fé, trabalho e poder.

PAULlNO, ANTÔNIO GEORGE LOPES.

143

(6)

Referências bibliográficas

qponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

BOURDIEU, Pierre (989).

tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

o

VUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

P o d e r S i m b ó l i c o .

Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

CORDEIRO, Domingos Sávio de Almeida (2004).

U m b e a t o l í d e r : n a r r a t i v a s m e m o r á v e i s d o C a l d e i r ã o . Fortaleza: Imprensa Universitária / UFC.

GEERTZ, Clifford (978). A I n t e r p r e t a ç ã o d a s

C u l t u r a s . Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

HALBW ACHS,M aurice (990).A M e m ó r i a C o l e t i v a .

São Paulo: Vértice / Ed. dos Tribunais.

LE GOFF, Jacques (990). H i s t ó r i a e M e m ó r i a .

Campinas: Ed. UNICAM P.

VELHO, Gilberto (2003). P r o j e t o e M e t a m o r fo s e :

a n t r o p o l o g i a d a s s o c i e d a d e s c o m p l e x a s . 33ed.

Rio de Janeiro: Zahar. (Footnotes).

(7)

-NORM AS PARA A APRESENTAÇÃO DE COLABORAÇÕES

tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

Por favor, envie sua contribuição em disquete de 3,5", em programa Word for Windows, com cópia impressa em papel para:

Revista de Ciências Sociais Departamento de Ciências Sociais Centro de Humanidades

Universidade Federal do Ceará

Av. da Universidade, 2995, 1

qponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

2andar (Benfica)

60.020-181 Fortaleza, Ceará/BRASIL Tel./Fax: (85) 4009-7416 ou (85)4009-7421

o

texto deve ser digitado em espaço duplo e não ultrapassar 30 laudas (sete mil palavras).

Utilize letra Times New Roman, de tamanho 12 para todo o texto, inclusive para os títulos, subtítulos e notas de rodapé.

Cada artigo deve ser acompanhado de um re-sumo (máximo de sete linhas) e de informações sobre o autor (instituição, cargo, titulação acadêmica etc.).

Os títulos, subtítulos etc. devem ser ressaltados por meio de 2 espaços dentro do texto, sem utilização de formatação especial para destacá-tos.

As citações que não ultrapassarem 3 linhas de-vem permanecer no corpo do texto. As citações de mais de 3 linhas devem ser separadas do texto por meio de 2 espaços, sem modificação do tipo de letra nem de mar-gens do parágrafo.

Palavras em outros idiomas, nomes de partidos, empresas etc. deverão ser escritos em itálico.

FORMAS DE CITAÇÃO

• a bibliografia, em ordem alfabética, e as notas de rodapé, numeradas, deverão aparecer no final do texto. • as referências bibliográficas no interior do texto deverão seguir a forma (Autor, data) ou (Autor, data: pá-gina). Exemplos: (Barbosa, 1964) ou (Barbosa, 1963:35).

• se houver mais de um título do mesmo autor

no mesmo ano, deve-se diferenciar por uma letra após a

data: (Correia, 1993a), Correia, 1993b).

o caso o autor citado faça parte da oração, a

referência bibliográfica deve ser feita da seguinte maneira: Wolf (1959:33-37) afirma que ...

o referências bibliográficas que venham

acompanhadas de comentários e informações comple-mentares devem ser colocadas como nota de rodapé.

BIBLIOGRAFIA

A bibliografia deve conter todas as obras citadas e orientar-se pelos seguintes critérios:

Livro: Sobrenome em maiúsculas, Nome. (Data entre parênteses).

DCBA

T í t u lo em it á lic o . L o c a l: Editora.

Exemplo: HABERMAS, JÜngen. (1987), D ia lé t ic a

e

h e r m e n ê u t ic a : p a r a

a

c r í t ic a d a h e r m e n ê u t ic a d e

G a d a m e r : Porto Alegre: L&PM Editores.

Coletânea: Sobrenome em maiúsculas, Nome. (Data). ''Título do capítulo entre aspas", inem itálico, iniciais do nome seguidas do Sobrenome do(s) organizador(es),

T í t u lo d a c o le t â n e a em it á lic o . Local: Editora.

Exemplos: MATOS, Olgária. (1990). "Desejos de evidência, desejo de vidência: Walter Benjamin", in A. Novaes (org.), OD e s e jo .São Paulo: Companhia das Letras.

Attigo: Sobrenome em maiúsculas, Nome. (Data). ''Título do artigo entre aspas". N o m e d o p e r ió d ic o

em it á lic o , número da edição: numeração das páginas.

Exemplo: VILHENA, Luís Rodolfo. (1996). "Os intelectuais regionais. Os estudos de folclore e o campo das Ciências Sociais nos anos 50". R e v is t a B r a s ile ir a d e

C iê n c ia s S o c ia is , 32: 125-149.

Referências

Documentos relacionados

Para os estudos acerca do fracasso escolar, a obra de Maria Helena Patto, A produção do fracasso escolar – Histórias de submissão e rebeldia ainda é um

Quando preparava uma sopa com uns olhinhos de couve para o jantar, a bruxa constatou que o caldeirão estava furado.. Não era muito,

Esta película não fica incorporada nos tecidos e não altera a sua cor; presença de espuma durante o último enxaguamento, o que não é necessariamente um sinal de um

Máximo de participantes | Maximum of participants: 25; Mínimo de participantes | Minimum of participants: 5 Inscrição prévia: Casa Museu Guerra Junqueiro | Previous booking:

O folheto de Rodrigues, “O beato Zé Lourenço e o boi Mansinho ou: a chacina do Caldeirão” direcionou o exemplo da comunidade do beato José Lourenço para além da condição

Um dos diferenciais da representação feita através de recorte do romance de Claudio Aguiar é o destaque que o poeta dá à organização funcional no desempenho das

É, esse pessoal aqui (Juazeiro), coitado dos pobrezim, tudo iam pro Curral do Buriti morrer empambabo com a suruina da Bahia, com aquela farinha. Nessas representações o episódio

Em São Paulo, foram dois meses no Teatro Itália e já com tempo- rada confi rmada para o mesmo teatro em abril e maio de 2020. Brasília, foi ingresso esgotado no Cento de Convenções