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A EDUCAÇÃO COMO EXPERIÊNCIA DO CORPO EM MOVIMENTO: DIÁLOGO ENTRE MERLEAU-PONTY E BUYTENDIJK

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Academic year: 2022

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO, LINGUAGEM E MOVIMENTO

A EDUCAÇÃO COMO EXPERIÊNCIA DO CORPO EM MOVIMENTO: DIÁLOGO ENTRE MERLEAU-PONTY E BUYTENDIJK

CHRISTYAN GIULLIANNO DE LARA SOUZA SILVA

JANEIRO/2021

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A EDUCAÇÃO COMO EXPERIÊNCIA DO CORPO EM MOVIMENTO: DIÁLOGO ENTRE MERLEAU-PONTY E BUYTENDIJK

CHRISTYAN GIULLIANNO DE LARA SOUZA SILVA

Texto apresentado como parte do componente curricular Seminário doutoral II do Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGED, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.

ORIENTADORA: Profa. Dra. Terezinha Petrucia da Nóbrega.

NATAL/RN JANEIRO/2021

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A EDUCAÇÃO COMO EXPERIÊNCIA DO CORPO EM MOVIMENTO: DIÁLOGO ENTRE MERLEAU-PONTY E BUYTENDIJK

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, do Departamento de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PPGED – UFRN), como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Educação.

BANCA EXAMINADORA

Dra. Terezinha Petrucia da Nóbrega (Orientadora) Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

Dr. Iraquitan de Oliveira Caminha (Titular externo) Universidade Federal da Paraíba – UFPB

Dra. Ana Cristina Zimmermann (Titular externo) Universidade de São Paulo - USP

Dr. José Pereira de Melo (Titular interno)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN Dra. Rosie Marie Nascimento de Medeiros (Titular interno)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN Dr. Bernard Andrieu (Suplente externo)

Universidade Paris-Descartes

Dr. Luiz Arthur Nunes da Silva (Suplente interno) Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

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“Um sonho absurdo?

Não possuímos direito maior e mais inalienável do que o direito ao sonho.

O único que nenhum ditador pode reduzir ou exterminar.”

Jorge Amado, 1981.

Um sonho de uma educação de qualidade.

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À minha família, Fernanda, João, Helena e Manuel.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha família, Fernanda, João, Helena e Manuel, por me ensinar a viver todos os dias. Obrigado por tudo.

Agradeço à minha orientadora Terezinha Petrucia da Nóbrega, pela generosidade, confiança e exemplo profissional inspirador. Pela parceria, por me ensinar e acreditar em mim, não apenas nesta pesquisa, mas desde a graduação e o Parafolclórico. É uma honra poder trabalhar com a senhora.

Agradeço à Professora Ana Cristina Zimmermann por participar deste projeto, pelas críticas e sugestões.

Agradeço ao Professor José Pereira de Melo por contribuir com minha formação desde a graduação, pela parceria e amizade.

Agradeço ao caríssimo Professor Iraquitan de Oliveira Caminha pelas contribuições, por ensinar em cada fala.

Agradeço à Professora Rosie Marie Nascimento de Medeiros, amiga desde a graduação, pela contribuição e incentivo nos estudos.

Agradeço ao Professor Luiz Arthur Nunes da Silva, companheiro do Estesia, por contribuir com a tese, pelas parcerias nas traduções e nas pesquisas.

Agradeço ao Professor Bernard Andrieu pela contribuição e incentivo.

Agradeço aos amigos, Raphael, Ana Cláudia, Ana Zélia, Jullya, Moau, Ingrid, Betth e Paula companheiros neste período do doutorado, que sempre compartilharam conhecimento, me ajudaram e me acompanharam neste caminho da pesquisa.

Agradeço ao Grupo de Pesquisa Estesia pela oportunidade de aprender e aos colegas do grupo.

Agradeço aos meus amigos Alison, Ricardo e Edilson e suas famílias.

Agradeço à Professora Ednice Peixoto, por confiar-me a função no grupo de formação de professores, uma experiência gratificante, e pela oportunidade de aprender. É uma satisfação trabalhar com a senhora.

Agradeço à minha sogra, Maria Cirina, pela confiança, carinho e colaboração.

Agradeço às amigas e colegas de trabalho que muito me apoiaram, Wanessa, Diane e a Matheus. Também a Cybelly, Ana Aparecida, Ana Paula e ao professor Adriano pelo abstract.

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Agradeço à Secretaria Municipal de Educação de Natal. Às Professoras Rosemarie, Carmélia e Jeane pelo apoio.

À minha mãe e meu pai pelo apoio e minha tia Eudinéia por estimular o caminho da educação e da pesquisa.

Agradeço à Comunidade católica Veni Creator Spiritus pelo apoio familiar.

À “gataiada” que esteve ou está em casa conosco neste tempo: Mia, Mila, Narigão, Madruga, Gatito, Magrela, Branquinha, Vaquinha, Shifú, Lua e Chamuska pela companhia e por colaborarem com a harmonia familiar.

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RESUMO

Esta tese apresenta a educação como experiência do corpo em movimento, a partir do diálogo entre o filósofo francês Maurice Merleau-Ponty e o médico holandês Frederik Jacobus Johannes Buytendijk. Acreditamos que a educação como experiência do corpo em movimento acontece durante toda a vida, a partir do que se vivencia a todo momento. Compreendemos neste estudo a educação física como educação, experiência sensível comum e exclusiva do ser humano, que implica todas as esferas, a sociedade de um modo geral, a família, a história e o mundo. A pesquisa tem como objetivo apresentar a educação como experiência do corpo em movimento, por meio do diálogo da trajetória acadêmica e profissional na educação física e as noções de corpo próprio em Merleau-Ponty e de movimento próprio em Buytendijk, como solo de uma educação fenomenológica pautada no corpo e no movimento. A metodologia pauta-se na atitude fenomenológica do filósofo francês Maurice Merleau- Ponty. Essa escolha encontra-se ligada aos estudos realizados anteriormente, assim como apresentados na relação com o grupo de pesquisa e nos trabalhos lá desenvolvidos a partir desse pensamento e, principalmente, por acreditarmos que esse caminho fenomenológico, pautado na experiência vivida, na experiência da vida, permite-nos compreender os fenômenos aqui discutidos. Esse novo pensamento aqui construído partirá das descrições das experiências vividas, das lembranças, do que nos toca nesse percurso, sempre envoltos ao corpo em movimento buscando aqui a volta ao mundo, o retorno sobre nós mesmos, bem como a leitura dos textos. Em seguida, fazemos a redução fenomenológica como mostrado por Merleau-Ponty na Fenomenologia da percepção (1945), dedicando-se à leitura fenomenológica dos textos de Merleau-Ponty e Buytendijk, que trazem os conceitos sobre corpo e movimento aqui tratados, buscando o sentido reivindicado a partir da fenomenologia.

Considerando as visões fenomenológicas sobre corpo e movimento humano, pensamos o campo da educação física a partir das concepções apresentadas por esses estudos que ampliam o horizonte epistemológico, proporcionando aberturas e perspectivas para as experiências educativas tendo como foco a experiência do corpo em movimento. As experiências na dança e no ciclismo, dentre outras, compuseram nosso modo de sentir o corpo próprio e o movimento próprio, o que nos permitiu compreender a importância de reafirmarmos os estudos de compreensão do corpo fenomenológico para a educação física, considerando-o como unidade de existência, bem como afirmar o movimento humano como abertura, expressão e função do ser no mundo.

Palavras-chave: corpo próprio; movimento próprio; educação; fenomenologia;

Buytendijk.

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ABSTRACT

This thesis presents education as an experience of the body in movement, based on the dialogue between the French philosopher Maurice Merleau-Ponty and the Dutch physician Johannes Jacobus Frederic Buytendijk. We believe that education as an experience of the body in movement happens throughout life based on what is experienced at all times. In this study, we understand Physical Education as education, a common and exclusive sensitive experience of the human being, which involves all spheres of society in general, the family, history and the world. The research aims to present education as an experience of the body in movement, through the dialogue of the academic and professional trajectory in Physical Education and the notions of very own body in Merleau-Ponty and very own movement in Buytendijk as the soil of a phenomenological education based on body and movement. The methodology is based on the phenomenological attitude of the French philosopher Maurice Merleau- Ponty; we believe that this phenomenological path, based on lived experience, allows us to understand the phenomena discussed here. This new thought built here will start from the descriptions of experiences, memories, of what touches us on this journey, always involved with the body in movement to search around the world, return to ourselves, as well as reading texts. Following the phenomenological reduction, as shown by Merleau-Ponty in the Phenomenology of perception (1945/1999), he dedicates himself to the phenomenological reading of the texts by Merleau-Ponty, Buytendijk that bring the concepts about body and movement treated here seeking the claimed meaning from phenomenology. Considering the phenomenological views on the human body and movement, we think of the field of Physical Education from the conceptions presented by these studies that broaden the epistemological horizon, providing openings and perspectives for educational experiences focusing on the experience of the body in movement. The experiences in dance and cycling made up, among others, our way of feeling the very own body and the very own movement, which allowed us to understand the importance of reaffirming the studies of the understanding of the phenomenological body for Physical Education, considering as existence unit, as well how to affirm the human movement as the opening, expression and function of being in the world.

Keyword: own body; own movement; education; phenomenology; Buytendijk.

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RÉSUMÉ

Ce mémoire présente l'éducation comme une expérience du corps en mouvement, basée sur un dialogue entre le philosophe français Maurice Merleau-Ponty et le médecin néerlandais Johannes Jacobus Frederic Buytendijk. Nous croyons que l'éducation en tant qu'expérience du corps en mouvement se produit tout au long de la vie sur la base de ce qui est vécu à tout moment. Dans cette étude, nous comprenons l'éducation physique comme une éducation, une expérience sensible commune et exclusive de l'être humain, qui implique toutes les sphères de la société en général, la famille, l'histoire et le monde. La recherche vise à présenter l'éducation comme une expérience du corps en mouvement, à travers le dialogue de la trajectoire académique et professionnelle en éducation physique et les notions de corps lui-même chez Merleau-Ponty et de mouvement lui-même chez Buytendijk comme le sol d'une éducation phénoménologique basée sur le corps et le mouvement. La méthodologie est basée sur l'attitude phénoménologique du philosophe français Maurice Merleau- Ponty, ce choix est lié aux études menées précédemment, ainsi que présentés dans la relation avec le Groupe de Recherche et dans les travaux qui y sont développés à partir de cette pensée, et principalement en croyant que ce chemin phénoménologique, basé sur l'expérience vécue, nous permet de comprendre les phénomènes discutés ici. Cette nouvelle pensée construite ici partira des descriptions d'expériences, de souvenirs, de ce qui nous touche dans cette trajectoire, toujours impliqué avec celui du corps en mouvement, cherchant ici le retour au monde, le retour sur nous-mêmes, ainsi que dans la lecture des textes. Suite à la réduction phénoménologique, comme le montre Merleau-Ponty dans la Phénoménologie de la perception (1945/1999), il se consacre à la lecture phénoménologique des textes de Merleau-Ponty, Buytendijk qui apportent les concepts de corps et de mouvement traités ici à la recherche du sens revendiqué à partir de la phénoménologie. En considérant les points de vue phénoménologiques sur le corps et le mouvement humain, nous avons pensé au domaine de l'éducation physique à partir des conceptions présentées par ces études qui élargissent l'horizon épistémologique, offrant des ouvertures et des perspectives pour des expériences éducatives axées sur l'expérience du corps en mouvement. Les expériences de danse et de cyclisme comprenaient, entre autres, notre manière de ressentir le corps lui-même et le mouvement lui-même, ce qui nous a permis de comprendre l'importance de réaffirmer les études de la compréhension du corps phénoménologique pour l'éducation physique, considérée comme unité d'existence, ainsi que comment affirmer le mouvement humain comme l’ouverture, l’expression et la fonction de l'être au monde.

Mot-clé: corps propre; mouvement propre; éducation; phénoménologie; Buytendijk.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Capa do livro O menino grapiúna ... 34

Figura 2 - Apresentação Caboclos de Lança – Folguedos; CIOFF – Internationales Schlitzerländer Trachtenfest – Schlitz, Alemanha (2001) ... 62

Figura 3 - Grupo Parafolclórico da UFRN – Espetáculo Folguedos (2002) ... 64

Figura 4 - Caboclos de Lança; Grupo Parafolclórico da UFRN – Espetáculo Folguedos (2002) ... 69

Figura 5 - A roda da bicicleta de Duchamp (1913). ... 82

Figura 6 - Treinamento solitário na bicicleta ergométrica ... 84

Figura 7 - A busca pelos movimentos naturais do corpo ... 86

Quadro 1 - Movimento do pensamento e relações entre Buytendijk e Merleau-Ponty ... 20

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO O contexto da pesquisa...

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CAPÍTULO I Experiências do corpo em movimento: relato da trajetória acadêmica e profissional...

31 CAPÍTULO II Visão fenomenológica do corpo...

60

CAPÍTULO III Visão fenomenológica do movimento humano...

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CONSIDERAÇÕES FINAIS ...

107

REFERÊNCIAS ... 115

APÊNDICE ...

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15 Acreditamos que a experiência da educação acontece durante toda a vida, a partir do que se vivencia a todo momento desde o nascimento, passando pela infância, adolescência, vida adulta e velhice. Nesse caminho da vida, temos as mais diversas experiências a partir do nosso próprio corpo, em contato com os outros corpos que nos circundam e com o mundo que nos envolve.

Diante desse itinerário percorrido nas nossas experiências, no qual eu mesmo me encontro, desde as brincadeiras de criança, o esporte, passando pela escola, pela educação física escolar até o campo profissional como professor, e considerando-o como uma experiência educativa que acontece a todo momento, propomos dar-lhe continuidade, nesta tese, afirmando que essa experiência educativa acontece a partir do corpo em movimento.

Essa tarefa vem sendo desenvolvida ao longo do tempo e partimos, neste momento, da continuidade da dissertação de mestrado intitulada Corpo, movimento e aprendizagem na Psicocinética de Jean Le Boulch, defendida no ano de 2015, no Programa de Pós-Graduação em Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Algumas reflexões iniciadas na dissertação discutem a temática da educação e do movimento humano, a partir dos trabalhos do professor francês Jean Le Boulch.

O caminho que levou às indagações surgidas naquela pesquisa encontra-se ligado ao caminho que percorremos anteriormente, na formação inicial em educação física, nas monitorias1 durante a graduação, na atuação profissional como professor de educação física do ensino fundamental, na especialização em ensino de educação física2 na escola, na participação do Grupo de Pesquisa Corpo e Cultura de Movimento3 e, mais recentemente, no Estesia – Corpo, Fenomenologia e Movimento, ao qual me reporto não apenas em relação à pesquisa de mestrado referida, porta de entrada no grupo, mas também em relação ao compartilhar do conhecimento e ao

1 Exerci a função de monitor no Projeto Habilidades Motoras na Infância: Bases Teóricas e Metodológicas, coordenado pelo Professor Doutor José Pereira de Melo, atuando nas disciplinas “Aprendizagem motora” e

“Desenvolvimento motor”, no período da graduação entre os anos de 2000 e 2002.

2 Curso de Especialização em Ensino de Educação Física na Escola, realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte nos anos de 2006 e 2007.

3 Participei do Grupo de Pesquisa Corpo e Cultura de Movimento no período de sua criação. Grupo de pesquisadores interessados em investigar as relações entre o corpo e o movimento, reunindo experiências diversas na formação acadêmica, profissional e institucional. Realizadas ações de ensino, pesquisa e extensão em áreas como arte, educação física e educação (http://www.paideia.sedis.ufrn.br/gepec).

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16 apontar do caminho ao conhecimento do corpo, a apreensão do movimento humano, bem como a um novo envolvimento e a uma nova perspectiva no campo da Educação.

Como havíamos apresentado na pesquisa desenvolvida no mestrado, bem como nos estudos realizados no Grupo Estesia, discutimos conceitos como corpo, aprendizagem e movimento humano. Na dissertação, esses conceitos foram debatidos a partir da teoria Psicocinética desenvolvida pelas pesquisas do professor de educação física francês Jean Le Boulch, estudioso que teve influência nas áreas da educação e educação física no Brasil entre os anos de 1970 e 1980, principalmente no que se refere aos conhecimentos trazidos da psicomotricidade.

O interesse por tal temática persiste pautado na construção de conhecimento para o campo da educação física e da educação de modo geral, por considerá-lo primordial também para a educação da criança, critério este concernente ao campo de atuação profissional como professor e à formação de professores, que se insere no desenvolvimento do estudo que prossegue e que se iniciou na dissertação de mestrado.

Na referida pesquisa, abordamos alguns conceitos contidos na construção da teoria que originaram reflexões no que tange à importância do movimento humano para o desenvolvimento e a educação da pessoa. Dentre vários aspectos importantes, destacamos que sua teoria foi pautada em pressupostos da filosofia da educação, na concepção unitária da pessoa, bem como na totalidade corporal, referindo-se também à relação do ser com o mundo (LE BOULCH, 1987). Esses pressupostos figuram como uma nova possibilidade de conceber o olhar sobre a criança que aprende, a educação do corpo e o movimento humano, atribuindo-lhes significado diferente do que se preconizava anteriormente.

Silva e Nóbrega (2020)4 tratam dos estudos de Le Boulch exatamente sobre o conhecimento do corpo e de sua relevância no pensamento sobre o movimento humano como elemento fundamental para o campo da Educação Física no Brasil e foi publicado juntamente com a tese de doutorado de Le Boulch no livro Jean Le Boulch Les facteurs de la valeur motrice Interprétation physiologique (2020), livro

4 SILVA e NÓBREGA. Les idées de Jean Le Boulch au Brésil: la connaissance du corps et l’éducation par le mouvement (2020).

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17 editado sob a direção do Professor Bernard Andrieu, juntamente com vários outros textos que recontextualizam sua produção acadêmica.

Desse modo, destacamos o conceito de corpo, ideia primordial para todo o trabalho de Le Boulch. Tal conceito, adotado por ele na teoria Psicocinética, encontra- se baseado na compreensão fenomenológica de corpo-próprio apresentado pelo filósofo Maurice Merleau-Ponty. Em Fenomenologia da percepção, obra da qual Le Boulch extrai a concepção fenomenológica do corpo, Merleau-Ponty (1999) traz novas relações entre o ser humano, o seu corpo e o mundo percebido; o corpo e o mundo estão em união; a busca pela compreensão do homem de forma integral, ligando a natureza e a cultura. O corpo é o lugar das sensações e da consciência, uma obra de arte; um conjunto cheio de sentidos, que experimenta e se expressa através de uma ligação natural com o mundo. O corpo é relacionado de uma forma radical a uma perspectiva da consciência, consciência perceptiva, a partir do movimento (NÓBREGA, 2010; VERÍSSIMO, 2012).

A compreensão do corpo expressa na teoria de Jean Le Boulch, fundamentada na fenomenologia de Merleau-Ponty, possibilitou desenvolver uma nova forma de conceber a educação, primeiramente por considerar a unidade do corpo como centro de toda a relação do homem com o mundo, mas também por titular a motricidade como parte fundamental desse processo. Desse modo, o movimento humano assume papel importante no campo do desenvolvimento e da educação da pessoa, o corpo e o movimento. Merleau-Ponty, em Fenomenologia da percepção (1999), considera a importância do movimento humano, não apenas em aspectos anatomofisiológicos, mas como elemento constituinte primário da totalidade do corpo.

Desse “diálogo” com a teoria Psicocinética de Jean Le Boulch, surgida também a partir da filosofia de Merleau-Ponty, o corpo e o movimento humano assumem papel preponderante no desenvolvimento humano, trazendo novas possibilidades para o campo da educação. Nesse diálogo, buscando reflexões e partindo do encontro entre educação física, educação de um modo geral e filosofia, percebemos que no embasamento de sua teoria encontramos, entre seus vários interlocutores para o campo do corpo e do movimento humano, os trabalhos do médico holandês Frederik Jacobus Johannes Buytendijk, o qual destacamos nesta pesquisa.

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18 F. J. J. Buytendijk foi professor de fisiologia, de psicologia geral, teórica e comparada, e médico militar durante a Segunda Guerra, quando trabalhou com psiquiatria e neurologia. Possui uma produção acadêmica e científica variada, e discute, entre outras temáticas, definições sobre o método de interpretação fenomenológica e sobre comportamento e aquisição de hábitos nos animais.

As referências das proposições de Buytendijk nos chamaram a atenção na teoria de Le Boulch apresentada na dissertação. Destaco ainda que o trabalho de Le Boulch, em detrimento da conclusão da dissertação, não constitui o fim da sua teoria em nosso pensamento; seu trabalho continua vivo, apesar dos limites encontrados conforme apresentado naquela pesquisa. A proficuidade de seu trabalho justifica parte desta pesquisa teórica, por se posicionar inicialmente como elemento de “ligação”

entre a concepção fenomenológica de corpo trazida por Merleau-Ponty e a concepção e estudos sobre o movimento humano apresentados por Buytendijk (1958), que em seu trabalho propõe uma compreensão fenomenológica de homem, apresentando-o como unidade orgânica ligada ao mundo a partir de sua ação, de seu comportamento, de seu movimento.

Desse modo, Buytendijk (1957) se apresenta com seu extenso trabalho, como mais uma possibilidade para avançarmos na compreensão e no desenvolvimento no campo da educação, apresentando o movimento humano não apenas como uma reação corporal, mas como uma atitude que se exprime a partir do movimento e representa certa maneira de corpo que se movimenta estar no mundo, reflexão introduzida nos trabalhos de Le Boulch apontando como caminho para o campo da educação.

Nesse sentido, o ser humano é ligado ao mundo de forma recíproca, a partir da função e importância do movimento, e esse envolvimento é imprescindível e intrínseco à sua organização, interferindo na sua experiência no mundo, bem como nos seus hábitos. Concepção que se aproxima ao que observamos na fenomenologia de Merleau-Ponty referente aos conceitos de corpo próprio e à noção de esquema corporal (MERLEAU-PONTY, 1999; 2006).

Chegando a essa relação de pensamentos, aproximando-nos dos trabalhos de Buytendijk, ainda na construção da dissertação, percebemos que em algum momento

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19 não apenas Le Boulch trouxera a filosofia de Merleau-Ponty à sua teoria, mas Buytendijk apresentara em suas proposições5 um embasamento fenomenológico pautado também na fenomenologia de Merleau-Ponty, principalmente no que concerne à unidade corporal e à sua ligação entre atos motores e situações vividas, sempre orientados para um situação, como forma de expressão com significado para atividade intencional, ou seja, o movimento ligando de forma intencional o corpo ao mundo (BUYTENDIJK, 1957; 1958).

No quadro a seguir,6 percebemos o movimento do pensamento e as relações entre Buytendijk e Merleau-Ponty, que constituem o referencial teórico e metodológico da nossa tese. Destacamos que, para este estudo, compreendemos a educação física como educação; desse modo, vislumbramos que possa originar novos conhecimentos para esse campo, baseados no corpo próprio e no movimento próprio imprescindíveis na educação e como itinerário do ser humano no mundo, refletindo assim sobre a experiência e a educação.

5 Consideramos neste caso, como obra específica, o livro O homem e o animal (BUYTENDJIK, 1958), ao qual recorremos para apresentar e referenciar seu trabalho na época da pesquisa de dissertação de mestrado.

6 Em nossa busca por livros e artigos de Buytendijk, encontramos textos em algumas línguas: holandês, alemão, francês, espanhol e português. No quadro, especificamente, utilizamos os anos das obras a que conseguimos ter acesso para compor nossas reflexões, o que não quer dizer que sejam suas primeiras edições publicadas. Nosso foco foi reunir um pouco do seu pensamento para compor a tese e apresentá-lo também como horizonte de conhecimento para as diversas áreas que tenham interesse em seus estudos.

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Quadro 1 - Movimento do pensamento e relações entre Buytendijk e Merleau-Ponty.

Fonte: Elaborado pelo autor

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21 Por outro lado, a partir da relação iniciada por Le Boulch, observamos que na fenomenologia de Merleau-Ponty e de modo semelhante em Buytendijk seus trabalhos foram “dispostos” para a construção da filosofia do próprio Merleau-Ponty, haja vista que encontramos referências aos seus trabalhos na construção do seu pensamento em Fenomenologia da percepção (1999). Nessa obra, há referências sobre o corpo fenomenal, não como junção de partes que conhecem o ambiente e um objeto, mas como um conjunto sinérgico que se conhece entre si, “partes” e receptores em um “termo único” intencional que reconhece o mundo e os objetos.

Assim surgiu a intenção de aprofundar esse diálogo de que trata esta tese, entre a fenomenologia de Merleau-Ponty e os trabalhos de Buytendijk, considerando as noções de corpo próprio e esquema corporal apresentadas pelo filósofo e os estudos sobre o movimento humano, a intencionalidade e a relação com a percepção do mundo que, na nossa compreensão, convergem no sentido de dar novos olhares ao corpo e ao movimento humano, acreditando na educação como experiência do corpo em movimento, o corpo próprio em Merleau-Ponty e o movimento próprio de Buytendijk, conceito tematizado no Grupo de Pesquisa Estesia e que traz para sua compreensão a experiência no mundo e a fenomenologia.

Desse modo, o objetivo da pesquisa é apresentar a educação como experiência do corpo em movimento, por meio do diálogo da trajetória acadêmica e profissional na educação física e as noções de corpo próprio em Merleau-Ponty e de movimento próprio em Buytendijk como solo de uma educação fenomenológica pautada no corpo e no movimento. A educação, nesse sentido, é pensada como experiência sensível, comum e exclusiva do ser humano, onde

todos os homens se educam, e só eles os fazem. Isso significa que a experiência da educação se torna uma das manifestações mais primitivas e típicas do fenômeno humano, em relação essencial com as outras características deste último. Tanto os indivíduos como os grupos, a família e a sociedade, a história e o mundo, estão implicados na estrutura do fenômeno educacional. Isto quer dizer que, em sua polissemia, a educação pode ser enfocada de vários pontos de vista, mas cada um deles acaba por nos remeter aos demais (REZENDE, 1990, p. 46).

Esta pesquisa doutoral é um desdobramento da pesquisa concluída no Mestrado em Educação Física na UFRN, ligada ao Grupo Estesia, com base na fenomenologia de Merleau-Ponty. Sabe-se que Merleau-Ponty influenciou os

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22 trabalhos de Buytendijk, como vemos no texto Attitudes et mouvements: étude fonctionnelle du mouvement humain (BUYTENDIJK, 1957), realçando a possibilidade de construção de conhecimento nesse campo. Esse livro de Buytendijk compõe parte dos estudos do Grupo de Pesquisa Estesia, que realizou extenso trabalho de tradução e discussões sistemáticas. Assim, apontamos o investimento do grupo em produzir conhecimento, possibilitando não apenas a compreensão dos textos traduzidos para esta pesquisa e outras pesquisas do grupo, mas também a produção de apontamentos pessoais a partir de anotações, bem como as descrições das discussões compondo parte importante das reflexões contidas nesta pesquisa.

Tal trabalho é base para compreensão dos estudos do movimento humano, o qual será usado nesta pesquisa, tendo sido traduzido e utilizado dentro do grupo, permitindo-se aprofundar outras pesquisas em andamento. Esse estudo desencadeou conhecimentos para o desenvolvimento de outras duas pesquisas, como na dissertação Uma fenomenologia do movimento na educação física: aproximações entre filosofia, ciência e arte (TORRES, 2018) e na tese No caminho dos pés e das mãos: a experiência do corpo como fenômeno educativo no Taekwondo (SILVA, 2018a), as quais se valeram dos estudos feitos do livro de Buytendijk buscando referência do conceito de movimento próprio e que compõem agora o reduzido acervo construído que utiliza os trabalhos de Buytendijk no campo da educação e da educação física e que servirão como fonte de estudos para esta tese.

Utilizamos também outros livros e textos de Buytendijk: Le football: une étude psychologique (1952b); La femme, ses modes d’être, de paraître, d’exister (1967);

Phénoménologie de la rencontre (1952); The first smile of the child (1988). Fizemos uma busca no banco de teses e dissertações, além de busca por artigos que trouxessem os trabalhos de Buytendijk no campo das pesquisas e em educação e educação física mais especificamente, para termos uma base de trabalhos para desenvolvermos nossas reflexões. Nessas bibliografias, encontramos várias referências à fenomenologia de Merleau-Ponty, La femme (1967) e Le football (1952b), mencionando seus trabalhos em vários momentos, deixando clara a relação dos trabalhos de Buytendijk com o pensamento do filósofo.

Do mesmo modo, além dos trabalhos anteriormente apresentados que nos acompanham nesta construção e intentando situá-los de maneira mais ampla, fizemos

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23 uma busca em portais, intencionando aprofundar parâmetros sobre as temáticas estudadas, a saber, o conceito de esquema corporal apresentado na filosofia de Merleau-Ponty e os trabalhos de Buytendijk no campo da educação e educação física no Brasil, que definem os conhecimentos em que desenvolveremos nossas reflexões.

Notamos que não são muitos os trabalhos de Buytendijk no campo da educação e educação física no Brasil. Realizamos as buscas inicialmente em três portais: catálogo de teses e dissertações da Capes, portal de periódicos Capes, biblioteca eletrônica da Scielo e base de dados Lilacs, este último por considerar que as áreas da educação e da educação física podem encontrar-se dialogando com a área da saúde, ampliando a visão panorâmica do contexto desta pesquisa.

Nesse primeiro momento, identificamos 144 registros, entre teses, dissertações e artigos científicos, utilizando os termos “esquema corporal” e “Merleau-Ponty”, junto aos operadores sugeridos nos documentos (tutorial) do próprio portal (LILACS, 2010;

CAPES, 2019), buscando uma recuperação mais precisa por termos para delimitarmos nossos interesses de pesquisa. O mesmo procedimento foi realizado em cada portal, sempre realizando as buscas segundo os parâmetros de busca sugeridos pelos respectivos portais, também com o termo “Buytendijk” e “F. J. J. Buytendijk”, haja vista ser a abreviatura comumente usada para identificar esse pesquisador.

Após essa primeira busca, fizemos uma delimitação para o campo da educação e da educação física e refinamos os resultados para 48 pesquisas, sendo três teses e 45 dissertações; foram somados a esses resultados sete artigos da biblioteca Scielo e cinco artigos da base de dados Lilacs. Em seguida, buscamos as convergências entre esses trabalhos que faziam referências ao esquema corporal e à filosofia de Merleau-Ponty, limitando-os pelo campo da educação e da educação física, este último demarcado apenas com questões ligadas à educação, pois como supomos, identificamos pesquisas as quais, mesmo apresentadas pela busca nas áreas de educação e educação física, traziam em seu texto referências sobre avaliação do esquema corporal a partir de testes em escala do desenvolvimento motor, ou voltados exclusivamente à melhora de modelos posturais, ou ainda referenciando o conceito de esquema corporal apenas como conhecimento das partes do corpo, lateralidade e equilíbrio do corpo da criança, por exemplo. Essas pesquisas foram retiradas do nosso

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24 rol de observação e passamos então a 17 pesquisas que julgamos mais próximas às nossas aspirações quanto a esta tese.

No Anexo I desta tese encontra-se um quadro que elaboramos contendo os títulos, os autores e os conceitos relacionados ao corpo e ao movimento na perspectiva fenomenológica. São referências dos trabalhos que dimensionam o estado da arte sobre o fenômeno investigado nesta pesquisa. Esse quadro aponta o movimento das ideias e conceitos em torno dos estudos do corpo e da fenomenologia.

Nas pesquisas selecionadas, encontramos dois trabalhos no catálogo da Capes que citam textos e pesquisas de Buytendijk. Dentre eles, localizamos a tese O se-movimentar como fundamento para uma educação física responsável: uma leitura fenomenológico-hermenêutica (CARDOSO, 2016) e a dissertação de Luciana Homrich (CECCO, 2000), Refletindo a prática pedagógica da educação física a partir dos pressupostos da teoria do interacionismo simbólico e da teoria do agir comunicativo. Sobre este segundo, não conseguimos acesso ao texto e, quanto ao primeiro, observamos uma parte apresentando os trabalhos de Buytendijk considerando o movimento humano, a gestalt e a fenomenologia. A referida tese também nos ajudará, dando a dimensão de uma perspectiva da fenomenologia e do trabalho de Buytendijk e sua relação com a fenomenologia de Merleau-Ponty.

Encontramos outras referências em livros e artigos publicados no Brasil e que trazem relação com a educação física e os trabalhos de Buytendijk, alguns relacionando-os à temática do jogo e do lúdico, conforme apresentado por Silvino Santin (2003), com a experiência e o comportamento humano, e que carrega uma carga cultural e simbólica inerente às relações humanas.

Outros trabalhos que abordam as questões sobre a filosofia do movimento apresentadas por Buytendijk, e que destacam sua originalidade e pioneirismo, são os do professor Elenor Kunz (1991; 2012), trazendo também essa perspectiva para o campo da educação física, bem como para as questões pedagógicas do ensino e do movimento humano e, consequentemente, para o esporte. No mesmo caminho, temos as considerações dos textos pedagógicos de Reiner (HILDEBRANDT, 2005), que também destacam os trabalhos de Buytendijk a partir da perspectiva fenomenológica do movimento humano, trazendo-os a uma abordagem pedagógica.

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25 Gonçalves (1994) traz em seu livro a referência do livro Atitudes e movimentos de Buytendijk, destacando sua percepção fenomenológica do corpo como unidade psicofísica humana e apontando nesse aspecto os sentidos que envolvem o movimento humano, aproximando-o do campo fenomenal, seguindo, segundo ela, a semelhança com as concepções de pensadores fenomenólogo-existenciais, sobretudo Merleau-Ponty. Ainda destaca a referência dos trabalhos de Buytendijk na Fenomenologia da percepção (1999), como já havíamos comentado, como também em A estrutura do comportamento (2006a).

Buscamos também outras referências que não se comunicam de forma direta com o campo da educação, mas nos permitem ter uma compreensão da profundidade dos trabalhos de Buytendijk e sua ligação com a fenomenologia de Merleau-Ponty, como os trabalhos do Professor Claudinei da Silva (SILVA, 2014; 2018), os quais nos apresentam algumas reflexões sobre os estudos de Buytendijk para que possamos compreender melhor a amplitude das suas reflexões, bem como a menção aos trabalhos de Buytendijk que ocupam lugar significativo na construção do pensamento de Merleau-Ponty (SAINT-AUBERT, 2016).

Fonseca (2008) também discorre sobre os trabalhos de Buytendijk, quando em seu livro busca unir os trabalhos de Merleau-Ponty e de Buytendijk diante das reflexões sobre o desenvolvimento da criança e o seu corpo na fenomenologia, evidenciando sua contribuição para o processo de interdependência do corpo, motricidade e mundo exterior.

Os trabalhos do Professor Danillo Veríssimo (2012) e outros dois artigos selecionados em nossa busca estão mais ligados à área da psicologia e filosofia.

Ainda assim, contribuem de forma significativa para compreender tanto a noção de esquema corporal, no início das ideias contidas na filosofia de Merleau-Ponty, quanto a aproximação nos seus primeiros trabalhos com o pensamento apresentado por Buytendijk. Nem todas as pesquisas versam exclusivamente sobre o campo da educação ou da educação física, mas abrem perspectivas para refletirmos sobre o modo como Buytendijk desenvolve seu pensamento, permitindo que possamos também refletir nossos anseios no campo da educação da educação física, contribuindo para os estudos do movimento humano.

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26 Outra pesquisa, a dissertação de Giovanina Gomes (OLIVIER, 1995), que também apresenta uma versão em livro (FREITAS, 2015), traz uma discussão em torno dos conceitos de imagem corporal, esquema corporal, corporeidade e consciência corporal, mostrando que embora sejam termos bastante utilizados em educação física, nem sempre se mostram claramente delineados, causando confusão em seus significados, segundo a sua abordagem. Nesse aspecto, concordamos com a autora e ainda observamos que os termos para além do campo da educação física e da educação, como aqui pretendemos apresentar, recebem visões de diversas áreas do conhecimento e são trazidos ao campo da educação para suscitarem novos olhares e debates.

Outras pesquisas trazem a noção de esquema corporal sob vários prismas, dentro dos campos das ciências sociais, na educação e na educação física: condição do corpo diante das pessoas com deficiência física, portadores de deficiência de um modo geral e detentos, citadas nas temáticas como o autismo, nas discussões sobre corporeidade, corporeidade e adolescência, apresentadas por Merleau-Ponty juntamente com outros autores como Marcel Mauss e Norbert Elias7.

Notamos de modo geral que as pesquisas que versam sobre a noção de esquema corporal pousam seus olhares sobre a fenomenologia da percepção de Merleau-Ponty e, muito especificamente, como um meio normal de conhecer os outros corpos e de estes conhecerem o meu corpo, ou uma relação entre o conhecimento do meu corpo, do corpo de outro e do corpo com o mundo, ligação, conhecimento e percepção.

É importante frisar que para a construção desta pesquisa, tivemos o olhar e a busca por outras pesquisas que pudessem apresentar-nos um pouco das questões que nos mobilizam para esta tese. Assim, retiramos inicialmente, e de forma proposital, os artigos, teses e dissertações dessa busca que compõem as pesquisas do Grupo Estesia, para agruparmo-nos dentro do grupo de trabalhos que nos orientarão em nossa visão da noção de esquema corporal no campo da educação e educação física.

7 Cambruzzi, Costa, Von Hertiwig (2012); Daolio, Rigoni, Roble (2012); Silva (2018); Freitas, (2015).

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27 Essas pesquisas balizam nosso olhar sobre os trabalhos de Merleau-Ponty, voltados para o campo da educação, afinal, o filósofo não escreveu especificamente sobre educação. Entretanto, acreditamos que sua fenomenologia possa contribuir para compreendermos melhor e buscarmos avanços para esse fenômeno. Contudo, é importante frisar que, em certo período de sua vida, Merleau-Ponty ensinava na Sorbonne, em Paris, a cadeira de Psicologia e Pedagogia da Criança e ocupava-se das questões da consciência e da linguagem infantil, a posição da pedagogia em relação às disciplinas científicas, em especial à psicologia (NÓBREGA, 2000; 2008).

Suas referências, entretanto, servem de norte para refletirmos também sobre a educação.

Nesse sentido, trazemos o trabalho de Nóbrega (2008), que apresenta um olhar sobre as contribuições das reflexões de Merleau-Ponty (2006), bem como dito anteriormente nas pesquisas produzidas no Grupo de Pesquisa Estesia, para pensarmos o campo educativo e a partir de sua filosofia. Nela, Merleau-Ponty problematiza as bases nas quais estão fundadas a psicologia, que dão suporte à pedagogia. Nestas, as experiências vividas são trazidas para serem observadas como forma de pensar, num significado apenas intelectual. Por outro lado, na fenomenologia de Merleau-Ponty, conforme aponta a autora, as experiências são compreendidas no acontecimento existencial, na experiência da subjetividade, da história, do imaginário, dos afetos, da expressão do corpo (NÓBREGA, 2008). Desse modo, buscamos em seus estudos o suporte para essa construção, a saber, a educação a partir da noção de esquema corporal expresso na fenomenologia de Merleau-Ponty e sua relação com os estudos de Buytendijk. Essa noção se fusiona no sentido de que ambos os trabalhos destacam a importância e a singularidade na construção de conhecimento sobre o corpo e o movimento humano.

Com base na atitude fenomenológica de Merleau-Ponty, apresentamos nossa experiência vivida, em especial no campo da educação física. Essa escolha encontra- se ligada aos estudos realizados anteriormente, assim como aos apresentados na relação com o grupo de pesquisa e aos trabalhos lá desenvolvidos a partir desse pensamento, e principalmente por acreditarmos que esse caminho fenomenológico, pautado na experiência vivida, na experiência da vida, nesta tese, permite-nos compreender os fenômenos aqui discutidos.

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28 Escrever uma tese fenomenológica é se arriscar o tempo todo, arriscar sua vida, sua história, seu conhecimento, suas crenças. É um desafio, de se mostrar, abrir- se a conhecer melhor o que se conhece, mas principalmente o que não se conhece.

É também uma experiência educativa. É a busca para se aprofundar, organizar e aglutinar cada dia mais o conhecimento, mantendo sempre a humildade e sabendo que o exercício da escrita é solitário. Estar solitário no sentido de estar implicado no processo reflexivo, mas, sem dúvida, de modo intersubjetivo, posto que para a fenomenologia o ser não se encontra sozinho, mas no mundo em relação com os outros, aprendendo a partir da coragem de poder errar, de duvidar das próprias reflexões e experiências vividas.

Pensar junto ao pensamento de Merleau-Ponty é pensar que “o mundo está ali antes de qualquer análise que eu possa fazer dele [...]”. Assim, nosso conhecimento, nossa experiência e nossa compreensão partem indubitavelmente do que sentimos no mundo a partir do nosso corpo, o modo a partir do qual pretendemos buscar os sentidos das nossas reflexões, considerando o percurso que seguimos até aqui (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 5).

Esse percurso dialoga com as concepções de corpo de Merleau-Ponty, assim como as reflexões sobre o movimento humano lançadas por Buytendijk, percurso do corpo e do movimento experimentados desde as mais simples brincadeiras de criança e das experiências vividas nos esportes e na educação física na escola, seguindo na formação em educação física, no campo profissional; corpo, movimento e educação convergem na busca por novos horizontes de conhecimento.

Nosso processo de construção de conhecimento, pautado na atitude fenomenológica, na experiência de vida, no conhecimento do mundo, busca na redução apresentada por Merleau-Ponty em Fenomenologia da percepção (1999) a admiração pelo mundo necessária, não apenas para empreender o novo olhar sobre o vivido, sobre o conhecido, mas também para superar o próprio conhecimento que vem sendo reconfigurado sempre, por novas experiências, novas leituras, novas reflexões, sendo isso feito diariamente. Esse novo pensamento aqui construído partirá das descrições das experiências vividas, das lembranças, do que nos toca nesse percurso, sempre envoltos ao corpo em movimento buscando deste modo, a volta ao mundo, o retorno sobre nós mesmos. Em seguida, a partir da redução fenomenológica

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29 conforme mostrado por Merleau-Ponty na Fenomenologia da percepção (1999), dedicamo-nos à leitura fenomenológica dos textos de Merleau-Ponty e Buytendijk, que trazem os conceitos sobre corpo e movimento aqui tratados, buscando o sentido reivindicado a partir da fenomenologia.

Destaca-se na pesquisa a redução fenomenológica por meio do diálogo entre os relatos de experiência vivida com as noções de corpo próprio e movimento próprio advindos das obras de Merleau-Ponty e de Buytendijk, em especial a Fenomenologia da percepção (1999) e Atitudes e movimentos (1957), respectivamente. Assim, relatos, conceitos e imagens se entrelaçam na compreensão da educação como experiência do corpo em movimento.

Percebe-se que minha própria compreensão sobre o corpo e o movimento humano vem sendo modificada a todo momento nos estudos da fenomenologia de Merleau-Ponty e mais recentemente com os estudos do movimento humano apresentados por F. J. J. Buytendijk, criando novos sentidos a todo envolvimento e admiração diante do mundo que se vive a partir do corpo em movimento. Os estudos referentes aos trabalhos de Buytendijk compõem parte central desta pesquisa. Desse modo, desenvolvemos nossas reflexões a partir da experiência vivida, destacando o campo da educação física, pautados nos conhecimentos referentes ao corpo e ao movimento humano.

O texto da tese está organizado em três capítulos. No primeiro, “Experiências do corpo em movimento: relato da trajetória acadêmica e profissional”, retomamos a experiência que nos trouxe até aqui, não apenas considerando os aspectos referentes ao mundo acadêmico ou da própria pesquisa, mas buscando nossas lembranças, nossos desejos, nossa história, relacionando-os a esse novo horizonte de conhecimento que aqui pretendemos, o corpo e o movimento.

No segundo capítulo, “Visão fenomenológica do corpo”, fundamentamo-nos na fenomenologia de Merleau-Ponty, que apresenta seu olhar sobre o corpo, considerando a noção de esquema corporal, que nos permite ver o corpo de forma ampla, de modo que percebamos o corpo como unidade. A partir desse entendimento, trazemos as concepções de imagem corporal para ampliar e complementar a noção de esquema corporal.

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30 No terceiro capítulo, “Visão fenomenológica do movimento humano”, trazemos os estudos de F. J. J. Buytendijk apresentando sua visão do movimento humano, fundamentados também nos estudos da fenomenologia de Merleau-Ponty, bem como sua compreensão do movimento próprio e suas reflexões sobre gesto e motricidade do homem. Ambos os capítulos são cotejados também com cenas de nossa experiência vivida na educação física.

Assim, considerando as visões fenomenológicas sobre corpo e movimento humano, pensamos o campo da educação física a partir das concepções apresentadas por esses estudos que ampliam o horizonte epistemológico, proporcionando aberturas e perspectivas para as experiências educativas, tendo como foco a experiência do corpo em movimento.

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32 A elaboração desta pesquisa vem sendo construída há algum tempo, buscando uma relação que integre em uma perspectiva educativa a experiência e o mundo da vida, no corpo, no movimento, na educação física. Considera-se o corpo como evidência primeira, por não ser possível fazê-lo de outra forma, pois sou meu corpo, como preconiza o filósofo Maurice Merleau-Ponty (1999). Trata-se ainda de uma experiência vinculada à educação de forma ampla, uma experiência que acontece a todo momento na vida, na educação formal ou não, aqui sendo considerada principalmente a educação física, por ser o campo do conhecimento que fundou e uniu em mim as possibilidades de refletir sobre os conceitos que embasam esta pesquisa e que nos permite compreender que a educação física é educação. Dessa maneira, ao nos referirmos à educação física, estamos compreendendo sua vinculação à educação de forma mais ampla como afirmamos acima e, em particular, vinculada ao corpo em movimento.

Destacamos algumas experiências que se passaram desde o período de formação para dar visibilidade ao caminho que nos fez refletir e buscar o conhecimento, e que direcionaram esta tese à compreensão da educação a partir do corpo em movimento. Ressaltamos também que as experiências aqui contidas partem da compreensão de que esta pesquisa, como dissemos, fundamenta-se numa filosofia fenomenológica, sendo a experiência vivida que parte do mundo da vida; do mundo vivido surgem as nossas reflexões.

Compreendemos que o processo de reflexão que enseja uma tese de doutoramento ultrapassa o fato do desenvolvimento de uma pesquisa científica, e não apenas isso, pois está diretamente ligado às experiências que, em um certo tempo, trouxeram o pesquisador a pensar e viver, até o momento no qual seja possível buscar aprofundar algum conhecimento que vem sendo desenvolvido, tanto na vida acadêmica como na vida pessoal de cada pesquisador.

Mesmo se tratando de uma tese de doutoramento, onde impera a sua característica de originalidade e ineditismo, numa tese fenomenológica é concebida uma historicidade, ligada às experiências vividas, e, neste caso, intimamente ligada ao caminho percorrido na universidade, na afinidade com as pessoas dos grupos de pesquisa, na relação de amizade com os professores e nas parcerias de pesquisa no mestrado, mas principalmente nas pesquisas desenvolvidas no Grupo Estesia, nos

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33 projetos e atividades ali desenvolvidos, como uma parte de um grande modo de pensar, pesquisar e refletir sobre a educação e a educação física.

Desse modo, esta pesquisa iniciou-se antes mesmo do ingresso na graduação em educação física, alguns anos antes do ingresso na universidade, assim como acontece com muitos ingressos nos cursos de educação física ainda hoje. Foi através de uma incursão pelo esporte, mas que se ampliou com a graduação. Na universidade, disciplinas, pesquisas e extensão no período de graduação, passando pela especialização em ensino de educação física na escola, no mestrado e atualmente no doutorado, bem como nas experiências com o esporte, na vida profissional que transita entre o fitness, a escola e a formação de professores, sempre se pautando, mesmo que inicialmente, sem a convicção do conhecimento teórico e filosófico que aqui se busca, ligado às mais variadas experiências do corpo e do movimento humano. Destaco a importância dos momentos dessa construção, que se encontram sempre relacionados também aos textos, aos livros e artigos de autores que nesse período foram despertando novos conhecimentos e interesses que delinearam o caminho até esta pesquisa.

Na pesquisa, construímos um diálogo a partir de uma abordagem fenomenológica, ou a partir de uma atitude fenomenológica, por meio da qual faremos uma conversa com as lembranças, com as experiências, com os livros. Trago inicialmente os livros por fazerem parte da construção da tese, junto às lembranças da infância e do início da adolescência, pela leitura do livro O menino grapiúna, de Jorge Amado (2010), em uma noite, tarde da noite, anterior a uma prova de literatura sobre esse livro em que tive a ajuda de minha mãe. Minha mãe, que era professora de língua portuguesa e literatura, dava aulas de manhã, à tarde e à noite e, mesmo depois de um dia inteiro de trabalho, ajudava-me, orientava-me, educava-me. O livro é lembrança e referência da experiência com os livros, pois acredito ter sido esse um dos primeiros livros de literatura que li; e por esta ser uma tese que versa também sobre livros, textos, fenomenologia e experiência de vida, fez-me lembrar das histórias da vida que educaram Jorge Amado. São narrativas da memória, cenas de vida que os livros evocam, nos inspiram e nos educam, pois estão marcadas em nosso corpo e em nossa experiência afetiva.

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34 Figura 1 - Capa do livro O menino grapiúna

Fonte: Amado (2010).

O livro me remeteu às experiências por ele vividas, lá contadas e ilustradas por Jorge Amado, em O menino grapiúna, uma história envolvente que conta um pouco de sua vida, da sua infância e da adolescência, suas aventuras, seus sofrimentos e alegrias, suas memórias. Não é o objetivo trazer nesta discussão uma autobiografia, mas trago a referência sobre como o livro, a leitura e as experiências de vida compõem também o campo do conhecimento diante de um método fenomenológico. Um livro como outros que aqui serão apresentados e que compõem também uma história dentro das temáticas das experiências vividas na infância, na adolescência, mas, principalmente, na universidade, onde os livros nortearam minhas reflexões, e se apresentaram como forma de compreender a educação física como experiência educativa a partir da experiência com os livros ou de como a leitura, o gesto da leitura, marca o nosso corpo e dá sentido ao conhecimento. Nesse movimento do corpo e das ideias, anunciamos neste primeiro capítulo a educação do corpo em movimento, a partir de uma linguagem humana que privilegia a descrição pelo corpo no mundo vivido.

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35 Retorno ao primeiro livro da minha lembrança como leitor e, relendo-o, lembro- me das aventuras por ele experimentadas, do gosto pela leitura, destacado pela minha mãe na época, da liberdade precoce do menino grapiúna, dos desenhos do livro, abrindo cada capítulo, como uma lembrança introduzindo os pensamentos que serão apresentados.

Trago o menino personagem de Jorge Amado e penso no menino que eu era, de algum modo parecido com o grapiúna, brincando livremente na rua, na mata, sonhava. Tive minha mãe me educando, contava a história, ajudando-me nas leituras, como professora que acreditava na educação. O menino grapiúna busca rememorar a sua vida, reconstruindo o que viveu, dando um novo significado. Sua mãe também contava histórias, ele as mistura um pouco, as lembranças com fantasias e o que aprendeu com suas experiências. Conta suas aventuras vividas com seu tio, relembrando a infância.

Argemiro colocava o menino na frente da sela e o levava a Pirangi nos dias de feira: uma festa, um deslumbramento. Entre os sacos de feijão e farinha, as mantas de jabá, as jacas, as abóboras, os cachos de bananas, as raízes de inhame e aipim, no meio do povo, homens e mulheres que possuíam a cor e o odor da terra, o menino ia aprendendo sem se dar conta. De nada gostava tanto como dessas idas a Pirangi, em companhia de trabalhadores e jagunços: ampliavam seu universo e impediam que medrasse em seu espírito qualquer espécie de preconceito (AMADO, 2010, p. 33-34).

Do mesmo modo, assim como o livro de Jorge Amado traz a lembrança da experiência com a leitura da vida do menino, trago alguns livros, seus autores e lembranças que influenciaram minha experiência na educação física. Não é possível falar da minha experiência na educação física sem referenciá-la também a partir dos livros no período da graduação.

Assim, no início buscamos dentro das experiências vividas e revividas a possibilidade de compreender e fazer dialogar a vida com as reflexões que permitirão surgir um sentido para esta tese. Não se trata de um trabalho de memórias, ou autobiografia que consta aqui; como dito, trata-se de uma tentativa fenomenológica, uma leitura do vivido, a partir da experiência vivida na graduação e da experiência na educação e na educação física, bem como na vida da infância que se relaciona, trazendo os livros, a relação com os amigos, as disciplinas, os professores, as

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36 tentativas nas pesquisas na extensão e no ensino da universidade, nos textos lidos e discutidos que aos poucos vão tomando forma.

Essa leitura também faz parte desta pesquisa, que talvez tenha começado antes, ainda criança, quando vivia da rua, das brincadeiras. Na adolescência, fui atleta de triatlo e ciclismo, mas a corrida de rua, durante um período da minha vida, e a natação me acompanharam desde criança. Criança que gostava e tinha habilidade de se movimentar, brincar, pedalar, correr, nadar, mergulhar, andar no meio da floresta, acampar, subir em árvores. Criança que tinha como matéria favorita, entre os livros da escola e a vida nas brincadeiras de rua, a educação física. Que passava o dia inteiro sob o sol forte, olhando as pipas, correndo atrás das que caíam do céu ou sentindo o contato da linha na mão, que controlava a pipa, e o assovio que “controlava”

o vento. Que gostava de viver e correr na rua. Correr, aliás, deve ter sido a melhor habilidade que desenvolvi durante minha vida, desde criança. Desde pequeno, eu me envolvi em corridas de rua, nas competições da escola, entre as brincadeiras e as aventuras por dentro da floresta que rodeava a vila militar onde morava. Nas competições das escolas ou no treinamento calistênico e exames biométricos, bem característicos do primeiro grau nas escolas no período, mas principalmente vividas nos anos de colégio militar, em Manaus. Nadar e mergulhar, outros movimentos, desenvolvi também como parte na minha infância, aprendi ainda pequeno com meu pai, no clube de militares que frequentávamos quando criança, um nado utilitário, com pouca técnica, que fora desenvolvido somente depois nas aulas de natação.

Aos sete anos, o aprendizado do nado em família se concentrava em não se desesperar, não ter medo e fazer apenas a propulsão para sair daquela situação específica, sobreviver à parte funda da piscina. Meu pai era militar e possuía uma pedagogia interessante para o aprendizado do nado, focada em sobreviver. Explicava- me como funcionava a propulsão do corpo na água, explicação na parte rasa da piscina; em seguida me lançava na parte profunda, dizendo que eu fizesse o que havíamos combinado antes. Deixava clara a relação de confiança. Dizia: “não se preocupe! caso você não consiga chegar à borda, eu lhe pegarei”. Nunca precisei que ele entrasse para me pegar. Gostávamos da água, eu e ele.

Pedalar foi outra grande paixão que me trouxe à educação física. A dificuldade do equilíbrio e o medo nas primeiras tentativas seguidas pelos “tombos” deram lugar

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37 à confiança, prazer e liberdade que passaram a me acompanhar cada dia que pegava a bicicleta pequena da minha irmã menor para sair livremente na hora de pedalar.

Desse modo, a bicicleta também foi me acompanhando durante todo o período da infância, adolescência, tempo no qual competia nas provas de triatlo de ciclismo e corrida de rua. Convivíamos com todos os tipos de pessoas ligados a essas práticas corporais (esportes), atletas amadores, entusiastas, bem como alguns professores de educação física que sempre estavam envolvidos no esporte ou na organização dos eventos. De modo geral, não eram muitos os professores de educação física que estavam participando ativamente em relação ao que acontecia naquele ambiente esportivo, naturalmente amador.

A época era a adolescência. No ensino médio, estudava à noite, trabalhava como office boy (usava a bicicleta como transporte e meio de trabalho) e dividia o tempo com os treinos de natação no Rio Paraguai, as corridas, as pedaladas nas rodovias e as caminhadas pelo cerrado/pantanal (sempre gostei de andar no meio das florestas), tudo isso sempre ligado também a uma compreensão de esporte como promoção da saúde, sempre vendida junto ao esporte.

A participação no esporte acontecia além dos treinos, das provas e das conversas com os amigos, pois eu buscava informações nas revistas esportivas que tratavam dos esportes triatlo, corrida e ciclismo, mas principalmente as que estavam ligadas diretamente à bicicleta, que mobilizava a grande maioria de nós. “Importava”

dos grandes centros revistas especializadas, peças, equipamentos e vídeos (fitas VHS, das provas do Tour de france, Giro d’Italia, Iron man do Havaí e outros). Muitos desses vídeos só chegavam até nós três ou quatro anos após a data do ocorrido.

Mesmo assim, estimulavam a nossa prática e alimentavam nossos sonhos. Livros sobre essas temáticas eram raros. Esse material servia-nos das mais variadas informações a respeito do esporte e de suas nuances competitivas em nível profissional nacional e internacional, bem como manuais para desenvolvermos nossos treinos. Foi nesse ambiente que se constituiu em mim a primeira ideia da busca pela formação em educação física.

Os conhecimentos sobre os diversos processos de treinamento físico, seus princípios, periodização, psicologia do esporte, saúde e qualidade de vida através do

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38 esporte, dentre outros que compunham inicialmente minha visão sobre a atuação da educação física como um campo do conhecimento, voltados mais especificamente para estes aspectos, não eram muito diferentes da educação física de que participava até aquela época na escola. Aliás, naquele período eu fora dispensado da educação física escolar por trabalhar e estudar no período noturno. Fazia minha “educação física” treinando com os conhecimentos das revistas.

Escolhi cursar educação física porque isso me possibilitaria conhecimento para atuar na área esportiva e de promoção da saúde, permitindo ainda diálogo com diversas áreas do campo do conhecimento esportivo, como fisiologia, nutrição, psicologia e outras que já povoavam meus pensamentos por intermédio do treinamento desportivo. Acredito que muitos alunos de graduação, ainda hoje, procuram o curso de educação física baseados nas experiências da vida esportiva.

No meu caso específico, o esporte foi o acesso para a educação física e, posteriormente, para o campo da educação de forma mais ampla, mantendo sempre o corpo em movimento, o que sempre me atraiu.

Ingressei na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no curso de licenciatura plena em educação física, no ano de 1998, e recordo-me ainda do que me trouxera até aqui: o esporte e seu mundo de conhecimentos, profissão, um trabalho que pudesse conciliar o gosto pelo esporte com algo de que gostasse muito, correr, nadar e pedalar, a relação com a natureza, o encontro entre as pessoas.

Durante a graduação, iniciamos com disciplinas que nos faziam transitar entre as ciências sociais, tais como sociologia, antropologia, folclore e filosofia, e outras ligadas às ciências naturais, tais como biologia, bioquímica e histologia, além das específicas da área de educação, tais como as didáticas e introdução à educação.

Muitas contribuíram mudando a minha visão sobre a educação física e sua importância na sociedade e na escola. Especificamente, lembro-me de algumas das primeiras disciplinas da graduação: Filosofia da Educação Física, História da Educação Física, Folclore, Anatomia e Biologia.

Curiosidade e ansiedade tomaram conta de todos que, na turma de 1998, quase unanimemente, escolheram o curso por identificação com as experiências esportivas pessoais. De modo geral, os alunos ingressos no curso, assim como eu,

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39 deparam-se com algum pré-entendimento a respeito da educação física e muitos de nós, ou em sua grande maioria, fazíamos relação direta entre a educação física e o esporte, muitos de nós advindos de experiências esportivas: futebol, futsal, ginástica rítmica e artística, basquete, judô, karatê, atletismo, dentro outras que compunham nossas experiências diante da formação em educação física.

Esse primeiro contato com as disciplinas do curso foi interessante, especialmente a de Filosofia da Educação. Percebi rapidamente a amplitude do campo de conhecimento que expandia e apresentava as diversas possibilidades para pensarmos, bem como transformava as preconcepções em reflexões mais elaboradas sobre a realidade da educação física e suas nuances, confrontando diretamente a visão de educação física que concebia como atleta e um novo olhar que as disciplinas e seus textos possibilitavam.

Até aquele momento, em minha visão, a educação física, como mencionado anteriormente, apresentava-se restrita ao esporte de modo geral e era voltada para promoção de saúde, o que começara a se mostrar limitado em relação à sua amplitude e importância na sociedade. Com o ingresso na universidade, pude ver outras possibilidades, tanto em relação à atuação profissional como em relação a um campo do conhecimento mais amplo e integrado com outras áreas, fato bastante difícil de perceber antes do ingresso. Cito a disciplina de Filosofia da Educação Física, por ter sido a primeira aula no curso em que nos deparamos com os primeiros livros e textos que se referiam ao campo da educação física, o movimento humano e a educação, e que traziam em suas reflexões discussões novas, bem como olhares bem mais amplos das compreensões sobre o campo da educação física até aquele momento.

Nessa disciplina, tivemos contato com o primeiro livro específico da área de educação física, Educação física e esportes: perspectivas para o século XXI (1992), organizado pelo professor Wagner Wey Moreira. Livro importante que teve grande impacto no meu pensamento dentro do campo da educação física, pois proporcionou uma visão geral sobre as temáticas, questionamentos e debates que aconteciam naquele momento. O livro e os textos apresentados nele acompanharam nossos estudos durante a graduação e até os dias atuais. Destaco dois textos: “Motricidade humana: um paradigma emergente”, do professor português Manuel Sérgio Vieira (1992), e “Métodos de confinamento e engorda (como fazer render mais porcos,

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