• Nenhum resultado encontrado

Avaliação da percepção visual de forma e tamanho em voluntários com estresse crônico

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Avaliação da percepção visual de forma e tamanho em voluntários com estresse crônico"

Copied!
86
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

Erika Cristiane da Silva

Avaliação da percepção visual de forma e tamanho em voluntários com estresse crônico

Recife 2013

(2)

Erika Cristiane da Silva

Avaliação da percepção visual de forma e tamanho em voluntários com estresse crônico

Orientadora: Dra. Maria Lúcia de Bustamante Simas

Recife 2013

Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em Psicologia, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia.

(3)

Catalogação na fonte

Bibliotecária Divonete Tenório Ferraz |Gominho.CRB-4 985

S586a Silva, Erika Cristiane da.

Avaliação da percepção visual de forma e tamanho em voluntários com estresse crônico / Erika Cristiane da Silva. – Recife: O autor, 2013. 85 f. il. ; 30 cm.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Lúcia de Bustamante Simas.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Pernambuco, CFCH. Programa de Pós-Graduação em Psicologia, 2013.

Inclui bibliografia, apêndices e anexos.

1. Psicologia. 2. Percepção da forma. 3. Percepção de tamanho. 4. Estresse (psicologia). I. Simas, Maria Lúcia de Bustamante. (Orientadora). II. Titulo.

(4)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

CURSO DE MESTRADO

Avaliação da percepção visual de forma e tamanho em

voluntários com estresse crônico

Comissão Examinadora:

_________________________________________ Profa. Dra. Maria Lúcia de Bustamante Simas

1º Examinador/Presidente

_________________________________________ Profa. Dra. Melyssa Kellyane Cavalcanti Galdino

2º Examinador

_________________________________________ Profa. Dra. Ana Cristina Taunay Gusmão

Cavalcanti 3º Examinador

(5)

À minha Mãe, exemplo de coragem, determinação e autoestima.

(6)

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiro a DEUS. É nele que encontro o maior sentido da vida.

À minha família que sempre se alegra a cada conquista realizada. Minha mãe, pelo exemplo; minhas duas irmãs, pela amizade, carinho, incentivo; meu irmão, por se alegrar nas minhas conquistas; meu pai, por se orgulhar de mim.

Ao meu esposo, pelo cuidado, carinho e apoio.

À minha orientadora, pela solicitude em várias ocasiões e pelos ensinamentos.

À Ana Cristina Taunay, pela simpatia de sempre e colaborações logo quando iniciei o mestrado.

À meiga Aline, pela disponibilidade e por ter partilhado suas experiências acadêmicas que tanto me ajudaram.

À Vivi, Geórgia e Adriele que me receberam tão bem no LabVis e sempre se dispuseram a ajudar-me quando precisei.

À Flora que esteve sempre disposta a cooperar.

À Escola Maria da Conceição do Rêgo Barros Lacerda, especialmente às pessoas: Fernando Santos, Elizete Santos e Ana Cicalese, as quais foram tão hospitaleiras durante a coleta de dados.

À Romana, pela disponibilidade de partilhar suas experiências de mestre e apoio de amiga. A tantas pessoas que direta ou indiretamente colaboraram comigo para a concretização desse sonho.

(7)

“Viu Deus que a luz era boa”. (Genesis 1:4a)

(8)

RESUMO

O estresse crônico é um fator de risco para o desenvolvimento de várias desordens somáticas e/ou psíquicas. O presente estudo buscou investigar se pessoas com estresse crônico apresentam diferenças na percepção visual de forma e tamanho, fazendo uso de pinturas de Salvador Dali como teste experimental e de lâminas do teste de Rorschach. Foi comparado o grupo experimental (GE), composto por professores da rede de ensino público Estadual de Pernambuco, que apresentavam estresse crônico e o grupo controle (GC), que consistiu de pessoas que não apresentaram estresse. Para a triagem dos grupos foram usados o Mini Exame do Estado Mental e o Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp (ISSL). Na etapa de teste foram usadas 10 fotografias de pinturas de Salvador Dali e também fotografias das 10 pranchas do Rorschach. Os voluntários foram instruídos a indicar, em cada fotografia, a figura percebida em primeiro lugar. Posteriormente, o diâmetro das figuras indicadas foi medido em milímetros. Os resultados foram transformados em grau de ângulo visual para análise estatística. A ANOVA, conforme segue: Dalí [(F9,270) = 0,90620, p < 0,52025] e Rorschach [(F9,270) = 0,54865, p < 0,83809], mostrou não haver diferenças entre os dois grupos, GE e GC. Portanto, este estudo não pode afirmar que há uma relação direta entre presença de estresse e alteração na percepção visual de forma e tamanho.

(9)

ABSTRACT

Chronic stress is a risk factor that may result in somatic and/or psychiatric disorders. The present study, investigated whether chronically stressed volunteers have the visual perception of form and size affected. To this end, we used 10 paintings by Salvador Dali and 10 plates of Rorschach's Test. Performance of chronically stressed teachers from a public school in Pernambuco, Recife, Brazil, formed the Experimental Group (EG) that was compared to a Control Group (CG) of volunteers free of chronic stress as assessed through the Mini Exame of Mental State (MMSE) and the Lipp's Inventory of Symptoms of Stress for Adults (LISS) in both groups. We used 10 paintings of Salvador Dali and the 10 plates of Rorschach. Volunteers were asked to point and circle the first image perceived as each figure was shown. The diameters of the pointed pictures were measured in milimeters and subsequently converted to visual angle. Results showed no differences between the groups either for Dalí [(F9,270) = 0,90620, p < 0,52025] or Rorschach [(F9,270) = 0,54865, p < 0,83809]. In conclusion, it is not possible to assume that Chronic Stress affects the visual perception of form and size.

(10)

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1: Os fotorreceptores da retina... 20

FIGURA 2: A fóvea... 21

QUADRO 1: Diferenças funcionais entre os três tipos de células ganglionares... 22

FIGURA 3: o percurso da informação visual da retina ao córtex visual primário... 23

FIGURA 4: As camadas do Núcleo Geniculado Lateral (NGL)... 24

FIGURA 5: As regiões corticais do processamento visual, realizado pelas vias dorsal e ventral... 26

FIGURA 6: Estimativa do tamanho do grau de ângulo visual em função de 24 estímulos de Dali... 29

FIGURA 7: Estimativa do ângulo visual em função do estímulo... 29

FIGURA 8: Eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA)... 37

FIGURA 9:Estágios do estresse... 38

FIGURA 10: Comparação da quantidade da substância cinzenta entre grupo experimental e controle... 45

FIGURA 11: Média geral dos grupos experimental e controle... 55

FIGURA 12:Médias dos grupos experimental e controle obtidas em cada imagem de Dali... 55

FIGURA 13:Médias dos grupos experimental e controle obtidas em cada prancha de Rorschach... 56

FIGURA 14: Estimativa do grau de ângulo visual em função do estímulo (Pinturas de Salvador Dalí) do Grupo Experimental e do Grupo Controle... 57

FIGURA 15: Estimativa do grau de ângulo visual em função do estímulo (Pranchas do Rorschach) do Grupo Experimental e do Grupo Controle... 57

(11)

LISTA DE TABELA

(12)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ACTH Hormônio Adrenocorticotrófico

ANOVA Análise de Variância para Medidas Repetidas CBA Complexo Basolateral da Amígdala

CID – 10 Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde

CPF Córtex Pré-Frontal CRF Corticotropina

DSM-IV Quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais Dp Desvio padrão

GC Grupo Controle GE Grupo Experimental

HHA Hipotálamo-Hipófise-Adrenal

ISSL Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp LABVIS Laboratório de Percepção Visual

LISS Lipp's Inventory of Symptoms of stress for adults

K Coniocelular M Magnocelular

MEEM Mini-Exame do Estado Mental

MMSE Mental State Examination

NGL Núcleo Geniculado Lateral P Parvocelular

PET Tomografia por Emissão de Pósitrons SNA Sistema Nervoso Autônomo

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TEPT Transtorno de Estresse Pós-Traumático UFPE Universidade Federal de Pernambuco V1 Área Visual Primária

V2 Área Visual 2 V3 Área Visual 3 V4 Área Visual 4

IVA Subcamada A da área visual 4 do córtex estriado IVB Subcamada B da área visual 4 do córtex estriado

(13)

IVC Subcamada C da camada IV do córtex estriado

IVCSub-região da subcamada C da área visual 4 do córtex estriado IVCSub-região da subcamada C da área visual 4 do córtex estriado V5 Área Visual 5

(14)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 15

2 A PERCEPÇÃO VISUAL DE OBJETOS... 18

2.1 Neurofisiologia do processamento visual... 19

2.1.1 As vias paralelas da retina ao tálamo... 22

2.1.2 Processamento cortical, em série ou em paralelo?... 24

2.2As pesquisas com pinturas de Salvador Dali e as Pranchas de Rorschach como ferramentas de avaliação do processamento visual... 27

3 O ESTRESSE... 31

3.1 Breve histórico do estresse... 31

3.2 Concepções do estresse... 32

3.2.1 A síndrome geral da adaptação... 32

3.2.2 O modelo transacional do estresse... 34

3.2.3 O modelo quadrifásico do estresse... 35

3. 2.4 O estresse como allostasis ou allostatic load... 36

3.3 Resposta aos estressores... 36

3.4 O estresse crônico... 39

4. O ESTRESSE E A PERCEPÇÃO VISUAL... 42

4.1 O efeito do estresse em algumas áreas do cérebro... 42

4.2 O efeito do estresse no córtex visual... 45

5 MÉTODO... 48 5.1 Objetivos... 48 5.1.1 Objetivo geral... 48 5.1.2 Objetivos específicos... 48 5.2 Local... 48 5.3 Voluntários... 48 5.3.1 Critérios de inclusão... 48 5.3.2 Critério de exclusão... 49 5.4 Participantes... 49 5.5 Instrumentos... 49

5.6 Procedimento de coleta de dados... 51

5.7 Dificuldades encontradas... 52

(15)

7 DISCUSSÃO... 59

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 62

REFERÊNCIAS... 63

APÊNDICE A - Termo de consentimento livre e esclarecido... 72

APÊNDICE B - Carta de anuência... 75

ANEXO A - Protocolo de entrevista clínica... 77

(16)

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho é fruto de um estudo exploratório que teve o objetivo de avaliar a percepção visual de forma e tamanho em voluntários com estresse crônico.

O estresse crônico pode afetar várias áreas de funcionamento biopsíquico (ANDERSEN et al., 2008; CHOI et al., 2012; GONZÁLEZ; ESCOBAR, 2006; HANSON et

al., 2012; JOËLS; KRUGERS; KARST, 2008; JOËLS; MORALES-MEDINA et al., 2009;

LOVALLO et al., 2010; McEWEN, 2006; TOMODA et al., 2009, 2012; YANG et al., 2008). Em seres humanos, um dos principais marcadores fisiológicos do estresse é a ativação do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), caracterizado pela liberação da adrenalina, na fase inicial do estresse, e do glicocorticóide cortisol, o qual tenta promover a resistência do organismo à ação do(s) estressor(es) (CHROUSOS, 2009;DEDOVIC et al., 2005;KLOET; JOËLS; HOLSBOER, 2005).

Esses reguladores químicos promovem uma reação de adaptação em busca da homeostase (SELYE, 1965). Se esta busca persistir por um longo período de tempo, o estresse passa a ser prejudicial, caracterizando o estresse crônico e podendo comprometer o bom funcionamento orgânico (CHROUSOS, 2009; McEWEN; ULRICH-LAI; HERMAN, 2009; WINGFIELD, 2010).

O estresse crônico tem sido relacionado, entre outras coisas, à redução de neurônios no córtex visual (CHOI et al., 2012; OLIVARES, et al., 2010; TOMODA et al., 2009, 2012). Tomoda et al. (2009; 2012) propuseram que este efeito, produzido pelos estressores, ocorreu devido a uma cascata de eventos que incluem a excessiva exposição a hormônios, como o cortisol.

Se o estresse crônico provoca mudanças morfológicas numa das mais importantes áreas do processamento visual, tais efeitos também acarretariam disfunções na percepção visual?

Estudos recentes têm sugerido que as pinturas de Salvador Dali podem ser uma ferramenta favorável na detecção de alterações na percepção visual de forma e tamanho em portadores de Esquizofrenia (MENEZES, 2008; NOGUEIRA, 2006; SIMAS et al., 2011). Considerando que o estresse crônico é um fator de risco que antecede surtos psicóticos (CORCORAN et al., 2003; CORTEZ; SILVA, 2007; LISTON; McEWEN; CASEY, 2009), buscou-se investigar, neste trabalho, se as pessoas com estresse crônico submetidas ao mesmo teste experimental apresentariam respostas semelhantes às encontradas no estudo com portadores de esquizofrenia.

(17)

Embora as alterações sensoriais na esquizofrenia estejam sendo amplamente abordadas e discutidas na literatura ainda são necessários mais estudos que contribuam para a prevenção de tais surtos (MAJ; SARTORIUS, 2005; LOUSÃ, 2007). Nesta perspectiva, as pesquisas que investigam os aspectos antecedentes da instalação da psicose, como exemplo, o estresse crônico, podem trazer colaborações importantes. (CORCORAN et al., 2003; CORTEZ; SILVA, 2007; LISTON; McEWEN; CASEY, 2009).

Tal como ocorre com as patologias listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10) e na quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV), não encontramos o estresse como doença física ou psíquica. Ele é referido como um dos itens que compõe as prováveis causas de uma enfermidade (BRADLEY; DINAN, 2010; CORCORAN et al., 2003; CORTEZ; SILVA, 2007; McEWEN, 2007; LIPP, 2006; LISTON; McEWEN; CASEY, 2009).

Desse modo, é a forma crônica do estresse que pode ser disparadora de inúmeras doenças geneticamente programadas, comoa Esquizofrenia, as quais permaneceriam latentes na ausência de estressores contínuos; de doenças oportunistas que se aproveitam da queda da imunidade para instalar-se no organismo; e de doenças cardíacas, gastrointestinais e etc. (BRADLEY; DINAN, 2010; LIPP, 2006). Além disso, a exposição ao estresse crônico pode alterar morfologicamente áreas do processamento visual (CHOI et al., 2012; OLIVARES, et

al., 2010; TOMODA et al., 2009, 2012).

Feitas as considerações acima, vale ressaltar que presente dissertação está subdividida em oito capítulos. O primeiro refere-se à introdução em pauta.

Os capítulos 2, 3 e 4 juntos compõe o marco teórico. Eles tratam, respectivamente, da percepção visual de objetos, do estresse e da relação entre estresse e percepção visual.

No capítulo dedicado a percepção visual, é descrito o processamento visual desde a retina até as áreas associativas. No final, é discutido sobre as pesquisas com o uso das fotografias das pinturas de Salvador Dali como instrumento de avaliação da percepção de forma e tamanho.

O capítulo reservado ao estresse traz inicialmente um breve histórico do mesmo, passando pelas suas principais concepções teóricas, a resposta aos estressores e o estresse crônico.

E o capítulo que relaciona estresse a percepção visual discute algumas pesquisas que relacionam o estresse crônico a alterações morfofisiológicas em algumas áreas cerebrais, destacando, no final, as alterações no córtex visual.

(18)

O quinto capítulo trata do método, explanando os objetivos deste trabalho, bem como o local da coleta de dados, os critérios de inclusão e exclusão que os voluntários foram submetidos, os participantes do estudo, os instrumentos e procedimentos utilizados para a coleta de dados e por fim as dificuldades encontradas durante tal coleta.

O sexto e o sétimo capítulos trazem, respectivamente, os resultados e discussão dos dados coletados. Na discussão é feita uma reflexão sobre o estresse em professores (sujeitos da pesquisa). Em seguida é feita uma comparação dos resultados desta pesquisa com resultados de pesquisas anteriores que utilizaram as fotografias de pinturas de Salvador Dali como ferramenta de investigação da percepção visual.

Por fim, no oitavo capítulo, a conclusão traz sugestões sobre futuras pesquisas que possam contribuir para ampliar as reflexões do presente estudo, e quem sabe, responder a questões suscitadas pelo mesmo.

(19)

2 A PERCEPÇÃO VISUAL DE OBJETOS

A psicologia, quando emergiu como ciência, apoiou-se no estudo da sensação e percepção. Nessa época, o médico e fisiologista Wilhelm Wundt (1832-1920) conduziu uma série de estudos neste campo, fundando a Psicologia Experimental. Continua sendo interesse da Psicologia Experimental a investigação de algo tão amplo e complexo como a percepção, notadamente o fascinante campo da percepção visual (SCHIFFMAN, 2005).

Várias abordagens teóricas surgiram ao longo da história para investigar a percepção visual, dentre elas: o Estruturalismo, a Psicologia da Gestalt, a Abordagem Computacional e a Psicologia Sensorial. Esta última, devido ao enfoque deste trabalho, receberá mais atenção.

O estruturalismo tem como base o método de estudo das ciências naturais, a qual tinha como objetivo descobrir a estrutura dos elementos básicos da matéria. Edward Bradford Titchener (1986-1927), um dos mais influentes alunos de Wundt, influenciado por tal método, decidiu pesquisar a estrutura da percepção. Sendo assim, ele propôs que a psicologia deveria se preocupar com os elementos constituintes da percepção, ou seja, com as sensações elementares (SCHIFFMAN, 2005).

Eram característicos dos estudos de Wundt, tal como era de se esperar de um método quantitativo das ciências naturais, a construção de hipóteses, a verificação experimental e o elementarismo1 (ENGELMANN, 2002). No entanto, por mais que esta metodologia e seus resultados tenham tradição, a mesma não agradou a muitos pesquisadores da psicologia da época e de épocas posteriores. Tal insatisfação fez com que outras formas de estudar e compreender a percepção fossem se desenvolvendo e eclodindo, como a abordagem denominada Gestalt.

A Teoria da Gestalt nasceu por volta de 1910 na Alemanha, partindo da oposição à visão elementarista do estruturalismo. Esse estudo começou com a investigação da sensação e percepção do movimento, realizado por Max Wertheimer (1880-1943), em parceria com Wolfgang Köhler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-1941). Em linhas gerais, a partir dos experimentos psicofísicos realizados por eles, defenderam a tese de que a gestalt2 é anterior à existência das partes. Com efeito, a gestalt vai se opor ao status quo da época, ao estruturalismo (ENGELMANN, 2002; SCHIFFMAN, 2005).

1

Metodologia, utilizada por grande parte de cientistas da época, que estudavam o objeto de interesse partindo dos seus elementos constituintes (ENGELMANN, 2002)

(20)

Outra forma de explicar a percepção é a abordagem computacional, a qual é baseada na monografia de David Marr (1945-1980). Ele propôs “que a percepção de características como as formas requer do observador um modo de resolução de problemas ou de processamento de informações dos estímulos ambientais” (SCHIFFMAN, 2005, p.6). Esses estímulos ambientais são quinas, bordas, contornos, movimento e outras descontinuidades. Esta forma de explicar a percepção é similar ao processamento de informações tal como ocorre com programas de computadores.

Para uma compreensão acerca da percepção visual é imprescindível uma análise dos processos neurofisiológicos nela envolvidos (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008, LENT, 2010).

2.1 Neurofisiologia do processamento visual

O olho humano é um órgão que apresenta uma anatomofisiologia especializada para a detecção, localização e fototransdução da luz. Descrevendo brevemente o caminho da luz até a formação da imagem no fundo do olho, pode-se dizer que ela incide na córnea, superfície vítrea transparente, passando pela pupila, abertura cercada pela íris, atravessando o humor aquoso, fluido que nutre a córnea. Em seguida os raios luminosos passam pelo cristalino, estrutura transparente localizada por detrás da íris, pelo humor vítreo, o qual é viscoso e gelatinoso, até chegar à retina, local que possui fotorreceptores, responsáveis pela transformação da energia luminosa em sinais neurais (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008; LENT, 2010; SCHIFFMAN, 2005).

Todas as estruturas anatômicas do olho colaboram de alguma forma para que a imagem de determinado campo visual3 seja formada sobre a retina. Esta é especializada na detecção de diferenças na intensidade da luz incidente. A retina consegue isso graças a dois tipos celulares que especialmente a constitui, os fotorreceptores, conhecidos como bastonetes e cones. Eles estão localizados na última camada da estrutura laminar que perfaz toda a retina (Figura 1) (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008; LENT, 2010; PURVES et al., 2010; SCHIFFMAN, 2005).

3 Campo visual é o espaço total que pode ser visto pela retina quando o olhar está fixo em um ponto à frente.

(21)

FIGURA 1: Os fotorreceptores da retina

A luz atravessa todas as camadas da retina até atingir os fotorreceptores, os quais são sensíveis à luz. Em destaque, as células que constituem a retina. Fonte: http://sites.ifi.unicamp.br/lf22/curiosidades-2/olho-humano/

Tanto bastonetes como cones apresentam um segmento celular contendo uma pilha de discos membranosos, local onde é realizada a fototransdução. Morfologicamente, o que os diferenciam é o fato do seguimento do primeiro ser longo e cilíndrico, com mais discos membranosos, enquanto o segundo apresenta um seguimento mais curto que gradualmente diminui de espessura, com menor quantidade de discos membranosos (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008; LENT, 2010).

Considerando que tais discos apresentam fotopigmentos (sensíveis à luz), acoplados à sua membrana, os bastonetes são capazes de responder a baixos níveis de estimulação luminosa, enquanto os cones respondem a níveis mais elevados de iluminação. O que cada receptor capta é um determinado comprimento de onda. Além de receber a luz, os receptores tem a tarefa de traduzi-la em alterações do potencial de membrana, para assim o estímulo luminoso poder ser transformado em sinal neural (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008; GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006; LENT, 2010; PURVES et al., 2010).

Cones e bastonetes são distribuídos diferentemente na retina. A retina, na sua porção periférica, é rica em bastonetes, o que faz tal região retiniana ser mais sensível à luz e em contrapartida com menos poder de resolução visual. No centro da retina, exatamente na fóvea, uma pequena depressão torna a retina mais delgada. Neste ponto, que é constituída somente

(22)

por fotorreceptores, há uma grande densidade de cones (Figura 2). Estes, por detectarem luz de diferentes faixas de comprimentos de onda são especialistas na visão de cores e de alta resolução (LENT, 2010; PURVES et al., 2010).

FIGURA 2: A fóvea

Na fóvea há um afastamento permanente das células bipolares e ganglionares, permitindo que a luz incida diretamente nos cones, o que o torna especializado na visão de cores e de alta resolução. Fonte: http://ocularis.es/blog/?p=16

A resolução da visão é medida em graus de ângulo visual, ou seja, a capacidade do olho em distinguir a separação angular entre dois pontos no espaço (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008).É a alta resolução da fóvea que permite a acuidade visual. Esta costuma ser testada nos consultórios oftalmológicos e em estudos envolvendo a percepção visual4.

Durante percepção de uma cena natural, passamos nossos olhos cerca de três vezes a cada segundo através de movimentos oculares rápidos (sacadas), de modo que o objeto de interesse seja centrado na alta resolução fóvea (PAJAK; NUTHMANN, 2013). Essa exploração do campo visual permite selecionar informações a serem extraídas de uma cena (SCHIFFMAN, 2005).

O tamanho dos objetos percebidos através do sistema visual é codificado pelo ângulo visual sobre a retina. Tal abertura depende da distância do objeto. Através de um mecanismo visual chamado "constância de tamanho”, o sistema visual executa um reescalonamento automático de abertura visual, conforme a distância do objeto, sem que o objeto percebido

4

Para Bicas (2002), o teste da acuidade visual adequar-se principalmente à medida da capacidade de discriminação de formas e contrastes. Este autor ressalta que o registro de um valor de acuidade visual depende dos componentes da percepção e da cognição.

(23)

pareça se encolher ou se expandir enquanto sua distância muda. (HEINRICH; WIEGREBE, 2013; SCHIFFMAN, 2005).

2.1.1 As vias paralelas da retina ao tálamo

Os fotorreceptores estabelecem conexões com as células bipolares, as quais estabelecem via direta até as células ganglionares. As células amácrimas e horizontais influenciam o processamento visual atuando nos fotorreceptores, células bipolares e células ganglionares (voltar à figura 1) (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008).

Três tipos morfofuncionais de células ganglionares parecem desempenhar diferentes papéis no processamento visual: (1) as células do tipo M (magnocelular), aproximadamente 10% das células ganglionares, apresentam soma e dendritos grandes; (2) as células tipo P (parvocelular), perfazendo cerca de 80%, apresentam soma pequeno, comparado as células tipo M, porém árvores dendríticas bem ramificadas. E (3) as células tipo K (coniocelular), menos frequentes, são células menores que as do tipo P (LENT, 2010).

Os axônios das células M, P e K são projetados ao NGL (Núcleo Geniculado Lateral) de uma forma interessante. Os tipos celulares citados se trifurcam rumo ao tálamo (local onde se localiza o NGL), constituindo três vias ou canais de processamento de informações visuais: o canal M, o canal P e o canal K. A tabela a seguir mostra as diferenças entre eles (LENT, 2010; PURVES et al., 2010).

Quadro 1: Diferenças funcionais entre os três tipos de células ganglionares

Magnocelular Parvocelular Coniocelular

- Apresentam-se em menor quantidade.

- Parece está ligado à detecção de objetos em movimentos.

- Maiores campos receptivos. - Condução rápida de potenciais de ação no nervo óptico.

- São mais sensíveis a estímulos com baixos contrastes.

- Respondem à estimulação dos centros de seus campos receptivos com uma série rápida e transitória de rajadas de potenciais de ação.

- São abundantes em quantidade;

- Apresenta função possivelmente ligada à detecção e análise fina da forma dos objetos.

- Detecta e analisa a cor de objetos. - Menores campos receptivos.

- Respondem à estimulação do centro de seus campos receptivos com uma descarga sustentada de potenciais de ação, que persiste enquanto persistir o estímulo.

- Possui função

relacionada à detecção de cores.

Fonte: BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2008.

(24)

As células ganglionares apresentam sensibilidade a contrastes e comprimentos de ondas de luz. Elas são as únicas na retina a dispararem potencial de ação, sendo também únicas a projetar axônios da retina para o restante do encéfalo. São estes axônios que constituem o nervo óptico. Parte das fibras que o constitui dirige-se para o diencéfalo, na região do tálamo, especificamente para o NGL, o qual recebendo fibras nervosas provenientes das células ganglionares retinianas, de cada olho, envia radiações ópticas ao córtex visual primário (Figura 3) (LENT, 2010; PURVES et al., 2010).

FIGURA 3: o percurso da informação visual da retina ao córtex visual primário

A informação visual que vem da retina passa pelo NGL, o qual as envia para o córtex visual primário. Fonte: adaptado de BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2008.

Vistos em uma secção transversal, macroscopicamente, cada NGL é constituído por seis camadas. Convencionou-se que elas fossem enumeradas de 1 a 6, sendo que cada qual recebe aferências de axônios do trato óptico e envia eferências até o córtex visual. Tendo em vista o grande tamanho de seus neurônios, as camadas 1 e 2 (inferiores ou ventrais) são denominadas sistema magnocelular, o qual recebe aferências de axônios M. As camadas 3, 4, 5 e 6 (superiores ou dorsais) constituem o sistema parvocelular, já que apresentam neurônios pequenos e recebem aferências das células P. Nos espaços interlaminares dessas camadas há neurônios ainda menores, os coniocelulares, os quais recebem aferênicas de axônios ganglionares K (Figura 4) (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008; GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006; LENT, 2010; PURVES et al., 2010).

(25)

FIGURA 4: As camadas do Núcleo Geniculado Lateral (NGL)

Fonte: Adaptado de BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2008.

2.1.2 Processamento cortical, em série ou em paralelo?

As vias M e P dispõem-se de forma segregada em todo o sistema retino-geniculo-estriado. As mesmas funções, descritas anteriormente (Quadro 1) sobre as células ganglionares M e P continuam igualmente no NGL e nas suas aferências de axônios até o córtex estriado5 (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008).

Esta região cortical é constituída por cerca de seis camadas, conforme a convenção estabelecida por Brodmann, cada uma referida por um algarismo romano. A camada IV é atualmente subdividida em três camadas (IVA, IVB e IVC, esta última subdividida em IVC e IVC) (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008; KANDEL; SHUARTZ; JESSEL, 2002).

É na camada IVC que terminam a maioria dos axônios oriundos do NGL. Os fluxos da informação visual, presentes nas camadas magno e parvocelulares do NGL, permanecem anatomicamente segregados na camada IVC. As camadas II e III recebem eferências de axônios das camadas coniocelulares do NGL (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008). É

5

É no lobo occipital do cérebro dos primatas que se localiza o córtex estriado, também conhecido por córtex visual primário, área 17 de Brodmann e área visual 1 (V1).(BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008).

NGL Parvocelular

NGL Magnocelular

(26)

bom lembrar que se deve aos estudos pioneiros, no início da segunda metade do século XX, realizados por Hubel e Wiesel6, as bases sistemáticas da fisiologia do córtex estriado.

Pesquisas realizadas por eles, estudando o campo receptivo7 de células do córtex

estriado de gato e depois de macaco, evidenciaram que as células da área 17 respondiam preferencialmente para estímulos que apresentavam uma determinada orientação e configuração de formas. É com base nesses estudos que se fala no processamento hierárquico ou serial (HUBEL; WIESEL, 1962, 1968).

Foi proposta a existência de uma hierarquia de áreas, partindo de V1, com complexidade crescente, visto que os campos receptivos vão se tornando progressivamente mais complexos, na medida em que vão se direcionando às regiões extra-estriadas do córtex. Vale considerar que nessas áreas as células respondem seletivamente a formas mais complexas e movimentos de objetos (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2008).

Diferente do modelo hierárquico, estudos com primatas, que sofreram lesões em áreas do córtex extra-estriadas, mostraram existir duas vias corticais (vias paralelas) para a percepção visual. São as vias dorsal e ventral.Essas regiões partem do córtex extra-estriado e frequentemente recebem aferências da área para a qual se projetam, ocorrendo extensos padrões de convergências e divergências de vias de processamento visual (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006; GOODALE; MILNER, 1992; KANDEL; SHUARTZ; JESSEL, 2002).

A via dorsal, que se direciona ao lobo parietal, parece relacionar-se a análise do movimento visual, bem como para o controle visual da ação. Esta via permite, por exemplo, a determinação de onde está um objeto (Figura 5) (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006; GOODALE; MILNER, 1992).

6 As contribuições dadas por eles conferiu-lhes o Prêmio Nobel de medicina e fisiologia, em 1981.

(SCHIFFMAN, 2005)

7

Campo receptivo é região do campo visual ou a região correspondente da retina que, quando adequadamente estimulada, excita ou inibe o padrão de disparo do potencial de ação de uma célula sensorial. (SCHIFFMAN, 2005).

(27)

FIGURA 5: As regiões corticais do processamento visual, realizado pelas vias dorsal e ventral.

Fonte: Adaptado de KANDEL, E. R.; SHUARTZ, J. H.; JESSEL, T. M. Princípios da Neurociência. 4 ed. São Paulo: Manoele, 2002.

Por outro lado, a via ventral parte de V1 em direção ao lobo temporal. As propriedades de seus neurônios parecem está ligadas ao reconhecimento de objetos, envolvendo a percepção tanto da forma quanto da cor, determinando o quê se está olhando (BEECK et al., 2008; GOODALE; MILNER, 1992; ). Para Gazzaniga, Ivry e Mangun (2006), a percepção da forma é o objetivo essencial da visão, visto não existirem registros clínicos de paciente cegos à forma. Eles argumentam que a percepção da cor serve a forma, já que não podemos falar em cor, sem antes existir uma forma para mesma.

Estudos com indivíduos que apresentam lesões restritas nas áreas corticais extraestriais da via ventral indicam que a análise da forma dos objetos é apenas iniciada pelo córtex estriado, continuando ao longo da via mencionada. O córtex ínfero-temporal parece conter céulas gnósicas (do grego gnosis, saber), relacionadas à percepção visual da forma, visto que lesões nesse local fazem indivíduos perderem a capacidade de reconhecer objetos, desenhos e faces, sem, contudo, perder a percepção espacial (BEECK et al., 2008; LENT, 2010; PURVES, 2010).

Gazzaniga, Ivry e Mangun (2006) preferem chamar o processamento de duas vias de processamento convergente (termo cunhado por David Van Essen, Universidade de Washington), o qual enfatiza a natureza analítica da percepção, com a estratégia de dividir (divisão de trabalho) para conquistar (ESSEN; GALLANT, 1994). É como se as informações visuais fossem dividas em subsistemas especializados, os quais, de forma interativa, trabalham para constituírem a cena visual. Nesse sentido, Bear, Connors e Paradiso, (2008) assemelham a percepção visual a uma orquestra de áreas visuais.

(28)

Conforme Lent (2010), pesquisas fundamentadas no modelo hierárquico e no modelo paralelo continuam coexistindo. Diante do fato das pesquisas sobre percepção visual estarem ainda na tentativa de elucidar muitos problemas ainda não respondidos, é mais razoável não escolher um modelo como o único capaz de explicar a neurofisiologia visual.

Alternativa é considerar que o entendimento do processo de reconhecimento dos objetos pode ter dois modos de processamentos: o bottom-up e o top-down. O primeiro acredita que as informações sensoriais fornecidas pelos receptores se combinam com mecanismos involuntários do sistema visual para construir e formar padrões e formas identificáveis. Já o segundo envolve níveis de análise abstrata, superiores e globais, relacionados com a experiência, o conhecimento, o significado e as expectativas que o observador atribui às imagens percebidas (GOLDSTEIN, 2010; SCHIFFMAN, 2005). Estudos recentes utilizando as pinturas de Salvador Dali como estímulos visuais (SIMAS et

al.,2011), conforme será discutido a seguir, parecem lançar mão desses dois modos de

processamento.

2.2 As pesquisas com pinturas de Salvador Dali e as Pranchas de Rorschach como ferramentas de avaliação do processamento visual

Como já foi dito anteriormente, o processo de reconhecimento dos objetos do mundo a nossa volta pode lançar mão de dois mecanismos de processamentos visuais: o bottom-up e o

top-down. Um caso interessante de integração entre esses dois processamentos ocorre na

pareidolia, “a percepção equivocada de algo claro e distinto a partir de um estímulo vago e obscuro” (MARANHÃO-FILHO; VINCENT, 2009, p.1117). Esse fenômeno está presente nas síndromes psicóticas (também podendo ser observada, com intencionalidade, por pessoas saudáveis) e pode ser bem ilustrado nas pinturas de Salvador Dalí (SIMAS et al., 2011).

Simas et al.(2011) vem realizando estudos nesse sentido, utilizando as pinturas de Dali. Os achados desses estudos revelam que a população estudada, portadores de Esquizofrenia, escolheram imagens que requerem bordas de vários objetos para formar uma única figura, o que resulta em proporções muito ampliadas da imagem escolhida.

Simas et al. preferem chamar esse fenômeno de concatenação de formas, para não ser confundido com a pareidolia, apesar de ambos fenômenos serem semelhantes. Para estes pesquisadores a concatenação de formas ocorre durante o agravamento dos sintomas positivos da Esquizofrenia, ou seja, delírios, alucinações e ilusões.

(29)

Nogueira (2006), pioneira a realizar estudos testando os quadros de Salvador Dali, revelou na sua pesquisa que as pessoas acometidas pela Esquizofrenia viam tamanhos de figuras em média três vezes maiores do que as indicadas pelo grupo controle. Para esta pesquisadora, uma das explicações hipotéticas para a preferência por figuras maiores entre o grupo experimental seria uma alteração nos canais visuais parvocelular. Déficits no processamento visual, em portadores de Esquizofrenia já são confirmados por estudos científicos (KIM et al., 2006; KANTROWITZ et al., 2009; NOGUEIRA, 2010).

O resultado desse estudo motivaram outras pesquisas que replicaram e aprimoraram o primeiro estudo. Uma dessas pesquisas procurou verificar se os quadros do pintor Salvador Dali podem ser ferramentas para investigar possíveis alterações na percepção visual, relacionadas a episódios depressivos, tal como parece ter sido útil no estudo de pessoas com Esquizofrenia. No entanto, não foi encontrada diferença estatisticamente significante nas respostas dos sujeitos experimental e controle (LACERDA, 2008).

Outro estudo replicou este estudo pioneiro e encontrou mais uma vez a diferença de escolhas de tamanhos entre grupo experimental (GE), pessoas com Esquizofrenia, e controle (GC), pessoas saudáveis.Os resultados indicaram que pessoas com Esquizofrenia escolheram figuras em média 1,51 (pelo menos uma vez e meia) maiores que as figuras escolhidas pelas pessoas saudáveis (figura 6) (MENEZES, 2009).

Diante dos resultados dos três estudos citados, Modesto (2012) realizou uma pesquisa, semelhante as três acima, realizadas por Nogueira (2006), Lacerda (2008) e Menezes (2009). Ela acrescentou mais dois grupos de estímulos visuais para investigar a percepção visual de pessoas com Esquizofrenia. Foram eles, as pranchas do Rorschach8 e pinturas de Bev Doolittle9. Os resultados (figura 7) mostraram que o GE escolheram figuras maiores do que o GC, nos três grupos de estímulos, reforçando os achados dos estudos de Nogueira (2006) e Menezes (2009).

8 É um teste projetivo, elaborado por Hermann Rorschach em 1918, composto por 10 lâminas com manchas de

tinta simétricas, o que lhe confere a característica de proporcionar a percepção de figuras ambíguas. (JACÓ-VILELA et al., 2010). Modesto (2012) utilizou as pranchas de Rorschach da mesma forma como utilizou Dali, ou seja, ela fez uso dele como ferramenta para a avaliação de possíveis alterações na percepção visual de forma e tamanho.

9 Nas palavras de Modesto (2012, p.72), ”Uma das características mais marcantes em suas obras é a utilização de

técnicas de camuflagem em que alguns detalhes de sua arte podem ser vistos de maneiras distintas”. Numa mesma pintura deste artista, cada observador pode observar uma forma, uma figura diferente.

(30)

FIGURA 6: Estimativa do tamanho do grau de ângulo visual em função de 24 estímulos de Dali.

Situações experimentais e controle (Menezes, 2009).

FIGURA 7: Estimativa do ângulo visual em função do estímulo

(31)

(B)

(A) Dalí e (B) Rorschach, mostrando os resultados do Grupo Experimental e do Grupo Controle (MODESTO, 2012). Tanto os tamanhos escolhidos em Dali, como em Rorschach pelo GC são em torno de 10 (dez) graus de ângulo visual.

Simas et al. (2011) consideram que as alterações cognitivas na Esquizofrenia são precedidas por alterações sensoriais. Além disso, argumentam que este efeito de percepção de forma e tamanho alterados pode servir como marcador no diagnóstico precoce de sintomas positivos na Esquizofrenia, o que pode conferir a essas pinturas um relevante instrumento de avaliação, detectando a possibilidade do surto antes do mesmo ocorrer e prevenindo o agravamento dos sintomas cognitivos.

As alterações sensoriais, típicas nos quadros de Esquizofrenia, já estão bem descritas e discutidas na literatura. Entretanto, pesquisadores apontam que ainda são necessários estudos que contribuam para a prevenção de tais surtos (MAJ; SARTORIUS, 2005; LOUSÃ, 2007).

Nessa perspectiva, parece relevante investigar aspectos antecedentes da instalação da psicose, como exemplo, o estresse crônico (CORCORAN et al., 2003; CORTEZ; SILVA, 2007; LISTON; McEWEN; CASEY, 2009). Uma possibilidade interessante seria utilizar os mesmos estímulos dos estudos citados acima em pessoas que apresentem estresse e avaliar as respostas dos sujeitos, comparando com estes estudos anteriores.

(32)

3 O ESTRESSE

Quando o homem não consegue responder satisfatoriamente às pressões do meio, pode ocorrer uma ameaça à sua homeostase, tendendo ao desequilíbrio orgânico e/ou psíquico. Não obstante, o ser humano dispõe de mecanismos biológicos para lidar neuroquimicamente com as situações adversas (CHROUSOS, 2009; CORTEZ; SILVA, 2007; 2008; ULRICH-LAI; HERMAN, 2009).

Vale lembrar que os reguladores químicos que ajudam o organismo no enfrentamento de estressores, se acionados por um longo período, em algum momento reduz sua produção, o que deixa o organismo mais susceptível às doenças (somáticas e/ou psicológicas) (CORTEZ; SILVA, 2007; 2008; HERMAN et al., 2012; McEWEN, 2008).

É no contexto acima que o termo estresse costuma ser empregado, ou seja, como sendo um considerável fator de risco para o desenvolvimento de inúmeras doenças, já que pode afetar vários órgãos. Essa idéia tem recebido muito destaque, tanto pela mídia popular, como meios de comunicação científicos (BAUER, 2002; GLEI et al., 2007; LIPP, 2006; McEWEN, 2005).

De um modo geral, o termo estresse é muitas vezes utilizado como sinônimo de estressores e adoecimento. Por isso, vale ressaltar que os três estão ligados entre si, porém, cada qual possui suas próprias características, como está explicado adiante (CORTEZ; SILVA, 2007).

3.1 Breve histórico do estresse

A palavra estresse é a versão em português do vocábulo inglês stress. Esse termo foi inicialmente utilizado na Física e significa literalmente tensão. Nesta ciência, tensão é conceituada como o grau de deformidade sofrido por um material quando submetido a um esforço ou pressão (HALLIDAY; RESNICK;WALKER, 2001).

Sem encontrar uma palavra que melhor caracterizasse o resultado de seus experimentos, o endocrinologista Hans Selye fez uso do termo stress para falar da soma de todas as reações sistêmicas não específicas que surgiram nos animais estudados (ratos), após uma longa e continuada exposição a diversos estressores. Reações não específicas, porque elas eram independentes do estímulo estressor utilizado (frio, exercícios físicos intensos e etc).

(33)

É provável que Selye não imaginasse que sua descoberta iria se popularizar tanto. A partir dele surgiram outros estudos utilizando o termo estresse como vocábulo científico. Alguns estudos continuaram a falar de estresse privilegiando a sua base original, a fisiologia, o que promoveu avanços nos conhecimentos sobre a regulação endócrina promovida a partir de estímulos estressores (ANTUNES-RODRIGUES, et al., 2005; CHARMANDARI; TSIGOS; CHROUSOS, 2005; McEWEN, 2008).

Outros, a exemplo Lazarus e Folkman (1984), propuseram uma vertente cognitiva de conceber o estresse. Estes foram além, propondo uma ferramenta que investiga o modo como o indivíduo enfrenta os estressores. Ainda surgiram pesquisadores, a exemplo Marilda Lipp (2005), no Brasil, que criaram instrumentos de detecção do estresse, bem como estratégias cognitivas de preveni-lo e enfrentá-lo.

Somado a popularização do termo estresse (McEWEN, 2000), críticas surgiram em torno do emprego do mesmo na ciência (CASTIEL, 2005; FIGUEIRAS; HIPPERT, 1999; WITTER, 2003). Figueiras e Hippert (1999) salientam que não se tem muita clareza do que é estresse, já que existem muitas definições para o mesmo termo. Vários autores (FIGUEIRAS; HIPPERT, 1999; McEWEN, 2005; WITTER, 2003) chamam a atenção para o fato de se tomar os agentes estressores como sinônimo de estresse, é o que torna o termo um tanto ambíguo. McEwen (2005) também lembra que é comum o termo estresse ser utilizado para referir tanto ao estresse bom (eutresse) como ao estresse mau (distresse). E ainda, Cortez e Silva (2007) argumentam que a ansiedade costuma ser confundida com estresse, embora, lembram estes, que ela esteja presente num quadro de estresse.

Tentando evitar a desconfiança acerca da cientificidade da palavra estresse, McEwen (2000) optou por adotar dois novos termos que pudessem separar o estresse adaptativo (allostasis), que é positivo, da sobrecarga de estresse (allostact load), que gera adoecimento e até morte. Ele criou sua própria saída para firmar o fenômeno do estresse como algo que pudesse ser mencionado sem ambiguidades.

3.2 Concepções de estresse

É relevante diferenciar estressor de estresse, já que por vezes, este último é referido como sendo um estímulo, ou uma resposta desenvolvida pelo estímulo (CORTEZ; SILVA, 2007; FIGUEIRAS; HIPPERT, 1999; MARGIS, 2003). Estressor, fisiologicamente empregado, é qualquer estímulo ou evento capaz de provocar estresse (HOUAISS, VILLAR; FRANCO, 2001). Estressores (ver figura 8) podem promover uma reação biológica que tem

(34)

por finalidade adaptar o organismo aos mesmos, ou às mudanças ocasionadas por eles (McEWEN, 2008).

No presente estudo, utilizou-se a definição de estresse apontada por Marilda Lipp (2005):

Stress é uma reação do organismo com componentes psicológicos, físicos, mentais e hormonais que ocorre quando surge a necessidade de uma adaptação grande a um evento ou situação de importância. Este evento pode ter um sentido negativo ou positivo.

Essa reação não é algo instantâneo que logo acaba; diferente disso, é um processo que aciona um conjunto de respostas orgânicas e/ou comportamentais, mediadas pela ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA). Com a persistência dos estressores, ocorre um aumento da produção de glicocorticóides (GC), como o cortisol, que permite que o organismo responda ao estressor (CORTEZ; SILVA, 2007).

O uso do termo estresse é normalmente empregado de modo unívoco, sem informar em qual concepção o mesmo se apóia. Neste capítulo serão abordadas quatro concepções de estresse. A primeira é ancorada na fisiologia; a segunda, na cognição, a terceira, em ambas e a quarta é uma concepção recente do estresse. Esta última busca diferenciar com muita clareza o estresse adaptativo do estresse que leva ao adoecimento.

3.2.1 A síndrome geral da adaptação

O endocrinologista Hans Selye (1907-1982) foi o primeiro a estudar cientificamente o estresse. Como já foi brevemente citado, ele realizou experimentos com ratos na Universidade McGill, no Canadá, buscando investigar as respostas fisiológicas dos mesmos quando expostos a diversos tipos de estressores, tais comos: frio, lesão cirúrgica, choque medular espinhal, excesso de exercício muscular, ou intoxicações com doses subletais de drogas diversas (adrenalina, morfina, etc). Os resultados da sua pesquisa mostraram que tais respostas fisiológicas foram independentes da natureza do agente nocivo ou o tipo farmacológico de droga empregada (SELYE, 1936).

A partir desse estudo, Selye (1936) lança o seguinte conceito de estresse: à soma de todas as reações sistêmicas não específicas que surgem em respostas a uma longa e continuada exposição ao estressor. Selye entendeu que essa resposta parecia representar um esforço generalizado do organismo para se adaptar às novas condições. Por isso, chamou o fenômeno observado de Síndrome Geral de Adaptação (SGA).

(35)

Ele dividiu a SGA em três estágios: alarme, no qual há uma excitação do sistema nervoso autônomo e liberação de catecolaminas (adrenalina, por exemplo) pela adrenal; resistência, o qual depende ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), quando o organismo tenta adaptar-se ao estressor, com a liberação do hormônio cortisol; e exaustão, caracterizado pela baixa imunidade, levando o indivíduo ao adoecimento ou até a morte (CORTEZ; SILVA, 2007; LIPP, 2005; SARDÁ, et al., 2004).

O próprio Selye, como o nome dado ao fenômeno sugere, já reconheceu que a SGA leva a adaptação. Entretanto, como o indivíduo não pode suportar um longo período exposto ao estressor sem apresentar sequelas, ocorre a exaustão, fase negativa do estresse.

Considerando que o estresse pode levar a adaptação ou causar doenças, Selye (1975) faz uma difenciação do estresse positivo, chamado por ele de eutresse, e estresse negativo, por ele denominado, distresse. O primeiro é um nível de estresse saudável para o indivíduo, ou seja, refere-se ao estresse adaptativo, o qual leva naturalmente a homeostase. Já o segundo indica a situação em que a exigência do ambiente é maior do que os meios para enfrentá-la, o que resulta num esgotamento do indivíduo.

3.2.2 O modelo transacional do estresse

Lazarus e Folkman (1984) se utilizam de uma perspectiva cognitiva para conceber o estresse. Consideraram-no como uma transação entre o indivíduo e o ambiente. Para eles, o estresse é resultado da associação entre fatores relacionados a pessoa e os que se relacionam a situação.

Fatores como personalidade, autoestima, avaliação cognitiva, estilo individual de enfrentamento, intensidade e duração dos estressores , entre outros, irão interferir no modo como cada pessoa vivenciará a ação dos estressores. Se um evento precipitante (interno ou externo) é avaliado cognitivamente pelo indivíduo como algo que excede os seus recursos, o estresse pode ocorrer como consequência.

Por exemplo, pessoas com auto-estima elevada tendem a perceber o estresse como um desafio e não como uma ameça. Já pessoas mais ansiosas tendem a identificar mais estresse nas situações (McEWEN, 2006). Lazarus e Folkman (1984) consideram que a avaliação cognitiva sobre os estressores vai determinar a ocorrência ou não de estresse. Para eles, fatores internos também podem agir como estressores.

Nesse processo o indivíduo realiza uma avaliação primária e uma secundária. A primeira refere-se ao jugamento que o indivíduo faz da situação. Já a segunda consite numa

(36)

análise das capacidades, meios e estratégias de que o indivíduo dispõe e se utlilizará para lidar com ela. Lazarus (1993) chamou de coping as estratégias que são utilizadas pelo indivíduo para o enfrentamento de estressores, a fim de preservar a sua integridade psicológica.

3.2.3 O modelo quadrifásico do estresse

Conforme Lipp (2001), toda mudança que exija adaptação por parte do organismo causa certo nível de estresse. Para ela, estresse é uma reação do organismo, com componentes físicos e/ou psicológicos que ocorre quando a pessoa se confronta com uma situação desencadeadora de irritação, amedrontamento, excitação ou confusão, ou mesmo uma imensa felicidade (LIPP, 2003).

Lipp (2005) propôs o modelo quadrifásico do estresse, acrescentando mais uma fase às decritas por Selye, a fase de quase-exaustão. É nesta fase que o processo de adoecimento se inicia, atingindo os órgãos que possuem uma maior vulnerabilidade genética ou adquirida. Esta nova fase do estresse, proposta por Lipp fica entre a fase da resistência e a fase da exaustão.

Lipp (2006) considera o alarme como uma fase saudável, positiva do estresse, ou seja, eutressse. Nessa fase o ser humano sente-se cheio de energia devido a produção de adrenalina. Opostamente, pode ocorrer o estresse negativo ou distresse, que acontece quando a resistência aos estressores chega ao seu limite máximo. É após esse momento que o indivíduo fica mais susceptível a enfermidades, ou seja, chega à fase de exaustão.

Em cada fase do modelo quadrifáfico do estresse se pode encontrar sintomas físicos e sintomas psicológicos. O estresse físico ocorre quando os estressores atingem diretamente o organismo, por exemplo, aumento da sudorese, nó no estômago, tensão muscular, taquicardia, hipertensão, aperto da mandíbula e ranger de dentes, mãos e pés frios e náuseas. O estresse psicológico ocorre quando acontecimentos afetam o indivíduo psíquica ou emocionalmente, como por exemplo, ansiedade, angústia, insônia, dúvidas quanto a si próprio, preocupação excessiva, inabilidade de concentrar-se em outros assuntos que não o relacionado ao estressor, dificuldades de relaxar, tédio, ira e hipersensibilidade emotiva (LIPP, 2005).

Lipp (2001) classifica o conjunto de fatores contribuintes para o estresse psicológico ou emocional em internos ou externos, conforme a sua natureza. Como exemplos do primeiro, ela cita: pensamentos estressógenos, crenças irracionais, vulnerabilidades psicológicas e vulnerabilidade genética. O segundo são eventos externos, como a competição excessiva no mundo do trabalho, a pressa, a pressão diária que as pessoas sofrem e se impõem e etc.

(37)

Para mensurar o estresse, Lipp, juntamente com Guevara (1994), elaborou, no Brasil, o Inventário de Sintomas de Stress (ISS). Quase uma década depois, ela validou o Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp (ISSL), o qual difere do ISS, já que este divide o processo de estresse em três fases, enquanto aquele divide em quatro, incluindo a fase da quase exaustão (LIPP, 2005).

3.2.4 O estresse como allostasis ou allostatic load

Como já brevemente mencionado, McEwen (2000, 2005, 2006) considera que estresse é uma palavra ambígua. Para evitar tal ambiguidade, ele adotou o uso de dois termos para falar de estresse: allostasis e allostatic load.

Allostasis é um termo introduzido por Sterling e Eyer (1988) e significa literalmente

"alcance da estabilidade através da mudança.” Refere-se aos processos adaptativos que mantem a homeostase através da produção de mediadores, tais como cortisol, adrenalina e outros mensageiros químicos. Esses mediadores da resposta ao estresse promovem a adaptação no processo de estresse agudo. Em contrapartida, se a busca pela homeostase persistir por um longo período de tempo, pode ocorrer uma sobrecarga alostásica.

O termo allostatic load foi introduzido por McEwen e sua equipe de pesquisas. Eles criaram esse termo para referir-se a forma crônica da allostasis, uma sobrecarga alostásica, caracterizada pelo desgaste no corpo e no cérebro produzido por uma resposta fisiológica a fim de manter o equilíbrio biológico (McEWEN, 2008; McEWEN; WINGFIELD, 2010). Nesse caso, o estresse passa a ser negativo, prejudicando o bom funcionamento orgânico, como por exemplo, diminuindo significativamente as funções sensoriais e perceptivas (SARDÁ JÚNIOR; LEGAL; JABLONSKI JÚNIOR, 2004).

Lipp (2005) parece concordar primeiro com Selye (1975), quando ela também emprega a designação de estresse positivo e negativo, cunhada por ele, e com McEwen, já que, ainda que ele não adote tais termos, a noção de positivo na sua fase inicial, portanto adaptativo, remete a allostasis e a noção de negativo (estresse prejudicial se persistir por um tempo maior do que a capacidade de enfrentamento do organismo) remete a allostatc load.

3.3 Resposta aos estressores

A resposta fisiológica aos estressores é mediada pelo sistema nervoso autônomo (SNA) e pela ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), bem como a consequênte

(38)

produção de glicocorticóides e catecolaminas (figura 8) (CORTEZ; SILVA, 2007; 2008; CHROUSOS, 2009; KLOET; JOËLS; HOLSBOER, 2005; McEWEN, 2008; TSIGOS; CHROUSOS, 2002).

FIGURA 8 – Eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA).

Fonte: Adaptado de Guizzo (2011).

O cérebro é um alvo do estresse, já que sofre mudanças químicas e estruturais em resposta a estressores agudos e crônicos. O hipotálamo, região do encéfalo que desempenha um importante papel na integração entre os sistemas nervoso, endócrino e imunológico, controla a liberação do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) pela hipófise através do fator liberador de corticotropina (CRF) (CORTEZ; SILVA, 2007; 2008; HERMAN et al., 2012).

A presença do ACTH na corrente sanguínea atua no córtex da glândula adrenal, localizada acima do rim. Esta atuação consiste na liberação de glicocorticóides, que em humanos é 95% de cortisol. Este, por sua vez, entre várias ações no organismo, atua no metabolismo dos carboidratos, disponibilizando grande quantidade de glicose (50 %, ou mais, acima do normal) no plasma sanguíneo, sendo um hormônio muito relevante durante o jejum prolongado; reduz as proteínas celulares, o que pode deixar os músculos mais fracos; mobiliza ácidos graxos (lipídios) para o plasma, aumentando a sua concentração sanguínea; atua no combate a inflamações e reações alérgicas; e reduz a produção de anticorpos, impactando

PRODUÇÃO DE CATECOLAMINAS

PRODUÇÃO DE GLICOCORTICÓIDES

(39)

diretamente a imunidade (GONZÁLEZ; ESCOBAR, 2006; GUYTON; HALL, 2006; McEWEN, 2008; TSIGOS; CHROUSOS, 2002).

A estimulação provocada por estressores tanto físicos, como mentais, atua no eixo HHA, fazendo com que a secreção de cortisol se eleve 20 vezes do seu nível basal. O ritmo circadiano do cortisol, em condições normais, apresenta taxas altas no início da manhã e vai diminuindo a noite, mais expressivamente horas depois do adormecer (CHROUSOS, 2009; GUYTON; HALL, 2006; HERMAN et al., 2012;TSIGOS; CHROUSOS, 2002).

É relevante esclarecer que o estresse não é uma doença. A função do estresse consiste em promover a resistência do organismo aos estressores. Entretanto, o excesso do estágio de resistência diminui a resposta imunológica, o que torna o indivíduo vulnerável a várias doenças (figura 9) (GONZÁLEZ; ESCOBAR, 2006).

FIGURA 9: Estágios do estresse

Destaque para o estado de estresse no estágio de resistência. Fonte: produzido especificamente para este trabalho.

Evidências crescentes demonstram que o estresse crônico pode contribuir para doenças somáticas, como: autoimune, gastrointestinal, cardiovascular e etc., as quais têm sido exaustivamente exploradas (ver revisão de PURDY, 2013).

Stojanovich (2010), num estudo de revisão, destacou que o estresse psicológico tem sido sugerido como fator precedente da doença autoimune, uma vez que numerosas estudos em animais e humanos demonstraram o efeito de estresse sobre a função imunológica. Além disso, o estresse crônico pode intensificar a inflamação e aumentar o risco de

(40)

desenvolvimento de infecções e outras doenças inflamatórias (SHOENFELD, 2008; TSATSOULIS, 2006).

Há muitas evidências experimentais e clínicas, de acordo com Tachéet al., (2001), de

que o estresse influencia a motilidade gastrointestinal. Um exemplo consistente de alterações motoras gastrintestinais induzidas por vários fatores de estresse agudo é o de retardar o esvaziamento gástrico. Além disso, a presença elevada de cortisol na corrente sanguínea, devido à ativação do eixo HHA, parece está ligada ao aumento da gordura abdominal (DAUBENMIER et al., 2011; LEVY et al., 2006).

Ainda, conforme revisão realizada por Houpe (2013), o estresse psicossocial é um importante fator de risco e prognóstico para doenças cardiovasculares.Känel (2012) classifica os fatores de riscos da doença cardiovascular em três domínios, os quais podem ganhar o status de estressores psicossociais se a pessoa percebe uma quantidade de ameaça e desafio que ele ou ela avalia sobrecarregar os recursos de enfrentamento: (1) o ambiente social, (2) os traços de personalidade e (3) afetos negativo. O primeiro engloba fatores como baixo nível sócio-econômico, experiências adversas na infância, estresse familiar e no trabalho e baixo apoio social. O segundo está ligado à personalidade tipo D (ver DENOLLET; SCHIFFER; SPEK, 2010) e o último refere-se à depressão, ansiedade, desespero e perdas.

Loures et al. (2002) chamou a atenção de que “o estresse mental pode agir como causador de doenças cardiovasculares de forma crônica e aguda” (p. 529). Outros pesquisadores como: Nóbrega, Castro e Souza (2007), Fonseca et al. (2009), entre outros estudos, tem mostrado que o estresse mental crônico é um importante fator na gênese da hipertensão arterial.

Não é foco do presente trabalho aprofundar sobre as doenças causadas e/ou influenciadas pelo estresse. Por isso, as considerações feitas acima são utilizadas para uma visão geral e convidativa para interessados aprofundarem, valendo-se das revisões acima, as quais abordam tanto a forma aguda como crônica do estresse.

3.4 O estresse crônico

O cérebro é um alvo do estresse, já que sofre mudanças químicas e estruturais em resposta a estressores agudos e crônicos (McEWEN, 2008). O estresse agudo cessa logo após o afastamento do agente estressor. Já o estresse crônico “refere-se a um estado de tensão prolongado que pode levar ao desenvolvimento de várias doenças e prejuízos para a qualidade de vida do ser humano” (LIPP, 2006, p. 83).

(41)

O estresse crônico pode ser o disparador de inúmeras doenças geneticamente programadas, as quais permaneceriam latentes na ausência do estresse, e de doenças oportunistas que se aproveitam da queda da imunidade para instalar-se no organismo. Essas

doenças podem ser tanto físicas como psicológicas (BRADLEY; DINAN, 2010; LIPP, 2006)

.

A exposição ao estresse pode precipitar ou agravar muitas doenças mentais, como o Transtorno Depressivo Maior, o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) e a Esquizofrenia (BRADLEY; DINAN, 2010; CORCORAN et al., 2003; CORTEZ; SILVA, 2007; McEWEN, 2007; LISTON; McEWEN; CASEY, 2009). Por exemplo, uma extensa revisão da literatura, realizada por Bradley e Dinan (2010), relaciona estresse crônico e a Esquizofrenia.

Eles citam que pessoas com Esquizofrenia experienciam períodos de elevadas secreções de cortisol. Isso regularmente acontece no primeiro episódio da doença, sendo verificado também em alguns pacientes crônicos com mais estabilidade clínica. O uso de medicação e o tipo de sintoma podem interferir no nível de cortisol do paciente.

Conforme Lipp (2006, p. 83), “o ser humano, cronicamente estressado, apresenta cansaço mental, dificuldade de concentração, perda de memória imediata, apatia e indiferença emocional”, o que compromete as relações do sujeito com o mundo.

Três fatores podem contribuir para o estresse crônico evoluir para estágios prejudiciais como quase-exaustão e exaustão, quais sejam: (1) permanência de um estressor na história de vida de uma pessoa, (2) acúmulo de estressores e (3) estresse recorrente.

Um exemplo de categoria profissional que é acometida por estresse crônico são os professores. Diversos estudos apontam que professores sofrem de estresse crônico. Entretanto, os estressores parecem atingir diferentemente homens e mulheres, visto que mulheres, conforme resultados de pesquisas, apresentam maior número de sintomas de estresse (CALAIS; ANDRADE; LIPP, 2003; GOULART JÚNIOR ; LIPP, 2008; MARTINS, 2007). Para exemplificar, conforme pesquisa realizada na Alemanha, o estresse crônico e a exaustão estão associados com maior carga alostática nos professores do sexo feminino, tendo em vista que a profissão docente pode gerar um potencial elevado de estresse (BELLINGRATH; WEIGT; KUDIELKA, 2009).

Estudos realizados no Brasil também confirmam a prevalência de estresse em professoras, com percentuais que passam dos 50% de cada amostra investigada. Pesquisas utilizando o Inventário de Sintomas de Stress para adultos de Lipp (ISSL), demonstram que

(42)

há predominância de sintomas psicólogicos e de stress na fase da resistência (ALBUQUERQUE et al., 2010; GOULART JÚNIOR ; LIPP, 2008; MARTINS, 2007).

A fase de resistência, de acordo com Lipp, é caracterizada pela persistência dos estressores (SADIR; BIGNOTTO; LIPP, 2010). Conforme Goulart Júnior e Lipp (2008, p. 848):

A fase de resistência ocorre quando, sendo o estressor de longa duração ou de grande intensidade, o organismo tenta restabelecer o equilíbrio interno de um modo reparador. O organismo se utiliza das reservas de energia adaptativa, na tentativa de se reequilibrar. Se a reserva de energia adaptativa for suficiente, a pessoa se recupera e sai do processo de estresse. Se, por outro lado, o estressor exige mais esforço de adaptação do que é possível para aquele indivíduo, então o organismo se enfraquece e torna-se vulnerável a doenças.

É possível verificar muita semelhança no que se chama fase de resistência e estresse crônico. De acordo com Lipp (2006, p. 83), o estresse crônico, como já colocado, é um “estado de tensão prolongado que pode levar ao desenvolvimento de várias doenças”. Comparando e relacionando os conceitos de fase de resistência e estresse crônico, infere-se que a fase de resistência pode servir como parâmetro para identificar o estresse crônico num indivíduo. Por isso, no presente estudo, os indivíduos identificados na fase de resistência serão considerados sujeitos em condição de estresse crônico.

Referências

Documentos relacionados

Os resultados desta análise podem vir a serem usados como base para que se crie uma estratégia padrão de análise de sistemas de medição entre fornecedor e cliente a ser feita

Resultados: Os parâmetros LMS permitiram que se fizesse uma análise bastante detalhada a respeito da distribuição da gordura subcutânea e permitiu a construção de

Essas informações são de caráter cadastral (técnico responsável pela equipe, logradouro, etc.), posicionamento da árvore (local na rua, dimensões da gola, distância da

Outro ponto importante referente à inserção dos jovens no mercado de trabalho é a possibilidade de conciliar estudo e trabalho. Os dados demonstram as

Comparative alignment (Clustal X) of deduced amino acid sequences for Eucalyptus expressed sequence tag clusters (EG) and others 14-3-3 proteins sequences from GenBank NCBI

Effects on body mass, visceral fat, blood glucose and hepatic steatosis were assessed in clinical use and by measuring the triglyceride, cholesterol and hepatic glycogen in

Este trabalho se justifica pelo fato de possíveis aportes de mercúrio oriundos desses materiais particulados utilizados no tratamento de água, resultando no lodo