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O DILEMA DO BONDE À LUZ DA PSICOLOGIA ECONÔMICA THE TROLLEY DILEMMA IN THE LIGHT OF ECONOMIC PSYCHOLOGY

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1 O DILEMA DO BONDE À LUZ DA PSICOLOGIA ECONÔMICA

THE TROLLEY DILEMMA IN THE LIGHT OF ECONOMIC PSYCHOLOGY

João Candido Pereira de Castro Neto1

Denise Ferreira2

RESUMO

O artigo pretende analisar o Dilema do Bonde, caso clássico de estudos de Filosofia, Psicologia, Direito e Ética, sob a ótica da Economia, mais especificamente da Psicologia Econômica, ramo que observa o processo de escolha racional e tomada de decisões econômicas sob a influência de condicionantes psicológicos.

Palavras-Chave: dilema do bonde, escolha racional, tomada de decisão, psicologia econômica, economia

comportamental.

ABSTRACT

The paper intends to analyze the Trolley Dilemma, a classic studies case in Philosophy, Psychology, Ethics and Law, from the perspective of Economy, more specifically of Economic Psychology, branch who observes the process of rational choice and economic decision-making under the influence of psychological factors.

Key Words: trolley dilemma, rational choice, decision making, economic psychology,

behavioral economics.

1 Economista, Especialista em Engenharia Econômica, Mestre em Administração e Gestão Financeira, Doutorando em Administração, Professor. jcandido@fesppr.edu.br

2 Psicóloga Clínica, Pedagoga, Especialista em Educação, Especialista em Psicodrama, Mestre em Administração e Gestão de Recursos Humanos, Professora em Cursos de Graduação e Pós-Graduação. denise@fesppr.edu.br

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2 1 INTRODUÇÃO

O Dilema do Bonde é um problema ético clássico criado pelo biólogo e antropólogo Marc Hause (PERUZZO, 2013) e proposto inicialmente pela filósofa britânica Philippa Foot (FOOT, 1967), com o objetivo de avaliar o comportamento de indivíduos diante de situações emocionalmente conflitantes. Na forma apresentada na página eletrônica do dilema produzida por Josh Dean (DEAN, s/d), este consiste de uma série de cenários hipotéticos em um ambiente extremo que testam o comportamento ético do objeto de estudo. A página menciona, também, que o problema foi expandido e validado pela filósofa americana Judith Jarvis Thomson (THOMSON, 1985) e é nesse formato que a página o apresenta: a descrição do cenário seguida de uma questão de múltipla escolha, com cada escolha relacionada a um dos cinco paradigmas éticos: utilitarismo, deontologia, teoria do comando divino, relativismo ético e ética da virtude. A página (em inglês) permite a escolha de uma das alternativas, a partir da qual é acessada a página do paradigma correspondente com a sua descrição e significado em relação à comunicação ética.

Resumidamente, na forma tradicional, o problema trata da tomada de decisão ante o conflito ético na forma de um bonde desgovernado que se dirige a um grupo de cinco trabalhadores imobilizados nos trilhos, e o objeto do teste tem a opção de desviar, por meio do acionamento de uma alavanca que os desloca em direção a outra pessoa. Não havendo opções intermediárias, o conflito ético consiste em permitir a morte de cinco pessoas por omissão, ou provocar a morte de uma pessoa por intenção.

A visão utilitária estabelece a obrigatoriedade de dirigir o bonde à vítima solitária como única opção admissível e moralmente defensável, trocando a maior “utilidade” de cinco vidas pela “utilidade” de uma. Outro ponto de vista estabelece que, diante da existência prévia dos prejuízos morais na situação, a ação de desviar o bonde implica a participação do agente no prejuízo moral e, dessa forma, a sua responsabilidade pela morte que não ocorreria no caso de omissão. Uma posição contrária à da ação também pode argumentar sobre a impossibilidade de se estabelecer critérios quantitativos sobre almas humanas e, portanto, à subjetividade da escolha utilitária do “mal menor” com base nessa quantificação. De outro lado, interpretações da

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3 obrigação moral podem estabelecer tal obrigação a partir da simples presença na situação, sendo a possibilidade de agir determinante da obrigação de fazê-lo e a omissão um ato imoral, já que, supostamente, cinco vidas valem mais do que uma.

Na revisão de Thomson, o problema é apresentado na forma de uma multidão que exige de um juiz que entregue a ela o suposto culpado de um crime, diante da ameaça de dirigir sua vingança a um determinado setor da população. Ante a ausência de prova, o juiz é confrontado com o dilema ético de agir e entregar à multidão um possível inocente, ou omitir-se e permitir que a multidão exerça sua vingança sobre um grupo social.

Peruzzo (2013) propõe duas variações do dilema: a versão original, na qual o sujeito não age diretamente na morte de um semelhante, fazendo-o por obra de um objeto intermediário que assume a forma da alavanca de direção do bonde que, acionada, desvia o bonde da direção ao grupo para a direção ao indivíduo. Na segunda variação, o sujeito está em uma ponte e age diretamente, empurrando um homem obeso para a morte certa nos trilhos com o objetivo de frear o bonde e, assim, salvar o grupo de cinco trabalhadores.

O dilema do bonde tem, recentemente, transposto as fronteiras da filosofia tradicional, sendo recentemente analisado sob a ótica da ciência cognitiva e da neuroética.

2 A TOMADA DE DECISÃO

A tomada de decisão, ou processo de decidir, ato humano por essência, fundamenta-se nas ações de perceber e avaliar e nas etapas de captar informações sobre o ambiente, analisá-las, ponderá-las, pensar e agir para criar ou transformar. Um processo que, aparentemente, fundamenta-se no pensamento, portanto na razão, mas que deixa assim de considerar os condicionantes culturais e emocionais de quem decide. Tal descrição apoia-se, também, na abstração da temporalidade, e, assim, da influência de resultados futuros e, logo, incertos, sobre o processo decisório.

Como resultado, estudos recentes sobre o processo de tomada da decisão, enfatizam mais as expectativas de quem decide (visão de futuro) do que a análise racional fundamentada em paradigmas experimentais do passado. Aplicados ao Dilema do Bonde, tais conceitos direcionam a decisão

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4 mais para o aspecto sociocultural das consequências da decisão do que para seus fundamentos racionais. Os entornos cultural, moral e econômico seriam condicionantes mais poderosos que a quantificação racional. Infelizmente, ou felizmente, não se pode agregar resultados experimentais à experiência em ambiente tão extremo.

Resta, portanto, a oportunidade de avaliar o dilema à luz da teoria psicológica subjacente. Como a tomada de decisão é um processo profundamente estudado pela Economia, as ciências fundem-se para estudar o fenômeno, dando origem aos novos ramos da Psicologia Econômica e da Economia Comportamental.

3 A ESCOLHA INTERTEMPORAL

Tema da Ciência Econômica clássica, a Escolha Intertemporal tem sido analisada, também, pela Psicologia Econômica e descreve o processo de tomada de decisão em que a variável tempo exerce forte influência. São situações nas quais uma variação na distância temporal entre causa e efeito pode modificar o resultado da decisão. Os modernos estudos sobre a Escolha Intertemporal desenvolvidos por Gianetti (2005) tratam da sua aplicação sobre decisões de compra a prazo e desenvolvem os conceitos de subestimação do presente e subestimação do futuro como distorções da racionalidade do processo decisório.

No nosso caso específico, o conceito de subestimação do presente é representado pelos atos (presentes) de puxar a alavanca ou de empurrar o homem gordo como fatos menores do que salvar da morte cinco pessoas (futuro).

De modo contrário, a subestimação do futuro pode ser representada nas duas variações, em que a preservação das vidas pela omissão assume um valor maior que as mortes (futuras) das outras pessoas.

No exemplo, a diferença das situações é em muito atenuada pela pequena intertemporalidade entre causa e efeito, impossibilitando a aplicação do conceito daí decorrente do desconto hiperbólico subjetivo proposto por Ainslie (2005), segundo o qual os eventos futuros perderiam sua importância de forma mais acelerada que o avanço intertemporal, descrevendo, assim, uma hipérbole em comparação com a linearidade do avanço do tempo.

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5 Na visão de O’Donoghue e Rabin (2000), o desconto hiperbólico subjetivo assume a forma da troca de gratificação imediata por gratificação postergada aplicáveis a situações de autocontrole como adição a drogas, teoria do incentivo e escolha do consumidor, e marketing. Aplicados ao caso em estudo, explicam a escolha da gratificação presente, de salvar ou poupar uma vida, como mais valiosa que a gratificação futura de salvar outras.

Outro conceito interessante é o da contabilidade mental distorcida desenvolvido por Richard Thaler (SCHAFIR; THALER, 2006), em que afirma que os cálculos mentais feitos pelas pessoas acerca de valor e temporalidade divergem dos conceitos da contabilidade formal, servindo como atenuantes da culpa por uma decisão de custo elevado, o que foi observado em colecionadores de vinhos caros que diluíam o custo da aquisição presente de um vinho particularmente caro pelos anos de vida restantes diante da raridade do evento.

No caso em questão, a recompensa ao ato de poupar a vida (presente) assume um valor significativamente maior que as consequências futuras da perda das demais vidas.

4 O NOBEL DE ECONOMIA EM 2002

Os fundamentos da moderna Psicologia Econômica foram estabelecidos por Daniel Kahnemann e Amos Tversky, em diversos trabalhos sobre a aplicação da Psicologia no campo da Economia, especialmente sobre vieses cognitivos e heurísticas de avaliação (TVERSKY & KAHNEMANN, 1974), que acabaram por render ao psicólogo Kahnemann o Prêmio Nobel de Economia de 2002 (Tversky morreu antes de ser indicado).

Tversky e Kahnemann (1974) sustentam que as pessoas fundamentam suas decisões em um número limitado de princípios heurísticos (ou “regras de bolso”) que, ao simplificar o processo de análise das probabilidades e previsão de resultados, agregam distorções sistemáticas e comuns, ou vieses aos processos de percepção e avaliação independentes de fatores motivacionais ou de punições e recompensas.

Citam como heurísticos indutores de vieses a representatividade, a disponibilidade e o ajustamento por ancoragem.

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6 A representatividade corresponde ao grau de semelhança entre a consequência e a causa. Quanto mais a consequência for representativa da causa, maior a probabilidade aparente de que a consequência esteja relacionada àquela causa. Citam o exemplo do sujeito tímido, reservado, fraco e meticuloso e a probabilidade de que este pertença a uma das seguintes ocupações: vendedor, fazendeiro, bibliotecário, médico ou vendedor. A resposta mais frequente foi “bibliotecário”, embora não haja nenhum fato estatístico que possa fundamentar tal decisão. A escolha baseou-se na representatividade do estereótipo do bibliotecário no imaginário coletivo.

A disponibilidade corresponde à frequência com que determinadas ideias, situações ou lembranças acorrem e substituem a noção da frequência real de certo fenômeno. Por exemplo, a impressão dos níveis de insegurança de uma população ou área pode decorrer mais do número de pessoas conhecidas vítimas de algum tipo de violência do que do número efetivo de ocorrências.

A ancoragem corresponde ao ponto de partida para análise de um problema sugerido por sua formulação ou obtido de uma avaliação parcial que provoca o ajustamento do resultado às estimativas feitas a partir desse valor. O Professor Marcelo Peruzzo exemplifica esse processo com um experimento em sala de aula, em que pergunta à classe qual a causa da falência da fábrica de brinquedos Estrela, após mostrar à turma imagens de brinquedos e logomarcas antiquados da empresa, remontando à época da infância dos alunos. Surgiram várias explicações para a falência da empresa que, afinal, vai muito bem no mercado internacional da produção de brinquedos eletrônicos!

Ajustadas ao exemplo analisado, tais heurísticas poderiam interferir na análise e na decisão introduzindo vieses a partir de experiências anteriores como a avaliação quantitativa de vidas ou a sua negação por vieses morais, culturais ou ideológicos, induzindo à preferência por sacrificar o passageiro por ser gordo ou a poupar os cinco operários por fazerem parte de uma classe desfavorecida.

5 A TEORIA DO PROSPECTO

A realização mais conhecida de Kahnemann e Tverski, a Teoria do Prospecto, contradiz a Teoria da Utilidade Esperada, um dos fundamentos da

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7 Economia Tradicional, que propõe um modelo normativo para a tomada de decisões que explicaria as decisões normalmente racionais das pessoas, fundamentadas na aversão ao risco e na avaliação exclusiva das consequências finais de suas decisões. Ao desconsiderar os efeitos de ganhos e perdas intermediários, e apostar na permanente consistência racional das escolhas, a Economia Tradicional deixa de explicar as consequências das tomadas de decisão enviesadas e dos efeitos condicionantes das heurísticas de avaliação, como o conceito de framing, ou seja, o condicionamento da decisão pelo “enquadramento” das informações necessárias à avaliação do problema, novamente exemplificado pelo caso da Brinquedos Estrela.

Outro fundamento clássico confrontado pela dupla de psicólogos foi o da linearidade da função risco, quando demonstraram que a aversão ao risco é maior em situações de ganho que em situações de perda, o que explica a propensão em apostar alto dos jogadores que estão perdendo em um cassino.

A teoria do prospecto aplicada ao Dilema do Bonde explicaria a decisão de preservar a vida do passageiro pela maior aversão ao risco da perda da vida do passageiro do que ao risco de ganho das outras cinco vidas.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Neuromarketing ajusta-se bem às teorias da Psicologia Econômica, uma vez que confia mais nas decisões do cliente fundamentadas nas emoções e nas intuições do que na racionalidade. Efetivamente, a influência das heurísticas simplificadoras da realidade e dos vieses de avaliação subvertem a racionalidade às distorções de percepção do consciente e nos entregam ao predomínio das avaliações emocionais e instintivas.

REFERÊNCIAS

AINSLIE, George. Emotion as a motivated behaviour. Disponível em: (http://www.picoeconomics.com). Acesso: 30/05/2014.

DEAN, Josh. The Trolley Dilemma. Disponível em: (http://www.trolleydilemma.com/). Acesso: 02/04/2014

FOOT, Philippa. The problem of abortion and the doctrine of the double effect. In Virtues and Vices and Other Essays in Moral Philosophy. Berkeley and Los Angeles: University of California Press, 1978.

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8 GIANETTI, Eduardo. O valor do amanhã: ensaio sobre a natureza dos juros. São Paulo, Companhia das Letras, 2005.

O’DONOGHUE, Ted; RABIN, Matthew. The economics of immediate gratification. Journal of behavioral decision making. v.13, n.2, p. 233-250, 2000.

PERUZZO, Marcelo. As três mentes do neuromarketing. Curitiba: IP2 Marketing de resultado, 2013.

SCHAFIR, Eldar; TALLER, Richard. Invest now, drink later, spend never: on the mental accounting of delayed consumption. Journal of economic psychology. v.27, n.5, p.694-712, 2006.

THOMSON, Judith J. The trolley problem. The Yale Law Journal, ISSN 0044-0094, 05/1985, Volume 94, Issue 6, pp. 1395 – 1415. Disponível em: (http://library.du.edu). Acesso: 02/04/2014.

TVERSKY; Amos; KAHNEMANN, Daniel. Judgement under uncertainity: heuristics and biases. Science. n. 185, p.1224-1131, 1974.

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