• Nenhum resultado encontrado

Um corporativismo americano : grievances e negociação coletiva nas ferrovias dos Estados Unidos, 1898-1950  

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Um corporativismo americano : grievances e negociação coletiva nas ferrovias dos Estados Unidos, 1898-1950  "

Copied!
325
0
0

Texto

(1)

PEDRO MAYER BORTOTO

UM CORPORATIVISMO AMERICANO: GRIEVANCES E NEGOCIAÇÃO COLETIVA NAS FERROVIAS DOS ESTADOS UNIDOS, 1898-1950

CAMPINAS 2019

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

(2)

ESTE TRABALHO CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA

PELO ALUNO PEDRO MAYER

BORTOTO E ORIENTADA PELO PROF. DR. FERNANDO TEIXEIRA DA SILVA

PEDRO MAYER BORTOTO

UM CORPORATIVISMO AMERICANO: GRIEVANCES E NEGOCIAÇÃO COLETIVA NAS FERROVIAS DOS ESTADOS UNIDOS, 1898-1950

Orientador: Prof. Dr. Fernando Teixeira da Silva

CAMPINAS 2019

Tese apresentada ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutor em História, na Área de História Social.

(3)
(4)

A Comissão Julgadora dos trabalhos de Defesa da Tese de Doutora, composta pelos Professores Doutores a seguir descritos, em sessão pública realizada em 26 de março de 2019, considerou o candidato Pedro Mayer Bortoto aprovado.

Prof. Dr. Fernando Teixeira da Silva

Prof. Dr. Robert Sean Purdy

Prof. Dr. Flavio Limoncic

Profa. Dra. Larissa Rosa Corrêa

Prof. Dr. Samuel Fernando de Souza

A Ata de Defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertações/Teses e na Secretaria do Programa de Pós-Graduação em História do Instituto de Filosofia e Ciência Humanas.

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

(5)

Agradecimentos

Apesar de a autoria desta tese estar sob o meu nome, toda pesquisa e escrita é um processo coletivo em que o autor, por meio de trocas, conversas, sugestões, leituras e apoio no dia-a-dia, vai aos poucos dando forma e conteúdo às ideias que surgem do trabalho com as fontes e a literatura. Agora é o momento para reconhecer o trabalho e a companhia daqueles que não aparecem como autor.

Essa tese deve muito a meu orientador, professor Fernando Teixeira da Silva, cujo rigor me incentivou a desenvolver uma pesquisa de qualidade desde a elaboração do projeto de pesquisa. Sem suas leituras marcadas por numerosas canetadas e caneladas, esse trabalho não seria o que se tornou: uma tese coerente, com começo, meio e fim. Durante os primeiros anos do doutorado, os colegas e professores do programa de pós-graduação em História Social foram boas fontes de conversas e discussões que me auxiliaram a pensar melhor nas fases iniciais da pesquisa. Agradeço especialmente aos almoços no “bandejão vegetariano” com Rachael Pasierowska e às conversas às 8:30 da manhã com Andrej Slivnik. Israel Ozanam participou em momento pontuais dessa trajetória com enriquecedoras conversas sobre o método historiográfico.

Ainda no começo do doutorado, recebi apoio dos colegas e da chefia do CEDEM-UNESP, cuja ajuda e flexibilidade foram essenciais para realizar as primeiras atividades da pesquisa. Os professores Antonio Celso Ferreira e Sonia Trotiño deram condições para que eu pudesse participar das atividades do programa de pós-graduação, e Rose Franclin, Mario Santos, Luiz Carlos Barreiros e outros tantos que trabalham e trabalharam na Praça da Sé descontraíam o arquivo e tornavam a rotina de trabalho e estudos mais fácil. Agradecimento especial à copeira Luciana, que, enquanto trabalhei na UNESP, sempre fez questão de me servir o café mais forte o possível depois do almoço.

A fase inicial da pesquisa também foi privilegiada pela convivência com Olga Futemma, Paulo Fontes, Hélio Costa e Priscila Xavier. Ao trabalhar no projeto do Museu do Trabalho e dos Trabalhadores, a convivência com esse grupo permitiu-me aprimorar minha competência e habilidade como historiador ao tentar traduzir para um público leigo a complexa e rica historiografia do trabalho brasileira.

A partir do segundo ano do doutorado, consegui me dedicar plenamente à pesquisa por conta de duas bolsas concedidas pelas Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). A bolsa de Doutorado no país de número 2014/22523-8 —

(6)

vinculada ao projeto temático “Entre a escravidão e o fardo da liberdade: os trabalhadores e as formas de exploração do trabalho em perspectiva histórica”, processo de número 2013/21979-5 — e a Bolsa Estágio de Pesquisa no Exterior (BEPE) de número 2012013/21979-5/11144-9 foram determinantes para a condução das primeiras análises e da pesquisa de arquivos nos Estados Unidos. Agradeço à FAPESP pelas bolsas concedidas a mim.

Durante a segunda metade de 2015, tive a oportunidade de participar em alguns eventos internacionais em que conheci vários colegas que foram ótimas fontes de discussões e excelentes companhias de viagem. Com Agata Zysiak, Edward Brudney, Alina-Sandra Cucu, Georg Schinko, Mareen Heynig e Jörg Nowak explorei as ruas de Seul e/ou Delhi. Agata, George e Alina se tornaram correspondentes e foram presenças, mesmo que virtuais, em momentos importantes do doutorado. Em Toronto, passei uma tarde bastante agradável com Frank Luce que, por sua vez, me introduziu ao professor Paul Craven que fez-me avaliar a proposta inicial de trabalho com questionamentos cirúrgicos.

A pesquisa me levou a Chicago, onde fui extremamente bem recebido por Leon Fink e Sue Levine. Eles permitiram a esse desabrigado ocupar o quarto de hóspedes de sua casa por duas semanas. Leon também foi companhia inestimável durante a minha estadia, em que conversas sobre a pesquisa se tornavam boas conversas na University of Illinois at Chicago, cafés e restaurantes. Quando encontrei um apartamento, Bruce Calder gentilmente me emprestou móveis e me auxiliou na mudança. Alguns meses depois de chegar à Windy City, Felipe Souza foi parceiro imprescindível nos primeiros seis meses de inverno e primavera estadunidenses. Nesse mesmo período, tive a sorte de contar com a amizade de Adriano Januário que, mesmo do Brasil, fez companhia a esse solitário pesquisador durante o quente verão de Chicago. Outro amigo à distância foi Marcelo Mac Cord, cuja serenidade trouxe um pouco de paz nas fases mais conturbadas do doutorado.

A pesquisa não teria sido feita sem o auxílio dos funcionários da Newberry Library, Chicago History Museum, e da biblioteca da University of Illinois at Chicago, além da equipe do Kheel Center da Universidade de Cornell. Quando em Ithaca, tive a oportunidade de trocar umas ideias com o gentil professor Larry Glickman, que se mostrou bastante interessado no meu trabalho e fez questionamentos pertinentes a pesquisa. Nos últimos seis meses de escrita, os funcionários da Chicaco Public Library, em especial a unidade de Logan Square, disponibilizaram os livros necessários para completar a tese. A

(7)

atenção de todas essas pessoas aparece nas numerosas notas de rodapé, resultado de um trabalho de pesquisa facilitado pela dedicação dessas equipes.

Ainda em Chicago, tive a incrível oportunidade de conhecer e conviver com os membros da L’Arche Chicago, uma comunidade em que pessoas com e sem deficiência vivem sob o mesmo teto com o objetivo de estabelecer as bases para uma sociedade mais igualitária. Nos últimos meses de 2016, convivi com Chrsitianne Msall, Anders Gullberg, Dana Wax, Annie Shaver e outros membros da Angel House e senti-me acolhido como se fosse membro da casa. Com o incentivo de Luca Badetti e Mic Altena, diretores da organização, resolvi participar dessa comunidade por um ano. Eu tive o privilégio de viver na Friendship House com Tim Stone, Elbert Lott, Chris Abri, Evangeline Smith, Ryan Weseloh e Kendall Batten-Kalantzis, com quem compartilhei as durezas e as dificuldades da vida de um doutorando enquanto cozinhava, ouvia música ou simplesmente desfrutava a companhia dessas pessoas.

Antes do início da minha vida americana, os professores Michael Hall e Sean Purdy leram e comentaram os primeiros rascunhos dos capítulos que se seguem durante meu exame de qualificação. As sugestões e críticas foram valiosas para reorientar o trabalho de escrita realizado ao longo dos anos seguintes. Antes de começar a morar em L’Arche, Sarah Lineberry e Coral Opem permitiram que eu ocupasse um dos quartos de seu apartamento e dividisse e casa com elas até que meu quarto na Friendship House estivesse disponível. A fase final da escrita foi beneficiada pelo apoio da Marz Community Brewing Co., em especial Logan Bay e Dave Price, que foram flexíveis diante das demandas que a elaboração da tese impôs sobre mim. Os últimos meses do trabalho também contou com a amizade de Jon Maunder e Nick Kuntzman nos momentos de descontração e desabafo.

Ao longo desse processo, porém, algumas constantes estiveram presentes. Meus pais, José Benedito Bortoto e Brigitte Bortoto, e meu irmão Ivan sempre apoiaram minhas escolhas, especialmente nos momentos mais difíceis que levaram a conclusão dessa tese. Além disso, eu tive a sorte de ser acolhido por minha nova família americana em meio à composição desta tese. Meghan Gindt, Connor Gindt, Cate Cook, Peter Cook, Susanne Davis, Adam Davis, Charlie Davis, Nick Brady, Colin Cook e Pete Cook criaram uma nova casa para mim. O convívio com eles me lembrou de que eu não estava sozinho.

Por fim, esta tese não teria sido concluída sem o apoio de Lizzy Bortoto. Ao entrar na minha vida enquanto o trabalho do doutorado estava em pleno vapor, Lizzy soube

(8)

navegar as dificuldades e o desafios de estar em um relacionamento com um doutorando estrangeiro com gentileza, graça e carinho inestimáveis. Em quase dois anos cheios de reviravoltas e surpresas, eu tive a sorte de contar com uma presença que trouxe a estabilidade e o incentivo necessários para a condução da escrita. Sem ela, as agruras da escrita seriam mais duras e as alegrias das etapas concluídas menos intensas. I couldn’t have asked for a better partner.

(9)

Resumo

A presente tese analisa a história da negociação coletiva na indústria ferroviária dos Estados Unidos em seu período formativo e de consolidação, desde finais do século XIX até meados do século XX. Para acompanhar esse processo, o estabelecimento e o desenvolvimento de políticas de grievances — reclamações de trabalhadores que surgiam da rotina de trabalho e da aplicação de acordos coletivos — serão o fio condutor da análise. Por meio desse enquadramento, apresentarei um longo processo de desenvolvimento de um possível e nunca finalizado corporativismo nas relações trabalhistas da indústria, isto é, um conjunto claro de regras processuais para resolução de reclamações e precedentes de decisões de reclamações. Iniciado com as greves do último quartel do século XIX, o Estado estadunidense, os sindicatos ferroviários e as companhias passaram a desenvolver mecanismos de negociação coletiva, em nível nacional e nos locais de trabalho, que formariam a base do sistema de relações trabalhistas consolidado ao longo do século XX. A década de 1920 seria palco da consolidação de mecanismos de privados de resolução de grievances, criados por meio da organização sindical dos trabalhadores ou pela imposição patronal de company unions, estabelecendo uma cultura de negociação de reclamações na indústria. Quando do New Deal de Franklin Delano Roosevelt, o sistema de resolução de grievances construído no período anterior foi colocado sob a tutela da National Railroad Adjustment Board (NRAB), uma agência federal cujo objetivo era estabelecer uma estrutura e um comitê nacionais para a negociação e resolução de reclamações. A partir do funcionamento da agência, membros do governo, ministros da Suprema Corte, companhias ferroviárias e sindicatos não chegaram a um acordo sobre quais as bases legais e institucionais da operação da agência. Como resultado, o sistema entrou em colapso em finais da década de 1940 por meio das greves lideradas por sindicatos contra a resistência patronal à autoridade da agência. Na última seção da tese, as considerações finais são dedicadas a debater as potencialidades e limites desse corporativismo nunca alcançado, o tipo de Estado mediador estabelecido nos Estados Unidos e as conexões com o atual estado do debate e situação da legislação trabalhista do país.

Palavras-chave: Estados Unidos; ferroviários; história do trabalho; negociação

(10)

Abstract

This thesis analyzes the history of collective bargaining in the United States’ railroad industry in its period of formation and consolidation, from the end of the nineteenth century to mid-twentieth century. To follow such a process, the creation and development of policies for grievances — workers claims that arose from the work routine and the application of a contract — will be organizing element of the analysis. With such a frame, it will be shown that a long developing process of a never-consolidated corporativism — i.e., a clear set of procedural rules in solving claims and jurisprudence for decisions — in the industry’s labor relations and policy. Beginning with the strikes in the last quarter of the nineteenth century, the American state, unions, and railroads started to develop practices and institutions of collective bargaining, both nationally and in the workplaces, that would constitute the foundation of the labor relations system further developed in the twentieth century. In the 1920s, private mechanisms of grievance resolutions would be consolidated through employer-controlled company unions or collective bargaining, establishing a culture of claim negotiation in the industry. With the New Deal of Franklin Delano Roosevelt, the grievance procedures were put under the oversight and jurisdiction of the National Railroad Adjustment Board (NRAB), a federal agency whose purpose was to establish a national structure and committee to negotiate and rule on grievances. Since the early days of the NRAB, government officials, Supreme Court Justices, railroads, and unions never came to an agreement on which legal and institutional logic would govern the agency’s actions. As a result, the NRAB grievance system collapsed at the end of the 1940s after a set of strikes against some railroads’ refusal do accept NRAB’s authority. In the last section of the thesis, I will briefly debate the potentialities and limits of this never-consolidated corporativism, the kind of state mediation developed in the United States and the connections with the current situation of labor law and institutions in the country.

(11)

Lista de siglas e abreviações

AFL: American Federation of Labor ARU: American Railroad Union B&O: Baltimore & Ohio Railroad

BIR: Bureau of Industrial Relation (Pullman)

BL&E: Brotherhood of Locomotive Firemen and Eginemen BLE: Brotherhood of Locomotive Engineers

BLF: Brotherhood of Locomotive Firemen BoA: Board of Adjustment

BRT: Brotherhood of Railroad Trainmen BSCP: Brotherhood of Sleeping Car Porters CB&Q: Chicago, Burlington and Quincy Railroad CIO: Congress of Industrial Organizations

CPPA: Conference for Progressive Political Action EJ&E: Elgin, Joliet & Eastern Railway

ERP: Employee Representation Plan FDR: Franklin Delano Roosevelt FSC: Federal Shop Crafts

H&M: Hudson and Manhattan Railroad ICC: Interstate Commerce Commission IWW: International Workers of the World KoL: Knights of Labor

MoPac: Missouri Pacific Railroad NLRB: National Labor Relations Board NMB: National Mediation Board

NRAB: National Railroad Adjustment Board NWLB: National War Labor Board

ORC: Order of Railway Conductors OSCC: Order of Sleeping Car Conductor

(12)

PRR: Pennsylvania Railroad

RED: Railroad Employees Department RLA: Railway Labor Act

RLB: Railroad Labor Board

RLEA: Railway Labor Executives’ Association SUNA: Switchemen’s Uion of North America

USBMC: United States Board of Mediation and Conciliation USBoM: United State Board of Mediation

(13)

Sumário

Introdução ... 15 Capítulo 1 – Um Estado dentro de um Estado: as bases jurídicas e institucionais da negociação coletiva ferroviária (1865-1925) ... 26

1.1 – Servos, greves e contratos: os limites das relações de trabalho nas ferrovias durante o século XIX (1820-1894) ... 34 1.2 – Erdmand Act de 1898 e Newland Act de 1913: fraturas e rachaduras na master and servant law (1898-1915) ... 59 1.3 – Adamson Act de 1916 e United State Railroad Administration: a formação do Estado mediador estadunidense e a nova roupagem da master and servant law (1916-1920) ... 78 1.4 – Transportation Act de 1920: primazia patronal e a fragilidade dos sindicatos (1920-1925) ... 99 1.5 – As bases do direito trabalhista nas ferrovias ... 112

Capítulo 2 – Universos paralelos: grievances, negociação coletiva e Employees Representation Plan na Companhia Pullman, 1919-1935 ... 116

2.1 – Os anos 20, as ferrovias e ferroviários dos Estados Unidos ... 120 2.2 – Monopólio e antissindicalismo: a Pullman Company, 1867-1923 ... 129 2.3 – Mais do que um equipamento do vagão: condutores e a negociação coletiva na Pullman Company, 1919-1934 ... 143 2.4 – “Por dentro em vez de por fora”: porters e o Plan of Employe Representation, 1920-1935 ... 170 2.5 – Universos paralelos e a cultura de grievances ferroviária ... 191

Capítulo 3 – As várias formas do corporativismo: a questão procedimental das

grievances e a National Railroad Adjustment Board, 1934-1941 ... 196 3.1 – A emenda de 1934 do Railway Labor Act: fundamentos políticos e legais ... 203 3.2 – O sistema regulatório previsto: National Mediation Board e a National Railroad Adjustment Board ... 207 3.3 – Os primeiros anos da NRAB e Attorney General’s Committee on Administrative Procedure, 1934-1941 ... 211

Capítulo 4 – Inconsistências persistentes: a Suprema Corte, greves e o sistema de

grievances ferroviário, 1937-1950 ... 240 4.1 – Bases da inconsistência: Virginian Railway Co. v. Railway Employees (1937) e Moore v. Illinois Central (1941) ... 246 4.2 – Inconsistência consistente: as duas decisões Elgin, Joliet & Eastern Railway Co. v. Burley, 1945-1946 ... 253 4.3 – Da inconsistência à desordem: greves e os limites das grievances ferroviárias, 1946-1951 ... 277

(14)

Considerações finais – Um corporativismo americano ... 295 Bibliografia ... 301 1. Fontes primárias ... 301 1.1 – Arquivos e fundos ... 301 1.2 – Jornais e periódicos ... 301 1.3 – Dicionários ... 302 1.4 - Leis ... 302 1.5 – Decisões judiciais ... 302 1.6 – Fontes impressas ... 303 2. Fontes secundárias ... 311

(15)

Introdução

A história das ferrovias estadunidenses e de suas relações trabalhistas foi marcada por processos de grande amplitude temporal e geográfica. Fragmentos de contratos, negociação coletiva e de mecanismos de reclamação trabalhista são encontrados datando desde a década de 1850. Ao longo das quatro décadas seguintes, esses primeiros experimentos foram se aperfeiçoando e se ampliando a ponto de se confundir com a história da própria indústria. Não houve um processo claro de dispersão, sendo que, desde o início da indústria, práticas de controle e ordenamento da força de trabalho se iniciaram em vários lugares distintos e, aos poucos, foram se coadunando em um conjunto de práticas comuns espalhadas por todo o país. Desse processo surgiu as primeiras iniciativas gerenciais de administração e, também, de ordenação e controle do mercado de trabalho por empregadores e sindicatos. Como resultado, as primeiras políticas trabalhistas de alcance regional e nacional começaram a ser gestadas privadamente pelas estradas de ferro e os trabalhadores.1

A partir do Erdman Act de 1898, contudo, essas iniciativas saíram do campo propriamente privado e foram trazidas para dentro do Estado por meio da composição de leis, criação e operação de agências específicas, decisões jurídicas e outras formas de debate público. A formação de uma política pública para as relações de trabalho ferroviárias se deu ao longo de seis décadas após o primeiro diploma legal sobre o tema. A presente tese pretende explorar essa questão com o objetivo de mostrar que a busca por um sistema que equilibrasse autonomia política dos trabalhadores e sindicatos, independência administrativa das estradas de ferro e o papel mediador e de arbitragem do Estado nunca foram estáveis, apesar da presença forte de mecanismos públicos de regulamentação. Nesse processo, houve a formação de um corporativismo à americana que caracterizou as relações de trabalho ferroviárias entre as décadas de 1930 e 1950. Apesar de particular à indústria ferroviária estadunidense, a tese é mais uma contribuição à história acrescenta das potencialidades e limites da legislação e práticas trabalhistas estadunidenses do século XX.2

1 CHANDLER, Alfred D. The Railroads: The Nation’s Big First Business. Sources and Readings. Nova York: Hartcourt, 1965; CASE, Theresa Ann. The Great Southwest Railroad Strike and Free Labor. College Station: Texas A&M University Press, 2010; LICHT, Walter. Working for the Railroad: The Organization of Work in the

Nineteenth Century. Princeton: Princeton Univ. Press, 1983; STROMQUIST, Shelton. A Generation of Boomers: the pattern of railroad labor conflict in nineteenth-century America. Urbana; Chicago: University of

Illinois Press, 1993.

2 O melhor levantamento bibliográfico referente a essa questão está em LICHTENSTEIN, Nelson. “Introduction to the New Edition”, Labor’s War at Home: The CIO in World War II. With a New Introduction by the Author.

(16)

O elemento orientador desse sistema e objeto de análise central deste trabalho são as chamadas grievances. Elas eram o procedimento pelo qual os trabalhadores apresentavam suas reclamações relativas à condução da rotina de trabalho e à aplicação de cláusulas contratuais. Nascido de forma difusa nas ferrovias e nas oficinas de artesão no período imediato após a Guerra Civil (1861-1865), esse mecanismo foi sendo incorporado ao longo do século seguinte à regulamentação das relações trabalhistas por meio da atuação sindical e, após a década de 1930, por indução estatal. No início, as grievances geralmente eram parte integrante de negociações mais amplas e compunham as reivindicações dos trabalhadores, mas, aos poucos, foram se tornando uma forma especializada de negociação e ganhando ritos próprios.3 No caso das ferrovias, a implementação desse sistema ocorreu por meio de fluxo e

refluxos desde o início da institucionalização legal das relações trabalhistas em 1898 e cujo delineamento mais preciso começou a ser elaborado, a partir de 1916, com a passagem da lei de jornadas de trabalho da categoria.

As reclamações — a tradução mais precisa para o termo grievance — são parte integrante e central dos mecanismos de ordenação e normatização das relações de trabalho por, ao mesmo tempo, se localizaram no fim e no começo das negociações coletivas.4 Elas

Filadélfia: Temple University, 2003, pp. vii-xxviii. Além disso, a tese se soma à recente e tímida retomada do estudo da história dos ferroviários e o seu papel na história dos trabalhadores nos Estados Unidos. Cf. ARNESEN, Eric. Brotherhoods of Color: Black Railroad Workers and the Struggle for Equality. Cambridge, MA: Havard University Press, 2001; HUIBREGTSE, Jon R. American Railroad Labor and the Genesis of New

Deal, 1919-1935, Gainsville, Florida: University Press of Florida, 2010; TAILLON, Paul Michel. Good, Reliable, White Men: Railroad Brotherhoods, 1865-1917, Chicago; Urbana: University of Illinois Press, 2009

3 FRASER, Steven. “Dress Rehearsal for the New Deal: Shop-Floor Insurgents, Political Elites, and Industrial Democracy in the Amalgamated Clothing Workers Union”, in; FRISCH, Michael; WALKOWITZ, Daniel (eds.). Working-Class America. Champaign: University of Illinois Press, 1983, pp. 212-255; KILLINGSWORTH, Charles C.; WALLEN, Saul. “Constraint and Variety in Arbitration Systems” [1964],

School of Labor and Industrial Relations, Reprint Series n. 68, Michigan State University, s/d, pp. 56-81;

LICHTENSTEN, Nelson. “Auto Worker Militancy and the Structure of Factory Life, 1937-1955”, The Journal

of American History, v. 67, n. 2, setembro de 1980, pp. 335-353 e “Industrial Democracy, Contract Unionism

and the National War Labor Board”, Labor Law Journal, v. 33, agosto de 1982, pp. 524-531; MIGAS, Nick. “How the International Took Over”, in: LYND, Alice; LYND, Staughton. Rank and File: Personal Histories by

Working-Class Organizers. Updated Edition. Chicago: Haymarket Books, 2010, p. 168; MONTGOMERY,

David. Workers’ Control in America: studies in the history of work, technology, and labor struggles. Cambridge, MA: Cambridge University Press, 1979 e The Fall of the House of Labor: The Workplace, the State, and

American Labor Activism, 1865-1925. Cambridge: Cambridge University Press, 1987; SCHATZ, Ronald W.

“‘Industrial Peace through Arbitration’: George Taylor and the Genius of the War Labor Board”, Labor, v. 11, n. 4, 2014, pp. 39-62.

4 Em inglês, grievances é um termo lato que compreende não apenas a reclamação trabalhista em si, mas pode também abarcar reivindicações políticas ou mesmo mal-estar psicológico causado por alguma situação estressante. Por toda a documentação consultada, é comum encontrar a palavra dispute sendo utilizada como sinônimo. Porém, como o termo “disputa” aparece em contexto bem específico no caso brasileiro, em geral como sinônimo de ação na Justiça Trabalhista, lançar mão desse termo seria problemático, pois haveria a

(17)

eram o momento de teste para avaliar se as regras referendadas funcionavam ou não. Outrossim, o resultado da adequação entre acordo coletivo e a rotina de trabalho levava a novas rodadas de elaboração contratual, estabelecendo, em teoria, um círculo virtuoso de administração das relações trabalhista.5 Entre a idealização da negociação coletiva e sua

prática, havia distâncias e contradições que levavam a conflitos sociais e debates políticos de variados graus de alcance e intensidade, desde a condução negociada de uma reclamação até a grandes movimentos grevistas. Entre esses dois polos ainda se situaram os debates políticos na elaboração e passagem de leis, as discussões acerca da natureza das relações trabalhistas até comissões de discussão e reforma das agências envolvidas na regulamentação da questão. Desse modo, ao utilizar as grievances como fio condutor da análise e escrita, é possível compreender os processos políticos que levaram à formação desse sistema a partir do elemento que organizava toda a negociação coletiva e também dava concretude à elaboração contratual e sua aplicação nas locomotivas, vagões e estações.

Como percebido pelo material coligido e apresentado ao longo dos capítulos que se seguem, a história da institucionalização das relações trabalhistas ferroviárias se desenvolveu em um longo processo iniciado com o Erdaman Act de 1898 e que se estendeu ao longo de outras cinco peças de legislação — Newsland Act de 1913, Adamson Act de 1916, Transportation Act de 1920, Railway Labor Act de 1926 e a emenda de 1934 dessa última lei. Esse processo se desenvolveu em dois grandes movimentos. Primeiro, o período formativo da legislação, em que noções e práticas relativas ao trabalho livre, a mediação estatal e a independência administrativa das empresas, foram estabelecidas entre 1898 e 1925. Segundo, após o fim da Primeira Guerra Mundial, ocorreria o desenvolvimento das práticas da resolução de grievances em nível privado e sua especialização em relação à negociação coletiva a tornou mais complexa. Por fim, existiu um longo processo de acomodação institucional entre 1934 e 1950, em que o debate girava em torno da forma como as instituições de regulamentação das relações trabalhistas seriam administradas e organizadas.

Entre 1913 e 1934, houve vários experimentos em termos da composição dos diplomas legais e arranjos institucionais, levando a significativas variações nesse breve possibilidade de confundir o leitor. As grievances, porém, geralmente se iniciam com uma claim, isto é, uma reclamação. Esse termo é utilizado em todas as instâncias de negociação e geralmente engloba a posição do reclamante. Nesse sentido, grievance e claim também são termos sinônimos, e o recurso à palavra reclamação se apresenta como a melhor maneira de traduzir o termo.

5 Ver, por exemplo, RANDLE, C. Wilson. Contrato coletivo de trabalho [1ª edição: 1951]. São Paulo: Centro de Publicações Técnicas; Missão Norte-Americana de Cooperação Econômica e Técnica no Brasil-USAID, 1965.

(18)

período. Ele se iniciou com a Railroad Labor Board, que atuava como um tribunal autônomo e composto de membros sem relação com a indústria ferroviária, e encerrado com uma agência — a United States Board of Mediation — que apenas oferecia mecanismos voluntários de mediação. Essas mudanças rápidas foram resultado da intensa organização sindical e oposição patronal aos avanços da regulamentação estatal das relações trabalhistas. Por conta das crises resultantes das mudanças radicais, companhias, sindicatos e Estado elaboraram um compromisso político que determinou as bases legais e institucionais das ferrovias para o restante do século XX. A partir de 1934, decretou-se uma lei que estabeleceu o desenho institucional final. O novo diploma suscitou um novo campo de discussão, em que as condições e as instituições criadas pela nova lei se tornaram o objeto da disputa política entre sindicatos, companhias e o Estado.6

A emenda de 1934 do Railway Labor Act estabeleceu a estrutura administrativa que se manteria estável até os dias de hoje. A lei criou duas agências que supervisionariam as relações trabalhistas do setor. A National Mediation Board (NMB) seria responsável por acompanhar e certificar eleições sindicais, além de operar mecanismos de mediação e arbitragem na elaboração de contratos coletivos. A National Railroad Adjustment Board (NRAB) foi criada com o objetivo de ser a última instância de resolução de reclamações. Ela seria composta por quatro divisões, sendo cada uma delas responsável por um conjunto de ofícios e constituída por meio de plenárias com número paritário de representantes sindicais e patronais. A NRAB era precedida de mecanismos privados de resolução de conflito, em geral realizados por comitês administrados pelos sindicatos nos locais de trabalho e com jurisdição local e regional. Desse modo, a agência de resolução de grievances era um último estágio de negociação que poderia ser decidida por meio de acordo entre os membros classistas ou arbitragem com a convocação de um árbitro.

A NMB, apesar de marcada por processos de negociação demorados e bastante complexos, foi aceita por companhias e sindicatos, sendo que as tensões ao redor dela eram relativas, principalmente, aos debates sobre condição de trabalho e negociação salarial.7 No

caso da NRAB, porém, a particularidade do sistema de resolução de reclamações lançaria um longo e complexo debate em que sindicatos, companhias ferroviárias e Estado tentariam sem muito sucesso estabelecer as bases do sistema de negociação coletiva ferroviário. Como os

6 A melhor narrativa política dessas questões está em HUIBREGTSE, op. cit.

7 Para uma história quase contemporânea sobre a questão, ver KAUFMAN, Jacob J. Collective Bargaining in the

(19)

capítulos que se seguem mostram, todo o ordenamento administrativo, jurídico e político das relações trabalhistas ferroviárias estava, em alguma medida, assentado sobre o debate acerca da natureza das grievances e o seu papel na condução das relações trabalhistas ferroviárias. Esse debate, por sua vez, se arrastava desde finais do século XIX, pois o principal ponto em jogo era a construção de um sistema estável de relações trabalhistas sobre os três elementos básicos já citados —autonomia de administração patronal, independência política sindical e atuação mediadora e/ou arbitradora do Estado. Esse conflito se espraiaria em várias instâncias de poder, do Congresso ao Departamento de Justiça, à Suprema Corte e aos movimentos grevistas de finais da década de 1940. Os debates persistiriam até 1950, quando, apesar de os primeiros sinais de consolidação de todo esse processo, a indústria ferroviária estadunidense entrava em uma de suas piores crises econômicas até então e recolocaria o debate da regulamentação trabalhista em outros termos e problemas.

Por conta da perspectiva e dos recortes escolhidos, a tese soma-se às discussões historiográficas nos Estados Unidos sobre a relação entre a política e a sociedade estadunidenses de finais do século XIX ao atual, em que supostos retrocessos ou permanências do modelo social da chamada Gilded Age (1890-1920) seriam a marca definitiva do atual estado político do movimento operário estadunidense. Essa era da história dos Estados Unidos foi marcada por uma contradição: apesar da atuação hostil do Estado e do patronato contra as tentativas de sindicalização dos trabalhadores, o período testemunhou a crescente força do movimento sindical que, por meio de greves e negociação coletiva, estabeleceu-se como força política.8

Duas posições surgem nesse debate. De um lado, há a defesa da noção de que o período da chamada “ordem do New Deal”, em que as políticas sociais do período entre as presidências de Franklin Delano Roosevelt (1933-1945) e Ronald Reagan (1981-1989), é uma exceção em face da história das relações trabalhistas estadunidenses ou, pelo menos, um interregno entre o final do século XIX e o início do XXI.9 De outro lado, existe o

entendimento de que há muito mais continuidades entre o final do século XIX e o restante do século XX do que fora inicialmente pensado, já que muito do que se assentou em termos

8 SCHNEIROV, Richard; STROMQUIST, Shelton; SALVATORE, Nick (editores.). The Pullman Strike and the

Cirsis of the 1890s: Essays on Labor and Politics. Urbana: University of Illinois Press, 1999; FINK, Leon The Long Gilded Age: American Capitalism and the Lessons of a New World Order. Filadélfia: University of

Pennsylvania Press, 2015, especialmente capítulo 4.

9 FRASER, Steven. The Age of Aquiescence: The Life and Death of American Resistance to Organized Wealth

and Power. Nova York: Little, Brown & Co., 2015; COWIE, Jefferson. The Great Exception: The New Deal and the Limits of American Politics. Princeton: Princeton University Press, 2016.

(20)

políticos e legais a partir da década de 1930 foi majoritariamente concebido e experimentado ao longo do cinquenta anos antes da chegada de FDR à presidência.10

Compartilho da segunda proposta. Como a tese mostra, as ferrovias, apesar de sua trajetória particular em termos legais e administrativos, são um claro exemplo de persistência de questões e problemas que guiavam a condução das políticas e práticas de regulamentação trabalhista do setor atravessaram meio século entre várias mudanças de posições de trabalhadores, sindicatos, companhias ferroviárias e estrutura estatal, sem que houvesse a mudança do objetivo final, a saber: como encontrar e fazer funcionar um sistema que trouxesse a desejada “paz industrial” entre empregadores e empregados para que houvesse a circulação ininterrupta de pessoas e cargas sobre os trilhos estadunidenses. Na busca por tal paz, a tensão entre direitos individuais e coletivos dos trabalhadores, além do constante conflito de tais direitos com a extensão da autonomia dos proprietários em conduzir as estradas de ferro, conduzem a análise e apontam para o caráter histórico, nacional e amplo desse problema persistente e ainda presente nas discussões políticas da legislação trabalhista estadunidense.11 Por fim, a persistência do sistema regulatório criado durante as décadas de

1930 e 1940 e das práticas políticas e organizacionais dos trabalhadores até hoje, apesar da redução do escopo de ação dos sindicatos por escolhas internas e pressões externas, indica que não se pode descartar o que fora realizado na segunda metade do século passado.12

A escolha da perspectiva que enfatiza relações mais diretas dos Estados Unidos pós-Segunda Guerra Mundial com os processos políticos e sociais do início do século XX

10 FINK, The Long Gilded Age…, op. cit.; O’BRIEN, Ruth. Workers Paradox: The Republican Origins of New

Deal Labor Policy, 1886-1935. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1998.

11 Ver, por exemplo, a persistência dessas questões quando da discussão da fracassada reforma trabalhista proposta por Obama por meio do Employee Freedom of Choice Act em ARNESEN, Eric; ADAMS, Roy J.; COBBLE, Dorothy Sue; BRODY, David; LICHTENSTEIN, Nelson, seção “Up for Debate”, Labor, v. 7, n. 3, outono de 2010, pp. 7-32. Para avaliações à esquerda desses problemas, ver GINDIN, Sam. “The Power of Deep Organizing”, Jacobin, 12 de agosto de 2016, disponível em: https://www.jacobinmag.com/2016/12/jane-mcalevey-unions-organizing-workers-socialism/, consultado dia 24 de abril de 2017; “Beyond Social Movement Unionism”, Jacobin, 17 de agosto de 2016, disponível em https://www.jacobinmag.com/2016/08/beyond-social-movement-unionism/, consultado dia 24 de abril de 2017; “Chasing Utopia”, Jacobin, 10 de março de 2016, disponível em https://www.jacobinmag.com/2016/03/workers-control-coops-wright-wolff-alperovitz/, consultado dia 24 de abril de 2017; “Paying Dues”, Jacobin, 27 de junho de 2014, disponível em https://www.jacobinmag.com/2014/06/paying-dues/, consultado dia 24 de abril de 2017; “Raising Our Expectations”, Jacobin, 16 de abril de 2014, disponível em https://www.jacobinmag.com/2014/04/raising-our-expectations/, consultado dia 24 de abril de 2017.

12 Para as desventuras do movimento sindical estadunidense após 1945, ver MOODY, Kim. An Injury to All: The

Decline of American Unionism. Londres: Verso, 1988. Para como, na década de 1990, o movimento operário

tentava se revigorar por meio da renovação de antigas táticas e estratégias de ação, ver ASHBY, Steven K.; HAWKING, C. J. Staley: The Fight for a New American Movement. Urbana: University of Illinois Press, 2009.

(21)

também tem por objetivo estabelecer a história de uma das faces daquilo que Leon Fink denominou de “Estado mediador”.13 No caso dos Estados Unidos, as ferrovias foram um dos

poucos setores industriais objeto de legislação desde finais do século XIX e, por conta disso, muitas das experiências nas estradas de ferro foram determinantes para enquadrar as leis e instituições que seriam criadas para os demais setores da economia estadunidense a partir da década de 1930. Apesar do caráter pioneiro, as instituições que regulamentaram as relações trabalhistas industriais nos Estados Unidos não seguiram o modelo ferroviário. Mais do que exceção, o que se passou nas estradas de ferro pode ser entendido como exemplo de como poderiam ter se configurado a relação entre empresas, sindicatos e Estado caso outras categorias tivessem se tornado igualmente fortes e presentes no campo político estadunidense desde o início do século XX. Desse modo, a tese se soma a mostrar a complexidade do sistema regulatório trabalhista estadunidense e as várias formas institucionais que ele adquiriu ao longo da primeira metade do século XX.14

No caso ferroviário, o sistema encabeçado pela National Railroad Adjustment Board pode ser caracterizado como uma das formas possíveis da curta experiência corporativista nos Estados Unidos. Entre 1935 e 1941, o ordenamento legislativo, administrativo e jurídico estabeleceu a proteção ao direito a sindicalização, parâmetros nacionais de condições de trabalho, meios para representação dos trabalhadores nas empresas que trabalhavam e certa estabilidade normativa que parecia caminhar em direção a um sistema nacional de regulamentação das relações de trabalho. Porém, a resistência patronal ao sistema, as escolhas políticas do movimento operário e a investida conservadora contra a ação política dos trabalhadores impediu que esse sistema chegasse à plena fruição às vésperas da entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial. As ferrovias experienciariam similar processo, em que as discussões entre sindicatos, companhias, membros do governo e ministros da Suprema Corte sobre a natureza do sistema criado pela emenda de 1934 do Railway Labor Act foram determinantes na aplicação e operação do mecanismo de grievances. Em vez da formulação de um consenso, a tentativa de se estabelecer um corporativismo para a indústria ferroviária se tornou mais uma etapa em que os preceitos políticos e legais desenvolvidos ao longo das primeiras três décadas do século XX foram

13 FINK, Leon, “Conclusion: The Rise and Consolidation of the Mediatory State”, in: FINK, Leon; PALACIO, Juan Manuel. Labor Justice across the Americas. Urbana: University of Illinois Press, 2018, pp. 259-266. 14 STONE, Katherine Van Wezel, “Labor and the American state: the evolution of labor law in the United States”, in: VAN DER LINDEN, Marcel; PRICE, Richard. The Rise and Development of Collective Labour

(22)

debatidos e disputados. A falência da NRAB em ser um veículo legítimo para os trabalhadores perseguirem reclamações no imediato pós-Segunda Guerra Mundial, causada principalmente pela resistência patronal ao sistema, foi o ponto de inflexão que passou a redirecionar a agência para um modelo privatista. Ao tentar forçar companhias a aceitarem a autoridade da National Railroad Adjustment Board, os sindicatos desencadearam o processo que traria para a indústria ferroviária o modelo de regulamentação das relações de trabalho que vigeria na Guerra Fria.15

Para compreender esse longo processo de formação, a análise da tese se dará em quatro capítulo e considerações finais. O primeiro, intitulado “Um Estado dentro de um Estado: as bases jurídicas e institucionais da negociação coletiva ferroviária (1865-1925)”, apresenta o processo formativo das relações trabalhistas ferroviárias por meio dos diplomas legais, movimentos grevistas ou coletivos significativos e decisões judiciais mais importante do período que levaram à consolidação do papel mediador do Estado no setor. Após apresentar a história das relações de trabalho na indústria ferroviária no século XIX, mostro como o arcabouço jurídico e político que fundamentou a negociação coletiva nas ferrovias resultou de um longo processo de repaginação da master and servant law, em que o direito dos trabalhadores à sindicalização e à negociação coletiva foi desenvolvido pelo Congresso e pelas cortes sem infringir a propriedade privada da estrada de ferro. Essa ideologia, que define a relação de trabalho como a submissão econômica e social do empregado ao empregador, não foi rompida e substituída por uma nova ideologia, mas foi vagarosamente readequada em face da crescente força do movimento operário ferroviário. Para compreender essa mudança, é preciso seguir um longo processo. Iniciado com a promulgação do Erdman Act de 1898, o reconhecimento da capacidade de sindicalização e negociação dos trabalhadores ocorreria em fluxos e refluxos, em que cortes e o Congresso responderiam às ações coletivas dos ferroviários e à consolidação do movimento operário ferroviário como força política e das bases da negociação coletiva para o setor.

O capítulo dois, “Universos paralelos: grievances, negociação coletiva e Employees Representation Plan na Companhia Pullman, 1919-1935”, utilizará um estudo de caso para explorar o desenvolvimento de uma cultura e de práticas de resolução de grievances nos locais de trabalho por meio da negociação coletiva e de sindicatos controlados pelos patrões—os chamados company unions. Os condutores e os porters da Pullman Company são

15 LICHTENSTEIN, Nelson. State of the Union: A Century of American Labor. Princeton: Princenton University Press, 2002, capítulos 2 e 3.

(23)

exemplos claros de cada um dos tipos em uma única companhia. Apesar das diferenças em termos de capacidade de negociação e resistência patronal, argumento que ambas as formas de negociação forma responsáveis por criar, ao longo da década de 1920, o arcabouço institucional e de práticas de resolução de grievances privadas que seriam fundamentais para a formação da National Railroad Adjustment Board. Com os condutores, exploro a legislação trabalhista vigente no período — o Transportation Act de 1920 e o Railway Labor Act de 1926 — por meio das iniciativas de negociação coletiva da categoria e, principalmente, de resolução de grievances realizadas sob auspícios dessas leis. Como estudo de caso, analiso as reclamações referentes à hardship — a dureza da rotina e os efeitos dela na vida e saúde dos trabalhadores. Com os porters, analisarei como funcionava o Plan of Employe Representation (PER) e como ele era utilizado como meio de tentar garantir, mesmo que de forma bastante limitada, certos limites à ação disciplinadora patronal sobre os trabalhadores negros. No caso da PER, o mecanismo de resolução de reclamações foi desenvolvido em resposta às demandas dos trabalhadores por representatividade na companhia. Desse modo, um sistema que, apesar de pensado para controlar os empregados e afastar a influência dos sindicatos, se tornou bastante complexo em termos de estrutura e operação. Mesmo de forma limitada, o plano foi um meio disponível para os porters que não podiam contar com uma organização independente. Ao cabo do capítulo, indico como, apesar de origem diferentes, ambas as formas de resolução de grievances compartilhavam bastantes similaridades e que essas equivalências eram resultado da legislação que privilegiava opções voluntaristas e do controle patronal sobre o procedimento e condução das reclamações.

O terceiro capítulo, “As várias formas do corporativismo: a questão procedimental das grievances e a National Railroad Adjustment Board, 1934-1941”, trata da tentativa de formulação de uma política nacional de resolução de grievances incorporada na então recém-criada National Railroad Adjustment Board (NRAB). Pautada nas experiências anteriores, os vários grupos e indivíduos envolvidos na criação e operação da agência entraram em conflito acerca da sua natureza e operação. O palco privilegiado desse embate foi o Comitê do Ministro da Justiça dos Estados Unidos para Procedimentos Administrativos (Attorney General’s Committee for Administrative Procedure), uma iniciativa do Departamento de Justiça para uniformizar o funcionamento das agências federais criadas ao longo do primeiro terço do século XX. Após apresentar a lei de 1934 e o funcionamento geral das agências por ela criada, as diferentes visões esposadas pelas companhias ferroviárias, sindicatos e o próprio

(24)

comitê serão explorada para mostrar como a existência de um diploma não garantia o funcionamento do sistema regulatório. Quatro perspectivas foram apresentadas, sendo que duas delas propunham o estabelecimento de um corporativismo para o setor. Membros do comitê e um grupo de sindicatos defendiam, cada qual a sua maneira, defendiam o estabelecimento de regras processuais claras para a condução das reclamações. As companhias ferroviárias desejavam que a NRAB fosse acionada de modo a proteger o direito à propriedade privada dos empregadores. Por fim, os sindicatos agrupados sob a alcunha de Irmandades Ferroviárias argumentavam que a única saída possível para a agência era o recurso a estratégias voluntaristas.

O quarto e útlimo capítulo, “Inconsistências persistentes: a Suprema Corte, greves e o sistema de grievances ferroviário, 1937-1950”, acompanhará como a discussão sobre a NRAB passou da seara administrativa para a jurídica. O capítulo acompanhará algumas decisões da Suprema Corte que tiveram efeito na moldagem ou operação do sistema. Em especial, será analisado o caso Elgin, Joliet & Eastern Railway Company v. Burley et ali, que recebeu duas decisões em 1945 e 1946 que causaram efeito significativo na condução da NRAB. Assim como no caso do capítulo anterior, a inconsistência decisória dos juízes apenas trouxe mais instabilidade ao sistema. A impossibilidade de acordo político entre companhias e sindicatos, somada à atuação pouco eficaz das cortes, levará o sistema a um ponto crítico de disfunção. Essa crise, que percorria vários setores indústrias estadunidenses, geraria uma onda grevista que acometeria o país entre 1946 e 1950. No caso ferroviário, darei mais atenção à greve de 1949 na Missouri Pacific, uma ferrovia que cobria parte do Meio-Oeste, Sul e Sudoeste estadunidenses. Com a crescente crise dentro da NRAB, o movimento paredista foi o meio encontrado pelos sindicatos para tentar forçar o funcionamento da agência. O resultado do movimento, porém, foi a busca por alternativas que, já no ambiente da Guerra Fria, levou a uma mudança de rumo política e institucional da agência e do movimento operário.

Nas considerações finais, eu retraço os argumentos centrais da tese para argumentar duas posições. Primeiro, o sistema de negociação coletiva ferroviário foi consequência das escolhas realizadas pelos trabalhadores. Ao longo da primeira metade do século, os ferroviários lutaram por representatividade junto às companhias por meio da negociação coletiva e, mais importante, a resolução de grievances. Segundo, o corporativismo falho desenvolvido durante as décadas de 1930 e 1940 deve ser compreendido dentro dessa

(25)

perspectiva. Mais do que uma derrota, a National Railroad Adjustment Board foi uma das várias expressões dos meios disponíveis aos ferroviários para tentar ter voz sobre a própria condição de trabalho.

(26)

Capítulo 1 – Um Estado dentro de um Estado: as bases jurídicas e

institucionais da negociação coletiva ferroviária (1865-1925)

Em artigo de 1937, o advogado Lloyd K. Garrison iniciou a descrição da indústria ferroviária estadunidense com a seguinte afirmação: ela seria “um Estado dentro de um Estado”. A frase expressava o reconhecimento de que as ferrovias, os sindicatos e os Congressistas haviam estabelecido, em 1934, uma estrutura bastante peculiar e extensa para regulamentar as relações trabalhistas no setor. A lei do mesmo ano, que emendara o Railway Labor Act de 1926, havia criado duas agências nacionais que supervisionariam as relações trabalhistas do setor. A National Mediation Board seria responsável por supervisionar, mediar e arbitrar negociações contratuais entre sindicatos e estradas de ferro, além de certificar a representação sindical de trabalhadores por meio de eleições. A National Railroad Adjustment Board, por sua vez, era uma agência bipartite composta por representantes sindicais e patronais, cujo objetivo era avaliar e julgar reclamações individuais ou coletivas relativas à aplicação das convenções coletivas — as chamadas grievances. De fato, a NRAB foi uma inovação no cenário regulatório, uma vez que foi a primeira agência permanente criada na história dos Estados Unidos para dirimir os casos específicos de antiguidade no emprego, esclarecimento de função profissional, horas trabalhadas, entre outras questões por meio de decisões colegiadas e arbitradas com força de lei.1

Dado o caráter de novidade, o autor se propôs a realizar uma apresentação crítica da agência. Garrison (1897-1991), naquele momento um advogado de destaque na administração de Franklin Delano Roosevelt e um dos pioneiros na implementação das políticas trabalhistas do New Deal, fora um dos primeiros árbitros da NRAB.2 Antes de

trabalhar com a nova agência, Garrison não tivera qualquer contato com o mundo ferroviário estadunidense e, ao longo do artigo, fica transparente o grau de fascinação do autor com as estradas de ferro. Bastante entusiasmado, destinou a maior parte do artigo apresentando como a agência funcionava, o papel do árbitro e sua experiência pessoal na posição, os procedimentos estabelecidos para se julgar uma reclamação, além de apresentar algumas

1 GARRISON, Lloyd K. The National Railroad Adjustment Board: A Unique Administrative Agency, The Yale

Law Journal, vol. 46, no. 4, Feb., 1937, pp. 567-598.

2 DANIEL, Lee A. “Lloyd K. Garrison, Lawyer, Dies; Leader in Social Causes Was 92”, New York Times, página D00020, 03 de outubro de 1991, disponível em: https://www.nytimes.com/1991/10/03/nyregion/lloyd-k-garrison-lawyer-dies-leader-in-social-causes-was-92.html.

(27)

sugestões sobre como tornar a agência mais eficiente e, talvez, servir de exemplo para outras indústrias.

De fato, a expressão “um Estado dentro de um Estado” visava descrever outros dois elementos centrais da indústria ferroviária que precisariam ser levados em conta para compreender a existência da National Railroad Adjustment Board. A primeira era o tamanho do setor: ele era composto por mais de 850 companhias e sua mão de obra contava com mais de um milhão de trabalhadores em meados da década de 1930. Milhares de contratos aplicados e discutidos distintamente precisavam de um mecanismo que trouxesse estabilidade e regularidade para a rotina de trabalho, além de um meio legítimo para a expressão do descontentamento dos ferroviários sem que estes recorressem a greves. Por conta do tamanho e das peculiaridades próprias da operação das estradas de ferro, trabalhadores e gerência haviam desenvolvido quase que um dialeto próprio que tornava o mundo ferroviário ainda mais particular em relação a outras categorias. Como exemplo, Garrison cita a seguinte frase de um contrato de trabalho: “All Yardmasters: Effective date, all yardmen in cannon-ball service bringing drags in yard from outside points will bleed and cut own cars”. 3 A frase, se

lida e traduzida literalmente — “um trabalhador de pátio em uma bola de canhão que puxa algo de pontos exteriores deve sangrar e cortar os vagões” —, não faz qualquer sentido. Traduzidas as gírias, a regra estabelece que o trabalhador de pátio que viajasse em um trem expresso (cannon-ball), cujo comboio é composto de cargas diversas (drags) e que é oriundo de um terminal em que o trabalhador não é designado regularmente (outside point) deve liberar o ar dos freios (bleed) e desacoplar os vagões do comboio em que ele viajara (cut own cars).4

Além das peculiaridades e curiosidades das ferrovias, o segundo elemento que o trecho citado faz referência era a longa história de experimentos legislativos, legais e políticos que deram forma à estrutura de negociação incorporada na National Mediation Board e na

3 GARRISON, The National Railroad Adjustment Board, op. cit.

4 Para as gírias, ver “Cannonball”, Merriam Webster, disponível em https://www.merriam-webster.com/dictionary/cannonball; Para “outside point”, parti do entendimento do termo estabelecido por uma decisão de grievance em Case no. 665, “Chicago and North Western Railroad and Egineers and Firemen”, in: UNITED STATES RAILROAD ADMINISTRATION, Decisions. Railway Board of Adjustments No. 1. January

to June, 1919. Washington, DC: Government Printing Office, 1919, p. 14, disponível em:

https://books.google.com/books?id=PQwSAAAAYAAJ&pg=RA2-PA14&lpg=RA2- PA14&dq=railroad+%22outside+point%22&source=bl&ots=jdsQYDjYF8&sig=wIM7LtZDbRz_E14s5QYg4-

YcwDU&hl=pt-BR&sa=X&ved=2ahUKEwjSy7fXjYjbAhWEy4MKHWNeC1MQ6AEwAXoECAEQMA#v=onepage&q=railro ad%20%22outside%20point%22&f=false; Outros termos foram extraídos de CSX, “Railroad Dictionary”, disponível em: https://www.csx.com/index.cfm/about-us/company-overview/railroad-dictionary/.

(28)

National Railroad Adjustment Board. Garrison apresentou as duas agências como parte de mais uma etapa na história da regulamentação da indústria ferroviária. Esse processo fora iniciado em 1887 com a criação da Interstate Commerce Commisssion e teria se desenvolvido em fluxos e refluxos durante as cinco décadas seguintes.5 Esse entendimento foi reforçado por

especialistas nas últimas oito décadas, com distintas apreciações de como as experiências ocorridas entre as décadas de 1880 e 1930 foram determinantes para a formação do sistema de negociação coletiva e reclamações ferroviária pós-1934 — o objeto central da presente tese.6

A título de introdução, portanto, é necessário um retorno ao período formativo do sistema para compreender as bases políticas e jurídicas sobre as quais a National Railroad Adjustment Board foi construída entre as décadas de 1890 e 1920.

O elemento determinante do período formativo foi o processo de institucionalização do trabalho livre como uma figura social e política legítima de expressão individual e coletiva dos trabalhadores. No período inicial das ferrovias, quando as primeiras linhas partiram da Costa Leste e foram alcançando o rio Mississippi, as planícies do Centro-Oeste, os desertos do Sudoeste e as montanhas do Noroeste e as costas do Golfo do México e da Flórida, os proprietários lançaram mão de várias formas de trabalho para assentar e operar as locomotivas. Os primeiros maquinistas entre as décadas de 1820 e 1840 eram engenheiros formados em universidades que, além de projetar e construir as máquinas, operavam-nas por meio de contratos individuais extremamente exigentes e sem clareza quanto à jornada de trabalho. Escravos no Sul foram empregados como foguistas e ajudaram a construir muito da malha ferroviária inicial. Formas servis de trabalho foram utilizadas para assentar trilhos e fazer a manutenção de linhas em grande parte do Oeste estadunidense, especialmente a mão de obra chinesa na década de 1850 na Califórnia. Mecânicos qualificados povoaram as

5 GARRISON, The National Railroad Adjustment Board, op. cit.

6 GARRISON, The National Railroad Adjustment Board, op. cit.; HUIBREGTSE, Jon R. American Railroad

Labor and the Genesis of New Deal, 1919-1935, Gainsville, Florida: University Press of Florida, 2010;

KAUFMAN, Jacob J. Collective Bargaining in the Railroad Industry. Nova York: King’s Crown Press: Columbia University, 1954; LICHT, Walter. Working for the Railroad: The Organization of Work in the

Nineteenth Century. Princeton: Princeton Univ. Press, 1983; O’BRIEN, Ruth. Workers Paradox: The Republican Origins of New Deal Labor Policy, 1886-1935. Chapel Hill: University of North Carolina Press,

1998; ORREN, Karen. Belated Feudalism: Labor, the Law, and Liberal Development in the United States. Cambridge: Cambridge University Press, 1992; STROMQUIST, Shelton. A Generation of Boomers: the pattern

of railroad labor conflict in nineteenth-century America. Urbana; Chicago: University of Illinois Press, 1993;

TAILLON, Paul Michel. Good, Reliable, White Men: Railroad Brotherhoods, 1865-1917, Chicago; Urbana: University of Illinois Press, 2009. A exceção é LECHT, Leonard A. Experience under Railway Labor

Legislation. Nova York: AMS Press, 1955, que defendeu o entendimento de que houve uma ruptura entre as

(29)

primeiras oficinas, e as bastante antigas estruturas de guilda determinaram a hierarquia nos locais de trabalho ao longo das primeiras décadas de operações ferroviárias. Em outras palavras, reinava nas estradas de ferro a chamada master and servant law, cujo fundamento era o entendimento de que o indivíduo que vendia a força de trabalho se submetia socialmente àquele que a comprava, sendo que cabia ao patrão determinar as condições e a duração dos serviços.7

A master and servant law, apesar do nome, não significava que os vínculos de trabalho estabelecidos carecessem de qualquer mecanismo legal ou social de regulação. Trabalhadores rurais, ferroviários e amas eram submetidos a contratos escritos ou orais por períodos determinados que estabeleciam as condições de trabalho. O empregador determinava as horas de trabalho, as atividades a serem realizadas, o tempo de descanso, os modos de punição — incluídos castigos físicos e restrição de locomoção — e, em casos rurais e de trabalho doméstico, as condições de moradia. Esse enquadramento legal, criado na Inglaterra durante o século XIV, foi reinterpretado e reforçado pelas cortes coloniais e, depois, por magistrados estaduais e federais pela a Suprema Corte estadunidense ao longo dos séculos XVII, XVIII e início do século XIX. Trabalhadores nativos ou imigrantes não ficaram passivos diante da violência engendrada por essa lógica, resistindo por meio de atos individuais e coletivos de contestação e de greves ou redes sociais de apoio mútuo, além de eventualmente recorrerem às cortes contra os abusos patronais. Enquanto no Norte do país houve um lento processo de definição das capacidades e limites de controle dos empregadores sobre os trabalhadores, os grandes proprietários de terras sulistas que plantavam algodão passaram a recorrer de modo mais intensivo ao trabalho escravo, presente nas antigas colônias desde o século XVII, como forma de evitar a resistência servil e exercer maior controle sobre a força de trabalho. Assim como aqueles empregados por vínculos servis, cativos e libertos africanos, caribenhos ou afro-americanos realizaram motins e estabeleceram redes de resistência e fuga.8

7 LICHT, Walter. Working for the Railroad, op. cit., capítulos 2 e 6. Licht não usa o termo master and servant

law ao longo da sua obra, porém a descrição das relações se trabalho nas primeiras décadas das ferrovias se

adequa ao apresentado em STEINFELD, Robert J. The Invention of Free Labor: The Employment Relation in

English and American Law and Culture, 1350-1870. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1991.

8 STEINFELD, Robert J. The Invention of Free Labor, op. cit., e Coercion, Contract, and Free Labor in the

Nineteenth Century. Cambridge: Cambridge University Press, 2001; TOMLINS, Christopher. Freedom Bound: Law, Labor, and Civic Identity in Colonizing English America, 1580-1865. Cambridge: Cambridge University

(30)

Após a Guerra Civil e o fim da escravidão entre 1863 e 1865, o trabalho livre — o entendimento de que os trabalhadores detêm a capacidade de negociar individual e coletivamente as condições do próprio emprego — começou a se tornar a ideologia e lógica dominantes, mas não exclusivas, de venda e compra de força de trabalho ao longo do último terço do século XIX. Nas ferrovias, assim como em outros setores, a industrialização massiva da economia e a introdução da mão de obra afrodescendente e imigrante transformaram as dinâmicas de compra e venda da força de trabalho. Com o fim da escravidão em 1865, teve início um longo e ainda incompleto processo de transição de formas compulsórias a livres de trabalho, afetando de fromas distintas trabalhadoras e trabalhadores brancos, negros e latinos por conta da ainda persistente desigualdade baseada na cor de pele, origem nacional, gênero, entre outros elementos advindos das práticas escravistas e compulsórias de aquisição de força de trabalho pelo patronato rural ou urbano. Esses indivíduos, por meio de movimentos coletivos, sindicalização, greves e recurso às cortes, começaram a questionar as condições de trabalho impostas a eles com o objetivo de torná-las menos injustas e ter voz sobre as próprias vidas. Devido às várias divisões raciais, étnicas e políticas entre os operários, as lutas por maior independência colocaram a classe trabalhadora contra o Estado e uns contra os outros. Como resultado, enquanto parte considerável dos trabalhadores brancos desenvolvia os meios para lutar e adquirir direitos individuais e coletivos, muitos outros ainda experienciariam vidas cativas ou com bastantes limites à liberdade.9

Entre aqueles que conseguiriam lutar pela própria liberdade, os ferroviários foram um dos grupos principais e pioneiros a avançar na luta por contratos, meios de negociação e direitos nas estradas de ferro que dariam expressão social à ideologia do trabalho livre. Essa primazia foi resultado de dois fatores. O primeiro e mais concreto motivo era a centralidade dos trilhos no setor de transportes dos Estados Unidos. Greves de alcance regional e nacional ameaçavam a estabilidade econômica e política do país, o que dava aos trabalhadores força política para estabelecer e defender leis, contratos e comissões. Em vários momentos ao longo das primeiras cinco décadas de experiências de negociação coletiva nas estradas de ferro, o empenho dos trabalhadores para exercer o controle sobre as próprias vidas e condições de trabalho seria expresso em greves e outros movimentos coletivos. Contudo, em face de um Estado resistente e oposto aos trabalhadores, a alternativa de fixar política e direitos de baixo para cima nunca se concretizou de fato e foi respondida com violência estatal.

(31)

Por conta desse caráter repressivo, o segundo elemento que determinou a formação da negociação coletiva ferroviária nos Estados Unidos foi a atuação pragmática da liderança sindical do setor, principalmente os presidentes das chamadas Irmandades Ferroviárias. Diferente de sindicatos cujas bases e lideranças radicais combatiam o patronato e o Estado com o objetivo de impor o controle dos trabalhadores sobre os locais de trabalho, os ferroviários representados pelas Irmandades após 1894 passaram a atuar dentro dos limites políticos e eleitorais existentes e, aos poucos e entre muitas marchas e contramarchas, capitanearam a formação de políticas públicas, práticas e instituições trabalhistas para as estradas de ferro, que resultaram no Estado dentro do Estado, conforme a assertiva de Lloyd K. Garrison. A saída encampada por alguns grupos ferroviários não era apenas uma questão de filiação política. Tratava-se primordialmente de uma leitura das forças sociais e da capacidade de ação coletiva e social presente nos Estados Unidos, em especial o papel das cortes na consolidação e no enquadramento da capacidade de ação dos sindicatos e agências regulatórias. Enquanto trabalhadores atuavam coletivamente em busca de direitos, contratos e mecanismos de negociação, assim como o Congresso passava a responder com leis para atender essas demandas, juízes e ministros da Suprema Corte atuavam como fiéis da balança entre as forças sociais e os partidos políticos. Porém, o caráter conservador e antipopular da magistratura estadunidense, aliado ao uso da violência por patrões, governadores e presidentes, levou as cortes a atuarem como bloqueadoras e limitadoras dos avanços sociais e políticos dos ferroviários, em vez de equilibrar as forças políticas patronais e dos trabalhadores. Ao longo da história dos Estados Unidos, magistrados de vários níveis sempre tiveram considerável poder para determinar o rumo do processo legislativo e o escopo de aplicação das leis devido a deferência legislativa aos magistrados — congressistas tendiam a elaborar leis amplas e as cortes eram (e ainda são) responsáveis por definir os termos particulares de aplicação de diplomas. Desse modo, em vez de uma ruptura clara entre a master and servant law e a ideologia do trabalho livre, o caso ferroviário mostra que o estabelecimento e desenvolvimento de uma jurisprudência e direito trabalhistas nos Estados Unidos se deu de forma paulatina e por meio de um contínuo processo de reinterpretação e readequação do modelo servil conduzida pelas cortes.10

10 CARTER, Saalim A. “Labor Unions and Antitrust Legislation: Judicial Activism vs. Judicial Restrain,

1880-1941”, paper, informatizado, 2006, disponível em

Referências

Documentos relacionados

Aqui, também pode ser interessante perceber que a UE (discursivamente) se compromete a avançar com a resolução de situações cujos resultados poderiam resultar adversos

En combinant le moment fléchissant (repris par les hourdis) et l’effort tranchant (repris par les âmes), il a aussi observé une très faible interaction. En 2008,

Study of the immune response and protective effect against neosporosis elicited by mucosal immunization with Neospora caninum antigens.. Tese de Candidatura ao grau

As questões das decisões tomadas pelo doente gravitam, pois, à volta do seu consentimento com prévia informação e esclarecimento o que, se é determinante para

No capítulo 1 são clarificados conceitos-chave essenciais à contextualização do estudo efectuado, destacando autores como Conceição Lopes, John Thompson, Mcluhan, Sara Pereira e

O Estágio Profissional “é a componente curricular da formação profissional de professores cuja finalidade explícita é iniciar os alunos no mundo da

Esta autonomia/diferenciação é necessária na medida em que contribui para o desenvolvimento da pessoa enquanto adulto individualizado, permitindo consequentemente

Desta forma, se em determinada situação jurídica o vínculo entre o fato e a norma de conflito for fraco, distante, e havendo outro sistema jurídico que fique muito mais próximo a