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IX COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS

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1 IX COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS

Teoria da Dependência: elementos gerais e hipóteses sobre suas limitações políticas

Profº. Drº. Luiz Fernando da Silva1 Universidade Estadual Paulista – UNESP

lf-silva@faac,unesp.br

Doutoranda - Gisele Cardoso Costa2 Universidade de São Paulo-USP

giseleccosta@usp.br

Introdução

O presente trabalho faz parte de uma pesquisa sobre as contribuições históricas e os possíveis limites teóricos e políticos da Teoria da Dependência3 para analisar as questões estruturais na América Latina. As recentes experiências políticas dos chamados “governos progressistas” – também conhecidos como de frente popular, nacional-burgueses ou social-liberais - recolocaram para intelectuais, militantes políticos e partidos de esquerda (social-democratas, reformistas ou revolucionários) a questão sobre os limites que as relações estruturais (interno/externo) impõem aos projetos que enfocam transformações sociais de caráter popular, nos marcos do modo de produção capitalista. Essas determinações estruturais recolocaram a questão sobre a inviabilidade de governos caracterizados como “populares” em administrarem estados burgueses e manterem alianças políticas com frações do capital nacional e internacional. Em outras palavras, a condição política sul-americana constituída nas últimas duas décadas recolocou em cena a teoria do imperialismo, considerada de distintas maneiras

1 Professor do Depto. Ciências Humanas (UNESPBauru), mestre e doutor em Sociologia pela Unesp

-Araraquara.

2 Graduada em Pedagogia (Unesp-Bauru), mestre e doutoranda pelo Programa de Integração

Latino-Americano (PROLAM-USP).

3 Pesquisa desenvolvida no Grupo de Pesquisa América Latina e Marx: Movimentos Sociais, Partidos,

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2 pelas correntes da Teoria da Dependência, e suas articulações e nexos com as relações institucionais internas. Recolocou, inclusive, a discussão sobre as possibilidades do desenvolvimento econômico e social, agora marcado pela teorização sobre o “neo-desenvolvimento”.

Nesse sentido, parece-nos relevantes apresentar a seguinte interrogante: O percurso e análise da Teoria da Dependência permanecem relevantes como chaves interpretativas da realidade latino-americana? Quais seriam as hipóteses a respeito dos seus possíveis limites?

Para o desenvolvimento do debate proposto pelas questões levantadas, este artigo estrutura-se, então, por meio da seguinte maneira a partir desta introdução: apresentação do contexto geral do surgimento do dependentismo: o conceito de dependência e vertentes teóricas constituem o terceiro tópico; os pressupostos a respeito de um suposto fracasso da Teoria da Dependência e seus limites integram a quarta parte desse trabalho, a anteceder as breves considerações finais.

Como procedimento teórico-metodológico, esse trabalho utilizou diretamente os materiais produzidos pelos principais autores da Teoria da Dependência, bem como a apreensão bibliográfica que serviu como fontes a respeito das interpretações contextuais e interpretativas sobre o dependentismo, referenciada por diversos autores das ciências sociais latino-americana.

2. Contexto e dimensão política do surgimento da Teoria da Dependência

O termo Teoria da Dependência designa uma extensa, diversificada e original produção teórica nas Ciências Sociais latino-americanas, principalmente entre a década de 1960 e 1970. Os estudos da dependência realizaram inovadora interpretação sobre os países da região, e traziam em si as experiências políticas e teóricas críticas ao desenvolvimentismo, em suas distintas correntes. Assim conseguiu reinterpretar a história da América Latina, em temas como passado colonial, industrialização, burguesia nacional e associada, Estado, integração econômica, transnacionais, dependência cultural e outros.

O que levou o nome de teoria da dependência nada mais foi do que cerca de 30 cientistas sociais, de acordo com Beigel (2014 p.79), que configuraram esse campo nas instituições acadêmicas de Santiago do Chile, a partir do ano de 1966: 27 deles eram sul-americanos, sendo metade constituída por brasileiros com idade entre 27 anos e 30

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3 anos. Os economistas dividiam ao meio esse conjunto; a outra parte eram sociólogos, advogados e cientistas políticos. Os autores do dependentismo são parte das classes médias urbanas em crescimento. A relação que essa jovem geração estabeleceu com os conceitos do marxismo apresentava relevância nessa elaboração teórica, em torno do que poderíamos considerar como um “marxismo acadêmico”, pois ambientado principalmente no espaço institucional universitário e dialogando (de maneira mais ou então menos crítica) com as abordagens (e metodologia) funcionalista e weberiana.

O período no qual se desenvolveu os primeiros escritos da Teoria da Dependência fora marcado pela combinação consolidada entre a expansão tecnológica promovida pelos países imperialistas, em especial pelos EUA, e o dilema do nacional-desenvolvimentismo em realizar a transição da produção de bens de consumo para a produção de bens de capital. Frente à incapacidade do projeto populista em superar por vias autônomas a primeira fase da industrialização na região, esse se aliou ao capital forâneo como meio de resolver a problemática instalada entre a necessidade de investimento para o projeto de industrialização e o alto processo inflacionário que inviabilizava tal projeto.

Nesse quadro, a desnacionalização de parte da própria indústria de bens de consumo, do setor financeiro e o controle estrangeiro direto sobre a tecnologia aplicada no interior das economias subcontinentais não apenas colocaram em relevo as características da dependência que escapavam à compreensão exógena de dominação, mas também dimensionaram para o plano interno as relações de integração subordinada e os projetos de classes. De modo, ao mesmo tempo em que a integração da América Latina ao capitalismo industrial se consolidou, gestou-se também a ascensão, institucionalização e profissionalização de quadros intelectuais que elaboraram sobre as determinações gerais das próprias transformações que os produziram enquanto acadêmicos.

A análise da dependência estrutural manteve como questão, para alguns de seus autores, a possibilidade do desenvolvimento capitalista integrado ao capital internacional; para outros, a questão do caráter da revolução latino-americana como dimensão central para a ruptura com a situação de dependência e subdesenvolvimento.

O dependentismo, como também ficou conhecido, recusava-se a interpretar a situação de subdesenvolvimento subcontinental produto das supostas características feudais e semi-coloniais da região, presente nas formulações da III Internacional Comunista a partir de 1928; (b) um processo “natural” pelo qual os países centrais já

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4 haviam passado, como propunha a teoria da modernização estadunidense (estágios lineares de desenvolvimento); ou então (c) decorrente apenas da troca desigual de mercadorias entre países industrializados e periféricos, na interpretação original da CEPAL. Nesse compasso crítico, as formulações dependentistas questionavam o protagonista das “burguesias nacionais” enquanto sujeitos políticos que levariam à superação do subdesenvolvimento. As suas distintas correntes consideraram que as burguesias locais eram estruturalmente débeis e integradas ao capital internacional. Neste sentido, a teoria da dependência constituiu se contrapondo às diversas interpretações desenvolvimentistas e dualista sobre a América Latina.

Em suas correntes, esboçou uma perspectiva sobre as particularidades da América Latina, todavia articulada ao desenvolvimento e afirmação do modo de produção capitalista. Tal enfoque aproximou-se da teoria do desenvolvimento desigual e

combinado4 e da teoria da revolução permanente5, que na região já referenciavam

elaborações teóricas e práticas políticas em décadas anteriores.

3. O conceito de dependência e o método histórico-estrutural

O conceito de dependência ganhou sentido nas ciências sociais mediante duas definições que marcariam também as formas de abordagem das principais correntes do dependentismo. Desse modo, destacam-se os escritos de seus principais formuladores: Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto (1967), Ruy Mauro Marini (1969, 1973), Theotonio dos Santos (1969 e 1970), Vânia Bambirra (1972).

Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto caracterizaram que a noção de dependência era o conceito que outorgava significado para um conjunto de fatos e situações em determinado momento, estabelecendo-se assim “as relações que tornam

inteligíveis as situações empíricas em função do modo de conexo entre os componentes estruturais internos e externos” (1970 p. 23).

Em Marini, a conceituação de dependência ganha materialidade a partir da relação de subjugação econômica de uma nação formalmente independente perante a expansão e demanda da economia de outra nação, a redefinir ininterruptamente as relações de produção da primeira mediante os interesses da segunda:

4 Formulação original presente em Leon Trotsky, em especial em sua obra A teoria da revolução permanente (1928).

5 Indicaremos por onde essas aproximações ocorreram mas também cabe nesse texto demonstrarmos

os limites que as correntes dependentistas tiveram nessa aproximação que, ao ser incompleta, significou uma das debilidades nesse enfoque.

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5 “(...) é a partir desse momento que se configura a dependência, entendida como uma relação de subordinação entre nações formalmente independentes, em cujo âmbito as relações de produção das nações subordinadas são modificadas ou recriadas para assegurar a reprodução ampliada da dependência. O fruto da dependência só pode assim significar mais dependência e sua liquidação supõe necessariamente a supressão das relações de produção que ela supõe (MARINI, 2000 p. 109)

Semelhante compreensão também pode ser verificada na definição de Theotônio dos Santos, para o qual a dependência é: “uma situação na qual certo grupo de países

tem sua economia condicionada pelo desenvolvimento e expansão de outra economia à qual se encontra submetida” (dos Santos, 1970, apud Bambirra 2012).

Para compreender a situação de subdesenvolvimento nos países latino-americanos e as possibilidades (ou não) do seu desenvolvimento, os teóricos da dependência procuraram retirar o enfoque analítico até então centrado nas relações externas. Até os anos 1960 o fenômeno do subdesenvolvimento fora explicado em sua “causalidade” externa, devido ao comércio exterior desvantajoso para os países “periféricos” (“deterioração dos valores de troca – CEPAL6) ou à subordinação política daqueles ao Imperialismo (tese comunista). Nessa maneira de analisar haveria uma ótica “mecânico-causal”, onde unidades distintas estabeleceriam relações, uma submetendo a outra. Foi justamente essa ótica que a teoria da dependência procurou rejeitar. A partir da década de 1960, portanto, perderia significado as concepções teóricas baseadas na contradição (ou exploração) entre as nações, como enfoque analítico do subdesenvolvimento. As mudanças que ocorriam na América Latina – crescente urbanização e industrialização de alguns países - teriam sido a base para o reenfoque sobre a dependência (Zemeno, 1972 p.466).

As modificações no tratamento da “variável externa”, como propunham os teóricos da dependência, vieram no sentido de preencher “a ausência conceitual gerada

pelas modificações operadas no desenvolvimento em nossas sociedades e representava, portanto, o aspecto mais afortunado da nova produção teórica” (Idem, p. 473).

É possível considerar que o surgimento da Teoria da Dependência ligou-se à crítica realizada a duas matrizes teóricas até então hegemônicas sobre a interpretação do subdesenvolvimento e do “atraso” latino-americano: o estrutural funcionalismo e a

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6 teoria do imperialismo – a primeira desenvolvida principalmente via CEPAL; a segunda, pelos partidos comunistas. Tanto para uma quanto para a outra matriz, a América Latina mantinha uma relação de dependência externa com os países industrializados.

Para os teóricos da dependência, não caberia mais um enfoque que, por um lado, separava as realidades das sociedades latino-americanas (regiões rurais e urbanas); por outro, que impunha um referencial de modernidade e progresso espelhado nos europeus ou norte-americanos. Os pressupostos metodológicos orientavam a crítica às teorias do desenvolvimento, a partir da qual se refaziam as perspectivas analíticas e seus desdobramentos políticos.

Para Thomas Coutrot (1991 pp.157-161), o enfoque centrado na relação centro/periferia é a problemática principal da dependência, embora reconheça o esvaziamento desse paradigma a partir dos anos 1980, o autor identifica a problematização presente no dependentismo. A natureza do mercado capitalista mundial impede o desenvolvimento da periferia? Uma reforma adequada permitiria superar os principais empecilhos? Seria possível realizar uma aliança nacional desenvolvimentista? Seria indispensável uma ruptura revolucionária com a classe dominante? Mediante tais interrogantes verifica-se três correntes: 1) a teoria cepalina da dependência, na qual se situavam inclusive as análises da primeira fase da CEPAL (Celso Furtado, Oswaldo Sunkel e outros); 2) a teoria marxista da dependência, segundo a qual a superexploração do trabalho na periferia seria a pedra angular que permitiria a manutenção da dependência como um acordo tácito entre os setores internos e internacionais do capital (Marini, Theotonio dos Santos, Vânia Bambirra, Jaime Osório, etc.) e; 3) a perspectiva que compreendia a dependência desvinculada do subdesenvolvimento, e que terminou por preconizar no campo político a defesa do desenvolvimento econômico sem ruptura com os parâmetros de dependência (Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto).

As diferenças nesse campo intelectual difuso são importantes ressaltar, e agrupamos os autores com perspectivas analíticas e políticas diferentes, entre as quais se sobressaíram três correntes: a) André Gunder Frank, Theotônio dos Santos, Ruy Mauro Marini, Vânia Bambirra, Orlando Caputo e Roberto Pizarro no campo marxista; b) Fernando Henrique Cardoso, Enzo Faletto, Aníbal Quijano, com enfoque weberiano e elementos conceituais marxistas, mas que expressaram uma perspectiva democrático-liberal; c) Celso Furtado, Oswaldo Sunkel que seguiam a matriz original cepalina e, na década de 1960, passaram a discutir a “estagnação” do capitalismo latino-americano.

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7 Entretanto, apesar dos rumos distintos que essas perspectivas tomaram, todos (exceto os cepalinos) partiram de um mesmo enfoque crítico às teorias de modernização e às teses sobre o “etapismo” democrático-burguês dos partidos comunistas, advindas do VI Congresso da III Internacional. E isso, porventura, em termos ainda que teórico sobre a luta de classes tenha se constituído na principal contribuição da chamada Teoria da Dependência, isto é, a partir da análise sobre as particularidades da formação social latino-americana, caracterizar como condição histórica e estrutural a impossibilidade dos setores internos do capital de serem protagonistas de um processo de ruptura com a dependência.

4. Hipóteses explicativas sobre o “fracasso” da teoria da dependência

Apesar da relevante contribuição da Teoria da Dependência para a constituição do pensamento crítico latino-americano, suas formulações foram desterradas durante as duas últimas décadas do século XX até meados do início do século XXI. Isso obriga-nos a indagar as possíveis razões que levaram a perda da importância interpretativa do dependentismo durante esse período. Em outras palavras, questionar: onde reside a sua suposta derrota teórica e/ou política nas ciências sociais?

Uma hipótese explicativa levanta aponta para a possibilidade do “fracasso” da Teoria da Dependência residir em sua debilidade em compreender a multiplicidade da realidade subcontinental, e supostamente terminar por condicionar os sujeitos sociais ao determinismo estrutural. (Ponte, 1990). Nessa hipótese, o enfoque da dependência remeteria à situação de dependência, na busca da conexão estrutural entre as dimensões externas e internas, e desconsideraria as dimensões conjunturais e cotidianas das lutas sociais. A essência epistemológica dessa crítica advém da perspectiva pós-estruturalista, que em contraponto às análises estruturais, históricas propôs o deslocamento das Ciências Sociais para temáticas como Estado, democracia, movimentos sociais, movimentos identitários, etc.

Essa crítica e deslocamento temático ocorreram em período entre as ditaduras militares sul-americanas e os processos de “redemocratização”, em diversos países da região. Para Cuevas (1988), o eixo do debate nas ciências sociais se deslocou das preocupações pelas mudanças estruturais para o tema da ordem e convivência democrática. No lugar do referencial histórico-estrutural, que era forte na teoria da dependência, dois enfoques ganharam presença nos espaços acadêmicos da região: o gramscianismo e o neoliberalismo. O neoliberalismo da década de 1980 ocupou o espaço teórico e político através de suas propostas de “desobstrução” dos entraves para

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8 a integração das sociedades latino-americanas à nova ordem internacional: desestatização da economia, fim das barreiras protecionistas, criação de um mercado latino-americano (ou americano?), etc.

O golpe civil-militar no Chile (1973) e como consequência o brusco corte de recursos para os centros institucionais nos quais se localizavam importantes teóricos da dependência, é outro hipótese explicativa para os anos de desterro da Teoria da Dependência no pensamento social latino-americano. No Chile, a partir da segunda metade da década de 1960 e, sobretudo no período do Governo de Salvador Allende (1971-1973), concentrou uma jovem intelectualidade acadêmica que foi consagrada com os estudos da dependência.

Essa última hipótese, apesar de apresentar elementos materiais bastante plausíveis, a considerar o lócus de produção da Teoria da Dependência, parece-nos ainda insuficiente para explicar o ostracismo pelo qual passou o dependentismo por um período de mais de uma década. Ao lado dessa explicação é preciso considerar os caminhos políticos engendrados pelas diversas vertentes da Teoria da Dependência, isto é, não apenas compreendê-las em suas dimensões mais abstratas e conceituais, mas verificar qual o percurso de sua análise não somente no campo econômico ou sociológico, mas diante da luta de classes e dos sujeitos políticos que a protagonizam. Em outras palavras, isso significa compreender a relação de seus teóricos frente às classes sociais e suas frações, aos governos, projetos políticos partidários e instituições estatais.

Esse debate não é irrelevante se considerarmos o deslocamento político de seus principais autores entre a década de 1960 e a década de 1980, do campo da esquerda contrária à conciliação de classes para um campo diretamente liberal, como sucedeu com Fernando Henrique Cardoso, ou para uma perspectiva nacional-burguesa como ocorreu com Ruy Mauro Marini, Theotônio dos Santos e Vânia Bambirra, primeiro em relação Governo Allende, e posteriormente em relação ao brizolismo.

Considerações finais

A importância da Teoria da Dependência para o pensamento social latino-americano, não está circunscrita às décadas de 1960 e 1970, mas também ao que diz respeito ao tempo presente. Sua dimensão, em muito, escapa a uma análise meramente conjuntural e adentra para o arcabouço das ciências sociais latino-americana como uma

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9 metodologia de compreensão das questões estruturais que se formaram desde a configuração política e econômica do subcontinente e que ainda permanecem vigentes.

A caracterização da burguesia autóctone como uma classe social débil, vacilante frente suas próprias tarefas históricas; as características das sociedades dependentes como combinação desigual do próprio desenvolvimento do capitalismo e da dominação do imperialismo, são algumas das análises estruturais da Teoria da Dependência que permanecem vigentes e resultam em importantes aportes para compreender a contemporaneidade das vicissitudes latino-americanas.

Isso ocorre porque há uma vinculação dos próprios conceitos elaborados pelo dependentismo e a realidade objetiva subcontinental. O problema da própria dependência e suas consequências; a superexploração do trabalho; o processo contínuo de transferência de valor para os centros capitalista; a integração da burguesia “local” com o capital internacional são problemas que não apenas não foram superados como se aprofundaram a partir da reconfiguração da divisão internacional do trabalho.

Essa perspectiva vigora na América Latina mediante um novo padrão de exportação que combina bens primários com bens secundários produzidos a partir de maquiladoras, por exemplo. Tal condição significa para a região, como bem caracteriza Jaime Osorio:

Mais do que economias dinâmicas que se orientam para o desenvolvimento (e que aproveitam as “janelas de oportunidades” abertas pelas novas tecnologias, como certos discursos gosta de destacar), o que temos na América Latina são novas formas de organização reprodutiva que reeditam, sob novas condições, os velhos signos da dependência e do subdesenvolvimento como modalidades reprodutivas que tendem a caminhar de costas para as necessidades da maioria da população (OSORIO, 2012 p.104

No entanto, apesar de sua vigência em relação às questões macroeconômicas, ainda segue em aberto aquilo que poderíamos considerar limites ou calcanhar de

Aquiles da Teoria da Dependência, para usar uma expressão de Agustín Cueva (1979): a

ausência de uma análise a respeito dos sujeitos políticos e sociais que gerenciam a dependência estrutural como projeto político, bem como uma análise do único sujeito social que é capaz de promover a ruptura definitiva com a subordinação dos países latino-americanos – o operariado organizado mediante um programa político de total independência de classe.

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10 Colocado no passado a partir da ligação teórica e ideológica dos dependentistas com o governo da Unidade Popular, no Chile, e em menor proporção com o nacionalismo burguês no Brasil, a partir da primeira gestão de Leonel Brizola, na condição de governador do Estado do Rio de Janeiro, os limites da Teoria da Dependência é mais uma vez recolocado pela realidade concreta das forças políticas que configuraram na América Latina um novo quadro de governos de conciliação de classe, cujo setor hegemônico foi o grande capital.

Desse modo, em nossa compreensão, a expressão máxima da limitação da Teoria da Dependência reside no campo político e é caracterizada pela sua recorrente crítica sem ruptura programática diante de Governos de Frente Popular ou nacional-burguês.

Nesse caso, o silêncio analítico da maioria dos novos formuladores da Teoria da Dependência diante do caráter de classe de governos burgueses como de Hugo Chávez, Nicolas Maduro, Lula, Dilma, Néstor e Cristina Kirchner, Rafael Correa, Pepe Mujica, Tabaré Vázquez e Evo Morales, governos esses que aprofundaram os patamares de subordinação dos países latino-americanos nas últimas duas décadas, parece-nos herdado das debilidades políticas intrínsecas à própria Teoria da Dependência, cujo setor mais radical foi incapaz de superar nacionalismo-burguês e o frente-populismo.

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