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APORTUGUESAMENTOS DA LADAINHA LAURETANA NOS ARREOORES DE BRASfLlA

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Academic year: 2021

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GRUPO DE ESTUDOS LINGUiSTICOS W(1 ):61-65. 1985.

APORTUGUESAMENTOS

DA LADAINHA

LAURETANA

NOS ARREOORES DE BRASfLlA

Augostinus STAUB Odilo Pedro LUNKES UnB

o

Termo. Na liturgia antiga a palavra litania (de

Ai

T

n

=

orat;:ao. que originou

Ai

T (lV£

1:

(l =sequencia de orat;:oes). tinha 0significado depro· cissao. Os historiadores eclesiasticos chamam de ladainha, nao somente as supli· cas cantadas ou rezadas nas procissoes. mas as pr6prias procissiies, bem como as pessoas que delas participavam. Hoje 0 termo ladainha denota uma forma de

orat;:ao que consiste num conjunto desuplicas, aclama~oes ou invoca~iies, can-tadas ou rezadas por um ministro. cantor ou rezador •.respondidas em cora com refroes ou respostas fixas pelos fi~is.

Origem. 0 tipo de orat;:§o. conhecido na Igreja Cat61ica sob 0nome de ladainha, ja era conhecido na antiguidade. Com invocat;:5es parecidas com as invocat;:oes das ladainhas de hoje, os gregos suplicavam a Ate que os protegesse da cegueira e de suas graves consequencias. Os assirios rezavam ladainhas para ex· conjurar os espiritos maus. Os habitantes do Egito antigo aplacavam os deuses re-citando os seus titulos honorificos. Prevendo a realizat;:§o de uma batalha san-grenta. Val~rius Licinianus Licinius (250·325), imperador romano, reunia os sol· dados sob seu comando e com eles rezava a ladainha que segue:Summe Deus, te rogamus; Sancte Deus, te rogamus; Omnem iustitiam tibi commendamus; Salutem nostram tibi commendamus; Imperium nostrum tibi commendamus. No Antigo Testamento temos provas que os judeus tambem conheciam asladainhas.

o

Salmo 45 divide-se em tr~s partes. Cada parte termina com 0refrao ou res-posta "Conosco esta 0 Senhor dos Exercitos; nosso baluarte ~0Deus de Jac6".

As duas primeiras partes do Salmo 66 sac seguidas pelorefrao: "Que Vos louvem os povos. 6 Deus. que todos os povos Vos louvem". Todo 0 Salmo 79 ~ com·

posta de 5 partes. No fim da primeira. segunda e quinta. 0mesmo refrao ou

res-posta "Restaurai-nos, 6 Deus, mostrai-nos 0 vosso rosto propicio. e seremos

salvos" ~ repetido. 0 Salmo 98 tem estrutura identica. A segunda e a terceira parte sac encerradas pelo refrao "Exaltai 0Senhor. nosso Deus.prostrai-vos ante

o escabelo de seus pes: Ele e santo". Osrefroes eram rezados e cantados pelo povojudeu.

As ladainhas cristas provavelmente tiveram origem no seculo IV, na cidade de Antioquia, penetrando posteriormente. em todo 0 territ6rio da Asia

Menor, em Constantinopla e no resto da Europa. A Ladainha dos Santos foi a primeira a ser estruturada e serviu de modelo para ladainhas posteriores.

A Ladainha Lauretana ou de Nossa Senhora, deriva 0 nome de

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STAUB, A. e LUNKES, O. P. - Aportuguesamentos da Ladainha Lauretana nos arredores de Bresllia. GRUPO DE ESTUDOS L1NGUISTICOS, 12(11:61-65,1985

residencia da 5agrada Familia em Nazare, milagrosamente transportada para a ci-dade italiana e transformada em santuario cristao, dedicado a Maria, Mae de Jesus. De acordo com Roschini (1948: 167), as primeiras formas dessa Ladainha devem ter surgido no seculo XII. Nicholas (1875: 200) afirma que "L'epoque de leur institution est assez incertaine".

Apesquisa. Em 1982, um grupo de professores da Universidade de Brasilia iniciou a eXeCUl;:aOdo projeto de pesquisa A Ladainha Lauretana cantada nos arredores de Brasflia. Objetivo da pesquisa: verificar a situa~ao atual da Ladainha, cantada em latim. Cinco informantes, velhos moradores de Planaltina GO e de Planaltina OF foram selecionados de acordo com um criterio: que con-seguissem cantar a Ladainha Lauretana do in(cio ao fim. Os cinco informantes apresentam as caraeter(sticas que seguem: (1) sac pessoas de idade. Nao encon-tramos mo~os que soubessem cantar a Ladainha. Os velhos nao mais a enslnam aos mais novos por falta de interesse destes. Prev4-se, em consequencia, 0

desapa-recimento desse costume tradicional; (2)sac sofrivelmente alfabetizados, capazes de decifrar, com muita dificuldade. um texto impresso; (3) tem renda familiar baixa; (4) trabalham a meia nas fazendas de latifundiarios; (5) estao estabeleci· dos nos arredores de Brasilia por um m(nimo de 4/5 de suas vidas; (6) todos aprenderam a cantar a Ladainha dos padrese dos mais velhos na localidade onde moram.

A Lingua. 0 fato de cantarem a Ladainha lauretana em grego e latim1 e ignorado pelos informantes. Todos sao unanimes em afirmar que a cantam em portugues. Eis a transcri~ao de alguns pareceres emitidos:

Informante I:"~ portugues. Um portugues esquisito".

Informante II: "A gente canta a ladainha em portugu4s. 56 podia ser. ~ a (mica lingua que 0pessoal que mora por aqui sabe. Da ladainha a gente

entende pouco".

Informante III: "Canto a ladainha em portugues. Em brasileiro. Nao eo brasileiro da gente".

Informante IV: "~ portugues que era falado pelos padres nas ora~oes da missa e que a gente nao eritendia".

Informante V: "A I(ngua da ladainha nao e latim nao. ~ portugues. Um portugues que a gente nao entende".

Na pesquisa, 0 original da ladainha lauretana, aprendido dos

padres, recebe 0 nome demodelo. Este, ap6s sofrer adapta~{jes por parte dos

in-formantes, recebe 0 nome dereplica. Poradapta~{jes entendemos 0conjunto de

modifica~{jes Que 0modele original sofre ao tornar-se replica. Na pesquisa sac

analisadas as adapta~{jes do modelo original feitas por cinco informantes. Em outras palavras analisamos cinco replicas.

Osaportuguesamentos. Certas invoca~{jes ourespostas domodele da Ladainha Lauretana sao quase irreconhedveis nas replicas dos informantes. Estes, em vez de entenderem as invoca~{jes ou respostas originais, associam as mesmas. ou parte das mesmas, a uma forma ou a formas conhecidas do

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por-STAUB, A. e LUNKES, O. P. - Aportugu_mentos d. Led.inh. L.u•.•••ne no•••. redo•.••

de Bresflie. GRUPO DE ESTUDOS L1NGU~T1COS,1Q(11:61-65,1985.

tugu~s. A esse processo deassocia~ao,em geral provocado pela semelhan~ fone~ tica. Hermann Paul (1920: 109-20) da 0nome deana/ogia. No presente trabalho recebe 0 nome deaportuguesamento. Tambem poderia ser chamado deetim%gia popular ou homonfmia popular. Varios aportuguesamentos da Ladainha

Laure-tana refletem 0 linguajar caipira do interior do Estado de Goias. Em geral nao ha

uniformidade nos aportuguesamentos que podem variar bastante de um infor-mante para 0outro.

Osaportuguesamentos da Ladainha Lauretana podem ser de varios tipos: (1) de invoca~oes inteiras que conservam 0significado do mode/o; (2) de invoca~oes ou respostas inteiras que 030conservam 0significado original do mo-delo; (3) de constituintes de invoca~oes ou respostas associadas a formas portu-guesas com outro significado. Ex.: Modelo: Sancta Trinitas unus Deus. R~plica: Ai de n6s Deus (II); (4) de constituintes deinvoca~oesourespostasassociados a formas portuguesas com 0 mesmo significado. Ex.: Modelo: Filo Redemptor mundi Deus. R~plica: Filho Redentor (I); (5) pelo emprego do homonimo portu-gu@s do latim. Ex.: Modelo: Virgo prudentissima. Replica: prudentlssima (I, II, IV, V); (6) de partes de constituintes deinvoca~oesdomodelo que. por analogia, tornaram-se idt1nticas a partes de itens lexicais portugueses. comuns na religiao cat6lica. Apesar de os vocabulos proparox(tonos relativos serem pouco comuns no portugu~s caipira do Estado de Goias. surgiram em algumas r~plicas, por pro-vavel analogia apurgatorio, as formas criatorio (III. V) da invocac;:aoMater Crea-toris, aflitorio, da invocac;:ioConso/atrix afflictorum.

Dos seis tipos de aportuguesamentos citados 56 apresentamos todos os exemplos dos dois primeiros:

1 - aportuguesamentos de invoca~oes inteiras que conservam 0

signi-ficado domode/o. 2

10 -Modelo: Sancta Maria

Replica: Santa Maria (I, II. III. IV. V) 31 -Modelo: Sedes sapientiae

Replica: Sede da sapienc;:a (sapiencia) (IV) 33 -Mode/o: Vas spirituale

Rep/ica: Vase espiritual (I. III, IV, V) 37 -Modela: Turris davidica

Rep/ica: Torre davldica (I, II. III. IV, V) 42 -Modelo: Stella matutina

Replica: Estrela matutina (I. II. III. V)

2 .aportuguesamentos de invocac;:c3esou respostas inteiras que nao conservam 0significado do modele

7 -Modelo: Fili Redemptor mundi Deus Rep/ica: Filho da turma de Deus (V) 8 -Modela: Spiritus Sancte Deus

Replica: Esplrito Santo de Deus 9 .Modelo: Sancta Trinitas unus Deus

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STAUB, A. e LUNKES, O. P, - Aportuguesamentos da Ladainha Lauretana nos arredores de Brasilia. GRUPO DE ESTUDOS L1NGUISTICOS, 19(1 ):61-65,1985

15 - Modelo: Mater purissima Replica: Matei purlssima 16 - Modelo: Mater castissima (II)

Replica: Matei caStissima (II) 27 - Modelo: Virgo potens

Replica: Vergais os potes (II) 30 - Madela: Speculum justitiae

Replica: 0 espeto na justiva (II) Peco na justic;:a (IV, V) 32 - Madela: Causa nostrae laetitiae

Replica: Casa nobre estrela triste (I V) 33 - Madelo: Vas spirituale

Replica: Voz espiritual (II) 35 - Modelo: Vas insigne devotion is

Replica: Vos consigo devoc;:ao (IV) 36 - Madelo: Rosa mistica

Replica:

0

via mlstica (V) R6sea m Istica (III) 42 - Madelo: Stella matutina

Replica:

0

estrela matutina (III) 51 - Modelo: Regina3 Martyrum

Replica: Regina mar 52 - Modelo: Regina Confessorum

Replica: Regina Confessore (confessor) (I) Regina confessora (II)

53 - Madelo: Regina Virginum Replica: Regina virge(m) (IV) 58 - Modelo: Regina pacis

Replica: Regina passa (III, V) 59 - Modelo: Parce nobis Domine

Replica: Paz e n6s que dorme (IV) Modelo: Ora pro nobis

Replica: Ora pro (para 0nobre) (I) Orais pro (para 0) nobre (I) Oras pro (para 0) nobre (I) Orai pro (para0) nobi (nobre) (V)

Nas orat;5es Introdut6rias ou Oferecimentos que precedem as repli-cas de dois informantes (II, V), rezadas em latim, tambem encontramos aportu-guesamentos de sentenc;:asinteiras que nao conservaram 0significado do modela.

Madelo: Deus in adjutorium meum intende Replica: Deus meu adjut6rio me entende (II) Modelo: Domine ad adjuvandum me festina Replica: (Em) nome de Joana e Faustina (II)

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STAUB, A. e lUNKES, O. P. - Aportuguesamentos da ladainha Lauretana nosarredores de Brasilia. GRUPO DE ESTUDOS lINGUISTICOS, 19(11:61-65,1985.

Modelo: Sicut erat in principio Replica: Se pudera do princfpio (II)

Se pudera no princfpio (V)

Modelo: Et nunc et semper Replica: E que nao cai sempre (II)

A pesquisa revela que certas invocat;:i5es e respostas, aportuguesadas nas localidades citadas, nao 0sao em outras:

2 - Modelo: Christie, eleison

Replica: Cristel (c1ister) em nos

26 - Modelo: Virgo praedicanda

Replica: Verga 0pe de cana

41 - Modelo: Janua coel i

Replica: JfJ nao hfJ ceu

59 - Modelo: Agnus dei qui tollis peccata mundi

Replica: Agua de Deus que atola a precata

(alpercata) imunda.4

1 -As trils primeiras invoca<;:oes em idioma grego e as cinquenta restantes em idioma latino.

2 - 0 numero que precede 0modelo da invoca<;:aoindica a posi<;:aoque 0mesmo

ocupa na Ladainha Lauretana

3 - 0 tItulo Regina (rainhal do modelo, que ocorre da invoca<;:ao47

a

invoca<;:ao 59 e interpretado como nome proprio Regina, dado a pessoas do sexo femi-nino.

4 - Aportuguesamentos na regiao de Catalao, Goias. Informa<;:oes prestadas pelo professor Dr. Antonio Salles Filho, Departamento de Letras e Lingulstica, UnB.

NICHOLAS, Auguste. Vierge Marie vivant dans L·~lise. Paris, Librairie Poussiel-gue, 1875.

PAUL, Hermann. Prinzipien der Sprachgeschichte. Tubingen, Max Niemeyer Verlag, 1920. (5<;1 edi<;:aol.

ROSCHINI, Gabriele M. Maria Santissima nella storia delia salvezza. Isola del Liri, Tipografia Editrice M. Pisani, 1948.

Referências

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