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Cópia do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo de registo da marca nacional n , Bobby Jones.

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Cópia do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça profe- rido no processo de registo da marca nacional n.° 307 251, Bobby Jones.

53/01-1 -Revista.

Relator: conselheiro Pinto Monteiro.

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Jus- tiça:

I - Escortkid Company Limited interpôs recurso do despacho do presidente do Instituto Nacional da Proprie- dade Industrial que recusou o registo da marca n.° 307 251, Bobby Jones, para a classe 42.ª, em que é parte contrária Jonesheirs, Inc.

A direcção do Serviço de Marcas defendeu o despacho em causa.

Jonesheirs Inc. deduziu oposição ao recurso interposto. Foi proferida sentença que julgou improcedente o recur- so, confirmando a decisão do INPI. Apelou a recorrente.

O Tribunal da Relação confirmou o decidido. Inconformada, recorre a autora para este Tribunal. Formula as seguintes conclusões:

O acórdão a quo aplicou erradamente a lei, designa- damente o Código da Propriedade Industrial [arti- go 16.°, n.° 2, artigo 17.°, n.° 1, artigo 32.°, n.° 1, alínea b), artigo 189.°, n.° 1, alíneas g) e m), e arti- go 25.°, n.° 1, alínea d)], o Código do Procedimen- to Administrativo (artigo 133.°, n.° 2), o Código de Processo Civil (artigos 2.° e 3.°-A e artigo 201.°, n.° 1) e a Constituição (artigos 2.°, 20.° e 268.°, n.° 3); A recorrente não foi notificada do último articulado da recorrida e, quando pretendeu pronunciar-se, o seu articulado já não foi considerado, pelo que lhe foi violado o n.° 2 do artigo 16.° e artigo 17.° do Código da Propriedade Industrial, pelo que, dada a omissão dessa formalidade essencial, o acto re- corrido do INPI é nulo, resultando nulidade de todo o processado após a apresentação desse ar- ticulado pela parte contrária;

O atrás referido constitui também uma violação do princípio do contraditório (artigos 2.° e 3.°-A do CPC);

O próprio despacho recorrido refere expressamente que «a discussão findou numa exposição feita pela reclamante», pelo que confirma e prova que não se chegou sequer ao conhecimento da entidade recorrida a posição da recorrente sobre o último articulado da recorrida, cujo teor foi uma das ba- ses do despacho recorrido, pelo que essa omis- são é essencial e constitui preterição de formali- dade que pode influir na decisão da causa (artigo 201.°, n.° 1, do CPC);

O princípio do contraditório é substancial e neste caso ficou frustrado, pelo que, também com esse fun- damento, o despacho é nulo;

Além disso, o despacho também seria anulável por padecer de violação da lei por erro nos pressupos- tos, por esse mesmo motivo;

Não procede a invocação do acórdão de que o n.° 1 do artigo 32.° só se aplica no caso de concessão, e não em recusa;

A lei nova da propriedade industrial é pouco precisa em alguns conceitos e aqui é um caso de lapso, pois fala em títulos quando devia ser «registos», assim como em concessão, quando devia falar de concessão ou recusa;

Houve também inconstitucionalidade, pois a violação do princípio do contraditório representa violação do direito de igualdade, previsto nos artigos 2.° e 20.° falta a notificação do artigo 268.°, n.° 3, todos da Constituição;

Há falta de ilegitimidade da parte contrária porque a recorrida apenas veio a adquirir um direito de pro- priedade industrial após a sua intervenção inicial no processo, pelo que há ilegitimidade inicial, e é nesse momento que deve ser apreciada e não pos- teriormente;

O artigo 189.°, n.° 1, alíneag), do CPI não pode ser invocado por quem não é o próprio ou herdeiro até ao 4.° grau nem juntou procuração a favor do procurador habilitado para intervir;

A lei fala em herdeiro até ao 4.° grau, pelo que exclui herdeiros do 5.° ou mais graus, aspecto que as instâncias não curaram saber, apesar de alegado, o que origina omissão de julgamento;

A expressão «Bobby Jones» não é nome inglês ou americano, nem é o nome da parte contrária, que é «Jonesheirs», nem a parte contrária é herdeira de ninguém até ao 4.° grau;

Os direitos publicitários de uma expressão, conferi- dos por pretensos herdeiros de um senhor faleci- do há mais de 50 anos, com base numa declara- ção da própria parte contrária, não configuram o pressuposto do artigo 189.°, n.° 1, alíneag), nem podem ter a virtualidade de impedir o registo de uma marca para restaurante e bar em Portugal onde tal nome nem sequer é ou foi conhecido; Como está demonstrado, a expressão «Bobby Jones»

já foi registada em Portugal, sem qualquer proble- ma, para «artigos de ginástica e desporto», pelo INPI;

A parte contrária veio adquirir essa marca para de- terminar a sua ilegitimidade, sendo esse o único direito que pode invocar;

A invocação desse direito marcário (a marca n.° 295 408, mista, também Bobby Jones, para artigos de ginástica, desporto, etc.) não pode im- pedir o registo da marca em apreço, nem com fun- damento no artigo 189.°, n.° 1, alínea m), nem com fundamento na aplicação do artigo 25.°, n.° 1, alínea d);

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A pretensa invocação da concorrência desleal para opor tal marca [artigo 25.°, n.° 1, alínea d)] não é conforme ao entendimento que deve ser dado a este instituto;

Conforme é pacífico entre os autores que se cita- ram - Oliveira Ascensão, Patrício Paúl, Carlos Ola- vo, Américo da Silva Carvalho, entre outros auto- res portugueses: «O acto de concorrência desleal pressupõe concorrência e assenta num acto de apropriação de clientela alheia»;

Oliveira Ascensão refere: «Se não houver concorrên- cia entre empresas não poderá haver concorrência desleal»; Américo da Silva Carvalho: «Obter uma maior quota-parte no mercado»; Carlos Olavo: «Prejuízo de uma clientela alheia, efectiva ou po- tencial»; Patrício Paul: «Produtos ou serviços em relação de substituição ou complementariedade»; Ramella e Roubier dizem: «O desvio da clientela não basta por si só para caracterizar a concorrência desleal, pois o acto da concorrência tem por mó- bil o aumento da clientela própria à custa da cli- entela alheia»;

A nossa jurisprudência é também clara ao estabele- cer os limites do entendimento da concorrência: o 5.° Juízo considera «absolutamente diferentes a ac- tividade de um restaurante e marca de vinhos»; a Relação considera que «onde não houver possi- bilidade de concorrência, não tem razão de ser a sua aplicação no que concerne ás normas protec- toras dos direitos nele [CPI] consagrados» (Acór- dão de 12 de Setembro de 1998); noutro aresto refere que o titular da marca «não possa opor-se à sua utilização em quaisquer produtos diferentes ou dissemelhantes» (Acórdão de 24 de Setembro de 1999); noutro aresto refere que se os produtos «não têm aptidão para satisfazer as mesmas neces- sidades, não havendo concorrência, não há con- corrência desleal» (Acórdão de 13 de Maio de 1999); o STJ considerou que não se confundiam «têxteis em bruto» com «tecidos e artigos de ves- tuário» (Acórdão de 21 de Maio de 1981) e consi- derou mesmo que não há usurpação da marca entre produtos e serviços (Acórdão de 10 de De- zembro de 1997); define ainda concorrência como «o esforço no campo da actividade económica de outrem no sentido de atrair clientela» (Acórdão de 7 de Janeiro de 1958);

Não faz sentido pretender que há concorrência entre artigos de ginástica e desporto e ou serviços de um restaurante ou bar, pois, num caso, é produ- ção, no outro, são serviços, sendo a clientela to- talmente diferente, não podendo ser aferida pelo critério do acórdão: alguém está num local ou a fazer desporto e nesse local pode haver um res- taurante... tem de haver limites! Ninguém que pre- tende comprar um artigo de ginástica ou desporto se engana e vai comer a um restaurante!; Não há concorrência entre «artigos de ginástica e

desporto» e «restaurante e bar (serviços hotelei- ros)», pelo que não pode haver concorrência des- leal, que, aliás, nunca haveria em qualquer circuns- tância, mesmo potencial;

Deve ser dado provimento à revista e revogado o acórdão recorrido, anulando-se o acto de recusa

do INPI e dando-se oportunidade à recorrente de aí defender a sua posição, proferindo o INPI novo despacho de concessão da marca Bobby Jones para a classe 42.ª, «restaurante e bar».

Contra-alegando, a recorrida defende a manutenção do decidido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. 11- Vem dado como provado:

Escortkid Company Limited requereu o registo da marca n.°307 251, meramente nominativa, constituí- da pela expressão «Bobby Jones», em 13 de Fe- vereiro de 1995, para assinalar «serviços de bar, hotelaria e restaurantes», da classe 42.";

Reclamou, no processo administrativo, Jonesheirs, Inc., em 10 d e Novembro de 1995;

A ora recorrente contestou tal reclamação em 13 de Fevereiro de 1996;

Em 11 d e Setembro de 1996, a ora recorrente apre- sentou no processo administrativo uma resposta a uma exposição suplementar que havia sido apre- sentada pela Jonesheirs, Inc.;

Escortkid Company Limited teve conhecimento da re- ferida exposição suplementar em Agosto de 1996; Em 12 de Setembro de 1996, foi proferido despacho de recusa do registo da marca n.° 307 251, Bobby .Jones, que foi publicado no Boletim da Proprie- dade Industrial, n.° 9/96, de 3 1 de Dezembro; É do seguinte teor o parecer que fundamentou tal des-

pacho: «Ao proceder ao estudo do presente pedi- do de registo, verifico que houve oposição de Jonesheirs, Inc., invocando todos e quaisquer di- reitos ao nome do falecido jogador de golfe Bo- bby Jones, a que a requerente respondeu e a dis- cussão findou numa exposição feita pela reclamante. A meu ver, a exposição é procedente porque, além de a marca registada conter um nome individual e para o qual não tem a devida autori- zação, a sua eventual concessão poderia favore- cer actos de concorrência desleal com a marca nacional n.° 295 408, Bobby Jones, da reclamante. Proponho, por isso, a recusa do registo nos ter- mos dos artigos, conjugados, 25.° n.° 1, alínea d), e 189.°, n.° 1, alínea g), do CI»;

Jonesheirs, Inc., é titular da marca registada n.° 295 408, Bobby Jones, que foi registada em Portugal pela Callaway Golf Company, com o prévio consenti- mento e autorização da reclamante no processo administrativo, no âmbito de um acordo de licen- ciamento;

Tal marca foi transferida para Jonesheirs, Inc., devi- damente averbada, em 21 de Junho de 1996; Tal marca assinala «artigos de ginástica e desporto,

aparelhos para o golfe não incluídos noutras clas- ses, tacos, bolas e sacos de golfe, resguardos para os tacos de golfe, partes e acessórios para estes produtos não incluídos noutras classes»; Bobby Jones foi um jogador de golfe;

Em 1985, os legítimos herdeiros de Bobby Jones for- maram Jonesheirs, Inc., uma sociedade do Estado de Geórgia, com a finalidade de controlar e explo- rar o uso do nome e figura de Bobby Jones, ten- do os herdeiros de Bobby Jones transferido os

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seus direitos de publicidade do nome e figura de Bobby Jones para Jonesheirs, Inc., sendo esta so- ciedade a proprietária de todos os direitos, títulos e interesse no nome e figura de Bobby Jones; Jonesheirs, Inc., não deu autorização à ora recorrente

para autorização do nome Bobby Jones.

III - A recorrente requereu o registo da marca n.° 307 251, constituída pela expressão «Bobby Jones». A ora recorrida reclamou, vindo a ser proferido despacho de recusa.

Interpostos competentes recursos, as instâncias manti- veram o despacho do presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

Daí o recurso para este Tribunal. São várias as questões colocadas:

Nulidade do acto recorrido por omissão de formali- dade essencial e violação do princípio do contra- ditório;

Inconstitucionalidade por violação do mesmo princí- pio do contraditório;

Falta de legitimidade da parte contrária;

Ausência de fundamentos para recusa do registo; Inexistência de concorrência desleal.

Vejamos a primeira das questões suscitadas, revendo, a tal propósito, a marcha processual.

A ora recorrida reclamou contra o pedido do registo da marca em causa e, notificada a aqui recorrente, veio con- testar tal reclamação.

Em 12 de Julho de 1996, a reclamante juntou uma expo- sição complementar e, em 11 de Setembro de 1996, a recor- rente apresentou a competente resposta.

Com data de 12 de Setembro de 1996, foi lavrada pro- posta de recusa do registo e na mesma data proferido despacho de indeferimento.

A exposição complementar é consentida por lei quando se mostre necessária para melhor esclarecimento do pro- cesso (artigo 17.°, n.° 2, do Código da Propriedade Indus- trial).

Aceite a exposição, deveria ter sido notificada a recor- rente. Não o tendo sido, existiu omissão de formalidade essencial e violação do princípio do contraditório, com a consequente nulidade, conclui a recorrente.

Pensamos que não tem razão.

A notificação serve no caso para dar conhecimento de um acto (artigo 228.°, n.° 2, do Código de Processo Civil). Ora, a recorrente, como expressamente admite, teve conhe- cimento da exposição em Agosto de 1996.

Não resulta que o seu direito tenha sido lesado ou o princípio do contraditório violado, uma vez que a recorrente tempestivamente apresentou a competente resposta. Nem o contrário se pode concluir do facto de a recorrente ter eventualmente direito a um prazo maior, já que ninguém é obrigado a esgotar os prazos legalmente concedidos.

Mas, sustenta a recorrente, e é esse o cerne da sua tese, a resposta apresentada não foi tida em conta. O despacho de recusa terá sido proferido sem ter em consideração os argumentos expendidos pela recorrente.

O despacho enfermaria assim de erro nos pressupostos. Vem provado que o despacho é posterior à apresenta- ção da resposta, contrariamente ao que a recorrente defen- deu inicialmente.

Sendo assim, é obviamente impossível concluir qual o grau de atenção e reflexão que mereceu a resposta. Terá sempre que se presumir que qualquer articulado (ou pare- cer, por exemplo), mereceu de quem decide a atenção que, necessariamente, deve merecer.

Afigura-se-nos evidente que nunca se poderá concluir com um mínimo grau de certeza se o juiz analisou devida- mente o documento, se a resposta à contestação foi devi- damente ponderada, se o articulado subsequente funda- mentou ou não a sua convicção.

O que é susceptível de ser atacado via recurso é o re- sultado objectivo concretizado no processo e não a moti- vação psicológica que terá originado a decisão.

O que se impugna são as decisões e não as reflexões que as terão produzido.

Nem procede o argumento central das alegações de que na informação consta que «a discussão findou numa ex- posição feita pela reclamante».

Desde um mero lapso de escrita ou uma redacção não cuidada até uma concepção não correcta do que significa findar a discussão, muitas explicações são possíveis.

O que há de concreto e ao que o julgador tem de dar relevância é o facto de a resposta ter sido apresentada, constar dos autos e ter sido junta ao processo antes do despacho de recusa.

Resulta do que está dito que não existe violação do princípio do contraditório.

Acrescentar-se-á, contudo, algo mais.

U m dos princípios fundamentais vigentes no nosso Processo Civil é o princípio do contraditório, desde logo realçado no artigo 3.°, n.° 3, do CPC, que estipula dever o juiz observar, e fazer cumprir ao longo de todo o pro- cesso, tal princípio, não Ihe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.

O princípio do contraditório e o princípio da igualdade das partes (artigo 3.°-A do CPC), não estando autonoma- mente consagrados na Constituição, possuem, contudo, dignidade constitucional por derivarem, em última instân- cia, do princípio do Estado de direito e constituírem ema- nações directas do princípio da igualdade. Assim tem sido entendido pelo Tribunal Constitucional - por exemplo no Acórdão n.° 516/93, de 26 de Outubro, in Boletim do Mi- nistério da Justiça, n.° 430, p. 179.

Nenhuma decisão deve ser tomada pelo juiz sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilida- de ao sujeito processual contra quem é dirigida de a dis- cutir, de a contestar, de a valorar - Prof. Miguel Teixeira de Sousa - Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2.ª ed., p. 47.

Às partes deve ser dado conhecimento de tudo quanto se passe no processo e possa ter interesse.

No caso, uma exposição complementar é algo de pro- cessual e substancialmente relevante e que, como tal, deve ser dada a conhecer à parte contrária, exactamente para esta se poder opor e contra-argumentar em favor da sua tese. Violar o princípio do contraditório e da igualdade das partes seria em concreto não se ter dado conhecimento à ora recorrente da exposição ou não se lhe ter dado a co- nhecer por forma a poder pronunciar-se tempestivamente. Então, sim, estar-se-ia face a uma nulidade que influiria decisivamente no exame e decisão da causa.

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Mas não foi isso que aconteceu.

A recorrente teve conhecimento da exposição e dedu- ziu em tempo oposição. É certo que não se apurou por que forma a recorrente conheceu o articulado, mas o certo é que o fim último da notificação foi alcançado.

Não há assim violação de qualquer princípio ou incons- titucionalidade que daí decorra.

Analise-se seguidamente a problemática da invocada ile- gitimidade da recorrida.

Sustenta a recorrente que há ilegitimidade da parte con- trária porque esta apenas veio a adquirir um direito de propriedade industrial após a sua intervenção inicial no processo e, por outro lado, o artigo 189.°, n.° 1, alínea g), do CPI não pode ser invocado por quem não é o próprio ou herdeiro até ao 4.° grau.

É preciso não confundir o problema da legitimidade com a questão de fundo.

A legitimidade afere-se pelo interesse directo em deman- dar ou contradizer, interesse esse que se exprime pela uti- lidade derivada da procedência da acção ou pelo prejuízo que dessa procedência advenha (artigo 28.°, n.°S 1 e 2). Consagrando uma orientação desde há muito maioritária na jurisprudência, o n.° 3 determina que, na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interes- se relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.

Ora, tal como a relação controvertida está configurada, a recorrida, atento o interesse directo que tem na causa, tinha legitimidade para intervir.

Saliente-se, aliás, que, estando-se no campo da proprie- dade industrial, o conceito de interesse directo tem uma maior latitude, já que pode reclamar da apresentação do pedido «quem se julgar prejudicado pela eventual conces- são de registo» (artigo 185.°, n.° 1, do CPI).

Segundo a factualidade apurada pelas instâncias, os herdeiros de Bobby Jones transferiram para a ora recorrida os seus direitos de publicidade do nome e figura de Bo- bby Jones.

A exploração económica de tais direitos é susceptível de ser cedida e é com base nessa transferência que a re- corrida tem interesse na recusa, por se julgar prejudicada. Saber se a parte contrária é ou não prejudicada prende- -se já com a questão substancial e não com o problema processual-formal da legitimidade.

Analise-se então a problemática de fundo.

Está em causa a marca n.° 307 251, constituída pela ex- pressão «Bobby Jones», para assinalar «serviços de bar, hotelaria e restaurante», da classe 42.ª

A recusa do registo fundou-se no entendimento de que a marca registanda contém um nome individual para o qual a requerente não tem a devida autorização, além de que a sua eventual concessão poderia favorecer actos de con- corrência desleal com a marca nacional n.° 295 408, Bobby Jones, pertencente à reclamante e ora recorrida.

Socorreu-se a informação e o consequente despacho do disposto nos artigos 189.°, n.° 1, alínea g), e 25.°, n.° 1, alínea d), do Código da Propriedade Industrial.

As instâncias entenderam que era correcta a recusa. O artigo 189.°, n.° 1, alínea g), do CPI estipula que será recusado o registo das marcas que contrariem o disposto nos artigos 165.°, 168.° e 183.° ou que, em todos ou alguns dos seus elementos, contenham nomes individuais ou re- tratos sem obter permissão das pessoas a quem respeitem e, sendo já falecidos, dos seus herdeiros ou parentes até

ao 4.° grau, e, mesmo quando obtida, se produzirem o des- respeito ou desprestígio daquelas pessoas.

Vem, a propósito, dado como provado que Bobby Jo- nes foi um jogador de golfe. Em 1985, os legítimos herdei- ros de Bobby Jones formaram a Jonesheirs, Inc., uma socie- dade do Estado da Geórgia, com a finalidade de controlar e explorar o uso do nome e figura de Bobby Jones, trans- ferindo os seus direitos de publicidade do nome e figura de Bobby Jones para a Jonesheirs, Inc., sendo esta socie- dade a proprietária de todos os direitos, títulos e interesse no nome e figura de Bobby Jones. Jonesheirs, Inc., não deu autorização à ora recorrente para autorização do nome Bobby Jones.

Como é sabido, ao Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista, só cumpre, em princípio, decidir ques- tões de direito e não julgar matéria de facto (artigos 729.° e 722.°, n.° 2, do Código de Processo Civil).

Face aos elementos trazidos até este Tribunal, tem de se concluir que se está perante nome individual. Aliás, que a marca está ligada ao nome do falecido jogador de golfe pode até avaliar-se pelo facto de a própria recorrente ter requerido o registo de uma outra marca (n.° 310 133) com o nome Bobby Jones associado a um desenho representan- do um jogador de golfe (documento a fl. 81).

Sendo assim, ao requerimento relativo ao pedido de re- gisto de marca deveria a requerente, além do mais, juntar documento comprovativo da autorização da pessoa cujo nome, firma, denominação social, insígnia ou retrato figure na marca e não seja o requerente. A omissão de tal docu- mento é fundamento de recusa [artigos 182.°, n.° 1, alínea d), e 25.°, n.° 1, alínea b), do CPI].

Suscita-se por fim a problemática da concorrência des- leal.

Em bem estruturadas e fundamentadas alegações, defen- de a recorrente que não existe concorrência desleal.

Estão em causa a marca nominativa Bobby Jones, des- tinada a assinalar «serviço de bar, hotelaria e restauran- te», que a recorrente pretende registar, e a marca Bobby Jones, requerida e autorizada em Portugal, de que a recor- rida é titular, e que se relaciona com «artigos de ginástica e desporto, aparelhos para o golfe, tacos, bolas e sacos de golfe, resguardos para tacos de golfe, partes e acessó- rios para estes produtos».

No nosso ordenamento jurídico, princípios como o da autonomia privada permitem e até estimulam a concorrên- cia, ou seja, no caso, a competição entre os vários agen- tes económicos com vista a alcançar posições de supre- macia no mercado.

Dada a grande variedade da oferta e a limitação das necessidades e capacidade de aquisição, o consumidor terá de escolher.

Se a concorrência é um dos pressupostos da iniciativa privada e da economia de mercado, a verdade é que a mesma tem de ter limites intrínsecos e extrínsecos, sendo aqueles constituídos pelas regras que disciplinam a pró- pria liberdade de concorrência.

O abuso dessa liberdade de concorrência poderá levar à concorrência desleal.

Daí que um dos fundamentos de recusa de registo seja o reconhecimento de que o requerente pretende fazer con- corrência desleal ou que esta é possível independentemente da sua intenção [artigo 25.°, n.° 1, alínea d), do CPI].

O conceito de concorrência desleal encontra-se estabe- lecido no artigo 260.° do CPI, onde se diz que quem, com

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intenção de causar prejuízo a outrem ou de alcançar para si ou para terceiro um beneficio ilegítimo, praticar qualquer acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade, incorre em punição.

Nos vários números do artigo, são exemplificados os vários tipos de concorrência desleal, exemplificação essa que, contudo, não é taxativa nem exaustiva.

Saliente-se que, relativamente à definição do conceito constante do artigo 202.° do Código de 1940, se passou a admitir a possibilidade de concorrência desleal quando houver intenção de alcançar para si ou para terceiro um beneficio ilegítimo.

A repressão da concorrência desleal não se esgota, aliás, nos dois referidos artigos. Desde logo no artigo 1.° do ci- tado Código se diz que a propriedade industrial desempe- nha a função social de garantir a lealdade de concorrência pela atribuição de direitos privativos, bem como pela re- pressão da concorrência desleal.

O Dr. Carlos Olavo, em Propriedade Industrial, 1997, p. 147, escreve que acto de concorrência desleal é, antes de mais, um acto destinado à obtenção de desenvolvimen- to de uma clientela própria em prejuízo de uma clientela alheia, efectiva ou potencial.

Existindo naturalmente concorrência entre as várias ac- tividades económicas, o problema que se coloca é o de saber quando a concorrência é desleal.

Entendem alguns autores que, para que se esteja perante um acto de concorrência desleal, é necessária a existência de uma certa «proximidade» entre as actividades desenvol- vidas pelos agentes económicos em causa, sendo o cerne da questão a definição de «proximidade».

Com base no que pensamos ser um entendimento res- trito do conceito, defende a recorrente que não pode exis- tir concorrência desleal entre «artigos de ginástica e des- porto» e «restaurante e bar (serviços hoteleiros)».

Afigura-se-nos que não é assim.

É evidente que existe «proximidade» entre actividades económicas idênticas ou afins, entendendo-se por afins as actividades que estiverem numa relação de substituição ou complementaridade.

Deve, contudo, ir-se mais longe.

Para que se verifique a flutuação na escolha dos consu- midores que caracteriza a concorrência, não é necessário que ambas as actividades económicas procurem satisfazer neces- sidades do mesmo tipo. Haverá concorrência «não apenas entre actividades económicas que estejam numa relação de identidade, substituição ou complementaridade mas ainda entre todas aquelas que se dirigem ao mesmo tipo de clien- tela» - Dr. Carlos Olavo, ob. cit., pp. 155 e 156.

Em concreto, uma marca que utiliza o nome de um joga- dor de golfe para assinalar artigos de ginástica e desporto, aparelhos para o golfe e acessórios pode ver a sua clien- tela afectada (sem intenção) por uma outra marca exacta- mente igual que se destina a serviços de restaurante e bar. Basta que se pense que os restaurantes e bares exis- tentes nas proximidades dos campos de golfe se dirigem ao mesmo tipo de clientela.

Mas não só por isso.

A marca «garante ao comprador que todos os produtos que a ostentam provêm da mesma empresa. O consumidor pode não a conhecer, é certo, mas sabe que só pode ser uma, exactamente aquela que tem direito ao uso exclusivo do sinal» - Nogueira Serens - A Vulgarização da Mar- ca, Coimbra, 1993, p. 9.

Ora, dada a especificidade do nome e a sua ligação ao desporto, designadamente ao golfe, com a amplitude de produtos e serviços que, directa ou indirectamente, abran- ge, é natural que o consumidor médio seja levado a pen- sar que serviços de hotelaria e o desporto em si estão li- gados, provindo da mesma empresa.

Essa confusão frustraria as expectativas que a recorrida possa ter de alargar a sua actividade a novos sectores, beneficiando do prestígio que, porventura, lhe possa ter trazido a comercialização dos artigos de desporto com o recurso à marca em causa.

Tem assim de se concluir que o despacho está correcto. Pelo exposto, nega-se a revista.

Custas pela recorrente.

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