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Tradução intersemiótica em Os Simpsons: A Streetcar named Marge

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Academic year: 2021

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Olívia Ribas de Farias

Universidade Federal da Bahia (UFBA) Resumo

Este trabalho tem como objetivo realizar uma análise da obra teatral de Tennessee Williams (1911-1983) A Streetcar named Desire (1947) relacionando com o segundo episódio dos Simpsons da quarta temporada A Streetcar named Marge (1992) de Jeff Martin, para estudar o modo como o texto literário é recriado na animação através de traços textuais paródicos. Almeja-se provar que a adaptação, quando discutida com os alunos de literatura de língua inglesa, pode auxiliar no processo de aprendizagem e tornar os mesmos mais críticos, com diversas visões de uma mesma obra.

Palavras-chaves: Simpsons - tradução intersemiótica - paródia

Abstract

The article has the objective of analyzing the play A Streetcar named desire (1947) by Tennessee Williams (1911-1983) as relates to the second episode of the Simpsons – fourth season - A Streetcar named Marge (1992) by Jeff Martin, in order to study the way the literary text is recreated in the animation through signs of parody. The aim is to prove that adaptations, when brought to students of literature in the English language, can be a helpful tool in their learning process, making them more critical as a result of different views derived from different exposures to a same work of art.

Key words: Tennessee Williams - A street car named Desire - The Simpsons.

Introdução

Este trabalho pretende apresentar uma análise do segundo episódio da quarta temporada da série de animação Os Simpsons, intitulado A Streetcar Named Marge (1992) de Jeff Martin. Este episódio foi escolhido como objeto de estudo por estabelecer um diálogo com a obra teatral A Streetcar Named Desire (1947) do dramaturgo norte-americano Tennessee Williams (1911-1983).

Contextualizando as obras e introduzindo o jogo intertextual entre diferentes formas de representação.

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das personagens Blanche DuBois e Stanley Kowalski. Ela é caracterizada como uma dama sulista, frágil, confusa e neurótica, que se entrega aos homens para resgatar seu amor próprio e sua vaidade perdida, bem como para tentar esquecer o suicídio de seu marido. Ao passo que, Stanley é casado com Stella, irmã de Blanche, caracterizado como um anti-herói, pois, trata-se de um sujeito rude, grosseiro e amante do sexo. Além disso, o mesmo expressa valores de uma sociedade contemporânea capitalista, em que o passado aristocrático da família de Blanche não possui tanta serventia.

No episódio A Streetcar Named Marge (1992), a obra dramática de Tennessee Williams ganhou uma versão paródica musical. Esta foi à alternativa escolhida pelos produtores da série de animação, por não receberem permissão do detentor dos direitos autorais da peça para adaptá-la a uma outra mídia. O episódio em questão foi criado no início dos anos 90, no momento em que aconteciam diversas transformações no mundo, como o fim da Guerra Fria, disputa entre o bloco capitalista liderado pelos EUA e o bloco comunista sobre o comando da Ex-União Soviética, e conseqüentemente o fim do comunismo. Desta maneira, os EUA consolidam-se como a única superpotência mundial, com seu sistema capitalista. Este sistema está diretamente relacionado à sociedade consumista, que incentiva à aquisição contínua de bens e serviços efêmeros como forma de sustentar a produção e o crescimento econômico.

Na releitura apresentada em Os Simpsons, Marge, que é caracterizada como uma dona de casa insatisfeita com a sua vidinha sempre igual, em que não é valorizada na sua condição de mulher, acaba participando da adaptação da peça do Tennessee Williams promovida pelo Centro Comunitário de Springfield, atuando como Blanche DuBois e Net, seu vizinho, como Stanley. Neste mesmo episódio, há também uma associação de comportamento entre Homer Simpson e o personagem de Tennessee Williams, Stanley, como se pode observar na cena em que Homer vai para o quintal e grita por Marge, tal como Stanley clamara por Stella na peça.

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dramaturgo norte-americano, há também alusões ao filme de Alfred Hitchcock., Os Pássaros (The Birds, EUA, 1963), quando Homer vai a uma creche apanhar a filhinha Maggie para levá-la a assistir o espetáculo de sua mãe Marge, acompanhado ainda por Bart e Lisa. Quando entram nesta creche, há bebês por toda a parte, todos quietos, sendo que o único som que se pode perceber ali é o que fazem com as suas chupetas; Homer aparece, então, movimentando-se de forma semelhante ao personagem principal de Hitchcock, entre os pássaros. Também em Os Pássaros, há um momento em que as aves aparecem quietas, emitindo os seus grunhidos característicos.

A segunda categoria proposta por Genette é a arquitextualidade, referindo-se ao que os títulos aludem. Na adaptação dos Simpsons, por exemplo, houve uma substituição do nome Desire do título do texto fonte pelo nome da personagem da animação Marge, que interpreta Blanche DeBuois no musical da série. Logo, o telespectador pode constatar que a animação fará uma parodia do texto fonte. Ao longo de todo o episódio, os personagens da animação fazem constantes alusões e reflexões sobre a peça do Tennessee Williams. De acordo com Genette, estas reflexões entre um texto e outro caracteriza sua terceira categoria a metatextualidade. Além disso, todas as informações e comentários que estão à margem do texto como as capas, ilustrações, prefácios e as dedicatórias representam a paratextualidade. No âmbito das artes performáticas têm-se os pôsteres, as pré-estréias, os comerciais, entre outros que influenciam a percepção da audiência em relação a estas artes. E por fim, o cinto tipo de transtextualidade é a hipertextualidade, evidenciando a relação entre o texto fonte ou hipotexto e o texto recriado ou hipertexto. Desta maneira, o episódio A Streetcar Named Marge (1992) é considerada um hipertexto do texto fonte, pois foi inspirado a partir da obra teatral do Tennessee Williams, ou seja, do hipotexto.

Estas categorias se relacionam mutuamente e são consideradas de grande relevância tanto para a análise fílmica como para o melhor entendimento e compreensão da audiência nas adaptações realizadas.

Apresentando Os Simpsons

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detalhados, abordam temas como corrupção política, violência urbana, homossexualidade, sistema de ensino decadente, críticas à vida em família, inclusive à própria cultura e à cultura do outro. Para ilustrar esse aspecto de crítica social e cultural, pode-se fazer menção ao fato de que no musical Oh! Streetcar! (nome que os produtores deram para a adaptação da peça de Tennessee Williams na animação, aludindo também à peça da Broadway Oh! Calcutta!) foram feitas diversas críticas à cidade sulista de New Orleans, denominada como a cidade das “lojas cafonas e caras, mal cheirosa, pobre, vil e lar de piratas, bêbados e prostitutas”. Então, os produtores de Os Simpsons, tiveram que pedir desculpas aos habitantes de New Orleans, quando na vinheta do episódio seguinte, Bart aparece escrevendo no quadro negro "I will not defame New Orleans".

Assim, ao longo dos anos, a televisão passou a ser não apenas um veículo de comunicação, mas um veículo indispensável para as grandes massas populares encontrarem entretenimento através, especialmente, de críticas sociais por vezes bastantes severas. O programa Os Simpsons constitui uma das séries mais populares e que está no ar desde dezembro de 1989, nos Estados Unidos, sendo exibido no horário nobre, às 20 horas, aos domingos pela emissora de TV FOX e para mais de 70 países. Além disso, trata-se de um programa de comédia de situações (sitcom1), que é um

gênero específico de seriado e sua característica mais relevante é representar costumes, hábitos, ideologias e preconceitos da sociedade através do riso. Contudo, ao longo do tempo, esta animação não se limitou apenas às características próprias da comédia de situações, mas expandiu suas possibilidades narrativas para outros gêneros do cinema, como a aventura e a ficção científica. Desta forma, esta série de animação, tornou-se um ícone da cultura de massa, atingindo um grande público, ao impor mitos de fácil universalidade com os quais a audiência pudesse se identificar.

Como afirma Umberto Eco em seu livro Apocalípticos e Integrados:

A cultura de massa colocada dentro de um circuito comercial está sujeita à “lei da oferta e da procura”. Proporciona ao público, portanto, somente o que ele quer, ou, o que é pior, seguindo as leis de uma economia baseada no consumo e sustentada pela ação persuasiva da publicidade, sugerindo ao público o que este deve desejar. (ECO, 1964, p.40)

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No episódio estudado, tem-se uma narrativa sendo contada dentro de outra, recurso conhecido como mis en abyme, em que personagens de uma família de classe média americana falam de uma obra canônica de tal maneira, que esse texto escrito em outra época se torna familiar e próximo do pólo receptor, já que adquire características da contemporaneidade. Dentre estas, ressalta-se a mudança de registro mais literário e formal para coloquial, pontuado por gírias e expressões do cotidiano do público-alvo. A adaptação e paródia nos Simpsons

As adaptações de obras literárias, tanto para a animação como para o cinema e televisão, ainda na atualidade, sofrem críticas negativas e preconceitos, havendo estudiosos que lhes atribuam os estigmas de infidelidade, traição, deformação, violação, vulgarização e profanação. Cada uma dessas palavras evoca uma carga semântica negativa e tende a privilegiar a idéia de superioridade da literatura sobre as artes performáticas. A afirmação de que uma determinada adaptação fílmica é “infiel” em relação ao texto fonte só vem a demonstrar o desapontamento do leitor e da audiência ao assistir o texto literário revisitado, pois o público muitas vezes vê tal recriação como um desvio profano da obra que lhe deu origem.

Contudo, a noção de fidelidade na adaptação fílmica é problemática, primeiramente, porque se trata de uma tradução para meios diferentes, logo, nem necessariamente melhor nem pior que o anterior, mas apenas diferente. Trata-se de uma tradução intersemiótica2, termo que veio ampliar o campo dos estudos da tradução e da

análise fílmica. O que ocorre é que o autor de um romance vai valer-se, predominantemente, do signo verbal para expressar suas idéias, enquanto que o diretor de um filme trabalha não só com as palavras, mas com vários outros elementos e recursos para ilustrar o que deseja: a performance dos atores, as trilhas musicais, os efeitos sonoros, de fotografia e os visuais, dentre outros. Cada meio tem suas próprias especificidades derivando de seus respectivos materiais de expressão. Assim, a linguagem cinematográfica apresenta uma ampla complexidade de recursos, devendo-se levar em conta que o processo de adaptação fílmica é um projeto coletivo, mobilizando

2 “interpretação dos signos verbais por meio de sistemas de signos não verbais, como, da arte verbal para

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o roteirista, o diretor e os colaboradores, ao contrário do que ocorre no processo de criação literária, sendo mais solitário.

Por tanto, as adaptações das obras literárias apresentam diferenças de conteúdo em relação ao texto de partida, tanto por causa dos aspectos já mencionados como também por causa do público alvo em que tais adaptações se destinam. Em Os Simpsons estas releituras são indiciais, pois se apropriam ou preservam alguns índices ou traços do texto fonte com o objetivo de satirizá-lo, parodiá-lo, ironizá-lo e de entreter a audiência. Trata-se de uma representação com uma proposta diferente da adaptação da peça A streetcar named Desire feita para a televisão, em 1995, pelo diretor Glenn Jordan, que é predominante icônica, ao procurar se aproximar do texto de partida.

Estas alusões freqüentes de obras literárias nos Simpsons são feitas através de traços textuais paródicos. Esta tendência contemporânea de brincar com o recurso da intertextualidade acaba, então, gerando um grande sucesso na série que, por meio de suas inúmeras releituras de obras clássicas, usa a paródia para divertir, informar e transgredir. A paródia representa a imitação de uma obra já existente, conhecida pelos leitores, espectadores e pela audiência com a intenção de satirizar, criticar ou polemizar temas diversos. Este elemento textual preserva algumas características da obra do texto de partida, mas o revisita não com a intenção de ser uma cópia do primeiro, contudo, para recriá-lo de modo que pareça diferente dele.

Logo, a paródia sugere um canto paralelo, primando pela diferença ou pela indexicalidade em relação ao texto de partida e não pela iconicidade ou pela semelhança com ele. É evidente que há um distanciamento crítico entre o texto a ser parodiado e a nova obra que emerge, sendo que tal distância aparece tracejada pela força da ironia, do humor, que pode ser bem-humorado ou depreciativo; que pode ser criticamente construtivo, como pode soar de modo destrutivo. Ademais, a paródia está relacionada ao burlesco, à farsa, ao pastiche, ao plágio, à citação e à alusão, mas também se mantém distinta deles.

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Considerações finais

Os traços indiciais presentes na adaptação de Os Simpsons levam o público que possui um certo conhecimento prévio do assunto, a identificar referências diversas. Nesse momento, se estabelece uma cumplicidade entre público-alvo e o diretor da animação, ao identificarem tais referencias. As releituras são importantes, pois ampliam a visão do público-alvo ao terem contato com várias interpretações da mesma obra e proporcionam motivação à audiência a ter acesso à obra fonte.

Regferências

ECO, Umberto. Cultura de Massa. In: Apocalípticos e Integrados. 2º ed. São Paulo: Perspectiva. 1964.

GENETTE, Gerard. Palimpsestos. Madrid: Taurus. 1999.

PLAZA, Julio. Tradução Intersemiótica. São Paulo: Perspectiva. 1999. OLIVEIRA, Marinyze, Prates de. Olhares Roubados – Cinema, Literatura e Nacionalidade. Salvador: Quarteto. 2004.

STAM, Robert. Introdução à Teoria do Cinema. Tradução Fernando Mascarello. Campinas, SP: Papirus. 2003.

Filmografia

Um Bonde Chamado Desejo (A Streetcar Named Desire – EUA – 1995), dirigido por Glenn Jordan.

Referências

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