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– PósGraduação em Letras Neolatinas

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(1)

AS

COMUNIDADES

DISCURSIVAS

NO

USO

DE

JOGOS

EDUCATIVOS

MULTIMÍDIA

NO

ENSINO

DE

ESPANHOL

LE

Jorge Luís Rocha da Silva

(2)

Universidade Federal do Rio de Janeiro

AS COMUNIDADES DISCURSIVAS NO USO DE JOGOS EDUCATIVOS

MULTIMÍDIA NO ENSINO DE ESPANHOL LE

Jorge Luís Rocha da Silva

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em Letras

Neolatinas da Universidade Federal do Rio

de Janeiro como quesito para a obtenção do

Título de Mestre em Língua Espanhola

(Estudos Linguísticos)

Orientador: Prof. Doutor Antonio Francisco

de Andrade Jr.

(3)

AS COMUNIDADES DISCURSIVAS NO USO DE JOGOS EDUCATIVOS

MULTIMÍDIA NO ENSINO DE ESPANHOL LE

Jorge Luís Rocha da Silva

Orientador: Prof. Doutor Antonio Francisco de Andrade Jr.

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras

Neolatinas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), como parte dos requesitos

necessários para a obtenção do título de Mestre em Língua Espanhola (Estudos Linguísticos).

Aprovada por:

________________________________________________

(Presidente, Prof. Dr. Antonio Francisco de Andrade Jr. - UFRJ)

________________________________________________

(Profª. Drª. Danielle de Almeida Menezes - UFRJ)

________________________________________________

(Profª. Drª. Leticia Rebollo Couto - UFRJ)

________________________________________________

(Profª Drª. Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold - UFRJ, Suplente)

________________________________________________

(Profª. Drª. Maristela da Silva Pinto - UFRRJ, Suplente)

   

(4)

                                                                                             

(5)

AGRADECIMENTOS

Ao professor Antonio Andrade, pela parceria constante em todo o tempo de trabalho,

inclusive desde antes de seu início.

Às professoras Danielle Menezes, Leticia Rebollo, Maristela Pinto e Mercedes Sebold,

pela participação como membros efetivos e suplentes da banca de aprovação dessa dissertação

(cabendo aqui um duplo agradecimento a Leticia, por além disso ter-me aberto as portas da vida

acadêmica desde a graduação, sob seu olhar atencioso e amigo).

Aos meus pais, Dalva e Jorge, e minha irmã, Gerlaine, por compartilharem de cada

momento do processo que me trouxe até aqui.

A Diana, pela presença infalível em todos os momentos importantes e pelo carinho

constante no qual me apoio.

A Bringel, Michel, Pedro, Rafael e Vinicius, colaboradores diretos no desenvolvimento do

protótipo

Detective Z

, além de Mairon, Marcelo, Marcos, Rodrigo e Sandro, os "abigos" da

Dumativa Estúdio de Criação

, que nos últimos anos se tornaram uma família profissional da qual me

orgulho de fazer parte.

A Juan Carlos, Julia Pelajo, Oscar Zambrano e Patricia Ramos, essenciais na criação do

protótipo

Detective Z

.

A Jaqueline, Marcia Brandão e Rosilene, pelo apoio ao desenvolvimento dessa pesquisa.

A Dr. Carlos Sant'Anna, Irene José, Leni Gusmão, a Anderson e Simone Amaral e outros,

a quem devo boa parte dos passos dados após tê-los conhecido.

Aos amigos de longa, média e curta data, de dentro e fora do meio acadêmico, que

sempre me ajudaram pelo simples fato de emprestarem a mim sua amizade.

A todos os pesquisadores e autores cujos trabalhos fundamentaram minha visão atual.

A Ralph Baer, Nolan Bushnell, Shigeru Miyamoto e vários outros, que criaram, inovaram

e popularizaram essa incrível invenção chamada

vídeo game

.

(6)

                                                                     

SINOPSE

(7)

RESUMO

AS COMUNIDADES DISCURSIVAS NO USO DE JOGOS EDUCATIVOS

MULTIMÍDIA NO ENSINO DE ESPANHOL LE

Jorge Luís Rocha da Silva

Orientador: Prof. Doutor Antonio Francisco de Andrade Jr.

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em

Letras Neolatinas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), como parte dos

requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Língua Espanhola.

O presente estudo analisa a relação entre o conceito de comunidades discursivas

(SWALES, 1990), a aplicação de jogos multimídia como objetos educacionais em aulas de

Espanhol como Língua Estrangeira (ELE) e o engajamento dos alunos frente ao uso de jogos

em sala de aula, considerando jogos digitais como potenciais ferramentas para o processo de

ensino aprendizagem de uma língua (GEE, 2009). Utilizando um jogo digital investigativo em

aulas de ELE de um colégio carioca, com turmas de Ensino Fundamental, são observadas e

correlacionadas diversas informações de cada aluno, referentes aos seus hábitos, gostos e

posicionamentos frente às atividades com o jogo, sobretudo os de engajamento ou

desengajamento, recolhidas por meio de questionários baseados em Likert (BERTRAN,

2007) e da observação do jogo em sala de aula. Os resultados apontam que alguns dos

elementos de identidade discursiva do aluno influenciam, sim, em seu posicionamento

engajado ou desengajado, em detrimento de outros, inicialmente também considerados como

possivelmente relevantes para esse quadro.

Palavras-chave:

Comunidades discursivas - Jogos educativos multimídia - Objetos

educacionais -

Game design

- Ensino-aprendizagem de Espanhol - Gêneros discursivos.

(8)

ABSTRACT

DISCOURSE COMMUNITIES IN THE USE OF MULTIMEDIA EDUCATIONAL

GAMES FOR TEACHING SPANISH AS A FOREIGN LANGUAGE

Jorge Luís Rocha da Silva

Orientador: Prof. Doutor Antonio Francisco de Andrade Jr.

Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em

Letras Neolatinas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), como parte dos

requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Língua Espanhola.

This study analyzes the link between the concept of discourse community (SWALES,

1990), the use of multimedia games as educational tools for teaching Spanish as a Foreign

Language (SFL), and student engagement when using such games in the classroom,

considering digital games as potential tools for the process of learning a language (GEE,

2009). By using an investigative digital game in SFL classes with elementary students at a

school in Rio de Janeiro, we have observed and correlated various information about each

student, regarding their habits, hobbies and responses to the game’s activities, more

specifically, engagement or disengagement responses. We have obtained this information

with questionnaires based on Likert (BERTRAN, 2007) and by utilizing the game in the

classroom. The results show that some of the student’s discourse identity elements do have

an influence on its engagement or disengagement positioning, to the detriment of other

elements that were previously considered as possibly relevant for this scenario.

Keywords:

Discourse communities - Multimedia educational games - Learning tools - Game

design - Spanish learning and teaching - Discourse genres.

(9)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 12

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 17

2.1. Questões de identidade ... 17

2.1.1. Comunidades e seus discursos ... 17

2.2. As habilidades de compreensão leitora e oral ... 23

2.3. Gêneros textuais e gêneros discursivos ... 25

2.3.1. Multimodalidades e multiletramentos ... 27

2.4.

Game

: multigênero multimodal ... 29

2.4.1. Categorização de jogos ... 32

2.4.1.1.

Games

e atividades lúdicas

... 32

2.4.1.2. Classificação de

games

e seus desafios

... 34

2.4.1.3.

Games

: entretenimento e educação

... 39

2.4.2. Aprendizagem e linguagem em

games

... 41

2.4.2.1.

Games

e comunidades discursivas

... 43

3. METODOLOGIA ... 46

3.1. Escolhas referentes à ferramenta de análise: o jogo digital

Detective Z

... 46

3.2. Escolhas referentes ao objeto de estudo: nível de ensino e instituição ... 51

3.3. Atividades de geração de dados ... 51

3.3.1. Antes: o questionário pré-jogo ... 52

3.3.2. Durante: a pesquisa em sala de aula ... 55

3.3.3. Depois: o questionário pós-jogo ... 59

3.3.4. O questionário docente ... 61

3.4. Definições metodológicas de pesquisa ... 63

4. ANÁLISE DE DADOS ... 64

4.1. Anotações de campo e acompanhamento do cotidiano escolar... 64

4.2. Dados dos questionários pré-jogo ... 66

4.3. Dados resultantes da pesquisa em aula ... 71

4.4. A identificação: questões dos questionários pós-jogo ... 74

5. RESULTADOS: COTEJO E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS ... 81

5.1. Expectativas e quebras de expectativa ... 92

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 99

(10)

6.2 Possíveis aplicações ... 102

REFERÊNCIAS ... 105

ANEXOS ... 110

 

(11)

1.

INTRODUÇÃO

Desde a década de 1970, quando houve grandes avanços na computação e o

nascimento de uma indústria de entretenimento eletrônico que se expandiria em poucos

anos1, os jogos digitais e audiovisuais ganharam ênfase de mercado, tornando-se um

relevante produto de cultura e entretenimento em praticamente todo o globo. O crescimento

dessa indústria fez com que a influência dos vídeo games − como comumente são

chamados os jogos eletrônicos/digitais − impactasse relevantemente nas maneiras do

homem contemporâneo interagir com o mundo. Isso porque, como relata o criador da Atari,

Nolan Bushnell, um dos nomes mais relevantes da recente história dos jogos eletrônicos, o

vídeo game levou às pessoas a experiência de romper com o aspecto estático das imagens

dos televisores, controlando elementos no visor, além de ter promovido a popularização dos

computadores pessoais (os Personal Computers, ou PCs), devido ao seu caráter mais

"amigável" do que as máquinas da época2.

De acordo com Jane McGonigal, desenvolvedora de jogos, mais de meio bilhão de

pessoas no mundo jogam games digitais pelo menos uma hora por dia3. Esse hábito na

contemporaneidade, aliado a outros, gerou modos específicos de relacionar-se com a

linguagem, com os demais sujeitos, com as informações. Assim, no século XXI, diversos

acadêmicos concentraram seus estudos nas possíveis relações dos games com a

linguagem, com o discurso, com a aquisição de elementos linguísticos, com o letramento.

Isso, muitas vezes, afunilou-se a um mesmo tema: as relações dos games com o ensino em

geral. Ou seja, passou-se a considerar que jogos digitais, de certa forma, podem ser uma

importante ferramenta para as metodologias de ensino-aprendizagem de diversas áreas de

conhecimento, entre elas a do ensino de línguas.

A complexidade que a tecnologia alcança na segunda década do século XXI faz com

que os games sejam cada vez mais repletos de possibilidades, variáveis e experiências

novas, atraindo mais pessoas de todas as idades para seu consumo4− entre elas, crianças,

adolescentes e jovens em fase escolar. Paul Gee (2009) defende que o jogo eletrônico pode

ser bastante efetivo no processo de ensino-aprendizagem desse público, tendo em vista que

em sua estrutura geral há princípios básicos de aprendizagem, que o levam ou não a ser

       1

Em 1972, foi fundada a Atari, empresa considerada por muitos como a precursora do sucesso e da popularidade dos jogos eletrônicos pelo mundo. (http://pressreleases.triplepointpr.com/2012/06/27/atari-celebrates-40th-anniversary-with-new-game-releases-and-special-promotions/, último acesso em 21/07/2015) 2

Bushnell considera que os primeiros vídeo games eram sistemas computacionais (video computer systems) com recursos lúdicos e ferramentas de uso simples, sendo por isso mais "amigáveis" ao público geral do que os computadores da época. Esses relatos estão citados no documentário Atari: Game Over (2014), que aborda a meteórica ascensão e a crise da empresa Atari nos anos 80 do século XX, em torno do relato das escavações em busca de um acervo do jogo ET: O Extraterrestre, supostamente enterrado pela empresa, em larga escala, no aterro sanitário de Almogordo, EUA. (http://www.imdb.com/title/tt3715406/, último acesso em 21/07/2015). 3

http://www.ted.com/conversations/44/we_spend_3_billion_hours_a_wee.html 4

(12)

considerado um bom jogo. Desse modo, bons jogos por si só reproduziriam técnicas de

aprendizado que devem ser intuitivas no que diz respeito à construção dos objetos de

conhecimento. Como exemplo, pode ser citado o mecanismo de criação de uma escala

progressiva de dificuldade dentro de um jogo eletrônico, no qual sempre que uma estratégia

básica é aprendida, essa mesma estratégia deve ser usada para alcançar o aprendizado de

uma outra, mais avançada, e assim sucessivamente − mecanismo esse conhecido por game

designers como curva de aprendizagem5. Além disso, um elemento comumente desejável em jogos digitais é a viabilidade da intuição do jogador nesse processo de aprendizagem,

colocando-o como coautor desse conhecimento, como o caso do First Goomba, elemento

muito usado na franquia Super Mario Bros, quando se coloca um inimigo simples ao início

do jogo, caminhando na direção do personagem controlável pelo jogador, forçando-o à

tomada de decisões − se parado, o inimigo o atinge, provocando sua derrota, deixando

apenas duas opções de estratégia: saltar por sobre o inimigo ou sobre sua cabeça,

descobrindo-se que é possível derrotá-lo dessa segunda maneira.

Figura 1. Primeira tela do jogo Super Mario Bros, exemplo de First Goomba Fonte: Google Imagens

Essa particular forma de "aprender" dentro dos jogos pode construir no jogador um

método de leitura do jogo em si, do acesso a suas informações, do contato com os textos

nele expressos sob diversas naturezas. Consequentemente, isso levaria a uma identificação

com determinadas formas e práticas do discurso. Isso se relaciona com os estudos de

Swales (1990), que observa na identificação de indivíduos entre si, por meio de fatores

ocupacionais, de especialidade ou de gostos pessoais, a formação do que ele próprio

denominou comunidades discursivas. Para ele, esses indivíduos, ao dominarem

determinado repertório de gêneros discursivos, hábitos, experiências em comum, e terem

aproximação com os mesmos, possuem a possibilidade de integrar-se a grupos sociais que

       5

(13)

pressupõem esse domínio de repertório, fazendo parte de comunidades construídas pelas

práticas discursivas comuns aos seus integrantes.

Relacionando essa identidade discursiva com o ambiente escolar, e considerando

que os grupos discentes em geral apresentam-se marcados por diversos discursos e

identidades, que se misturam e se dispersam6, além de serem influenciados pelo uso

cotidiano de novas tecnologias de informação e comunicação (as NTIC), é possível

compreender o fato de que há muito tornou-se crescente e imperiosa a busca por práticas

didáticas que levem em consideração a heterogeneidade cultural dos aprendizes e façam

uso de recursos tecnológicos contemporâneos. E é nesse cenário que estudos sobre o uso

didático de games eletrônicos começaram a ganhar relevância.

Porém, para o docente pode não ser tão clara a eficiência desses recursos

tecnológicos contemporâneos, como os jogos digitais, para o desenvolvimento do processo

de ensino-aprendizagem dos conteúdos curriculares e das habilidades relacionadas a eles −

como por exemplo o que ocorre no ensino de língua estrangeira (LE), no qual é comum o

uso de objetos educacionais como obras audiovisuais, textos verbais e registros sonoros.

Dessa forma, constituímos como problemas de pesquisa centrais para esta dissertação os

seguintes questionamentos: considerando que os indivíduos podem ter maior afinidade com

atividades que se relacionem às suas comunidades discursivas, esse quadro se reproduziria

no uso de jogos multimídia digitais para alunos que se considerem gamers? Ou seja,

• alunos pertencentes a comunidades gamers estariam mais engajados em

atividades que envolvessem jogos digitais?

E levando em conta as últimas requisições de jogos em materiais didáticos pelo

Programa Nacional do Livro Didático (PNLD)7,

• no caso dos aprendizes que não se enquadrem como gamers, o uso dessa

ferramenta aportaria igual nível de engajamento?

Levando em consideração os elementos que caracterizam uma comunidade

discursiva, levantamos as hipóteses de investigação: (I) o uso de jogos criaria uma

relação de aproximação de gamers aos conteúdos e estratégias da LE, já que a

familiaridade com os recursos discursivos envolvidos facilitaria o rompimento de "bloqueios"

       6

Cf. Canclini (2005). 7

(14)

relacionados ao aprendizado de línguas. Entretanto, pelo fato de esta ser uma ferramenta

que possa envolver temáticas do gosto comum de alguns alunos, estratégias textuais de seu

domínio e usos de linguagem próximos a sua experiência, (II) o uso de jogos promoveria

maior interesse por parte daqueles aprendizes que não se consideram gamers, pois

associado a outras ferramentas didáticas, o uso de jogos digitais pode romper com um ciclo

de atividades já costumeiras no âmbito do ensino de LE8 e aproximar-se das práticas

discursivas desses estudantes. Além disso, acredita-se que (III) o fator lúdico de uma

atividade de ensino-aprendizagem baseada em um jogo digital atribuiria significado à

tarefa proposta e ao conteúdo a ela relacionado, acarretando no efetivo engajamento

do aluno.

Isso porque, refletindo sobre as relações que um sujeito cria com diversificadas

comunidades discursivas, a partir de suas experiências e gostos pessoais, considera-se que

todo aprendiz em nível escolar possui uma complexa rede de conhecimentos, em termos de

apropriações de distintas formas de linguagem e expressão, que o diferencia ou aproxima

dos demais indivíduos de seu convívio comum e das práticas à sua volta. Dessa forma,

determinadas linguagens, hábitos sociais, modos de expressão e gêneros discursivos

constroem sua rede de interesses, fazendo com que elementos similares àqueles elementos

que integram as comunidades discursivas das quais ele faça parte sejam mais atrativos e

comuniquem mais significados do que outros elementos distantes dessa rede (cf. SWALES,

1987, p. 2; 1990, p. 23-24; ROCHA DA SILVA, 2014a, p. 3-4).

Assim, nosso objetivo geral nesse estudo é

• compreender o papel representado pela experiência prévia do aprendiz, ou

seja, sua proximidade a determinadas comunidades discursivas, no nível de

produtividade didática alcançado por um jogo educacional multimídia em sala de aula.

Essa noção de nível de produtividade diz respeito ao efetivo interesse do aprendiz na

participação das etapas propostas, no empenho demonstrado no cumprimento das etapas e

tarefas, e da resolução dos desafios lúdicos, ambos dependentes da aplicação e uso de

conhecimentos, estratégias e habilidades no âmbito da língua espanhola.

O fato de, assim como outros recursos didáticos possíveis, um jogo ter em si o

potencial de contextualizar a proposta de atividades de Espanhol como língua estrangeira

(ELE) em sala de aula, por meio de seu aspecto lúdico, é bastante relevante. Ao mesmo

tempo, pode se relativizar frente às diversas questões de interesse pessoal, em práticas

cotidianas e entrosamento com determinados gêneros discursivos. Isso significa que, do

       8

(15)

mesmo modo que há diversos gostos, identidades e práticas, também os diversos gêneros e

estilos de jogos existentes são uma variante essencial a ser analisada.

No próximo capítulo, é desenvolvida uma discussão teórica sobre comunidade,

discurso, leitura e habilidades no ensino aprendizagem de língua estrangeira, o(s)

conceito(s) de jogo e sua relação com a educação, multiletramento e discurso em

comunidade. Em seguida, são descritas as bases metodológicas para o estudo, como as

ferramentas de pesquisa (em destaque o jogo digital Detective Z e os questionários

elaborados) e as estratégias utilizadas em sua aplicação, bem como o aparato teórico

utilizado e o campo de pesquisa escolhido. À metodologia se segue a análise das

informações geradas na pesquisa, relacionadas à aplicação do jogo em aulas de Espanhol

LE e às respostas aos questionários, geradas pelos alunos da instituição educacional

selecionada como campo de pesquisa. Por fim, discutem-se os resultados dessa análise e a

(16)

2.

FUNDAMENTAÇÃO

TEÓRICA

2.1.

Q

UESTÕES DE IDENTIDADE

Identidade e cultura são elementos que, de um modo geral, caminham juntos quando

se estudam as relações sociais e seus desdobramentos. E ao falarmos de cultura, devemos

não apenas pensar nas realizações materiais humanas, pois esta abarca "o conjunto dos

processos sociais de significação ou, de um modo mais complexo, [...] o conjunto de

processos sociais de produção, circulação e consumo da significação na vida social"

(CANCLINI, 2005, p. 41).

Ou seja, neste ponto de vista, basicamente ela envolve tudo o que está relacionado à

prática humana. Assim, o constante processo de significação do homem a tudo que está em

seu entorno cria um vasto conjunto de elementos que, por sua vez, acabam por diferenciar

os grupos sociais por suas próprias práticas, levando em consideração que estes

constantemente podem ressignificar o uso desses elementos (CANCLINI, 2005).

É esta diferenciação que pode ser entendida como um dos parâmetros para

encontrar noções sobre o que caracterize uma identidade, tendo em vista que dentre o

diferente, o outro, há a semelhança. E então vale salientar que estas duas faces de uma

mesma "moeda" dependem intrinsecamente das próprias relações dos sujeitos em

sociedade, pois

só faz sentido falar em identidade com relação a uma prática social que determina critérios públicos para decidir o que conta como "o mesmo" [...]. Isto quer dizer que a estabilidade do sentido não se encontra em propriedades autônomas e inerentes aos objetos ou às pessoas, e que não se dá privadamente, em um palco mental individual. Pelo contrário. A estabilidade da significação é fruto de um escrutínio público, fazendo com que eu tenha que recorrer ao outro (pessoa, grupo, teoria, tradição, etc.) para dela me certificar. Por isso, não existe princípio da identidade desvinculado de uma prática coletiva e de determinado contexto social que lhe dê sentido e articule consequências convencionalizadas (MOITA LOPES & FABRICIO, 2004, p. 5).

O resultado desse processo é que, ao mesmo tempo em que o sujeito ou grupo

produz cultura, também produz sua própria identidade, e no processo social esta é

significada, reconstruída e auxilia a que ocorra o mesmo com as demais identidades com as

quais tem contato.

2.1.1. Comunidades e seus discursos

Segundo essa linha de pensamento, pode-se chegar à conclusão de que o sujeito,

ao relacionar-se com os demais construindo relações de diferenciação e semelhança, é o

(17)

partimos ao conceito de comunidade. Uma das descrições deste conceito é dada por

Esposito (2003, p.22-23), quando relata que uma de suas possibilidades é tratá-la como

uma propriedade dos sujeitos que ela une: um atributo, uma determinação, um predicado que os qualifica como pertencentes ao mesmo conjunto [...], uma qualidade que é acrescentada a sua natureza de sujeitos, tornando-os também sujeitos da comunidade. Mais sujeitos. Sujeitos de uma entidade maior, superior ou inclusive melhor que a simples identidade individual, mas que tem origem nesta [...].

Bauman (2003, p. 7) também oferece uma definição para a ideia de comunidade, em

um ponto de vista mais metafórico, indicando que ela é

um lugar "cálido", um lugar confortável e aconchegante. É como um teto sob o qual nos abrigamos da chuva pesada, como uma lareira diante da qual esquentamos as mãos num dia gelado. Lá fora, na rua, toda sorte de perigo está à espreita; temos que estar alertas quando saímos, prestar atenção com quem falamos e a quem nos fala, estar de prontidão a cada minuto. Aqui, na comunidade, podemos relaxar - estamos seguros, não há perigos ocultos em cantos escuros.

Percebe-se nessas duas visões a ideia de que comunidade agrega sujeitos

culturalmente relacionados, sendo formada por laços de semelhança e, ao mesmo tempo,

também formando-os.

Em meio às relações e práticas sociais do sujeito, a utilização da linguagem, que

promove processos de significação, gera o que podemos denominar como discurso, tendo

em vista que este pode ser definido, de um modo amplo, como o efeito de sentido entre

enunciadores (ORLANDI, 1994, p. 52). Desse modo, é plausível considerar que a interação

está fundamentalmente pautada em condições de produções do discursos. Ao interagir

socialmente, o sujeito se vê impelido a aderir a formações discursivas, conceito inaugurado

por Foucault (1997) e retomado por Serrani-Infante (1997, p. 5) como "condensações de

regularidades enunciativas no processo − constitutivamente heterogêneo e contraditório −

da produção de sentidos no e pelo discurso, em diferentes domínios de saber."

É por meio dessa aderência que o sujeito constrói posicionamentos identitários,

relações sociais e sua vida em sociedade (MOITA LOPES & FABRICIO, 2004, p. 6), sendo

também agente do processo de atualização de seu discurso.

Observando a relação entre discurso, sujeito e comunidade, Swales (1987) cunhou

o termo comunidades discursivas, ao analisar a assimilação discursiva e identificação mútua entre pessoas pertencentes a determinados grupos sociais. Segundo ele, as comunidades

discursivas são grupos nos quais sujeitos se identificam entre si, por meio de fatores

ocupacionais, de especialidade ou de gostos pessoais. Sendo assim, os participantes de

uma comunidade discursiva não só dominam um determinado repertório de gêneros

discursivos, hábitos e experiências em comum, como também conservam uma relação de

(18)

Essa proposta teórica acaba representando um contraponto à análise linguística do

que se denomina comunidade de fala, conceito fundamental da sociolinguística cunhado na

década de 1960 e disseminado por Labov (1972) em suas pesquisas. Segundo Wiedemer

(2008, p. 23), tal conceito passou a constituir um objeto de estudo da área sociolinguística a

partir de quando Labov (1972) considerou o estudo da evolução e estrutura da língua

relacionado ao contexto social da comunidade de fala, rompendo com outras correntes

anteriores, como o gerativismo e o estruturalismo, que estudavam a língua sob uma suposta

homogeneidade estrutural e um conjunto de regras independentes do meio social à sua

volta. Centrada essencialmente em aspectos prosódicos, culturais e pragmáticos, a ideia de

comunidade de fala está relacionada à demarcação local e geográfica de falantes de uma

determinada variedade linguística – ou seja, definindo-os como integrantes por meio dos

elementos físicos e culturais de sua comunição dialetal. Já as comunidades discursivas,

ainda que considerem fatores lexicais e expressivos, estão mais livres do elemento espacial,

pois os mecanismos de significação do discurso são compartilhados pelos sujeitos por

processos não apenas relacionados à interação direta presencial em um meio social físico

específico.

Outra importante diferença é que as comunidades de fala tendem a aglutinar novos

integrantes por meio do contato linguístico, criando uma fronteira instável de influências com

as demais comunidades do mesmo tipo. Enquanto isso, comunidades discursivas, apesar

de também possuírem uma tendência à absorção, acabam por separar os grupos de

sujeitos entre si, por meio de distinções relacionadas ao âmbito ocupacional, de

especialidade ou de interesse. Isso significa que o processo de identificação e

pertencimento a elas não é automático, e sim, implica uma escolha. Segundo Swales (1990,

p. 24), para que um sujeito efetivamente se integre ao contexto de uma determinada

comunidade discursiva, é necessário atingir algumas “metas” comuns, o que inclui a

assimilação de mecanismos comunicativos específicos, assim como da experiência temática

e dos gêneros discursivos dominados pela comunidade – e, consequentemente, a

aprendizagem das estruturas envolvidas nesses gêneros9 e temas. Além disso, um mesmo

sujeito poderia pertencer a diversas comunidades discursivas ao mesmo tempo, sendo

variável o número de comunidades e de gêneros dominados nessa integração, de acordo

com cada sujeito (SWALES, 1987, p. 7).

Outro conceito que pode ser discutido em torno desse assunto é o de comunidades

de prática, tendo em vista que este também se opõe à ideia de comunidades de fala pelos mesmos aspectos relatados anteriormente, com relação às comunidades discursivas.

Fundado por Lave & Wenger (1991) e Wenger & Snyder (2000), o conceito possui

       9

(19)

consideráveis similitudes ao de comunidades discursivas, pois, como Eckert (2005) indica,

comunidades de prática são conjuntos de pessoas que se aproximam entre si e interagem

para engajar-se em um empreendimento. Segundo ela, essas comunidades podem

constituir-se de "uma família, uma classe de linguística, uma banda de garagem, colegas de

quarto, uma equipe esportiva e até um pequeno povoado" (ECKERT, 2005, p. 16). Porém,

por mais que se incluam nessas definições as considerações de hobbies e atividades de

entretenimento como possíveis comunidades de prática, o conceito possui um viés mais

voltado às atividades comerciais, de trabalho e estudo. Tal aspecto torna-se mais

perceptível em Wenger & Snyder (2000), onde se define que comunidades de prática são

grupos de pessoas que se reúnem pela "experiência compartilhada e paixão" por uma

atividade empreendedora (WENGER & SNYDER, 2000, p. 139), relacionando essa ideia

predominantemente a uma série de situações práticas de empresas e empreendimentos

comerciais, utilizando-a como uma ferramenta de organização social para fins práticos.

Sendo assim, este conceito se difere das comunidades discursivas na medida em que as

últimas têm explicitada por seus autores uma constituição de membros por mecanismos

mais baseados nas trocas da própria prática linguística dos gêneros, temas, conhecimentos

relacionados, etc.

Ou seja, pensando em um exemplo de aplicação prática dos dois conceitos,

pode-se considerar uma claspode-se de ensino fundamental de uma escola, que pode-segue um currículo

tradicional, durante as aulas de uma disciplina. Todos os alunos dessa classe, estando mais

ou menos engajados nas práticas de conhecimento dessa disciplina específica, possuem o

objetivo mútuo de alcançar a média satisfatória definida pelas diretrizes da instituição

escolar. Inclusive espera-se do docente da disciplina, levando em conta sua posição

pedagógica frente ao processo de ensino-aprendizagem, engajamento nessa meta coletiva.

Tal coincidência do foco coletivo em torno do mesmo empreendimento, tanto individual

quanto coletivo (cada aluno espera cumprir as metas de avaliação, ao mesmo tempo em

que normalmente todos os demais também esperarão o mesmo, criando-se um ambiente de

objetivos mútuos), caracterizaria essa classe como uma comunidade de prática envolvida no

empreendimento do êxito nas médias anuais de avaliação, visando à progressão em

conjunto ao próximo ano letivo. Assim, segundo Eckert (2005) e Wenger & Snyder (2001),

os alunos e docentes compartilhariam modos de organização, métodos e práticas que

auxiliariam no alcance do empreendimento coletivo, gerando engajamento ao processo e

conhecimento compartilhado pelos integrantes.

Em outro viés, nessa mesma classe seria possível perceber que, dependendo das

afinidades, experiências, preferências, hábitos e conhecimentos prévios, cada aluno

interagiria mais com alguns colegas e menos com outros, levando a agrupamentos coletivos

(20)

alunos, mesmo mantendo-se no mesmo empreendimento coletivo da classe, poderiam

utilizar práticas discursivas distintas às dos demais, gerando relações de diferenciação e

similitude, consequentemente levando a um relativo afastamento ou aproximação dos

agrupamentos da classe. Na visão de Swales (1990), isso caracterizaria as comunidades

discursivas, já que, mesmo possuindo um objetivo coletivo comum (núcleo da comunidade de prática em questão), os sujeitos se distribuiriam entre si de acordo com suas experiências e práticas discursivas/comunicativas, sendo essa a natureza das comunidades

de discurso.

Para definir mais detalhadamente essa natureza, é possível resumir que Swales

(1990, p. 24-27) identificou seis parâmetros fundamentais para a categorização e definição

de uma comunidade discursiva:

"Uma comunidade discursiva possui um conjunto compartilhado de metas comuns" – as metas, publicamente reconhecidas, são objetivos comuns que podem

ser concretos ou abstratos, simples ou complexos;

"Uma comunidade discursiva possui mecanismos de intercomunicação entre seus membros" – tais mecanismos não necessariamente levam ao contato

interpessoal, podendo geralmente servir a uma intercomunicação paralela entre os

membros;

"Uma comunidade discursiva utiliza prioritariamente mecanismos participativos para oferecimento de informação e de seu retorno" – mecanismos

participativos seriam ações de participação efetiva nos meios de comunicação e

informação da comunidade discursiva;

"Uma comunidade discursiva utiliza e domina um ou mais gêneros como apoio comunicativo a suas metas" – considera-se que para tal algumas comunidades

tomam “empréstimo” de alguns gêneros característicos de outras;

"Além de seus próprios gêneros, uma comunidade discursiva possui uma rede específica de léxicos e contextos" – ou seja, vocabulário específico, siglas, formas

de coloquialidade, jargões, sentidos particulares, valoração, juízos e etc.;

"Uma comunidade discursiva possui certo nível de membros com grau elevado de conteúdo relevante e de experiência discursiva" – há sempre uma

proporcionalidade entre o número de membros altamente próximos aos elementos

da comunidade e aqueles novos, em nível inicial.

Posteriormente, outros trabalhos (como BORG, 2003) realizaram críticas a respeito

de alguns desses parâmetros e conceitos − inclusive o próprio Swales, que inicialmente

(21)

noção de comunidades discursivas também à oralidade (SWALES, 1990, p. 32) −, mas a

estrutura de sua análise segue sendo referência em estudos atuais sobre o tema.

Embora a noção delimitadora de comunidades discursivas não atenda

necessariamente a fatores geográficos e de contato direto pessoal, devido à época em que

seus principais estudos entraram em circulação no meio acadêmico, não se considerou a

possibilidade de uma ainda maior virtualização do processo.

Entretanto, com o surgimento e franco crescimento das novas tecnologias de

informação e de comunicação (NTIC), as noções de comunidade se amplificaram, muito por

conta do impacto da internet nas relações sociais, já que ela

constitui a base material e tecnológica da sociedade em rede; é a infraestrutura tecnológica e o meio organizativo que permitem o desenvolvimento de uma série de novas formas de relação social que não têm sua origem na internet, que são fruto de uma série de mudanças históricas, mas que não poderiam desenvolver-se sem a Internet (CASTELLS, 2000 apud Moraes, 2003, p. 286-287).

As chamadas sociedades em rede, logo, acarretariam a formação de novas formas

de comunidade e a diversificação das já estabelecidas. Porém, a relação entre as

comunidades virtuais e as culturas levou a divergências teóricas acerca do reflexo desse

fenômeno nas práticas discursivas. Por exemplo, Canclini (2005, p. 17) indica que as NTIC

provocaram a passagem de um cenário global de multiculturalidade para a

interculturalidade, de modo que, enquanto o primeiro apontava à diversidade, à

compreensão da heterogeneidade, o segundo tende ao homogêneo, às relações de troca

entre culturas, levando o panorama virtual a uma cada vez maior assimilação de aspectos

de uma comunidade dominante culturalmente. Já Acioli (2007, p. 9) aponta que na verdade

em um “mundo em redes, onde há mais quantidade do que qualidade de informação, a

possibilidade de fragmentação de saberes e culturas, e, portanto de sujeitos é muito

grande”. Isso significaria, dentro dessa lógica, que há uma valorização de vários elementos

da construção de identidade dos sujeitos, inclusos aí os aspectos de sua cultura local,

segundo o pensamento da autora.

Entretanto, pensando apenas no viés virtual das comunidades, pode-se considerar

que há também a possibilidade de verificar sua aplicabilidade na ideia de assimilação de

discursos, presente nas comunidades discursivas. Não à toa, ao definir-se o conceito de

comunidades virtuais, são utilizados parâmetros muitos semelhantes aos atribuídos por

Swales (1990). Exemplo disso ocorre na seguinte reflexão de Castells (2000, p. 274):

(22)

alguém. Por exemplo: como criar um clube de ciclismo? Como criar um clube de gente que se interesse por espeleologia?

Ou seja, o que ele define como comunidade virtual possui atributos compartilhados

com o conceito de comunidades discursivas: integração por afinidade e escolha, não

necessidade de contato direto e físico, etc. A internet em ambos os casos tornou-se um dos

mais recorrentes mecanismos de intercomunicação entre os sujeitos que integram as

comunidades discursivas. Independentemente do impacto provocado pelo fator globalizante

da internet sobre as diversas culturas e sociedades, ela inegavelmente faz com que as

interações sociais se deem de um modo mais rápido e dinâmico, sem as fronteiras e

limitações dos meios sociais correspondentes aos espaços físicos – inclusive podendo

romper barreiras linguísticas, o que também influencia nos níveis de aproximação e

distanciamento das diferentes comunidades discursivas existentes.

O impacto disso é crucial para a formação e adaptação dos discursos em suas

várias esferas, tendo em vista que a comunicação e o sentido transitam por contextos que

cada vez mais os influenciam – tornando mais diversificada a composição de formações

discursivas e, consequentemente, de suas comunidades de discurso.

2.2.

A

S HABILIDADES DE COMPREENSÃO LEITORA E ORAL

O jogo educacional aplicado neste estudo de caso, Detective Z, possui uma

mecânica que consiste na resolução de casos policiais fictícios e relativamente cômicos, por

meio unicamente de elementos linguísticos (segmentais, prosódicos, lexicais, pragmáticos,

etc.) relacionados aos "suspeitos" e suas variedades do espanhol, inicialmente não

declaradas aos jogadores. Para a investigação desses elementos, o jogador é conduzido à

leitura de termos, expressões, textos escritos e orais de gêneros diversos, todos em língua

espanhola. Tal mecanismo possui o intuito de promover meios contextualizados para o

exercício das habilidades de compreensão leitora e oral dos alunos, além de lançar um

espaço aberto para propostas de interlocução e escrita em espanhol. Devido a essa

natureza do jogo, cabe aqui um aprofundamento a respeito das habilidades do espanhol de

acordo com as práticas de ensino de ELE10 no país e com suas diretrizes oficiais.

O ensino de Língua Estrangeira no Brasil, no que se relaciona ao Ensino

Fundamental, segue os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) como principal

diretriz, que por sua vez são revistos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação

Básica (BRASIL, 2013). As orientações gerais de ambos os documentos expressam

preocupações a respeito da formação do cidadão, de sua visão amplificada sobre as

culturas e suas diversidades e o respeito às diferenças, que percorrem transversalmente as

       10

(23)

disciplinas e conteúdos escolares. E para o caso específico do ensino de Espanhol como

língua estrangeira moderna, as bases curriculares focam-se nos aspectos linguísticos que

consistem na compreensão leitora e oral, além da produção leitora e oral. Porém, a

abordagem dos PCN de 1998 com relação às habilidades de compreensão de línguas

estrangeiras pode ser considerada predominantemente tendenciosa à leitura, com foco

minoritário na oralidade. Considerando a discussão levantada na seção anterior do capítulo,

a respeito das possibilidade geradas pelas novas tecnologias de informação, uma visão

metodológica dessa natureza, que privilegia a compreensão leitora de uma língua

estrangeira, em detrimento da oral, se coloca como anacrônica frente à relação

contemporânea dos sujeitos com os textos das mais diversas composições. As

possibilidades multissemióticas dos textos na contemporaneidade, permitidas pelo avanço

tecnológico das últimas décadas11, devem ser levadas em conta na prática em sala de aula

de línguas estrangeiras, inclusive correlacionando o escrito com o som, com o visual, com a

interação, sem dissociar estes aspectos. Do contrário, essa prática didática está fadada a

afastar-se da realidade dos alunos, como sujeitos e leitores das novas mídias.

Ainda em termos de oralidade e leitura, cabe a realização de críticas com relação

ao simplismo variacional que algumas metodologias adotam para o ensino-aprendizagem de

Espanhol como Língua Estrangeira (ELE). Celada & González (2000, p. 38-39), por

exemplo, chamam a atenção para metodologias que insistiam em utilizar estruturas

repetitivas como a de falsos cognatos de maneira que fossem essenciais para o processo

de ensino-aprendizagem de uma língua estrangeira, relegando a compreensão textual e oral

a um patamar superficial ou nem ao menos trabalhado, sob uma perspectiva baseada nas

supostas dificuldades de falantes brasileiros ao aprender a língua espanhola, ao contrário de

seus traços socioculturais.

De um modo geral, tanto na prática oral quanto leitora de LE no ensino, as

diretrizes oficiais dão amplo foco à necessidade de valorização da noção de variedades

linguísticas, por exemplo, evitando estereótipos e vieses ultrapassados, como a dicotomia

espanhol da América x espanhol da Espanha. Estudos como o de Moreno Fernández (2000), do "mapeamento" das regiões do espanhol por meio de aspectos culturais,

morfossintáticos, sociopragmáticos e prosódicos, além de análises pragmáticas e

variacionistas do espanhol (PENNY, 2004; SILVA-CORVALÁN, 2001)12, são recomendados,

nos documentos oficiais de orientação e seleção de docentes, como bases metodológicas.

       11

Essas possibilidades do texto contemporâneo nas novas tecnologias de informação, como a multimodalidade, serão discutidas em seções posteriores.

12

(24)

Esses aspectos representam grande importância nos pressupostos de nosso estudo de

caso, tendo em vista que o próprio jogo, objeto educacional de aplicação, se utiliza de uma

concepção linguística baseada em determinados aspectos da língua espanhola, entre eles a

noção das áreas geoletais, segundo Moreno Fernández (2000), demonstrando a diversidade

das variações do espanhol e, frequentemente, a tenuidade das fronteiras linguísticas entre

elas, as distinções e semelhanças entre grupos historicamente influenciados por usos

heterogêneos da língua e seus registros.

Assim, a compreensão leitora adquire caráter relevante frente a essas diretrizes,

em geral recomendando-se o trabalho ativo e significativo do papel do leitor, no

ensino-aprendizagem. Ou seja, ressalta-se a importância de que o aprendiz, nesse papel,

desempenhe não apenas a função de decodificador das mensagens explícitas do texto, mas

reconstrua-o, funcionando como uma espécie de coautor de seus sentidos (GRIGOLETTO,

1992, p. 43). O leitor ativo, construindo o significado do texto em conjunto e autoria com as

diversas vozes nele presentes, pode afastar-se da mera reprodução de discursos e gerar

criativamente os seus próprios, posicionando-se no papel de cidadania e de sujeito com

amplas visões de mundo, assim como as diretrizes oficiais de educação sugerem como

meta para o processo de ensino aprendizagem das línguas estrangeiras.

Leitura, em um sentindo amplo, deve também abranger a esfera da oralidade, tendo

em vista o caráter cada vez mais multimodal dos textos acessíveis na contemporaneidade,

conforme será discutido em seções mais adiante. Os mecanismos de leitura e acesso à

informação estão, de certo modo, ligados intrinsecamente à identificação dos sujeitos frente

a comunidades discursivas, pois o domínio dos gêneros discursivos, das estruturas

linguísticas e dos temas envolvidos nos contextos, segundo Swales (1990), é requisito de

integração a essas comunidades. Desse modo, as habilidades de compreensão oral e

escrita, assim como a capacidade de construção dos significados envolvidos nos textos de

circulação nas comunidades discursivas, são "ferramentas" linguísticas para a formação da

identidade discursiva dos sujeitos.

2.3.

G

ÊNEROS TEXTUAIS E GÊNEROS DISCURSIVOS

Na presente reflexão, utiliza-se o conceito de gêneros discursivos com base

fundamental na visão de Bakhtin, que os caracteriza como produtos comunicativos que se

distinguem pela utilização de tipos relativamente estáveis de enunciados, construídos

essencialmente com o uso de conteúdos temáticos, estilos e construções composicionais

(BAKHTIN, 2003, p. 279), sejam eles escritos ou orais. Nessa visão, os gêneros seriam

flexíveis e mutáveis, por meio de novas utilizações e reorganização de suas funções. A

(25)

discutida por alguns autores, sob a esfera da forma, do conteúdo, da pragmática e outros

aspectos do discurso e do texto, sendo esse último referido como o produto formal da

construção do primeiro. Quanto à natureza do gênero e suas delimitações, Marchuschi

(2002, p. 21) afirma que

é bom salientar que embora os gêneros textuais não se caracterizem nem se definam por aspectos formais, sejam eles estruturais ou linguísticos, e sim por aspectos sócio-comunicativos e funcionais, isso não quer dizer que estejamos desprezando a forma. Pois é evidente, como se verá, que em muitos casos são as formas que determinam o gênero e, em outros tantos serão as funções. Contudo, haverá casos em que será o próprio suporte ou o ambiente em que os textos aparecem que determinam o gênero presente.

Roxane Rojo (2006) chama a atenção à característica da heterogeneidade, marcada

na concepção bakhtiniana de gêneros, proveniente de sua própria natureza de criação de

novos gêneros a partir dos já existentes. Para ela, a hibridização e o plurilinguismo13 nesse

processo são pontos-chave da visão de Bakhtin (ROJO, 2006, p. 1768), deixando claro que,

para ele,

não é somente pelo estilo – ou seja, pela “seleção operada nos recursos da língua - recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais” [...] – [...] que se verifica a flexibilidade, as formas criativas e a refração dos sentidos dos enunciados pertencentes a gêneros e do próprio gênero, mas pelas formas do plurilinguismo nos enunciados, fenômeno bastante variado e complexo.

Tal visão serviu eventualmente de baseou estudos sobre gêneros que utilizam a

terminologia de gêneros textuais, levando em consideração os elementos que constituem a

visão bakhtiniana sobre os gêneros discursivos, mas realizando uma alternância de focos

específicos entre os chamados tipos textuais – definidos como "uma espécie de construção teórica definida pela natureza linguística de sua composição (aspectos lexicais, sintáticos,

tempos verbais, relações lógicas)" (MARCUSCHI & XAVIER, 2010, p. 21-22) - e os gêneros textuais

uma noção propositalmente vaga para referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica.

Segundo Rojo (2005, p.188), essa definição "propositalmente vaga" dos gêneros

textuais "diluiria" a fronteira entre os conceitos de gênero e texto, como se fossem

       13

(26)

sinônimos, construindo-se a ideia de que o próprio texto seja formado a partir de uma

"família de textos".

Considerando esse fato, optamos no presente estudo pelo conceito de gêneros

discursivos, já que este abrange esferas e elementos relacionados diretamente ao conceito de comunidades discursivas. Observando a análise que Rojo (2005, p. 196) realiza sobre o

conceito bakhtiano, gêneros discursivos envolvem três dimensões:

- os temas - conteúdos ideologicamente conformados - que se tornam comunicáveis (dizíveis) através do gênero;

- os elementos das estruturas comunicativas e semióticas compartilhadas pelos textos pertencentes ao gênero (forma composicional);

- as configurações específicas das unidades de linguagem, traços da posição enunciativa do locutor e da forma composicional do gênero (marcas linguísticas ou estilo).

Comparando-se esses pressupostos com os de formação de uma comunidade

discursiva (SWALES, 1990), torna-se possível inferir a coincidência teórica das esferas

relacionadas a ambos os conceitos discursivos de gênero e comunidade. O sujeito,

experiente no uso e na compreensão de determinados gêneros, também adquire práticas

discursivas relacionadas aos temas, ao estilo, à estrutura composicional, aos

posicionamentos enunciativos, etc. Ao tratarmos dos gêneros discursivos, dessa forma,

tratamos igualmente da construção da identidade do sujeito frente às diversas comunidades

discursivas às quais ele tem contato, e vice versa − fato esse que norteia a metodologia de

análise, apresentada no próximo capítulo.

Além disso, essa cadeia de fenômenos do discurso ocorre devido à prática discursiva

do sujeito mediante aos conteúdos, às mídias e as tecnologias de informação, o que leva a

discussão à próxima subseção.

2.3.1. Multimodalidades e multiletramentos

As novas tecnologias de comunicação e de informação se consolidaram nas décadas

finais do século XX, impactando fortemente na maneira como o ser humano passou a

encarar o próprio ato de comunicar-se e "ler" o mundo. Os textos e discursos, cada vez mais

interconectados em uma rede hipertextual, adaptaram-se às novas mídias e transformaram

a maneira como acessar informações. Com a expansão da internet e a popularização dos

dispositivos eletrônicos inteligentes14, dinamizou-se na construção e publicação de textos o

traço da multimodalidade − ou seja, como descreve Komesu (2012, p. 79), a natureza

textual está ligada às diversas modalidades semióticas que se entrecruzam em uma

       14

(27)

produção significativa, em um “ambiente que, por hipótese, permite acesso 'ilimitado' a todo

e qualquer texto, não somente àquele reconhecido como 'verbal', comumente atribuído ao

recurso gráfico". Tal natureza multimodal pode ser justificada principalmente pelo avanço da

tecnologia computacional, que "facilita não apenas o emprego fácil de uma ampla variação

tipográfica em termos de fonte, tamanho, cor, etc., como também o uso de textos dinâmicos

que ‘surgem’, ‘voam pela tela’, ‘giram’, ‘aparecem e desaparecem’, etc." (UNSWORTH,

2001, p. 9).

Ou seja, as novas tecnologias possibilitaram que a comunicação fosse ampliada por

meio de um texto cada vez mais multimodalizado e hipertextualizado15, o que levaria ao

surgimento de novas práticas de leitura, relacionadas ao uso de suportes digitais na

reprodução de textos em mídia e do contato dos leitores com os mesmos, em contraponto

às práticas tradicionais tipográficas. Tal fenômeno, como aponta Soares (2002), de certo

modo gerou uma modificação na maneira com que o processo de letramento16, em seu

sentido mais tradicional, centrado em uma cultura da leitura em papel impresso, se tornasse

ainda mais complexo e diversificado, tanto no aspecto formal quanto no semiótico e cultural.

E assim o texto, que inserido na multimodalidade "dobra-se, redobra-se, divide-se e

volta a colar-se pelas pontas e fragmentos" (LÉVY, 1999, p. 149), inaugurando novas

práticas leitoras, também gera os letramentos múltiplos − ou multiletramentos −, que

passam a abranger áreas semióticas multimodais, como a imagem e o som (ROJO, 2013, p.

8), além dos

diferentes efeitos cognitivos, culturais e sociais em função ora dos contextos de interação com a palavra escrita, ora em função de variadas e múltiplas formas de interação com o mundo – não só a palavra escrita, mas também a comunicação visual, auditiva, espacial (SOARES, 2002, p. 156).

Os letramentos múltiplos são, portanto, resultado das práticas de leitura em diversos

meios e suportes e do contato com a diversidade modal e dos textos, cada vez mais amplos

em possibilidades tecnológicas. No ciberespaço17, possibilitado pela expansão do uso

globalizado da internet nas últimas décadas, assim como nos suportes tecnológicos da

contemporaneidade, diversos novos tipos de letramento podem surgir, à medida que novos

recursos sejam implementados. Jogos digitais, nosso objeto de reflexão, constituem um

gênero baseado nesses suportes e serão discutidos a seguir.

       15

Hipertextualidade, segundo Komesu (2012, p. 80-81), trata-se de um "dispositivo, ao mesmo tempo, material e discursivo, que permite, mediante links nele indexados, acessar determinados hipertextos (não quaisquer uns) que circulam na internet, disseminando, dessa maneira, sentidos socioistoricamente condicionados por práticas atualizadas não apenas na rede, mas também fora dela".

16

O conceito de letramento pode ser entendido como um "estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e exerce as práticas sociais que usam a escrita" (SOARES, 1998, p.47), ou então "a habilidade de entender a informação" (LANHAM, 1995, p. 1).

17

(28)

2.4.

G

AME

:

MULTIGÊNERO MULTIMODAL

Huizinga (2000) defende a ideia de que o jogo, em seu sentido mais geral18, faz parte

das relações humanas e de suas interações com o mundo, mesclando-se à cultura e à

comunicação de modo indissociável. Isso levaria as formas da linguagem humana a estarem

relacionadas ao jogo, em suas diversas esferas, tendo em vista que

as grandes atividades arquetípicas da sociedade humana são, desde início, inteiramente marcadas pelo jogo. Como por exemplo, no caso da linguagem, esse primeiro e supremo instrumento que o homem forjou a fim de poder comunicar, ensinar e comandar. É a linguagem que lhe permite distinguir as coisas, defini-las e constatá-las, em resumo, designá-las e com essa designação elevá-las ao domínio do espírito. Na criação da fala e da linguagem, brincando com essa maravilhosa faculdade de designar, é como se o espírito estivesse constantemente saltando entre a matéria e as coisas pensadas. Por detrás de toda expressão abstrata se oculta uma metáfora, e toda metáfora é jogo de palavras. (HUIZINGA, 2000, p. 7)

E desse jogo de palavras, da prática comunicativa do ser humano, seria possível

afirmar que provêm os novos sentidos, as novas formas de construir o discurso e o texto.

Consequentemente, o jogo como forma de entretenimento também é munido de linguagens

em sua formação e prática. Assim, o jogo de entretenimento, aquele considerado como uma

"ocupação separada, cuidadosamente isolada do resto da vida" (CAILLOIS, 2006, p. 125),

além de geralmente carecer de um espaço delimitado19, também poderia requerer o uso de

alguma ou mais formas de linguagem

Pensando nisso, ao analisar os jogos digitais, potencializados ao mesmo passo das

tecnologias informacionais, pode-se notar que seus recursos de linguagens muitas vezes

equivalem-se aos das mídias contemporâneas a eles. De modo semelhante à mídia

impressa, os primeiros jogos digitais também comumente limitavam-se a um meio semiótico,

tendo em vista os recursos eletrônicos disponíveis. Um exemplo é o jogo Blockade20,

lançado em 1976 pela desenvolvedora Gremlin21 para máquinas arcade22, que possuía a

imagem em movimento como meio semiótico central, consistindo-se na representação

gráfica de uma serpente percorrendo um espaço limitado na tela, como é possível ver na

figura 2.

       18

Um conceito amplo e generalizante de jogo, presente em Huizinga (2000, p. 24), considera que se trata de "uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da 'vida quotidiana'".

19

Para Caillois (2006, p. 125), essa ideia de jogo geralmente necessita de uma clara delimitação de espaço, como aquele destinado "às amarelinhas, o tabuleiro de xadrez ou damas, o estádio, a pista de corridas", entre outros. Sobre isso, ainda acrescenta que quase sempre é irrelevante para o jogo o que ocorre além desses limites, além de isso eventualmente significar alguma penalidade aos jogadores.

20

Conhecido popularmente no Brasil como "jogo da cobrinha". 21

Informações retiradas do website www.arcade-history.com (disponível em http://www.arcade-history.com/?n=blockade&page=detail&id=287, último acesso em 24/01/2015).

22

(29)

Figura 2. Tela básica do jogo Blockade, de 1976 Fonte: http://www.uvlist.net/game-2790-Blockade

Outro exemplo é o do jogo Zork I: The Great Underground Empire, desenvolvido e

lançado em 1980 pela desenvolvedora Infocom23 para microcomputadores compatíveis à

época; o único meio semiótico envolvido era o do texto escrito, tendo em vista que o jogador

apenas lia a narrativa e interagia com ela, tomando decisões por meio de enunciados

significativos à mecânica de jogo. A figura 3 apresenta um exemplo de tela de jogo.

Figura 3. Tela básica do jogo Zork, de 1976

Fonte: http://www.uvlist.net/game-169739-Zork+I+The+Great+Underground+Empire

À medida que a indústria de jogos avançou em termos tecnológicos, assim como as

áreas tecnológicas da informática, as condições para uma natureza multimodal nos jogos

digitais foram criadas e, assim, a linguagem neles tornou-se cada vez mais multissemiótica,

mesclando escrita e oralidade com som e imagem (inclusive é possível dizer que, a partir de

       23

(30)

199724, quando os controles de jogo passaram a reproduzir vibrações significativas ao

contexto dos jogos, a sensibilidade tátil25 também passou a ser explorada como meio

semiótico presente em jogos digitais). Com sua natureza multimodal, os jogos digitais

passaram a apresentar a linguagem escrita de modo diversificado e relacionado às imagens

e sons em sua experiência, comportando gêneros discursivos que, dentro do processo de

significação contextual de cada jogo, se hibridizam e se ressignificam: jogos digitais como

Super Mario Bros 3 (Nintendo, 1988), The Legend of Zelda (Nintendo, 1987) e Indiana Jones and The Fate of Atlantis (LucasArts, 1992)26, representantes das primeiras gerações de

jogos digitais multimídia de consoles e computadores, já apresentavam informações textuais

escritas em diálogos, cartas, pensamentos, inscrições públicas, livros, relatos históricos e

outros gêneros que se ressignificavam na narrativa e no contexto do jogo de forma que o

jogador, ao ter contato com cada um deles, tivesse que interpretá-los e relacioná-los ao

enredo e aos demais gêneros encontrados.

Figura 4. Exemplo de tela de Indiana Jones and The Fate of Atlantis, no qual um pensamento reflexivo do personagem é ressignificado como uma instrução de jogo, dentro de uma situação-problema

Fonte: http://imgkid.com/

Em meio à análise das capacidades que um jogo digital contemporâneo pode ter em

trazer gêneros discursivos ao contato dos jogadores, hibridizando-os e (res)significando-os,

pode-se dizer que jogos digitais funcionam como uma espécie de multigênero, servindo de

espaço de materialização de uma ampla diversidade de gêneros de discurso, e com caráter

       24

Em 1997, a empresa Nintendo lançou o Rumble Pak, um acessório que, ao ser acoplado ao controle de jogo, fazia-o vibrar. (http://www.gamespot.com/articles/rumble-pak-titles-on-the-rise/1100-2466717/, acessado em 24 de janeiro de 2015).

25

Após o lançamento desse acessório pela Nintendo, as desenvolvedoras de jogos passaram a cada vez mais integrar a vibração física como algo que informe o jogador sobre determinadas circunstâncias no contexto de jogo, como aproximação a elementos estratégicos, mudanças no tipo físico de solo, impactos, etc.

26

(31)

multimodal, devido aos recursos tecnológicos multimídia disponíveis nas plataformas onde

são executados.

Para uma terminologia mais clara, nesse estudo considera-se game como o jogo de

natureza e suporte digital, enquanto jogo é a própria categoria ampla, incluindo não apenas jogos digitais, como também os analógicos (de cartas, de tabuleiro, narrativos, físicos, etc.)

2.4.1. Categorização de jogos

Em um sentido mais geral o jogo é considerado por Huizinga (2000) como algo

intrínseco da relação humana com o mundo e mútua, desde os processos mais primitivos de

formação de culturas27. Consequentemente, a linguagem humana e o jogo também

possuem uma relação afim, projetando-se nos jogos digitais modernos tal como apontou-se

na seção anterior. Ao representar, utilizar e trazer à tona uma gama de conceitos

específicos, recursos, modalidades semióticas, interações e gêneros discursivos, a

categorização de jogos digitais pode ser complexa e difusa, levando-se em consideração as

distintas possibilidades de viéses de análise, cada um relativamente coerente com relação a

seus pontos de vista. Portanto, é conveniente iniciar a discussão em torno das categorias

mais amplas de jogo até aquelas mais específicas dos jogos digitais mais atuais.

2.4.1.1. Games e atividades lúdicas

Em um primeiro plano, é preciso discutir quais elementos são considerados mais

relevantes para entender um jogo digital em sua natureza e estrutura e diferenciá-lo de

outras atividades lúdicas. Na perspectiva de Caillois (2006, p. 128), algumas características

imprescindíveis aos jogos, mas resumíveis à consituição da forma como se joga, segundo

ele, seriam estas: serem livres, consistindo-se em uma atividade não-obrigatória;

separados por fronteiras de tempo e espaço, definidos e explicitados em si mesmos;

indeterminados ou não-fixados, pois seu curso interno, dentro dos limites gerais, não pode

ser plenamente determinado a não ser pelas decisões do jogador; improdutivos, pois não

geram riquezas nem outros bens de quaisquer naturezas, a não ser que sejam trocados

entre os próprios jogadores28;

governados por regras, fundando novas regras acima das

ordinárias já existentes, que podem não valer nesse contexto; de faz de conta, criando uma

segunda realidade em contraponto à vida real.

       27

"(...) a cultura surge sob a forma de jogo, que ela é, desde seus primeiros passos, como que "jogada". Não queremos com isto dizer que o jogo se transforma em cultura, e sim que em suas fases mais primitivas a cultura possui um caráter lúdico, que ela se processa segundo as formas e no ambiente do jogo. Na dupla unidade do jogo e da cultura, é ao jogo que cabe a primazia. Este é objetivamente observável, passível de definição concreta, ao passo que a cultura é apenas um termo que nossa consciência histórica atribui a determinados aspectos." (HUIZINGA, 2000, p. 37)

28

Imagem

Figura 1. Primeira tela do jogo Super Mario Bros, exemplo de First Goomba  Fonte: Google Imagens
Figura 2. Tela básica do jogo Blockade, de 1976  Fonte: http://www.uvlist.net/game-2790-Blockade
Figura 4. Exemplo de tela de Indiana Jones and The Fate of Atlantis, no qual um pensamento reflexivo do  personagem é ressignificado como uma instrução de jogo, dentro de uma situação-problema
Figura 5. Esquema de jogo dentro dos elementos de interação, problemas, competição e tomadas de decisão  Fonte: Burgun (2013)
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Referências

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