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ARRENDAMENTO DENÚNCIA DE CONTRATO HABITAÇÃO

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 0624314

Relator: PEREIRA DA SILVA Sessão: 19 Dezembro 2006 Número: RP200612190624314 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: REVOGADA.

ARRENDAMENTO DENÚNCIA DE CONTRATO HABITAÇÃO

HERDEIRO

Sumário

I- A necessidade de habitação para residência exigida para a denúncia do contrato de arrendamento tem de ser séria, real e actual, não bastando o desejo de ali viver, quando, sendo emigrante, regressar ao país.

II- Pertencendo o prédio a uma herança, este requisito, que tem de existir à data da propositura da acção, tem de verificar-se em relação a quem ocupa o lugar activo da relação jurídica do contrato de arrendamento, não aos

herdeiros e muito menos a um herdeiro específico.

Texto Integral

Apelação 4314/06--2

Apelante: Herança indivisa de B………… e C………….;

Apelada: Herança indivisa de D……….

1) Relatório.

1.1) E………….., F………. e marido G……….., todos residentes nos Estados Unidos da América, em nome próprio e em representação da herança aberta por óbito de H……….., instauraram acção declarativa de condenação sob a forma sumária, contra a Herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de B………….. e mulher I………., representada pelos seus herdeiros J………. e

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C……….., pedindo a denúncia do contrato de arrendamento a que se alude no art.º 7º do articulado inicial, com efeitos no dia 1 de Janeiro de 2003, data em pretendiam que o imóvel fosse entregue à "Autora", livre e devoluto de

pessoas e bens.

1.1.1) Alegam, para tal e, em síntese, que a "demandante" E……… necessita do locado para sua habitação, uma vez que pretende regressar definitivamente dos Estados Unidos da América.

1.2) C…………. apresentou contestação, alegando que sempre habitou com os seus progenitores e que para ela se transmitiu a posição de titular do

arrendamento, não renunciando a tal direito.

Impugnou, quanto ao mais, a invocada necessidade da "Autora" habitar o locado.

1.3) A Autora apresentou resposta arguindo a caducidade do direito alegado pela Demandada, quanto ao arrendamento em questão.

1.4) Por apenso a estes autos, foi deduzido incidente de habilitação de

adquirente por parte de Ana E…………, uma vez que em 11.9.04 foi outorgada escritura pública de partilha extra-judicial, pela qual se formalizou e

concretizou a partilha da herança indivisa de B……….. e sua mulher I…………, pela qual foi atribuído o imóvel dos autos à mencionada E……… (vd. fls. 4/8 do apenso B). Foi a mesma julgada habilitada para, no lugar dos restantes

Autores, prosseguir os termos da demanda.

1.5) Foi proferido o despacho de fls. 99 e 100.

1.6) Que foi acatado através da peça processual de fls. 113/115.

1.7) Foi proferido despacho saneador, elaborado especificação e questionário, os quais não foram objecto de reclamação – fls.121/125.

1.8) Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, e pelo despacho de fls. 171 a 172, respondeu-se à matéria factual constante do questionário.

Tal despacho não foi objecto de qualquer reclamação.

1.9) Foi proferida sentença que no seu segmento decisório exarou:

"A) Declarar extinto, por denúncia para habitação da autora E……….., o

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contrato de arrendamento relativo ao prédio urbano composto por casa de habitação de rés do chão com 4 divisões, 1º e 2º andares com 5 divisões cada, sito no ……., em Vila Real, inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º 86 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Real sob o n.º 128.677 a fls. 174 v.º do Livro B-324 e a que se reporta a alínea e) dos factos provados.

B) Condenar a ré C………… a despejá-lo e a entregá-lo à autora, livre de pessoas e bens, após o decurso de seis meses sobre o trânsito em julgado desta decisão.

C) Condenar a autora E………. a pagar à ré C………. a indemnização correspondente a dois anos e meio de renda à data do despejo.

Custas pela Ré C…………., sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.

Registe e notifique."

1.10) Desta decisão foi interposto recurso de apelação por J………. e por C…………..

1.10.1) Quanto ao primeiro apresentou as seguintes conclusões:

" 1-- A acção foi proposta contra a herança ilíquida e indivisa representada por apenas parte dos respectivos herdeiros. Não tendo sido citados os demais herdeiros, como as autoras requereram na p.i., não poderia a herança ser condenada no pedido.

2-- A sentença considera provados vários óbitos sem que os mesmos sejam comprovados por documento como é exigido pelo artigo 211 do CR Civil. Esta falta não pode ser suprida pelo M. Juiz, nem pela aceitação tácita ou expressa da ré herança, que não está devidamente representada para tal. A prova do óbito é, neste tipo de processos, elemento essencial. A sentença viola assim o artigo 211 do CR Civil.

3-- Tendo as autoras alegado e sido considerado provado que a herança era a titular do direito de propriedade sobre o prédio em causa, e alegando

necessidade da casa para um dos herdeiros, a sentença que tal decide viola o disposto na al. a) do artigo 71 do RAU.

4-- A denúncia nos termos do artigo 69 do RAU exige condições pessoais previstas no artigo 71 e que devem ser provadas em acção intentada antes de seis meses do final do contrato (art. 70). Como a acção foi proposta em 2002 e a autora E……… adquiriu o prédio por partilha da herança apenas em 2004, não tinha os requisitos alegados na p.i. e que foram objecto de oposição. A situação a apreciar em julgamento te que ser pessoal e reportada à data da entrada da petição em juízo, com exige o artigo 70 e 71 do RAU, pelo que foram violados estes artigos. A decisão viola o artigo 71 do RAU.

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6-- Não tendo as partes alegado o limite temporal referido no artigo 71, não pode a M. Juíza suprir tal falta, muito menos de forma vaga, referindo que tal situação decorre dos autos. Acresce que tal facto não foi sequer levado ao questionário nem sobre ele foi produzida qualquer prova, pelo que não pode ser levado em conta na sentença final. A M. Juíza violou o disposto no artigo 264 e 664 2ª parte do CPC.

7-- Nenhuma das autoras alegou que a sua posição de facto existia há mais de um ano pelo que, exigindo a lei este pressuposto a sentença violou o referido artigo 71.

8-- A necessidade de casa para fundamentar o despejo tem que ser séria, actual, real, devendo resultar de factos que integram estas exigências.

A simples declaração de regressar ou mesmo a existência de tal desejo, desacompanhado de outros factos ou elementos que permitam aquilatar da seriedade ou razão de ser de tal vontade não integra a necessidade prevista no artigo 69 do RAU. Ver, entre outros, acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11.1.99, JTRP00024848, processo 9851304 in www.dgsi.pt.

Assim violou, por errada interpretação o referido artigo 69 do RAU.

9-- A intenção da autora em regressar não só não está fundamentada nem credibilizada nos autos de forma a que a mesma possa ser averiguada e analisada, como, pelo contrário, resulta dos factos comprovados por

documento que a mesma não é plausível já que a autora reside nos Estados Unidos, há mais de vinte anos, na mesma rua da sua única filha que ali está casada e ali nasceu, e não tem outros familiares em Portugal.

A decisão de considerar tal desejo como existente integra errada apreciação das provas apresentadas. E incorrecta análise dos elementos existentes nos autos.

Por tudo o exposto, deve a sentença proferida ser anulada e substituída por outra que absolva a ré do pedido."

1.10.2) Quanto à segunda gizou as seguintes conclusões:

"1ª -- A Autora não alegou nem consequentemente se provaram, factos

concretos que demonstrem a efectiva necessidade do locado para nele habitar;

2ª -- Igualmente não alegou, nem se provou, que não era proprietária nem arrendatária, há mais de um ano, de casa que satisfizesse as suas

necessidades habitacionais;

3ª-- Apenas se fez prova de que é sua intenção regressar a Portugal e ir residir no arrendado, não possuindo qualquer outra moradia no nosso país para o efeito.

4ª Da prova fixada não se extraem os motivos determinantes da pretensão da

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A., pelo que não se pode considerar verificada a necessidade efectiva, real e séria do locado para sua habitação.

5ª -- É manifesto que a A. apenas pretende a desocupação do prédio visando pôr termo a um contrato que, para ela, é altamente desvantajoso, já que a renda é extremamente baixa.

6ª -- Pela correcta interpretação e aplicação das regras dos art.°s 69.° e 71.°

do R.A.U. não poderia, a douta sentença recorrida, considerar (como erradamente o fez) verificada a necessidade.

7ª -- Consequentemente, na adequada aplicação de tais normas, deverá a acção improceder.

Subsidiariamente:

8ª -- Ainda que a acção devesse proceder, nunca o diferimento da desocupação poderia ser fixado apenas em seis meses.

9ª-- Considerando a real situação social, familiar e económica da recorrente, à luz da correcta aplicação das regras e dos art.°s 102.° a 104.° do R.A.U. (que a douta sentença não respeitou), será de fixar tal diferimento no requerido e legalmente admissível, prazo de um ano.

Dando provimento ao presente recurso e, em consequência, decidindo pela improcedência da acção, ou, a não se entender assim, considerando

procedente o pedido subsidiário."

1.11) Foram apresentadas contra-alegações propugnando pela manutenção do decidido.

1.12) Correram e foram tomados os vistos legais.

-- Thema decidendum.

A questão central colocada pelos recursos interpostos consiste em apurar, dado o circunstancialismo de facto dado como provado, se estão reúnidas as condições para a concretização da denúncia do contrato de arrendamento dos autos, tendo em atenção a disciplina legal da norma complexa emergente da conjugação dos artigos 69, nº 1, al. a) e nº 2, 70, 71 e 72 do RAU.

2) Matéria de Facto provada.

2.1) A autora, Herança, é dona e legítima proprietária do prédio urbano composto por casa de habitação de rés do chão com 4 divisões, 1º e 2º andares com 5 divisões cada, sito no …….., em Vila Real.

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2.2) Tal prédio encontra-se inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º 86 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Real sob o n.º 128.677 a fls. 174 v.º do Livro B-324.

2.3) E pertence-lhe, porquanto foi adquirido, por compra, efectuada pelo falecido D………., marido da autora E…………, a L………… e mulher M………...

2.4) Nunca tendo nele residido, quer o falecido D……….., quer a sua mulher, pelo facto de, já à data da aquisição, se encontrar arrendado aos autores da Herança – ré.

2.5) Tal imóvel foi arrendado a B…………. e mulher I…………, por contrato celebrado a 10 de Janeiro de 1964.

2.6) A renda anual acordada foi de Esc. 15.000$00 (quinze mil escudos), devendo ser paga em duodécimos mensais de Esc. 1.250$00, montante esse nunca até hoje actualizado ou aumentado.

2.7) Consignou-se no aludido contrato que teria a vigência de um ano, com início a 1 de Janeiro de 1964 e terminus no último dia do mês de Janeiro de 1965, sendo automaticamente renovado por igual período de tempo, se não fosse denunciado por nenhuma das partes, no prazo legal.

2.8) Na pendência do mencionado contrato de arrendamento, faleceu o arrendatário marido, mantendo-se nele a aí residir, a arrendatária mulher.

2.9) Por sua vez, a arrendatária I……….. faleceu a 7 de Fevereiro de 2002.

2.10) A ré C………. nasceu a 5 de Abril de 1943.

2.11) A autora E………… pretende regressar a Portugal definitivamente, vinda dos Estados Unidos da América, onde esteve emigrada durante mais de vinte anos.

2.12) E instalar a sua habitação no prédio referido na alínea a).

2.13) Não possuindo qualquer outra moradia no nosso país para o efeito.

2.14) A ré C………., sempre e desde o início do arrendamento, habitou com

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os arrendatários, seus progenitores.

2.15) No dia 10 de Julho de 2002 a ré C………… enviou uma carta para a autora E……….. na qual lhe comunicava o óbito da arrendatária I………….

2.16) Na aludida missiva, a ré também referiu que sempre residiu no locado, com os arrendatários, seus pais.

2.17) E que não renunciava ao direito ao arrendamento.

2.18) A ré C………… habita no arrendado com os seus dois filhos maiores.

2.19) Não possui quaisquer bens imóveis, nem exerce qualquer ocupação remunerada.

2.20) O seu agregado familiar sobrevive, apenas, com os rendimentos mensais auferidos pelos seus filhos.

2.21) A ré C……….. não dispõe, imediatamente, de outra habitação, sendo-lhe difícil conseguir, a curto prazo, arrendar outra.

2.22) Por outro lado, tem uma saúde débil.

3) -- O Direito.

3.1) Foi deduzido pedido de denúncia do contrato de arrendamento dos autos com alegação de necessidade de habitação para residência, por parte da Demandante.

A denúncia para arrendamento vem prevista em termos conjugados, nos

artigos 50, 51, 68 a 73, 107 a 110, 113, 118, 121 e 123º, do RAU, e consiste na declaração feita por um dos contraentes, em regra com certa antecedência sobre o termo do período negocial em curso, de que não quer a renovação ou a continuação do contrato renovável ou fixado por tempo indeterminado, dirigida ao funcionamento da caducidade do contrato de arrendamento.

Uma vez que a denúncia só é possível nos casos previstos na lei e pela forma nela estabelecida (artigo 68 nº 2 do RAU), teremos que averiguar se o caso em concreto configura uma dessas situações.

Assim, são casos de denúncia pelo senhorio as situações previstas no artigo 69 do RAU, interessando-nos considerar a alínea a) do nº 1 do citado preceito legal, que estabelece que o senhorio pode denunciar o contrato para o termo

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do prazo ou da sua renovação "quando necessite do prédio para sua habitação, ou dos seus descendentes em 1º grau, ou para nele construir a sua

residência".

A necessidade do prédio para habitação constitui o requisito base da denúncia assim como constitui causa de pedir da acção (Ac. Relação de Lisboa,

6.3.1981, Ricardo da Velha, CJ, 2, pág. 162; Rui Vieira Miller, Arrendamento Urbano, Almedina, 1967, pág. 152).

O fundamento da acção dirigida à denúncia é a necessidade de habitação pelo senhorio, "fundamento esse que funciona como um macro-requisito ou um requisito prévio em relação ao conjunto dos requisitos do artigo 1098º"

(actualmente artigo 71 nº 1 do RAU), sendo aliás "a verdadeira causa

justificativa, aos olhos da lei, da denúncia do contrato" (Antunes Varela – Pires de Lima, Código Civil Anotado, II, 3ª Edição revista e actualizada, Coimbra Editora, pág. 579).

O RAU não esclareceu se o senhorio, para além da alegação e prova dos requisitos do nº 1 do artigo 71, tem de alegar e provar, como requisito autónomo, a necessidade do prédio para sua habitação.

Mas de acordo com a Doutrina e Jurisprudência dominantes, é o senhorio que tem de alegar e provar factos que conduzam o Tribunal a concluir que

efectivamente necessita da casa para sua habitação (Pais de Sousa, Cardona Ferreira e Lemos Jorge, Arrendamento Urbano – Notas Práticas, Rei dos Livros, 1996, pág. 140 e 141; Acórdão da Relação de Lisboa, 21.6.1990, Cardona Ferreira, CJ, 3, pág. 144; STJ, 7.10.1986, Joaquim Figueiredo, BMJ, 360-571; Acórdão da Relação de Lisboa, 27.4.1995, Cruz Broco, CJ, 2,

pág.126; Acórdão da Relação de Lisboa, Santos Bernardino, 20.6.1996, CJ, 3, pág. 124; Tribunal Constitucional, 16.1.1996, Ribeiro Mendes, DR. II,

30.4.1996, págs. 5803).

Essa necessidade deverá ser real, séria e actual para que, justificando-se as exigências de habitação do senhorio, cesse o proteccionismo de que goza o locatário.

Este conceito de necessidade, representa aquilo a que Pinto Furtado, chamou de "facto-conclusão "assente em dados apreensíveis pelos sentidos e

ponderados segundo as regras da experiência, de acordo com as exigências normais da vida e do estado do denunciante" (Curso de Direito dos

Arrendamentos Vinculísticos, Almedina, 1984, pag. 449), referindo,

posteriormente (Manual do Arrendamento, Almedina, 1996, pag. 763), que se trata de um "estado de carência económico-material; portanto, essencialmente um facto e, mais propriamente, um facto que não se evidencia directamente por si, mas como produto natural doutros factos (factos-meios ou

instrumentais), de que é o corolário lógico - um facto-conclusão, em suma" .

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A necessidade da casa como fundamento de despejo constitui excepção à regra que domina o inquilinato para habitação, devendo por isso, como já referido, ser uma necessidade real e séria que, para além de devidamente demonstrada, tem de traduzir razões ponderosas, visto que não basta aquela necessidade que roça a comodidade, e tem que simbolizar um estado actual ou pelo menos eminente (cf. Isidro de Matos, Arrendamento e Aluguer, Atlântida, 1968, pág. 243).

Essa necessidade pode além do mais ser futura, desde que séria e comprovada e iminente (Galvão Teles, Denúncia do Arrendamento para Habitação Própria, Parecer, CJ, 1983, 5, pág. 11; Acórdão do STJ, 7.10.86, Joaquim Figueiredo, Proc. n.º 073868, www.dgsi.pt).

Para que o senhorio possa denunciar o contrato de arrendamento para sua habitação ou dos seus descendentes em 1º grau, é necessário de acordo com o artigo 71º, n.º 1, alíneas a) e b):

Que seja proprietário, comproprietário ou usufrutuário do prédio há mais de cinco anos, ou, independentemente desse prazo, se o tiver adquirido por sucessão;

Que não tenha, há mais de um ano, na área das comarcas de Lisboa ou do Porto e suas limítrofes ou na respectiva localidade quanto ao resto do País casa própria ou arrendada que satisfaça as necessidades de habitação própria.

A necessidade do prédio para habitação é o requisito primeiro, que é também causa de pedir na acção; os requisitos aqui supra mencionados aparecem já

"configurados como condições de exercício do direito de denúncia.

Ou seja, os requisitos da alínea a) e b), do artigo 71 do RAU, são

"circunstâncias necessárias para a concessão da tutela jurisdicional que é requerida pelo Autor" circunstâncias essas que impendem "da existência ou constituição da situação jurídica alegada" (Miguel Teixeira de Sousa,

Introdução ao Processo Civil, Lex, 1993, pág. 73). Por outro lado a

necessidade que integra a causa de pedir da acção, diz respeito e circunscreve a situação subjectiva trazida ao processo, por isso os requisitos do artigo 71, não se confundem com a causa de pedir, sendo dela autónomos.

Em suma, a causa de pedir neste tipo de acção para denúncia de um contrato de arrendamento é a necessidade do prédio para habitação, e os requisitos do artigo 71º, nº 1, alíneas a) e b), são apenas requisitos, condições da acção, ou pressupostos do exercício desse direito.

"In casu" importa averiguar se os factos alegados, e os depois provados,

configuram uma situação de necessidade da casa arrendada para habitação, e uma vez demonstrada esta, cumpre verificar se estão preenchidos as

condições de exercício do direito de denúncia--requisitos do artigo 71 do RAU.

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3.2) Em consonância com o que se acaba de expor vejamos quais os factos dados como provados, eventualmente relevantes para aferirmos da ocorrência da "necessidade" que vem consignada no artigo 69 nº1 al. a) do RAU.

São eles os seguintes:

"A autora E…………. pretende regressar a Portugal definitivamente, vinda dos Estados Unidos da América, onde esteve emigrada durante mais de vinte anos.

E instalar a sua habitação no prédio referido na alínea a). Não possuindo qualquer outra moradia no nosso país para o efeito." – vd. 2.11, 2.12 e 2.13 supra.

Comparando este mínimo acervo factual com o que se disse acima sobre o que se devia entender como necessidade de habitação, é fácil concluir que não foi conseguida prova de modo a poder-se firmar tal juizo dedutivo, pelo qual se deveria estabelecer o conteúdo do sobredito conceito, de modo a percebê-lo suficientemente densificado, e portanto, como se defendeu acima, legalmente relevante para integração tal como previsto no artigo 69.

Com efeito, o que a matéria de facto nos deslinda é a ocorrência de a herdeira E………… ser emigrada nos Estados Unidos há mais de 20 vinte anos, querer voltar para Portugal, definitivamente, e querer habitar a casa dos autos, o que aliás são factos perfeitamente compreensíveis.

Esta linearidade não se enquadra no entanto na previsão legal, ou se se quiser, constituindo neste caso particular, a necessidade de habitação a causa de pedir imediata da acção, a instrução e discussão da causa, não permitiu canalizar para o processo factos-instrumento, cuja adição e concatenação viabilizassem o facto-conclusão "necessidade", tal como o descrevemos.

Impondo a Lei (artigo 68 nº 2 do RAU) o exercício do direito de denúncia para habitação por parte do senhorio por forma muito vinculada, a mera invocação de querer habitar a casa dos autos, por regresso a Portugal, nas condições apontadas, e considerar-se essa invocação como alegação suficiente para tal exercício, mais do que isso, para o sucesso de tal exercício, redundaria em perspectivar esse direito, mais como um direito potestativo, atenta a sua

caracterização clássica, do que um poder vinculado, sujeito a condicionalismos estritos, o que se situaria nos antípodas da opção legal do Legislador.

A este propósito dizia-se no acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 7.7.92, no BMJ 419/844: "Necessitar de um prédio é precisar dele, precisão que há-de traduzir-se na sua imprescindibilidade e que deve representar um estado de carência actual conexionado com a situação concreta existente quando o contrato de arrendamento foi celebrado.

Não sendo imediatamente apreensível a necessidade do locado para habitação a que corresponde o direito de denúncia pelo senhorio, carece de base factual

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que, valorada no plano legal, preencha o seu conceito técnico-jurídico."

Acrescente-se ainda que não constitui estranheza constatar a exiguidade da matéria de facto dada como provada relativa ao aludido conceito. É que logo na p.i. se pode lobrigar essa magreza alegatória, constando apenas nessa peça processual aqueles factos que enumerámos, dados como provados, relevantes para o efeito aqui em causa, sem que se tivesse invocado uma cadeia factual que a ser provada, estribasse a conclusão necessária, como referimos atrás.

(Sem factos-instrumento não poderá ocorrer o facto-conclusão logicamente neles assente.)

Numa palavra, quem devia provar a substancialidade da causa de pedir não o fez, e terá que se extraír as devidas consequências de tanto.

3.3) Ainda assim, e para que se não diga que houve omissão de pronúncia, é necessário analisar outro aspecto da controvérsia. Diz respeito concretamente às condições exaradas no artigo 71 do RAU, em particular aquela que é

veículada na al. a) do seu nº 1.

Como consta do processo (vd. p.i. e escritura de partilha no apenso respectivo) e como deve determinar-se sob um ponto de vista processual, autora aqui, é a herança indivisa dos autores da sucessão, nomeadamente B………… e I………..

.

Significa isto que estando nós perante comunhão hereditária, todos os

herdeiros são titulares das relações patrimoniais que se inscrevem na esfera jurídica da herança, que permanecendo indivisa, implica, quanto aos

herdeiros, que não exista determinação de parte ou de objecto, relativamente aos bens que a integram. Consequentemente é a herança que ocupa o lugar activo da relação jurídica do contrato de arrendamento, não os herdeiros, e muito menos um herdeiro específico, tomando como ponto de referência a altura em que é interposta a acção.

A redacção do do nº 1 do artigo 71 do RAU diz que o direito de denúncia para habitação do senhorio depende, em relação a ele, da verificação dos

"seguintes requisitos".

Ou seja, estes, têm que se reportar necessária e pessoalmente ao senhorio.

Ademais, a verificação dos mesmos, tem que se verificar ao momento em que a acção é interposta.

Consequentemente, a conclusão a extraír, é que no momento de interposição da presente acção, a herdeira E……….., não era a senhoria no que toca ao contrato de arrendamento, ocupando essa posição, antes, a herança.

A atribuição pessoal dos requisitos é feita pela Lei de forma inequívoca, e está em consonância com o carácter excepcional do exercício de direito de

denúncia para habitação por parte do senhorio, como o artigo 68, nº2,

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vincadamente inculca, e que o artigo 71 torna a sublinhar.

Apenas com a escritura pública de partilha extra-judicial é que cessou a indivisão da massa hereditária, operando-se a determinação de parte e de objecto, integrando-se nessa altura o prédio dos autos na esfera patrimonial da até então herdeira E………, que por via dela, surge como proprietária dele e se assume como senhoria no que ao contrato de arrendamento diz respeito.

Mas mais de dois anos depois da data de interposição da acção.

Por esta via se tem que concluir, que no momento de interposição da presente acção, não se verificava o requisito prescrito na al. a) do nº 1 do artigo 71 do RAU, e por arrastamento consequencial, também não se verifica o

condicionalismo do artigo 70 do RAU (a data da escritura de partilha extra- judicial é de 14.9.04).

3.4) Feita esta análise torna-se incontornável que o pedido deduzido não pode proceder; aliás, já quando nos debruçámos sobre a questão da necessidade de habitação, se perfilou tal desfecho, atenta a argumentação exposta.

Pelo que, dilucidado o objecto primacial dos recursos, não é necessário indagar sobre outros argumentos expostos pelos mesmos, posto que não

corporizam questão ou questões diferentes, mas antes, razões argumentativas, que se não reconduzem a questões que se têm de conhecer, sendo certo, que em via de recurso, o Tribunal "ad quem" se há-de pronunciar sobre aquelas concretamente postas, não havendo necessidade de passar em revista todos os argumentos explanados pelas Partes.

Decisão.

Face ao exposto acordam os Juízes que constituem esta 2ª secção cível do Tribunal da Relação do Porto, em conceder procedência aos recursos de apelação interpostos, revogando a sentença apelada, julgando a presente acção improcedente, por falta de requisitos legais, nomeadamente por

referência às disposições conjugadas dos artigos 68 nº2, 69, 70 e 71 do RAU, absolvendo-se a Ré do pedido.

Custas em ambas as Instância a cargo da Autora.

Notifique-se.

DN.

Porto, 19 de Dezembro de 2006 José Gabriel Correia Pereira da Silva Maria das Dores Eiró de Araújo Anabela Dias da Silva

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