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COMUNICAÇÃO COERCITIVA: INTERNET COMO FATO SOCIAL E SUAS CARACTERÍSTICAS DE GENERALIDADE, EXTERIORIDADE E COERCITIVIDADE

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Revista Litterarius – Faculdade Palotina www.fapas.edu.br/revistas/litterarius

COMUNICAÇÃO COERCITIVA: INTERNET COMO FATO SOCIAL E SUAS CARACTERÍSTICAS DE GENERALIDADE, EXTERIORIDADE E

COERCITIVIDADE

Jean Michel Laureth* Evandro José Machado**

Felipe Antônio Fachini Gabriel***

Resumo: A comunicação entre os indivíduos, membros da sociedade moderna, está em constante mudança. Observando as novas alterações comportamentais na comunicação objetivou-se estabelecer a caracterização de fato social para a internet e seu uso. Neste contexto, as molduras de exterioridade, generalidade e coercitividade são as faces do novo modelo de interação e, assim, procurou-se estender os apontamentos sobre a ação coercitiva da comunicação. Resultado de uma pesquisa bibliográfica, que pretendeu apontar como a mudança do comportamento comunicacional global afeta os indivíduos que estão às margens do conhecimento tecnológico e de seu uso. A internet, como fato social, é um elemento moldável e de característica generalista, uma vez que incorpora as novas ações humanas e representa um movimento independente que não pode ser freado. Incorporar o novo organismo representa a capacidade de comunicar-se com outros seres ativos do grupo. O artigo apresenta os pensamentos de vários pesquisadores, como Pierre Lévy, Émile Durkheim, Manuel Castells e Zygmunt Bauman, que apontam para um movimento global. A internet não é mais um elemento externo aos grupos sociais, ela é uma coisa, um fato social, que se incorporou à comunicação. Um objeto de estudo não findável.

Palavras-chave: Rede de computadores. Comunicação. Relações sociais. Fato social.

Coercitive Communication: Internet As A Social Fact And Its Characteristics Of Generality, Exteriority And Coercitivity

Abstract: Communication between individuals, members of modern society, is constantly changing. Observing the new behavioral changes in the communication was aimed to establish the social fact characterization for the internet and its use. In this context, the frames of exteriority, generality and coercivity are the faces of the new model of interaction and, thus, we tried to extend the notes about the coercive action of communication. The result of a

* Jornalista formado pela Faculdade Sul Brasil – Fasul. E-mail: jmlaureth@hotmail.com

** Mestre em Ética e Filosofia Política - Professor na Faculdade Assis Gurgaz. E-mail:

machadinho27@hotmail.com

*** Jornalista formado pela Faculdade Sul Brasil - Fasul. E-mail: felipefachini2fs@gmail.com

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bibliographic research, which aimed to show how the change in global communication behavior affects the individuals who are on the margins of technological knowledge and its use. The internet, as a social fact, is a formative element and a generalist characteristic, since it incorporates new human actions and represents an independent movement that can not be restrained. Incorporating the new organism represents the ability to communicate with other active beings in the group. The article presents the thoughts of several researchers, such as Pierre Lévy, Émile Durkheim, Manuel Castells and Zygmunt Bauman, who point to a global movement. The internet is no longer an external element to social groups, it is a thing, a social fact, that has been incorporated into communication. An object of study that can not be completed.

Keywords: Computer network. Communication. Social relationships. Social fact.

Introdução

O uso da internet1 e a própria internet tornaram se parte da vida econômica e social da cultura mundial moderna. “A internet é o tecido de nossas vidas” (2003, p. 07), revelou Castells, em sua obra “A Galáxia da Internet”, ao descrever como o uso da internet pode ser comparado ao uso da eletricidade e do motor, e como a internet fundamentou-se na base tecnológica para a Era da Informação: a rede – como define. “Atividades econômicas, sociais, políticas, e culturais essenciais por todo o planeta estão sendo estruturadas pela Internet e em torno dela, como por outras redes de computadores” (CASTELLS, 2003, p. 08), apontamento que leva a fazer uma observação mais atenta ao comportamento comunicacional, envolvendo em todo o processo e evolução técnica e cultural, sua interferência nas relações e no modo de comunicação. O mesmo autor ainda explica que “[…] as pessoas, as instituições, as companhias e a sociedade em geral transformam a tecnologia, qualquer tecnologia, apropriando-a, modificando-a, experimentando-a” (2003, p. 10). O que revela no uso da internet, a história social da tecnologia, uma tecnologia da comunicação, ou seja, a internet transforma o modo de comunicar-se e, por consequência, as vidas são afetadas por essa nova tecnologia. “Por outro lado, ao usá-la de muitas maneiras, nós transformamos a própria Internet. Um novo padrão sociotécnico emerge dessa interação” (CASTELLS, 2003, p. 10). É esse novo modelo sociotécnico, essa nova atmosfera de relações humanas, que libera o ser humano da relação presencial, possibilitando-o vencer distâncias, espaço e tempo (BARBOSA, 2014, p. 115). Segundo O´Brien (2001 apud GONÇALVES, 2004, p. 4467),

1 O uso regular da palavra internet, ganhou aspecto de substantivo comum, podendo ser grafada com minúscula.

A palavra “internet” é preferível por maior parte dos pesquisadores. Contudo, pode se usar a maiúscula por se entender a Internet (redução de internetwork, “ligação entre redes”) como um nome próprio (PIACENTINI, 2013).

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deve-se entender a organização como um sistema sociotécnico, ou seja, o sistema implica na conciliação de pessoas, atividades, tecnologia, cultura e estrutura. Um novo padrão, modelado pela globalização, a qual, “[…] revelar-se-á como mecanismo gerador da renovação do laço social, que se caracterizará por uma nova relação com o saber, promovida pela sinergia de competências, de imaginação e de inteligência coletiva” (SILVA, 1999, p. 02).

O comportamento comunicacional em rede é um desafio aos pesquisadores, haja vista a fragmentação e a multiplicidade de ferramentas e caminhos. Uma velocidade de mudanças que abre brechas entre compreensão, análise e estudo de situações, criadas a partir da internet e no uso da internet. “A velocidade da transformação tornou difícil para a pesquisa acadêmica acompanhar o ritmo da mudança com um suprimento adequado de estudos empíricos sobre os motivos e os objetivos da economia e da sociedade baseadas na internet”, diz Castells (2003, p. 08).

Ao estudar os avanços tecnológicos, ligados ao modo de comportamento comunicacional humano, observou-se mudanças comportamentais da sociedade, do ser em seu modo de agir dentro do grupo.

Destacou-se que as comunidades são estabelecidas pela associação de membros, ou seja, ao pensar em comportamento comunicacional no ambiente online – uma comunidade humana – faz-se referência a um tipo de sociedade (OLIVEIRA, 2003). Na virada do segundo milênio, com novas tecnologias e ferramentas, voltou-se ao conceito de sociedade societária, onde para o autor, “as relações sociais nas sociedades societárias tendem a ser transitórias, superficiais e impessoais. Os indivíduos associam-se uns aos outros em função de propósitos limitados” (OLIVEIRA, 2003, p. 50). Essa sociedade descrita por Oliveira, é o reflexo do comportamento humano em rede, no uso da internet e das novas tecnologias. O indivíduo tornou-se mais independe com objetivos findáveis. “A vida perde o caráter unitário coesivo.

[…] A relativa uniformidade de pensamento é em geral substituída por uma enorme variedade de interesses e ideias divergentes” (OLIVEIRA, 2003, p. 50). Interesses que convergem em novos universos socialmente construídos, através das redes de comunicação online – internet – e que, segundo Berger e Luckmann, são produtos históricos da atividade humana, dotados da capacidade de modificação pela ação dos indivíduos, assim “A realidade é socialmente definida. Mas as definições são sempre encarnadas, isto é, indivíduos concretos e grupos de indivíduos servem como definidores da realidade” (BERGER; LUCKMANN, 2003, p. 157).

O que eles explicam é que é preciso entender a organização social para entender o estado do universo socialmente construído em qualquer momento.

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O que se procurou é absorver as mudanças do comportamento comunicacional, observando que se referem diretamente à mudança social, uma vez que “mudança social é qualquer alteração nas formas de vida de uma sociedade. Nenhuma sociedade é perfeitamente igual a si mesma em dois momentos sucessivos de sua história” (OLIVEIRA, 2003, p. 179), o que incorpora a transfiguração do modelo de interações estabelecidas a partir dos avanços tecnológicos permeados pela internet e as ferramentas digitais de comunicação onde “pela incorporação das mudanças, a história de cada sociedade vai sendo construída de maneira sucessiva e única” (OLIVEIRA, 2003, p. 180).

Neste artigo, busca-se tratar a internet, o seu uso e sua caracterização, como fato social, recorrendo aos escritos de Durkheim para apresenta-la como fato social, a partir das suas respostas sociais de generalidade, exterioridade e coercitividade. Os autores Émile Durkheim (2001), Pierre Lévy (1993; 1999), Manuel Castells (2003), Antonio Nicolau Youssef e Vicente Paz Fernandez (1988), Zygmunt Bauman (2007) e outros relatos de pesquisadores ajudarão a sintonizar a internet e o seu uso como ferramenta de comunicação em um produto, uma coisa – como fato social. Em especial, dedicou-se um capítulo ao caráter coercitivo da comunicação que emergiu do alvorecer tecnológico da segunda década do século XXI.

1 Fato social

O indivíduo, em seu ato de ser pensante, representa as inspirações e resoluções particulares que cabem somente a ele como único detentor da razão. Contudo, avance-se ao campo do conhecimento coletivo, do construir e inferir representações sociais a partir da consciência coletiva. Durkheim define o fato social através do seguinte relato: “Fato social é toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior: ou então, que é geral no âmbito de uma sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria, independente das suas manifestações individuais” (DURKHEIM, 2001, p. 40).

A conjectura social entre indivíduos vai além das percepções da psicologia, pois, o grupo formado por particularidades constituiu um novo fenômeno. Durkheim descreve, que deve ser estudado como pensamento coletivo e de representações coletivas, do qual se obtém um substrato diferente da consciência individual. “Mas, para que haja fato social, é pelo menos necessário que vários indivíduos tenham combinado a sua ação e que desta combinação tenha resultado algum novo produto” (DURKHEIM, 2001, p. 26), no qual os

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efeitos, desejos, ações e juízos não dependam do indivíduo, mas são resultantes de um processo cognitivo coletivo, em seu caráter institucionalizante. Sobre este aspecto, o autor afirma que é possível “chamar instituição a todas as crenças e a todos os modos de comportamento instituídos pela coletividade; a sociologia pode então ser definida como: a ciência das instituições, da sua gênese e do seu funcionamento” (DURKHEIM, 2001, p. 26).

Invoque-se, então, a sociologia e aos pressupostos de Durkheim para revelar as preposições que exprimem o caráter fato social das interconexões humanistas através das quais os grupos constroem novas representações da coletividade social.

Não é possível definir o fato social pela sua generalidade no interior da sociedade.

Características distintivas do fato social: 1ª) a sua exterioridade em relação às consciências individuais; 2º) a ação coercitiva que exerce ou é suscetível de exercer sobre essas mesmas consciências. Aplicação desta definição às práticas constituídas e as correntes sociais. Verificação desta definição. Outra maneira de caracterizar o fato social: o estado de independência em que se encontra em relação às suas manifestações individuais. Aplicação desta característica às práticas constituídas e às correntes sociais. O fato social generaliza-se por ser social, mas não é social porque se generaliza. Como esta segunda definição se reduz à primeira. Como os fatos de morfologia social ajustam-se nesta mesma definição. Fórmula geral do fato social (DURKHEIM, 2001, p. 31).

Assim, especule-se sobre os três aspectos que formulam a caracterização do fato social, suscite-se: exterioridade, coercitividade e generalidade.

1.1 Exterioridade

Representa todos os aspectos que estão além do ser, refere-se aos contatos e as ações as quais não estão diretamente ligadas a seu desejo. Assim, tudo aquilo que norteia o homem em sociedade, as concepções de família e deveres, as relações comerciais, as crenças e os costumes que ao indivíduo estão voltados, mesmo antes dele existir como matéria, são os aspectos que existem externamente a ele e sua vontade. “São as maneiras de agir, de pensar e de sentir que apresentam a notável propriedade de existir fora das consciências individuais”

(DURKHEIM, 2001, p. 32), que refletem o modo como é o comportamento e como se age em sociedade, são exteriores ao desejo e até mesmo exteriores ao conhecimento, uma vez que a elas foram apresentados e moldados, mesmo sem perceber que tais aspectos direcionam o comportamento coletivo.

Como Durkheim (2001) descreve, não são apenas exteriores aos indivíduos, mas ganham aspectos imperativos e coercitivos, afinal, são práticas que são seguidas independentemente da vontade da pessoa.

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1.2 Generalidade

A repetição dos indivíduos acerca de certas consistências coletivas não caracteriza por si só um aspecto de generalidade. Tal resultado é caracterizado, através da convergência entre as crenças, tendências e as práticas coletivas que se fragmentam e refletem no caráter individual do ser. Em suma, é possível inferir que a generalidade está no hábito que se repete e toma para os intermediários um aspecto de manifestação coletiva. “[…] é um estado do grupo que se repete nos indivíduos porque se impõe a eles; está em cada parte porque está no todo, e não no todo por estar nas partes” (DURKHEIM, 2001, p. 37). Em síntese, a generalidade do fato social que repousa sobre as ações e reações das consciências individuais que convergem ao ressoar coletivo sobre determinado aspecto espaço-temporal, é a mesma força movendo no mesmo sentido. Conforme Durkheim (2001, p. 37), “[…] se uma maneira de se comportar, que existe exteriormente às consciências individuais, se generaliza, não pode ser senão impondo-se” (DURKHEIM, 2001, p. 38).

1.3 Coercitividade

Em alguns aspectos a coercitividade nebulosa entra na prática já sedimenta, fazendo com que os homens se moldem de forma assimilativa, mas ganham forma no momento em que procura resistir. As máximas morais, as convenções diretas e indiretas abstraem o poder coercitivo. Leis, regras, costumes, idioma, moeda de troca, uso de padrões de produção, são algumas das ferramentas coercitivas às quais o indivíduo está fadado a seguir. Porém, mesmo que tente resistir, terá resultado nulo, uma vez que a prática social é mais forte e submerge o desejo individual (DURKHEIM, 2001). Isso também se reflete na autonomia individual, uma vez que “é hoje incontestável que a maior parte das nossas ideias e tendências não são elaboradas por nós, mas antes nos vêm do exterior, elas só podem penetrar em nós impondo- se” (DURKHEIM, 2001, p. 33). Tal apontamento reflete a suscetibilidade do homem ao poder de coerção social, imposto pelas reações socioculturais à qual está restrito.

1.4 Comportamento técnico-social

Assim é possível categorizar os aspectos da sociedade moderna alicerçados nos preceitos de Durkheim, revelando aos novos ambientes técnico-sociais, propiciados pelo

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avanço tecnológico. Escavar sobre estas novas etapas é incutir a discussão das novas características comportamentais e sociais em que as gerações da cibercultura estão inseridas.

Oliveira, a partir dos apontamentos de Durkheim, descreve que “os fatos sociais são o modo de pensar, sentir e agir de um grupo social. Embora os fatos sociais sejam exteriores, eles são interiorizados pelo indivíduo e exercem sobre ele um poder coercitivo” (OLIVEIRA, 2003, p.

13), revelando um caráter externo aos desejos e vontades pessoais, sob a ótica de grupo social, com força de coerção, a partir da necessidade de adaptação ao meio. Castells (2003), descreve o mundo social da internet como diferente e incoerente, “[…] tão diverso e contraditório quanto a própria sociedade” (CASTELLS, 2003 p. 48) e ele ainda acrescenta que “é uma extensão da vida como ela é, em todas as dimensões e sob todas as suas modalidades”

(CASTELLS, 2003, p. 100). Se então, a internet é como a vida em sociedade fora da rede, não é possível se desassociar dela. Então, é correto instigar que, a vida moderna do século XXI está balizada pela estreita relação entre real e virtual e assim tencionando a relação social comunicativa entre aquele que a entende – a internet – e dela participa para aquele que dela está faltoso.

É o desejo externo ao sujeito que concebe o modelo coercitivo da comunicação no uso da internet, como Durkheim revela: “É um estado do grupo que se repete nos indivíduos porque se impõe a eles; está em cada parte porque está no todo, e não no todo por estar nas partes” (DURKHEIM, 2001, p. 37). O estado atual do grupo está moldado pelo uso da internet como comunicação. Logo, a internet se impõe ao indivíduo de forma coercitiva, uma vez que ela está no todo, onde todas as novas relações se encontram no virtual.

2 Internet como fato social

Ao procurar descrever o fenômeno tecnológico de integração mundial, iniciou-se pelos apontamentos de Durkheim, para o qual, a regra fundamental de observação dos fatos sociais é tratar como coisas2, assim, se esvaziar das noções místicas precedentes, agrupar os fatos segundo as características externas e que estas sejam as mais objetivas possíveis (DURKHEIN, 2001).

2Para o filósofo francês, René Descartes, o conceito de coisa é mais amplo que a distinção de objetos. Para ele, há uma divisão entre res cogitans (coisa pensante) e res extensa (coisa extensa). A primeira está alocada ao pensamento, a existência - eu sou uma coisa pensante, a sua generalidade imaterial, envolta à coisa externa - sensível. A segunda, por sua vez, faz alusão ao aspecto material da realidade. A internet pode ser entendida como uma res cogitans, um elemento imaterial, virtual de existência sublime. Para maiores esclarecimentos, Cf.

SILVA, Bruno dos Santos. A “res cogitans” no pensamento de René Descartes. 2014. Disponível em:

<http://pensamentoextemporaneo.com.br/?p=2610.html>

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A internet tornou-se uma inundação de natureza exponencial, explosiva e caótica.

Lévy (1999), fala sobre como esse fluxo de informações e interações ganhou de Roy Ascott o termo “segundo dilúvio”. Termo que segundo Lévy, refere-se a um oceano de informações, a uma rede de comunicação, à amplificação do pensamento, ao enriquecimento da imaginação e à extensão dos sentidos humanos. Lévy descreve esse novo ambiente de relacionamento e interação como Ciberespaço. O termo refere-se à interconexão dos computadores, à rede, o oceano de informações, e sobre ele, cresce e transforma-se intermitentemente e exponencialmente a cibercultura, que pode ser definida como as “[…] atitudes, técnicas, pensamentos e valores desenvolvidos junto com o ciberespaço” (LÉVY, 1999, p. 17). Produto da internet, ou até mesmo compreendido como a ferramenta modeladora de tal, a cibercultura faz do uso da internet um elemento em constante mutação, tão imprevisível e fervilhante.

Aspectos postos à custa ao se avaliar o processo sociocultural, envolvido em seu uso. “A dificuldade de analisar concretamente as implicações sociais e culturais da informática ou da multimídia é multiplicada pela ausência radical de estabilidade neste domínio” (LÉVY, 1999, p. 24). Isso confirma a internet como um processo de inteligência coletiva que se desenvolve e propaga-se de forma exponencial, onde o ciberespaço releva um campo em expansão desenfreado para a cibercultura, o que o mesmo autor revela como universal sem totalidade, a essência paradoxal da cibercultura (LÉVY, 1999, p. 111).

É a reflexão sobre a cibercultura, como inteligência coletiva, que poderá dar nortes aos estudos de fato social para essa discussão como para as vindouras, afinal é impossível findar um juízo sobre um processo humano e técnico que evolui constantemente. É como Castells (2003) define a internet: “[…] a internet é uma tecnologia particularmente maleável, suscetível a ser profundamente alterada por sua prática social, e conducente a toda uma série de resultados sociais potenciais – a serem descobertos por experiência, não proclamados de antemão” (CASTELLS, 2003, p. 10).

A internet, o seu uso e suas implicações – cibercultura -, estão inseridas em grande parte de todas as atividades humanas atuais, mesmo que não alcance a totalidade dos indivíduos do planeta, suas interações são de caráter mundial. É uma nova sociedade, partindo de um intenso processo de desenvolvimento técnico e ampliação das informações (YOUSSEF; FERNANDEZ, 1988).

Pode-se identificar a internet como fato social, uma vez que ela se solidificou e existe externamente ao desejo individual. Um homem pode escolher não fazer parte da cibercultura, porém ela é externa a sua vontade e incorpora as ações econômicas e comunicacionais planetárias e a sua exterioridade está em existir e se auto sustentar sem que os desejos

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individuais possam interferir em sua estrutura global. “Os indivíduos de todas as latitudes começam a se sentir interpelados pela globalização. […] A conexão ao mundo realiza também e sobretudo, na ordem do vivido” (MATTELART, 2000, p. 175-176), onde a internet, através de seu efeito globalizador e generalizador incorpora a mutação do modelo econômico, cultural e sobretudo comunicacional de integração entre ser e estar em sociedade. Em síntese, a generalidade da internet é o próprio uso dela, em todas as atividades humanas modernas. Esse novo modelo comportamental é a cibercultura, e o “valor da cibercultura é o universal”

(LÉVY, 1993, p. 113), onde optar em não participar é escolher estar fora do movimento de interconexão e inteligência coletiva pois, é a necessidade de sobreviver e participar que faz do uso da internet um elemento coercitivo (LÉVY, 1999).

Lévy confirma que é uma evolução sem métrica, que não pode ser totalizável. “Quanto mais o ciberespaço se amplia, mais ele se torna universal, e menos o mundo informacional se torna totalizável” (LÉVY, 1999, p. 111). Não é só externo ao desejo do ser, como é autossustentado pelo próprio sistema, é o próprio ciberespaço, “Um único computador, vivo, fervilhante, inacabado” (LÉVY, 1999, p. 44), afirmou o autor ao se referir ao conjunto de computadores e à rede mundial, interligada como um único computador em constante evolução, o ciberespaço. Um conjunto, um grande computador, que não pode ser desligado pela vontade individual, mas existe e se mantém vivo, através das constantes ações econômicas, industriais e culturais que alimentam este modelo de interação e comunicação – o virtual, o digital – a informática. A internet é um campo comunicacional aberto, uma rede de comunicação global. Contudo, o uso e evolução são reflexos da ação humana, em condições específicas da história (CASTELLS, 2003).

A consciência coletiva e a convergência informacional refletem a característica de generalidade a qual pertencem a internet e seu uso. É o processo de inteligência coletiva, de interconexão, onde toda a rede (a internet) é o ciberespaço. Através dele e por ele é que as interações entre os indivíduos se enriquecem e modelam o ambiente sociocultural. Como Lévy afirma, é a propriedade de colocar em sinergia os dispositivos de criação, informações e comunicação de todos os navegantes do segundo dilúvio (LÉVY, 1999). Os usuários da internet, conectados à rede de informações, constituem um grupo de identidade coletiva universal, onde a cultura local e regional está hora em conflito, hora em suporte, ao modelo cultural global que constitui um movimento social energizante. “Virtualmente, todas as mensagens encontram-se mergulhadas em um banho comunicacional fervilhante de vida, incluindo as próprias pessoas, do qual o ciberespaço surge, progressivamente, como o coração” (LÉVY, 1999, p. 118). Essa vivacidade retém o conceito de generalidade e dá

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suporte ao aspecto de exterioridade que o uso da internet desenvolveu. Ao avaliar o crescente movimento social, são observáveis as relações de natureza superficial onde o que reflete é o tempo real e a internet é o meio de produção, propagação e consumo, em tempo real, ou seja, aquilo que o indivíduo realiza/consome no agora, porque, no momento seguinte já se tornou passado, um movimento generalizado onde, conforme Lévy, surge a constituição de um novo tipo de temporalidade social, o grupo em torno do “tempo real”, do agora (LÉVY, 1993, p. 118). Um ambiente que o filósofo Bauman descreve como passagem da fase “sólida” para a modernidade “líquida”:

Ou seja, para uma condição em que as organizações sociais (estruturas que limitam as escolhas individuais, instituições que asseguram a repetição de rotinas, padrões de comportamento aceitável) não podem mais manter sua forma por muito tempo (nem se espera que o façam), pois se decompõem e se dissolvem mais rápido que o tempo que leva para moldá-las e, uma vez reorganizadas, para que se estabeleçam (2007, p.

07).

A queda das estruturas é o reflexo de uma sociedade globalizada, de um ambiente virtual global, onde os membros constroem novas experiências online que norteiam as ações do grupo. “A sociedade é cada vez mais vista e tratada como uma rede em vez de uma estrutura. Ela é percebida e encarada como uma matriz de conexões e desconexões aleatórias e de um volume essencialmente infinito de permutações possíveis” (BAUMAN, 2007, p. 09).

Conforme Durkheim, a investigação do fato social também repousa sobre a característica de coercitividade, que em síntese, agrega um conjunto de meios e elementos dos quais o indivíduo não pode lançar mão sem ser prejudicado. Na segunda década do século XXI o avanço dos meios de comunicação e a popularização do uso de internet solidificou a cibercultura como um elemento fundamental da contextualização social do indivíduo. Lévy descreve que “habitamos todos os meios com os quais interagimos” (1993, p. 196), contudo, mais que interagir, a nova cultura virtual sujeita o indivíduo a uma reforma organizacional e das mentalidades, individuais e coletivas. O ciberespaço é um ambiente, um movimento social, onde são aceitos todos os pensamentos e críticas, todos os modelos e culturas, um campo aberto que acolhe a todos, um grande mar onde há espaço para cada indivíduo navegar.

“O nervo do ciberespaço não é o consumo de informações ou de serviços interativos, mas a participação em um processo social de inteligência coletiva” (LÉVY, 1993, p. 194) que reflete no modelo comercial, cultural e de gestão, dentro e fora da rede. “Os modos de comunicação e de acesso à informação se definem por seu caráter diferenciado e personalizável, sua

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reciprocidade, um estilo de navegação transversal e hipertextual, a participação em comunidades e mundos virtuais diversos” (LÉVY, 1993, p. 193).

Aquilo que Pierre Lévy já prenunciava antes da virada do milênio, consumou-se como a máxima global da cibercultura. Porém, ao mesmo tempo em que se consumou em um ambiente de participação comunitária e de inteligência coletiva, ganhou um aspecto coercitivo. Ao se observar a vida em sociedade, olhando para países de primeiro mundo, países emergentes e até mesmo médias e grandes cidades de países, considerados de terceiro mundo, é possível identificar que as atividades humanas e sociais estão enredadas ao ambiente online/digital, ou seja, aqueles que não estão aptos ao uso ou não tem acesso ao mundo virtual, ao ciberespaço, estão fora do contexto atual de sociedade global, excluídos da cibercultura. Esse novo mundo interconectado é o que Lévy descreve como inteligência coletiva, e explica que sua eficácia contribui para acelerar a mutação em andamento e para isolar ou excluir ainda mais aqueles que dela não participarem (LÉVY, 1999). Deste modo, é possível identificar o caráter coercitivo do uso da internet, pois, o novo contexto de construção comercial e cultural está fixado ao novo ambiente, à nova cultura global. O indivíduo pode abster-se da cibercultura, contudo está fadado à exclusão, técnica e social, uma perspectiva que será ainda mais expoente nas próximas décadas, Lévy já presumia o crescimento exponencial e indeterminado, dizendo que “A aceleração da mudança, a virtualização, a universalização sem fechamento são tendências de fundo, muito provavelmente irreversíveis” (LÉVY, 1999, p. 200). O mesmo autor ainda revela a máxima da coercitividade, encontrada na cultura da internet moderna, segundo o qual, cada novo sistema de comunicação produz seus excluídos. Neste caso, o indivíduo desconectado da rede não pertence ao grupo e suas ações podem não chegar ao conhecimento coletivo, logo, suas atividades estão fadas ao definhamento.

A coercitividade da internet enquanto fato social, não recai sobre a internet como precursora e nem sua extinção, se assim fosse possível, tornaria o mundo livre de ações coercitivas, Castells explica essa modelação do comportamento humano no uso da internet.

A elasticidade da Internet a torna particularmente suscetível a intensificar as tendências contraditórias presentes em nosso mundo. Nem utopia nem distopia, a Internet é a expressão de nós mesmos através de um código de comunicação específico, que devemos compreender se quisermos mudar nossa realidade (2003, p.

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É sobre essa necessidade e envolvimento com o novo padrão sóciotécnico que repousa a coercitividade da internet, ou seja, as relações, econômicas, sociais e culturais passam a ser

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moldadas pelo ambiente virtual e mesmo fora dele são reflexo do seu uso e compete ao ser a necessidade de participar e conhecê-lo, como Durkheim explica: “Um fato social reconhece- se pelo poder de coerção externa que exerce ou é suscetível de exercer sobre os indivíduos;

[…] se uma maneira de se comportar, que existe exteriormente às consciências individuais, se generaliza, não pode senão impondo-se” (DURKHEIM, 2001, p. 37).

Pontue-se que Lévy, no livro “Cibercultura” descreve que “a dificuldade de analisar concretamente as implicações sociais e culturais da informática ou da multimídia é multiplicada pela ausência radical de estabilidade neste domínio” (1999, p. 24). Contudo, é sobre essas implicações que quase duas décadas depois repousa a caracterização da internet como fato social. O autor escrevera em um período onde o uso das redes estava limitado pelo espaço físico (desktop), mas o avanço tecnológico e a pluralização da internet, smartphones3 e redes sem fio, permite ao usuário estar conectado ao ciberespaço em todo tempo.

O que está em jogo nesse começo de século XXI é o surgimento de uma nova fase da sociedade da informação, iniciada com a popularização da internet na década de 80, e radicalizada com o desenvolvimento da computação sem fio, pervasiva e ubíqua, a partir da popularização dos telefones celulares, das redes de acesso à internet sem fio (“Wi-Fi” e “Wi-Max”) e das redes caseiras de proximidade com a tecnologia “bluetooth”. Trata-se de transformações nas práticas sociais, na vivência do espaço urbano e na forma de produzir e consumir informação. A cibercultura [...]

solta as amarras e desenvolve-se de forma onipresente, fazendo com que não seja mais o usuário que se desloca até a rede, mas a rede que passa a envolver os usuários e os objetos numa conexão generalizada (LEMOS, 2004, s/d).

A internet, e o que nela acontece, ultrapassa seu espaço virtual, porque ela é a matriz das relações sociais em todos os aspectos, é o espelho do real e o real se intensifica na rede.

3 Comunicação coercitiva

Fato é o uso da informática nas mais diversas ações do homem moderno do século XXI, no trabalho e no lar. Faz parte dos estudos e do entretenimento. Os escritores Antonio Nicolau Youssef e Vicente Paz Fernandez já revelaram há três décadas que a questão central da informatização repousa sobre o cunho fundamentalmente sociológico e comportamental. O que eles comparam à Revolução Industrial e seus reflexos:

3 Conceito para aparelho híbrido entre as funções de um telefone e um computador (RODRIGUES, 2009).

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13 Na nova ordem social, o computador desempenha um papel tão relevante quanto o da máquina a vapor no surgimento da Sociedade Industrial. As consequências sócio- economicas, políticas e culturais da utilização do computador e da informática serão análogas àquelas verificadas na Revolução industrial, exigindo, portanto, uma reflexão profunda do homem, na análise de suas tendências (YOUSSEF;

FERNANDEZ, 1988, p. 30).

Os autores apontam para uma sociedade informatizada, em que as alterações, segundo eles, podem levar, se não houver uma reflexão satisfatória, a graves riscos sociais. O processo de informação e uso da informática/internet, interfaces digitais, constituem uma matéria em constante metamorfose, revela:

Não há identidade estável na informática porque os computadores, longe de serem os exemplares materiais de uma imutável ideia platônica, são redes de interfaces abertas a novas conexões, imprevisíveis, que podem transformar radicalmente seu significado e uso. O aspecto da informática mais determinante para a evolução cultural e as atividades cognitivas é sempre o mais recente, relaciona-se com o último envoltório técnico, a última conexão possível, a camada de programa mais exterior (LÉVY, 1993, p. 102).

Sobre essa mutação constante, repousam, além da técnica, os relacionamentos humano-culturais, que refletem o uso e absorção da tecnologia como ferramenta de interação e comunicação. Lévy já propunha uma avaliação técnica-social das ferramentas digitais, muito à frente de seu tempo. Ele percebera que o ser, homem evolutivo, iniciará um novo processo de construção da inteligência, um processo de evolução e transformação em crescente expansão, sem previsões de término. Uma construção técnica intrinsicamente ligada ao comportamento e ao modo de relacionamento humano. Observou-se que o autor já citava a revolução através do computador, contudo, a evolução tecnológica e a popularização dos smartfones, na segunda década do nosso século, representa uma guinada aos pressupostos do sociólogo Pierre Lévy. Uma evolução técnica e cultural, de relacionamento e compreensão humana, que Lévy compara ao período da Renascença (LÉVY, 1993, p. 108). Silva descreve a vida social, intermediada pelas relações técnicas-sociais, como “[…] um construto que tem a sua génese e metamorfose nas tecnologias da informação e da comunicação, são essas tecnologias que geram novas dinâmicas fazendo surgir o que usualmente se designa de tecnocultura que gera uma nova ecologia cognitiva marcada pelo hibridismo e pela globalização” (SILVA, 1999, p. 05). Esse hibridismo da tecnocultura é o que, segundo a autora, dilui as fronteiras, revelando uma estrutura de “nós de conhecimento, e de aglutinação motivacional”, (SILVA, 1999, p. 05), um movimento social multiforme e incontrolável por essência (LÉVY, 1999).

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O mesmo autor já defendia o uso da internet como um elemento somatório ao desenvolvimento humano. Cabe aqui ressaltar que o objetivo do estudo não é fazer uma crítica a própria internet, a busca está em explorar as mudanças comportamentais de comunicação, estabelecidas a partir das novas relações entre homem, tecnologia e internet que inundam o planeta do século XXI. Para Lévy, no livro Cibercultura, “O virtual não “substitui”

o “real”, ele multiplica as oportunidades para atualizá-lo” (1999, p. 88). É sobre essa atualização que repousa o caráter coercitivo da comunicação, uma vez que os discursos e debates humanos face-to-face estão pautados no universo online, ou seja, o membro de uma sociedade tecnológica que não participa ativamente das interações online está desatualizado em relação ao tema de debate e pode sentir o caráter coercivo da internet nos relacionamentos sociais, “[…] este acontecimento transforma, efetivamente, as condições de vida em sociedade. […] cultura e social se aprofundam e se diferenciam a cada novo acontecimento”

(LÉVY, 1999, p. 111).

É o que o professor brasileiro, André Lemos descreve como um desenvolvimento comunicacional pervasivo e ubíquo. “Agora, em pleno século XXI, com o desenvolvimento da computação móvel e das novas tecnologias nômades (laptops, palms, celulares), o que está em marcha é a fase da computação ubíqua, pervasiva e senciente, insistindo na mobilidade.

Estamos na era da conexão” (LEMOS, 2004). Essa era da conexão definida por Lemos, pode ser também esclarecida, através dos apontamentos de Castells, como a “A Galáxia da Internet”, ou seja, a internet incorpora um movimento de comunicação revolucionário que possibilita mais do que a comunicação de um para muitos, é a comunicação de muitos para muitos, uma aldeia de nível global. Silva e Alvarenga explicam que o conceito de aldeia global foi preconizado pelo filósofo canadense Herbert Marshall McLuhan, que assim se refere à globalização. “Aldeia global quer dizer que o progresso tecnológico está reduzindo todo o planeta à situação de uma aldeia, ou seja, que as pessoas têm a possibilidade de se intercomunicar diretamente umas com as outras, independentemente da distância” (SILVA;

ALVARENGA, 2009, p. 141). É a caracterização da internet do século XXI, é um mundo interligado, com estreitas relações econômicas, políticas e sociais, fruto da evolução das Tecnologias da Informação e da Comunicação.

Assim como nas mais diversas atividades humanas, a internet e o seu uso também estão fadados a dois tipos de representações. Para aqueles que dela fazem uso e para aqueles que estão à margem do processo, descriminados e ou excluídos. “De fato, ser excluído dessas redes é sofrer uma das formas mais danosas de exclusão em nossa economia e em nossa cultura” (CASTELLS, 2003, p. 08). Entende-se a comunicação e o uso da internet para tal

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como uma nova cultura, como uma peça importante para a constituição social e cultural, Medeiros e Ventura (2008, p. 65) explicam que cada realidade cultural é dotada de uma lógica e, assim, também se formula o mundo tecnológico, a cibercultura.

É preciso que o sujeito saiba relacionar a variedade de procedimentos culturais com os contextos em que são produzidos para que as suas práticas e concepções lhe façam sentido, evitando comportamentos preconceituosos e para que lhe seja possível articular-se nesse contexto. Mesmo que a participação de um indivíduo em sua cultura seja sempre limitada, já que em nenhuma sociedade são todos os indivíduos igualmente socializados, […] ressalta que é necessário que exista um mínimo de participação do indivíduo no contexto cultural, a fim de permitir a sua convivência com os demais membros daquela sociedade(MEDEIROS; VENTURA, 2008, p. 65).

Medeiros e Ventura, revelam um importante elemento da comunicação coercitiva dentro da internet, em que o membro é levado a participar, mesmo que contra seu desejo, com o propósito de permitir a convivência com os outros membros. Não se ficou apenas no mundo virtual e as relações online, porque a internet e a mobilidade digital fazem do virtual, parte da construção social no real. “[…] é necessário, no entanto, reconhecer que a tecnologia se constitui num dos campos adaptativos da cultura, a partir do qual outras mudanças adaptativas e culturais se realizam” (MEDEIROS; VENTURA, 2008, p. 65).

A adaptação é exponencial da nova modalidade de comunicação, em que a coerção do uso digital revela-se na promoção do indivíduo como elemento membro da sociedade em que está inserido, em suma, é tornar o eu parte do todo, parte de um projeto existencial (SILVA, 1999). “A tecnologia catalisa alterações não só naquilo que fazemos, mas também na forma como pensamos. Modifica a percepção que as pessoas têm de si mesmas, umas das outras, e da sua relação com o mundo” (TURKLE, 1989, p. 14-15 apud SILVA, 1999, p. 03).

Essa relação pode ser entendida, como a nova cultura, é o que Zulmira Medeiros e Paulo Ventura (2008) descrevem como o conjunto complexo de valores, comportamentos e relações sociais, pois “A sua importância está relacionada com a possibilidade de o indivíduo agir socialmente, a partir de um saber tecnológico do qual ele se apropria e desenvolve a sua identidade, tornando-se um cidadão tecnologicamente competente” (MEDEIROS;

VENTURA, 2008, p. 66). Para a nova sociedade, fazer parte do grupo, é fazer parte do virtual, é conhecer, compreender e interpretar as novas inferências tecno-sociais sobre o grupo e o meio. Ianni descreve que “o signo por excelência da modernização parece ser a comunicação” (2000, p. 119) com destaque para a proliferação e a generalização dos meios eletrônicos de comunicação. A comunicação é inclusiva, mas também coercitiva, uma vez que estar aquém dela, é não participar da nova aldeia global, a aldeia que “pode ser vista como

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uma teoria da cultura mundial, entendida como a cultura de massa, mercado de bens culturais, universo de signos e símbolos, linguagens e significados que povoam o modo pelo qual uns e outros situam-se no mundo, ou pensam, imaginam, sentem e agem” (IANNI, 2000, p. 119). O uso da internet ganhou mais do que um significado, tornou-se um elemento de identificação social.

Considerações

A partir das leituras e estudos realizados no presente artigo, considera-se que é possível, através dos apontamentos de Durkheim, estabelecer um parâmetro entre o uso e a própria internet como fato social, uma vez que o fato social como coisa a ser estudada incorpora as mutações sociais que se estabeleceram com a ascensão da cibercultura das relações virtuais-reais, proporcionadas no ambiente online e também sua extensão ao mundo social, ao mundo real. Essa divisão já é obscura, uma vez que virtual e real se entrelaçam na vida em sociedade.

Generalidade, exterioridade e coercitividade são elementos caracterizadores do fato social e, conforme Durkheim, também são constituintes de corporificação de um objeto, cultura, ação, costume ou grupo como fato social. Com as indagações, foi possível encontrar na internet e no seu uso os três fatores determinantes do fato social, a generalidade – uma nova aldeia global – que surge no universo online, a exterioridade, onde o digital - a internet, corporifica uma rede de intersecções, um grupo de vias e nós mundial que existe independente da vontade individual e a coercitividade, ou seja, usar e participar da internet é fator determinante para integralizar o ser ao grupo.

Em especial, a coercitividade do fato social internet está intimamente ligado ao elemento comunicacional, um meio pelo qual os indivíduos são coagidos a incorporar o uso da internet em sua capacidade comunicacional a fim de fazer parte do grupo e da rede atual de conhecimento. O homem é coagido a aceitar e participar do mundo virtual para que possa ser aceito pelo grupo e, assim, fazer parte dele, fazer parte dessa nova cultura, da cibercultura, um elemento em constante mutação. “Acredita-se, portanto, que não se pode estudar a cultura como algo pronto, estático, pois ao mesmo tempo, ela é condicionada e condiciona uma sociedade que, por sua vez, está em constante transformação” (MEDEIROS; VENTURA, 2008, p. 65).

Contudo, os apontamentos são apenas um ensaio sobre a verdadeira e atual constituição da rede, um fato social: uma cultura generalista, exteriorizada e coercitiva. Que

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as pesquisas apresentadas possam servir para que pensadores observem as mutações de um universo em constante transformação, ou seja, “é importante ter em mente que a maioria das sociedades modernas são pluralistas. Isto significa que compartilham de um universo que é o seu núcleo, aceito como indubitável, e têm diferentes universos parciais coexistindo em um estado de mútua acomodação” (BERGER; LUCKMANN, 2003, p. 168). Uma acomodação de várias culturas que convergem para o mesmo caminho, virtual e global.

Compreender que a internet e o seu uso pelas pessoas se alterou em poucas décadas também é um elemento a ser explorado além dos conceitos técnicos. É uma cultura – já prenunciada por grandes autores, mas que ainda apresenta um grande campo sociológico, social, filosófico, técnico e comportamental a ser explorado, é uma pesquisa sem mensuração, vista a velocidade excêntrica de alteração do virtual e do seu modo de uso, pois, a alteração comportamental dos usuários é frenética. A caracterização é um estudo que concebe o real, que no futuro pode não esclarecer as novas indagações, uma vez que “[…] a pesquisa não pode ser completa quando seu objeto (a Internet) se desenvolve e muda muito mais depressa que o sujeito (este pesquisador – ou, aliás, qualquer pesquisador)” (CASTELLS, 2003, p. 11).

A coercitividade comunicacional imposta pela internet, como apontado na pesquisa, é um campo muito mais vasto e nebuloso que este trabalho possa interpretar, uma vez que o modo como as pessoas, os grupos – família, amigos e trabalho – estão se comunicando e interagindo está ganhando cada dia mais “curtidas” no ambiente virtual. As relações estão na rede, e quando os indivíduos se reúnem face to face o mundo virtual ainda é presente, ele é o assunto das conversas, o tema dos comentários. É o balizador entre aquilo que fazem ou gostam, ou então deixam de gostar. No final do século XX a rede e seu uso estava presa aos desktops e ao quarto onde ficava a máquina do usuário. Mas o avanço técnico foi muito mais rápido que a geração que concebera o conceito de rede e em poucos anos, os pontos, os nós da rede virtual, deixaram de estar presos a uma sala, para ganharem movimento. O uso de smartphones e a multiplicação exponencial de novos usuários faz com que a rede flua de um lugar para outro: em casa, no transporte, no trabalho e no lazer. A rede é reflexo da vida moderna que não descansa, ou seria o contrário?

A pesquisa, apresentada, procura esclarecer as mudanças comportamentais, com destaque para a comunicação, que ocorrem nas sociedades do século XXI. Uma alteração que se estende além da comunicação pessoal, mas está diretamente ligada à comunicação midiática e ao jornalismo, visto que essa nova estrutura de comunicação mundial força o jornalismo a uma nova adaptação. Um desafio para os jornalistas-navegantes do dilúvio informacional.

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O jornalismo não se sustentará, se não for capaz de compreender e agir sobre esse novo modelo de comunicação e que os pensamentos postos, possam ser alavancas para grandes discussões sobre o jornalismo e o modo de fazer jornalismo em meio a essa aldeia global.

Essas são incertezas e apontamentos que podem dirigir novas pesquisas acerca do comportamento comunicacional em rede. “Estamos em meio a uma reconfiguração cultural, econômica e política ainda sem contornos muito nítidos”. (LEMOS, 2004). Nada está certo, nada é o final, tudo ainda é moldável e provavelmente em constante transformação permanecerá.

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