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ABAIXO O ACUMULO! PALAVRAS-CHAVE: efeitos de sentido, discurso publicitário, slogans, evidências naturais.

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ABAIXO O ACUMULO!

CARMO, Alex Sandro de Araujo (PG – UNIOESTE)

RESUMO: Para compreender os efeitos de sentido contidos nos discursos é preciso

considerar, dentre alguns fatos, as junções do texto e do contexto, do que foi dito e quando foi dito, do enunciado concreto e da enunciação, sem os quais não se entenderia porque o sentido de um enunciado pode significar isso e não aquilo. Utilizando o saber indiciário, como método de trabalho, busca-se, neste estudo, visualizar efeitos de sentidos que não são ditos, mas, que são compreendidos. Isto é, pretende-se retirar de um slogan publicitário do iogurte Activia pistas e indícios que reiterem ou remontem certa realidade que não é vista diretamente no nível do intradiscurso. Acredita-se ser possível encontrar no corpus deste estudo, a articulação de já-ditos comuns e científicos que reproduzem discursivamente representações sociais da corporalidade atual que reforçam a eficácia social do imaginário existente sobre o corpo. O arcabouço teórico e analítico versa sobre questões pertinentes ao campo da Análise de Discurso de linha francesa, e está embasado, principalmente, nos estudos de Pêcheux (1997). Assim, pretende-se observar, nas materialidades discursivas de tal slogan, as relações de pertença ideológica que o constitui. Nesta perspectiva, procura-se desvelar as estratégias discursivas que criam “evidências naturais” para os sujeitos da contemporaneidade.

PALAVRAS-CHAVE: efeitos de sentido, discurso publicitário, slogans, “evidências

naturais”.

1 - Introdução

Para compreender os efeitos de sentido contidos nos discursos é preciso considerar, dentre alguns fatos, as junções do texto e do contexto, do que foi dito e quando foi dito, do enunciado concreto e da enunciação, sem os quais não se entenderia porque algo pode ser isso e não aquilo. O caminho que se pretende percorrer para utilizar o suporte teórico que sustentará o objetivo deste estudo, está pautado no paradigma indiciário, como método, e na anamnese, como metodologia.

O paradigma indiciário, como método para analisar anúncios publicitários, torna-se pertinente, principalmente, quando se precisa de um método de investigação que seja capaz de retirar de pequenas pistas e indícios fatos que remontem certa realidade que não é vista diretamente. Ginzburg (1989, p. 177) diz: “Se a realidade é opaca, existem zonas privilegiadas – sinais, indícios – que permitem decifrá-la”. Nesta direção, esse trabalho, propõe uma investigação centrada na anamnese para analisar os sinais e indícios deixados pelo slogan Abaixo o acumulo, do iogurte Activia.

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2 - O pré-construído

Pêcheux (1997), em Semântica e Discurso: uma crítica à afirmação do óbvio, inicia seu estudo, fazendo uma crítica ao realismo metafísico e ao empirismo lógico, buscando na relação explicação/determinação, que é um ponto lógico-linguístico, a sua referência para estudar a base comum em que certos processos, sejam nocionais, de origem ideológica, ou conceptuais, de origem científica, constituem-se como processos discursivos, com o intuito de trabalhar acerca da natureza material do sentido.

Dada a proposta para uma teoria materialista do discurso, Pêcheux (1997), ao mostrar algumas características da relação explicação/determinação, buscou no termo “pré-construído”, de P. Henry, uma forma de criticar as posições teóricas de Frege acerca do funcionamento da língua (ou seja, das questões de “pensamento” e de “ilusão”):

[...] a “ilusão” de que fala Frege não é o puro e simples efeito de um fenômeno sintático que constitui uma “imperfeição da linguagem”: o fenômeno sintático da relativa determinativa é, ao contrário, a condição formal de um efeito de sentido cuja causa material se assenta, de fato, na relação dissimétrica por discrepância entre dois “domínios de pensamento”, de modo que um elemento de um domínio irrompe num elemento do outro sob a forma do que chamamos “pré-construído”, isto é, como se esse elemento já se encontrasse aí. (PÊCHEUX, 1997, p. 99) (grifos do autor).

A partir da crítica a Frege, Pêcheux (1997) traz para o campo teórico da AD a noção de pré-construído, mostrando sua pertinência para o estudo da materialidade dos sentidos. Assim, Pêcheux (1997) demonstra que o caráter material do sentido depende tanto da formação ideológica, quanto da formação discursiva (doravante FD), e que esta dependência ocorre de duas maneiras: a) o sentido não existe na literalidade, ou seja, ele existe, por exemplo, na paráfrase, desde que se utilizem palavras de uma mesma formação discursiva. Assim, o processo discursivo é um sistema de relações de substituição, paráfrase, sinonímia, desde que seja esta relação determinada por uma mesma formação discursiva; b) uma formação discursiva dissimula sua dependência pela transparência de sentido e disfarça a objetividade material do interdiscurso, que indica que algo já foi falado antes e em outros lugares.

Desta maneira, Pêcheux indica que o pré-construído (ou seja, o já-dito) vem do interdiscurso e que a constituição do sujeito se dá por meio do esquecimento e pela

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identificação com uma FD que se revela no interdiscurso. Para reforçar a noção de pré-construído, destaca-se que o “pré-construído é um traço, no discurso, de um discurso anterior, que produz um efeito de evidência; é, por um lado, o já-dito, e, por outro, o que é uma verdade para uma FD” (POSSENTI, 2005, p. 385).

3 - Abaixo o acumulo

O slogan Abaixo o acumulo pertence ao lema publicitário mais atual do Activia. Pode-se entender com a utilização da palavra acumulo que um intestino que não funciona bem, isto é, que não consegue excretar os detritos que produz, acaba por acumular. Assim, a Danone, procura mostrar que há intestinos que ao invés de excretar substâncias começam a depositá-las no organismo humano. A Danone, para fazer a afirmação do slogan, vale-se de conhecimentos compartilhados por uma coletividade. Não é essa empresa que está dizendo pela primeira vez que se deve abaixar os níveis de substâncias do organismo. Há já-ditos nocionais que pregam que não se pode acumular substâncias, pois um corpo que acumula muitas substâncias não consegue atender aos padrões de beleza atuais que pregam o corpo como o lugar da magreza.

A essa luz, para abaixar os níveis de depósitos de substâncias indesejadas no organismo, este mote publicitário, de forma velada, vai por afirmar que ajuda a abaixar os níveis de substâncias que foram acumuladas no organismo pelo mau funcionamento intestinal. Em outras palavras, esse slogan leva a entender que com o consumo do Activia o acumulo de substâncias se acaba. Assim, a Danone além de afirmar/prometer que com o consumo do Activia se abaixa os níveis de substâncias no corpo, acaba por dizer implicitamente que também ajuda as pessoas na busca de um corpo belo, nesse caso, um corpo magro.

Na atualidade, há uma necessidade crescente em ter um corpo sempre pronto para ser exposto, como se a vida fosse uma vitrine, mostrando que se atende aos padrões de beleza e saúde veiculados pelos discursos presentes nas sociedades para o consumo. Esses discursos revelam que a preocupação com a qualidade de vida anda muito próxima da qualidade estética. Ou seja, muitas vezes se acaba preterindo a saúde em nome da beleza.

Busca-se, hoje em dia, muito mais a beleza do que a saúde. Por exemplo, há uma infinidade de receitas de dietas milagrosas que podem fazer as pessoas emagrecerem

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muitos quilos por semana. Essas dietas milagrosas, na maioria das vezes, acabam por desestabilizar/desregular o funcionamento fisiológico do corpo. Essas dietas prejudicam muito mais do que ajudam.

4 - Efeitos de sentido

“Nem tudo pode ou deve ser dito”. Esta afirmação, com certeza, lembra a

qualquer leitor mais atendo de trabalhos de Análise de discurso que se trata do conceito de FD. Por isso, não se aprofundará na descrição e delimitação deste termo neste trabalho, far-se-á, apenas, algumas colocações que darão mais consistência ao estudo.

Como é sabido por muitos, para alguns autores de AD, dentre eles Pêcheux (1997, p. 160), o que determina o que pode e deve ser dito são as formações discursivas. Nas palavras deste último, “Chamaremos, então, formação discursiva aquilo que, numa formação ideológica dada, isto é, a partir de uma posição dada numa conjuntura dada, determinada pelo estado de luta de classes, determina o que pode e deve ser dito” (grifos do autor). Buscando ratificar o que foi dito

[...] “os indivíduos são „interpelados‟ em sujeitos falantes (em sujeitos de seu discurso) por formações discursivas que representam „na linguagem‟ as formações ideológicas que lhes são correspondentes”. [...] “a interpelação do indivíduo em sujeito de seu discurso se realiza pela identificação (do sujeito) com a formação discursiva que o domina” (PÊCHEUX, 1997, p. 214) (grifos do autor).

Seguindo no sentido desta citação, pode-se dizer que o sujeito falante não é dono de seu dizer, e que os sentidos (efeitos de sentido), das palavras e/ou expressões que este sujeito reproduz em seu discurso, são dados por FDs determinadas, e que, portanto, uma mesma palavra e/ou expressão dita a partir de FDs diferentes pode não ter o mesmo sentido. Porém, palavras diferentes (numa relação metafórica ou sinonímica), desde que ditas de uma mesma FD, podem ter o mesmo significado, isto é, o mesmo efeito de sentido.

Possenti (2001, p. 48), no artigo Ainda sobre a noção de efeito de sentido, ao falar sobre efeito de sentido, recorrendo a textos do Pêcheux, diz que “a matriz do sentido não é a palavra ou o enunciado, mas uma „família‟ metafórica ou parafrástica, conforme se trate de palavras ou de enunciados”. Ou seja, o sentido das palavras e/ou

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expressões não pode estar preso a uma literalidade, isto é, a um significado fixo e estável. Mais a frente neste mesmo artigo, Possenti (p. 50) mostra que “o (efeito de) sentido nunca é o sentido de uma palavra, mas de uma família de palavras que estão em relação metafórica (ou: o sentido de uma palavra é um conjunto de outras palavras que mantêm com ela uma certa relação)”.

5 - Uma questão de esquecimento

Pêcheux (1997, p. 173) apoiado na interpretação da primeira tópica freudiana, valendo-se da oposição entre o “sistema pré-consciente” e o “sistema inconsciente”, propõe dois tipos de esquecimentos inerentes ao discurso. Segundo ele, há o esquecimento nº 1 e o esquecimento nº 2. Para este autor, “o esquecimento nº1, dá conta do fato de que o sujeito-falante não pode, por definição, se encontrar no exterior da formação discursiva que o domina”. Este esquecimento é da ordem da ideologia e do inconsciente. Já, sobre o esquecimento nº 2, Pêcheux (1997, p. 173) afirma:

Concordamos em chamar esquecimento nº 2 ao “esquecimento” pelo qual todo sujeito-falante “seleciona” no interior da formação discursiva que o domina, isto é, no sistema de enunciados, formas e seqüências que nela se encontram em relação de paráfrase – um enunciado, forma ou seqüência, e não um outro, que, no entanto, está no campo daquilo que poderia reformulá-lo na formação discursiva considerada.

Assim, vê-se que este esquecimento é da ordem da paráfrase e do pré-consciente e é por meio deste esquecimento que se dá ao sujeito do discurso a ilusão de liberdade enquanto sujeito-falante. Dando prosseguimento ao seu estudo, Pêcheux (1997, 177) diz, “o efeito da forma-sujeito do discurso é, pois, sobretudo, o de mascarar o objeto daquilo que chamamos o esquecimento nº1, pelo viés do funcionamento do esquecimento nº 2”.

Então, após mostrar, embora de forma breve, a crítica de Pêcheux à forma-sujeito do idealismo e ver como se dão os esquecimentos que criam as evidências de que o sujeito-falante é dono de seu dizer, este trabalho se finalizará, realizando uma análise comparativa entre outros dois slogans do Activia, cujos motes publicitários são

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diferentes. Esses slogans são: Activia funciona para você e Mantenha o ritmo com Activia.

Far-se-á, de forma breve, a respeito da linha de iogurtes Activia, o apontamento de alguns aspectos pertinentes para o desenrolar deste trabalho. Assim: a) este iogurte é comercializado em vários países desde a década de 1980 e no Brasil desde 2004; b) este produto contém uma cultura probiótica exclusiva para ajudar a regular o trânsito intestinal, a saber, o Dan Regularis. Sua principal função, além da nutrição, é ajudar a melhorar o trânsito intestinal lento; c) por esse fato, o Activia se encaixa no segmento de alimentos funcionais. Este segmento está em alta nos últimos anos, fato indicado pelo aparecimento de vários produtos com características que vão além de uma nutrição adequada. Isto é, circulam-se pelo mercado alimentício na atualidade produtos que visam ter efeitos benéficos em funções específicas do organismo humano, como, por exemplo, no caso do Activia, melhorar o trânsito intestinal, fazendo com que pessoas que sofrem de algum tipo de constipação intestinal tenham o funcionamento de seu intestino regulado pelo seu consumo.

Pretende-se mostrar utilizando os pressupostos teóricos sobre o esquecimento nº 2 que os slogans Activia funciona para você e Mantenha o ritmo com Activia dizem a mesma coisa. Ou seja, fazem a mesma afirmação/promessa, isto é, dizem que o consumo do Activia faz o intestino de quem o consome funcionar.

Nesse viés, para empreender a análise proposta, é mister dizer que as peças publicitárias do Activia que continham o enunciado do primeiro slogan foram proibidas de veiculação em 2008, pois a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) entendeu que os anúncios publicitários deste iogurte que continham o referido enunciado possuíam informações incompletas e incoerentes sobre o consumo do produto.

Assim, por conter a afirmação/promessa de que o consumo do Activia era a solução definitiva para os problemas de constipação intestinal, a Danone, fabricante deste iogurte, precisou retirar de circulação todas as formas de publicidade que continham este enunciado. Então, não podendo mais anunciar que o seu produto, o Activia, fazia o intestino lento e preguiçoso funcionar, a Danone precisou trocar o slogan do desafio. Assim, ao reformulá-lo sem fazer a afirmação explícita de que o

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consumo do Activia seria a solução para os problemas de trânsito intestinal lento, entrou em cena o slogan Mantenha o ritmo com Activia.

Sendo eles vistos à luz da pressuposição ou de inferências, ver-se-á que comportam o mesmo dizer implícito, se observado alguns critérios. Isto é, ao se realizar uma redução parafrástica, isto é, uma substituição por sinonímia, pode-se, em ambos, observar os mesmos efeitos de sentido que se encontram implicitados nestes dois enunciados.

Assim, para o enunciado Activia funciona para você, têm-se como efeitos de sentido inferidos ou pressupostos que o consumo do Activia faz o intestino lento e preguiçoso funcionar. Isto é, se o sujeito cliente/consumidor toma o iogurte Activia seu intestino irá funcionar. Este enunciado é dirigido às pessoas que possuem algum tipo de problema no funcionamento intestinal.

Já, no caso do enunciado Mantenha o ritmo com Activia, o que se pressupõe/infere é que o consumo do Activia mantém o trânsito intestinal no ritmo, em outras palavras, faz o intestino funcionar. O trabalho da flexão verbal imperativa mantenha mostra que para se manter o intestino no ritmo é preciso que o Activia seja consumido, fato esse que denuncia que o consumo deste iogurte ainda afirma/promete que faz o intestino de quem o consome funcionar.

Desta maneira, numa redução parafrástica, tem-se como efeito de sentido possível que o consumo do Activia mantém o trânsito intestinal no ritmo, sendo o termo ritmo compreendido no mesmo sentido de funcionando, fato que torna possível um enunciado do tipo: o Activia faz o intestino lento e preguiçoso funcionar.

Referências Bibliográficas

GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. (Trad. Federico Carotti). São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. [Trad. ORLANDI, Eni. et AL]. Campinas: Editora da UNICAMP, 1997.

POSSENTI, S. Ainda sobre a noção de efeito de sentido. In: GREGOLIN, M; BARONAS, R. (orgs). Análise do Discurso: As Materialidades do Sentido. São Carlos, SP: Claraluz, 2001.

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________. Teoria do Discurso: um caso de múltiplas rupturas. In: MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna C. (orgs). Introdução à lingüística: fundamentos epistemológicos. São Paulo: Cortez, 2005.

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