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(art. 147 CP) e lesão corporal (art. 129 CP) iv, exclusivamente quando relacionados a conflitos no âmbito das relações afetivo-conjugais v.

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Gênero, violência e segurança pública. ST 39 Sabrina Rosa Paz

Flávia Rieth

Universidade Federal de Pelotas – UFPel Instituto de Sociologia e Política – ISP

Laboratório de Ensino e Pesquisa em Antropologia e Arqueologia – LEPAARQ. Palavras-chave: Conjugalidade – violência – classes populares

Relações conjugais e violência: estudo sobre o “ponto de vista” das mulheres de classe popular que recorrem a Delegacia de Polícia para a Mulher no Município de Pelotas-RS

O presente trabalho trata de apresentar a discussão e resultados da pesquisa realizada como monografia de conclusão do curso de bacharelado em Ciências Sociais da Universidade Federal de Pelotas finalizada no ano de 2004. Trata-se de uma investigação etnográfica, que se situa na interface das Ciências Sociais e Jurídicas, e tem como objetivo discutir a violência endereçada à mulher a partir da perspectiva de mulheres de classe popular envolvidas em relações conjugais violentas, no Município de Pelotas – RS. Buscou-se perceber com que objetivo essas mulheres recorrem à Delegacia de Polícia para Mulher, bem como em que termos é realizada a comunicação do conflito e em que situação arrisca-se o rompimento da aliança. Estas foram perguntas que nortearam esta investigação, articulando-se o valor família com as relações de gênero no universo investigado.

O trabalho de campo, que se dividiu em duas etapas, contemplou:

• Observações e entrevistas informais com mulheres que buscaram registrar “queixa”i

contra seus companheirosii na Delegacia de Polícia para Mulher;

• Entrevistas semi-estruturadas, com a utilização de gravação de fitas, enquanto meio de obtenção das informações fornecidas por sete mulheres que são ou foram agredidas por seus companheiros. As entrevistas foram realizadas nas casas dessas mulheres, nas Vilas Castilho, Pestano e Cohab Tablada, bem como nos Bairros Bom Jesus e Centro do Município de Pelotas. Quatro dessas informantes foram indicadas, configurando uma inserção no campo em redeiii e as outras três foram contatadas na própria Delegacia, quando da realização das observações.

Na Delegacia de Polícia para Mulher, no período de março de 2002, durante as manhãs das segundas, quartas e sextas-feiras, conforme liberação da Delegada, foi possível acompanhar os atendimentos realizados pelos(as) funcionários(as) da Delegacia a 20 (vinte) mulheres, quando da comunicação de seus conflitos. Foi retomado o trabalho de campo no período de maio a outubro de 2003, durante o qual foram realizadas observações de mais 81 (oitenta e um) atendimentos. O tempo total em campo foi de seis meses, no qual observou-se 101 (cento e um) casos.

Embora os atendimentos tenham sido relacionados a diversos tipos de delitos, a pesquisa contempla apenas dois tipos de expressão da violência endereçada à mulher, quais sejam: ameaça

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(art. 147 CP) e lesão corporal (art. 129 CP)iv, exclusivamente quando relacionados a conflitos no âmbito das relações afetivo-conjugaisv.

Conjugalidade E Violência Em Classes Populares

A análise do material pesquisado, tanto oriundo do campo quanto da bibliografia, permitiu revelar a maneira com que as mulheres de classe popular, da cidade de Pelotas, utilizam a Delegacia de polícia para mulher, relativização que se ancora na reflexão das relações de gênero e percepção da família presente neste universo social.

As mulheres que procuraram a Delegacia de Polícia para Mulher, durante a realização da pesquisa, demonstraram em seus relatos constantes contradições, ora denunciandovi, ora justificando as agressõesvii que lhes foram dirigidas. Tais justificativas relacionavam-se ao uso de álcool ou drogas, pelo companheiro, às más influências e preocupação de prover a família, conforme os relatos:

“Até que eu me dou bem com ele, agora, com essas ameaças eu não agüento mais. O problema mesmo é a bebida” (Mulher, 60 anos).

“Ele (o marido) anda armado e agora que eu saí de lá, vão me matar (o marido e os filhos dele). O velho não é ruim, o velho é pessoa boa, mas quando se ataca pega o revólver. Já deu um tiro pra cima... Ele (o marido) se vê obrigado a fazer essas coisas porque eles (os filhos do marido) colocam coisa na cabeça dele... não queria entregar, mas eu tô cheia...” (Mulher, 65 anos).

“Tá certo que ele bebe pra descansar a cabeça porque é muita preocupação, tá certo que nós temos quatro crianças...” (Mulher, 25 anos).

As justificativas que foram alegadas por essas mulheres com relação ao comportamento violento dos companheiros, revelam que na representação das mulheres de classe popular os homens são fracos e por isso estariam mais suscetíveis às “bebedeiras” e ao uso de drogas, assim como também às más influências (KNAUTH, 1988).

De outra parte, a crítica às outras mulheres, reafirma os papeis de boa esposa e boa mãe que desempenham:

“... Eu sei quando ele tá com outra, fica triste e faz essas coisas... se ele começar a freqüentar a igreja (ela é evangélica), eu acredito que ele muda... Se Deus colocar ele de novo na minha casa eu aceito... Eu, graças a Deus, nunca traí, fui muito bem educada. Sou mulher direita, nem saio de casa. As mulheres separadas, que saem de casa, são vagabundas, as direitas são casadas... (Mulher, 49 anos).

“Ele anda com uma mulher que é bem diferente de mim. Anda na rua, vai a festa... Bem diferente mesmo porque eu vivia só pra ele” (Mulher, 52 anos).

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Para as mulheres de classe popular, os aspectos positivos da aliança superam as desvantagens, desde que tal comportamento esteja submetido à condição de que os homens cumpram, ao menos minimamente, seu papel de provedor (KNAUTH, 1988).

Mediação ou Rompimento da Aliança: Os Usos da Delegacia de Polícia Para Mulher

Quando os homens não cumprem com as expectativas dessas mulheres o recurso à polícia pode vir a ser utilizado, por elas, como um meio de promover o “reajustamento” do companheiro (BRANDÃO, 1999). Tal fato pode ser comprovado a partir dos casos em que os relatos dessas mulheres revelam não o acontecimento de um delito, mas um sentimento de descontentamento com relação ao companheiro:

“Alguma coisa tem que ser feita porque eu não quero mais ele dentro de casa porque ele não quer trabalhar. Agora ele tá internado porque engoliu um palito de tanto espalitar os dentes. Ele não faz nada da vida” (Mulher, 42 anos).

De outra parte, quando há o cometimento de uma infração, tipificada como crime na legislação penal, por parte do companheiro ou ex-companheiro, registrar o delito que lhes foram dirigidos significa ameaçar o agressor, visando resolver de forma rápida o conflito instaurado. O objetivo é dar-lhes um “susto”, mostrar-lhes que a polícia poderá intervir no conflito, caso a violência se repita (IZUMINO, 1998), como será possível verificar nos seguintes relatos:

“Não tem como chamar ele aqui? ?Não queria mandar ele pra justiça...” (Mulher, 26 anos). “Espero que com isso ele pare, né? Mas se não parar venho pra representar criminalmente” (Mulher, 40 anos).

“Só ficou na ameaça, mas se ele fizer de novo... Se não adiantar falar pra ele que eu vim aqui, aí eu represento criminalmente” (Mulher, 55 anos).

“Se ele continuar vou registrar de novo ou até reabro esse aí...” (Mulher, 23 anos).

Percebe-se, portanto, que o recurso à polícia é estratégia feminina para mediar as relações de conjugalidade, no qual, a polícia cumpre o papel de interromper, momentaneamente, o ciclo de violência.

Nesse sentido, é possível verificar que a suspensão da queixa não é compreendida, pelas mulheres que se utilizam desse recurso, como um ato contraditório à denúncia, ao contrário, pode-se inferir que há a atribuição de pode-sentido positivo, por indicar o alcance de êxito na negociação com o companheiro ou ex-companheiro acusado (BRANDÃO, 1999).

Como a relação de ameaça/resolução dos conflitos, é percebida por um dos funcionários da Delegacia:

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“O que ocorre é que as mulheres apanham do marido, saem de casa, dão a queixa e dali há uns dois dias, motivadas pelo fator financeiro, voltam pra casa e retiram a queixa. Muitas são figurinhas carimbadas, vão e voltam da Delegacia... Elas dizem que quando saem de casa fazem um escarcéu, e ele (o companheiro) passa uma época quieto, até começar de novo a violência”.

Diante do exposto, se torna evidente que a dinâmica que envolve os casais é facilmente percebida pelo funcionário, mas este, também reproduz o discurso da mulher que fundamenta o não rompimento da aliança com o argumento da dependência econômica.

Essa explicação para a manutenção do laço conjugal, que privilegia aspectos sócio econômicos como a pobreza e as desigualdades sociais entre homens e mulheres, além de não explicarem, de forma significativa, o fenômeno da violência no âmbito da conjugalidade, tendem a vitimizar a mulher, fortalecendo o imaginário social de que elas são frágeis e obedientes, razão que as levariam a assumir, via de regra, o pólo passivo de uma relação conjugal conflitiva.

No entanto, a vitimização destas mulheres deve ser relativizada (GREGORI, 1993; GROSSI, 1998) diante das falas que demonstram situações em que elas reagiram e mesmo deram início ao conflito.

“Desacatei mesmo! Me botei e apanhei tanto que não teve como esconder porque a boca ficou inchada...” (Mulher, 52 anos).

“Ele ameaça, chega bêbado, não me bate porque eu não deixo. Eu me defendo com um pedaço de pau...” (Mulher, 43 anos).

“Dei queixa, chamei a polícia em casa. Dei-lhe pau nele. Não agüento desaforo... Não ia arranjar alguém pra me bater...” (Mulher, 40 anos).

O laço que mantêm essas mulheres ligadas aos companheiros agressores corre o risco de ser desfeito diante de situações em que estas mulheres consideram limite. Essas situações correspondem à possibilidade da violência envolver os filhos e ocorre em virtude da maternidade fazer parte da própria identidade dessas mulheres.

Na lógica particular dos grupos de classe popular, o vínculo entre a mãe e os filhos são “mais fortes” em comparação com o laço conjugal (FONSECA, 2000).

“Dessa vez vou registrar queixa e representar criminalmente... mas é que agora ele levou o menino” (Mulher, 35 anos).

Considerações Finais

No relacionamento conjugal, as razões que são alegadas para o surgimento do conflito decorrem de condutas dos companheiros, tais como: as bebedeiras, o uso de drogas, ser mulherengo, ser boêmio. Para as mulheres estas são as fraquezas masculinas.

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Elas consideram injustas as agressões endereçadas a elas e praticadas pelos companheiros e afirmam o seu papel de boa esposa e boa mãe, através da crítica a outras mulheres que diferente delas, saem de casa, vão a festas, pintam-se demasiadamente e etc.

A pressão da família, dos empregadores e advogados pode levar as mulheres a realizarem a comunicação de seus conflitos na Delegacia, no entanto, a busca deste recurso efetivamente só pode ser compreendida se levada em conta a esperança que estas mulheres possuem com relação a melhora por parte dos companheiros ou ex-companheiros agressores. O uso do recurso à polícia, do ponto de vista destas mulheres, é a forma de propiciar uma ocasião para amedrontar o companheiro quanto às possíveis implicações de uma próxima agressão, diferente da perspectiva criminalizadora (SUÁREZ e BANDEIRA, 2002).

As classes populares reconhecem e legitimam a Delegacia de Polícia contra a Mulher como uma instância de resolução de conflitos, a despeito de sua dimensão repressiva.

A tolerância feminina à violência pode ser relativizada quando neste cenário evidenciam-se inúmeras referências a investidas femininas contra os homens, como reação e mesmo desencadeadoras das agressões sofridas.

A dependência econômica é o argumento utilizado pelas mulheres na justificação do não rompimento com o agressor, mas esse rompimento acaba se concretizando quando existe a possibilidade do conflito envolver os filhos, com a possibilidade de perda da prole ou que os espancamentos passem a ocorrer com os mesmos. Os filhos parecem ser o limite para uma tomada de decisão que leve a concretizar o rompimento da aliança.

“Olha, ele não é ruim, ruim, mas ele não da bola, não sai com eles nunca. Ele não agride porque eu sempre disse: Tu podes bater em mim, mas no dia que tu bater num deles, deu pra ti!” (Mulher, 25 anos).

Referências

BELA-FELDMAN-Bianco (org.). Antropologia das sociedades contemporâneas. Métodos. SP.Globo. 1987.

BRANDÃO, Elaine Reis. Violência Conjugal e o recurso feminino à polícia. In: BRUSCHINI, Cristina; HOLLANDA, Heloísa Buarque de (org.). Horizontes Plurais: Novos Estudos de Gênero no Brasil. Editora 34. P. 51 à 84.

FONSECA, Cláudia. Família, fofoca e honra: Etnografia de relações de gênero e violência em grupos populares. Porto Alegre: Ed. Universidade/ UFRGS, 2000.

GREGORI, Maria Filomena. Cenas e Queixas: Um estudo sobre mulheres, relações violentas e a prática feminista. São Paulo: Paz e terra, 1993.

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GROSSI, Miriam Pillar. Rimando amor e dor: reflexões sobre a violência no círculo afetivo-conjugal. In: PEDRO, Joana Maria; GROSSI, Miriam Pillar (orgs) Masculino, feminino, plural: Gênero na Interdisciplinaridade. Florianópolis, SC: ed. Mulheres, 1998.

HEILBORN, Maria Luíza e SORJ, Bila. Estudos de Gênero no Brasil. In: O que ler na Ciência Social Brasileira (1970-1995), Sociologia (volume II) MICELI, Sérgio (Org.), São Paulo, Editora Sumré: ANPOCS, Brasília, DF: CAPES, 1999, p.183 - 222.

IZUMINO, Wânia Pasinato. Justiça e violência contra a mulher: O papel do sistema judiciário na solução dos conflitos de gênero. São Paulo: Annablume: FAPESP, 1998.

MALINOWSKI, Bronislaw. Introdução-tema, método e objetivo desta pesquisa. In: Argonautas do pacífico ocidental. São Paulo: Abril, 1984.

NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso Completo de Processo Penal. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 1993. SAFFIOTI, Heleieth. Violência contra a mulher e violência doméstica.In: BRUSCHINI, Cristina e UNBEHAUM, Sandra (orgs.) Gênero, democracia e sociedade brasileira. São Paulo: FCC: Ed.34,2002.

SUÁREZ, Mireya e BANDEIRA, Lourdes. A politização da violência contra a mulher e o fortalecimento da cidadania.In: BRUSCHINI, Cristina e UNBEHAUM, Sandra (Orgs.) Gênero, democracia e sociedade brasileira. São Paulo: FCC: Ed.34,2002.

i

Palavra empregada no seu sentido êmico, ou seja, o mesmo que ir até a Delegacia e noticiar um crime. ii

No universo pesquisado, “companheiro” refere-se ao homem que vive maritalmente com a mulher, independente de serem eles casados ou de terem a relação caracterizada, pelo mundo jurídico, como União Estável .

iii

BELA-FELDMAN-Bianco (org.). Antropologia das sociedades contemporâneas. Métodos. SP.Globo. 1987. iv

Ambos delitos cuja Ação Penal é pública e condicionada a representação e que têm seu procedimento judicial regulado pela lei nº 9.099/95. Esta lei dispõe sobre os Juizados Especiais Criminais. Estes Juizados foram criados com o intuito de desafogar o Poder Judiciário. Desde então, os delitos de lesão corporal leve (artigo 129 caput do CP) e ameaça (artigo 147 do CP), passaram a ser classificados como crimes de menor potencial ofensivo – em virtude do tempo de pena definido em lei – por isso tornou-se da competência desses Juizados.

v

Categoria definida a partir do conceito de conjugalidade de Grossi (1998): “Considero como conjugalidade o projeto afetivo/emocional de duas pessoas, não necessariamente vivendo sob o mesmo teto, nem tendo filhos. Este projeto se fundamenta nas categorias de amor e paixão, categorias tidas nas culturas ocidentais modernas como ‘naturais’ e como sentimentos obrigatórios para uma união afetivo/conjugal” (GROSSI, 1998, P.298).

vi

Este termo, neste texto, esta sendo empregado como sinônimo de noticiar um crime na Delegacia, no entanto, o seu sentido jurídico é: “peça que dá início à Ação Penal pública, condicionada ou não, em que o promotor de justiça pede a condenação do acusado nas penas do crime por ele cometido” (NOGUEIRA, 1993, P. 57).

vii

Na Delegacia, as lesões corporais e vias de fato – estas, não exigem a presença de marcas no corpo da vítima – são nomeadas pelas partes e policiais de agressão, linguagem inexistente nas leis penais do direito oficial e entendida como o ato de agredir alguém.

Referências

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