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A Teoria da Decisão como Ferramenta de Apoio às Decisões Clinicas

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Academic year: 2021

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A Teoria da Decisão como Ferramenta de Apoio às Decisões Clinicas

Alane Alves Silva

Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Recife- PE

alaneaas@yahoo.com.br

Fernando Menezes Campello de Souza Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

Recife- PE fmcs@hotlink.com.br

RESUMO

O presente trabalho descreve o processo decisório clínico o qual encontra-se num cenário de permanente incerteza. Em seguida é apresentada a ferramenta da teoria da decisão enquadrando-a ao contexto clínico buscando utilizá-la como meio de estruturar e buscar uma melhoria no processo decisório. São descritos os construtos dessa ferramenta.

PALAVRAS CHAVE: Teoria da decisão, Medicina.

ABSTRACT

This work describe the clinical decision process that is inserted in a scene of the constant uncertainty. After this, the Decision Theory is shown in the clinical context, and its elements are described. The Decision Theory is used to try resolve and structure the clinical decision process.

(2)

1. Introdução

A medicina, e em particular os médicos, vive confrontada pela busca de tomar decisões com o máximo de precisão num cenário de permanente incerteza. Tais incertezas apresentam-se sob vários aspectos, sendo a primeira fonte de incerteza o beneficiário do trabalho médico, o paciente. Para o mundo jurídico todos os seres humanos são iguais, são semelhantes em vários aspectos morfofisiológicos, porém quando considerados em sua totalidade são únicos e diferentes de todos. A segunda fonte de incerteza encontra-se nos resultados provenientes das tecnologias em uso na área médica como por exemplo os resultados de exames complementares. A outra fonte de incerteza encontra-se novamente no elemento humano desta vez na figura do médico.

Em decorrência disso, os diagnósticos que são feitos e a partir dos quais as decisões terapêuticas são baseadas, têm apresentado uma grande variabilidade e imprecisão nos seus resultados. Os sistemas de apoio ao diagnóstico que são baseados na teoria da decisão podem ser bem úteis no contexto médico, pois o uso desses sistemas tendem a reduzir a variabilidade e a imprecisão de um modo sutil mas muito importante.

Dessa forma, com o uso dessa ferramenta é possível elaborar uma maneira estruturada de gerenciar o paciente, buscando-se a maior satisfação para o mesmo, com uma agregada redução dos custos financeiros e físicos como, por exemplo, a morbidade causada por problemas de origem cardiovascular.

2. O Status Quo

Os médicos dedicam grande parte do seu tempo diagnosticando a partir das queixas ou anormalidades de seus pacientes, aplicando testes e trocando informações com especialistas. É com a combinação destas informações que o médico toma as suas decisões dentro do contexto diagnose-terapia. Contudo, estes dados estão cheios de imprecisão, vagueza e incerteza.

Por conta dessa incerteza inerente, os diagnósticos têm uma grande chance de não serem os mais precisos e muitas vezes estarem errados, o que acarreta a adoção de uma terapia inadequada. O problema é que o erro e a incerteza na medicina podem ter conseqüências bem mais graves do que em outras áreas.

Esta variabilidade tem várias fontes de manifestação como, por exemplo, na ficha médica, no exame clínico, na interpretação dos resultados dos exames de laboratórios e na própria definição das doenças.

3. A Ferramneta

A teoria da decisão é utilizada como um meio de agir de forma lógica em situações onde os resultados são incertos. É uma ferramenta de apoio a tomada de decisão que leva em consideração o fato de uma boa decisão ser uma conseqüência lógica do que se quer, do que se sabe e do que se pode fazer. Entre as referências sôbre este assunto pode-se citar Campello de Souza (2005), Berger (1985) e Keeney e Raiffa (1976). Para tanto, faz-se necessário entender cada uma dessas fases cuidadosamente.

- O que se Quer

São os objetivos do decisor, as suas preferências com relação às possíveis conseqüências provenientes das ações adotadas. Usa-se a função utilidade para medir tais preferências.

Na medicina a preocupação básica é com o bem estar do paciente. Assim, está-se interessado em medir a utilidade das possíveis sensações de bem estar. Há um interesse tanto na utilidade do paciente como na do médico.

Uma boa definição da utilidade, no contexto médico, é encontrada em Lenert, 2001, que diz:Utilidades são avaliações numéricas da desejabilidade de cada sensação de bem estar que refletem uma preferência subjetiva.

Um dos métodos clássicos usados para medir a utilidade é o standard gamble (jogo padrão), que foi proposto por von Neumann & Morgenstern (para detalhes ver Campello de Souza (2005), Keeney and Raiffa (1976), Berger (1985), Silva (2002), Moraes (2003) e Fishburn (1994). O seu objetivo é determinar quando uma pessoa é indiferente entre ter, com certeza, uma

(3)

certa condição intermediária de bem estar e uma loteria com probabilidade pde melhorar seu bem estar e com probabilidade 1p ganhar uma pior sensação de bem estar.

- O Que se Sabe

Segundo Almeida (1986), nesta parte do problema a preocupação concentra-se no conhecimento que o decisor tem sobre o verdadeiro estado da natureza. Isto é, dado que o paciente apresente determinados sintomas, qual será o conhecimento que o médico tem sobre o verdadeiro estado de saúde do paciente?

Há uma relação probabilística entre os resultados dos exames e os estados de saúde. Esta relação será denotada por uma distribuição de probabilidade P(x|

θ

), onde

θ

representa os

estados de saúde.

Pode-se estudar os estados de saúde do paciente através do conhecimento a priori. O médico, através da sua experiência, tem em sua mente um grande conjunto de informações sobre os estados de saúde dos pacientes mesmo antes que qualquer exame seja feito. Este conhecimento será expresso em termos de uma distribuição de probabilidade sobre

θ

, a função

π

(

θ

). Essa

família de distribuição de probabilidades

π

(

θ

) é obtida através de um protocolo de edução. Tal

método encontra-se bem detalhado em Campello de Souza e Nadler Lins (2001) e Campello de Souza (2005).

- O Que se Pode Fazer

O que se pode fazer são as alternativas que são possíveis de serem implementadas e a determinação desse espaço de ações depende fundamentalmente da criatividade do decisor. 4. Estrutura

Para que se possa estruturar um problema à luz da teoria da decisão faz-se necessário definir seus construtos básicos, os quais envolvem alguns conjuntos, mecanismos probabilísticos e funções.

Os principais conjuntos são: -Estados da Natureza

Diz respeito a como a natureza poderá vir a se apresentar. No caso médico este conjunto descreve os possíveis estados de saúde que podem vir a estar presentes em dado paciente. O conjunto de todos os possíveis estados de saúde é denotado por Θ={

θ

}. Esta notação foi introduzida por Savage (1954). Eles têm a ver com parâmetros biológicos e fisiológicos. São subconjuntos do espaço Θ que vão caracterizar as doenças. O complementar à

união desses subconjuntos caracterizará a região de bons estados de saúde. Não devem ser confundidos com sensações de bem estar, que são as conseqüências. Como exemplo, pode-se citar a seguinte situação

Θ

=

{

θ

0,

θ

1} onde:

0

θ

- o paciente não tem nenhuma doença;

1

θ

- o paciente tem a doença.

-Observações

São dados (observações) de variáveis que guardam algum tipo de relação com o estado da natureza. O conjunto de todas as observações é denotado por X ={x}. Em medicina, as

observações são obtidas durante o exame clínico e através de exames complementares, os quais trazem dados relacionados aos estados de saúde do paciente. Como exemplo, pode-se pensar na situação em que se tenha apenas duas possibilidades de resultado de um exame complementar, ou seja,

X =

{

x

0,

x

1} onde

0

(4)

1

x

- o resultado do exame foi positivo. -Ações

As ações estão relacionadas às medidas que podem vir a ser adotadas na busca da solução do problema. Dentre estas medidas encontra-se a opção por não fazer nada. No presente contexto, este conjunto será formado pelas ações terapêuticas que serão adotadas para tratar o paciente. Tal conjunto será representado por

A

={

a

}. Em um exemplo simples pode-se supor o

caso em que o paciente tenha apenas duas possibilidades de ação

A =

{

a

0,

a

1} no qual

a

0 será a ação de não fazer nenhum tratamento e

a

1 será a ação de fazer o tratamento mais adequado ao caso.

-Conseqüências

Tal conjunto representa as conseqüências advindas das ações adotadas quando o indivíduo encontra-se num determinado estado de saúde. O conjunto de todas as possíveis conseqüências (também chamadas de bens ou payoffs é representado por

P

={

p

}. É a união do

conjunto das sensações de bem estar e do conjunto das sensações de mal estar; para facilitar a notação, quando se disser “sensações de bem estar”, estar-se-á incluindo tudo.

Estas conseqüências estão relacionadas a um sentimento interno de prazer, com a ausência de sintomas. Ou, caso o decisor opte por não adotar nenhuma ação, a conseqüência poderá ser uma piora no estado de bem estar do paciente. Silva & Campello de Souza (2003) mostram um exemplo em que tem-se tres possíveis conseqüência,

P =

{

p

0,

p

1,

p

2} em que,

p

0 denota a pior sensação de bem estar possível,

p

1 representará uma sensação de bem estar intermediaria e

p

2 a melhor sensação de bem estar possível.

Os principais mecanismos probabilísticos que representam e descrevem as várias fontes de incerteza presentes nos problemas de decisão são os seguintes:

A) Função Conseqüência

A função conseqüência mede a probabilidade de se ter um bem p,dado que o decisor tomou a ação

a

e a natureza escolheu o estado

θ

. Esta escolha, feita pela natureza, independe da

ação tomada pelo decisor. A representação da função conseqüência é dada por

P

(

p

|

θ

,

a

). A

mesma poderá ser inferida a partir de uma base de dados disponível, ou através da edução de uma especialista, ou ambos ao mesmo tempo. No caso clínico, essas probabilidade podem ser obtidas de estudos epidemiológicos ou de ensaios clínicos (vide Campello de Souza, Campello de Souza e Stamford da Silva (2002)).

B) Função de Verossimilhança

A função de verossimilhança é uma representação da relação existente entre as observações

X

={

x

} e os estados da natureza Θ={

θ

}. Ou seja, é uma distribuição de probabilidade que expressa o quanto

x

, a observação, informa sobre o estado da natureza

θ

. Tal

representação se dá por meio de uma distribuição de probabilidade denotada por

P

(

x

|

θ

).

No contexto médico, o

P

(

x

|

θ

) é a relação existente entre as observações e estado de

saúde do paciente. As observações podem vir tanto da ficha de anamnese como do resultado de exames complementares. Quando as observações são provenientes apenas dos exames clínicos o

) | (

x

θ

P

é dado por um levantamento histórico dos dados, epidemiológico ou da casuística do médico, ou a partir dos

p

'

s

relatados pelo paciente (são conseqüências já realizadas, determinísticas, que já ocorreram a ele), que, nesse momento, na consulta, funcionam como observações x's para o médico. O P(x|

θ

), no caso dos exames complementares, irá expressar

(5)

complementar é capaz de informar sobre a doença. Pois, ao se solicitar um exame, está-se interessado na utilidade da informação que o mesmo possa vir a fornecer.

C) O Conhecimento a Priori

O conhecimento a priori é todo aquele adquirido independentemente de qualquer experiência (Kant (1781)). Logo, no contexto médico, o conhecimento a priori será aquele que se tem sobre o estado de saúde

θ

, antes de se saber o resultado dos exames complementares. Este

conhecimento a priori pode ser expresso em termos de uma distribuição de probabilidades sobre os estados de saúde, a chamada função

π

(

θ

) (ou função de distribuição a priori sobre os estados

da natureza). Tal distribuição representa o grau de crença na ocorrência de um determinado

θ

,

podendo a mesma vir de um especialista, por um processo de edução, ou de um banco de dados, com o tratamento matemático adequado.

- Obtenção Através de um Especialista

De acordo com Campello de Souza (2005), especialista é um indivíduo detentor de conhecimento sobre determinado assunto. No caso da medicina o especialista será o médico, pois é quem detém o conhecimento sobre os possíveis estados de saúde

θ

que podem vir a acometer o

paciente, e sua relação com os sinais e sintomas que este apresenta, antes mesmo que qualquer exame complementar venha a ser feito. Isto significa que o médico, por meio do seu conhecimento, tem em sua mente um grande conjunto de informações sobre os estados de saúde dos pacientes, no que diz respeito a sua forma de manifestação, fisiologia, fisiopatologia, entre outros fatores.

É necessário ficar claro que tal conhecimento a prioi não está relacionado apenas à quantidade de pacientes que o médico tenha visto. Pois, se assim fosse, um banco de dados seria muito mais eficiente. Os esforços concentram-se no conhecimento clínico que o médico detém. A partir dele o médico é capaz de diagnosticar uma determinada doença à qual nunca tenha sido exposto. Ou seja, dado que um paciente apresente uma disfunção nunca vista pelo médico, este deverá ser capaz, com base no seu conhecimento clínico, de fazer afirmações probabilísticas consistentes acerca dos possíveis estados de saúde daquele paciente.

Para tornar o conhecimento do especialista acessível a todos, usa-se um protocolo de edução, no qual as respostas são tratadas matematicamente de forma a se obter uma estimação das distribuições de probabilidade sobre os estados de saúde. Tal método de edução encontra-se bem detalhado em Campello de Souza (2005), Nadler Lins (2000) e Nadler Lins e Campello de Souza (2001) e aplicações desse método no contexo medico podem ser vistas em Silva & Campello de Souza (2005a) e Silva & Campello de Souza (2005b).

5. Processo Decisório

Uma vez de posse dos construtos (conjuntos e mecanismos probabilisticos) anteriormente listados, é possível estabelecer um procedimento chamado regra de decisão. Tal procedimento, permite escolher um curso de ação, ou seja uma ação terapeutica, dentre as disponíveis levando-se em consideração as preferências do paciente e as informações sobre seu estado de saúde. O que se quer é uma regra de decisão que proporcione a melhor conseqüência possível, em termos das preferências do paciente. Para tanto, faz-se uso da função conseqüência e da função utilidade do paciente para cada par (

θ

i,aj) esta utilidade é o valor esperado de u(P),

calculado usando-se a distribuição P(p|

θ

,a). Ter-se-á:

= = n k j i k k j i a u p P p a u 1 ) , | ( ) ( ) , (

θ

θ

O negativo da utilidade,

u

, é a perda, que será denotada por L (do inglês Loss).

) , ( ) , ( a u a L

θ

=−

θ

(6)

Quanto maior a utilidade, ou, quanto menor a perda, melhor a decisão. O risco é definido como o valor esperado da perda (vide Campello de Souza (2005) e Silva & Campello de Souza(2003)).

Agora, para prosseguir no processo decisório, há que se incorporar informação a respeito do estado da natureza. A informação sobre o estado de saúde do paciente é proveniente de duas fontes:

- O conhecimento a priori do medico e - O resultado do exame complementar.

Decisão a patir da Combinação dessas Duas Informações

A partir desse ponto já se é capaz de tomar alguma decisão. Utiliza-se o cálculo do valor da utilidade esperada (isto é, o valor esperado da utilidade), fazendo-se uso da distribuição

) | (

θ

x

π

que será denotado por:

)

,

(

)

|

(

)

(

))

,

(

(

1 0 1 0

a

u

x

a

u

a

u

E

i i j i j

θ

θ

π

θ

θ

= =

=

=

Dessa forma, o paciente deve adotar a ação que lhe proporcionar o maior valor esperado da função utilidade pois, assim sendo, estará lenvando em consideração o conhecimento a priori do médico, o resultado do exame complementar ao diagnóstico suas preferências e atitudes em ralação ao risco. Uma aplicação mais detalhada desse procedimento pode ser encontrada em Silva (2002) e Silva & Campello de Souza (2003).

Resumo da Sistemática

A aplicação da teoria da decisão é sistemática e não apresenta nenhum problema intransponível. Apresenta-se, a seguir, um resumo do processo, já para o caso geral (conjuntos maiores de conseqüências, estados da natureza e ações). Em suma tem-se o seguinte:

a) Um indivíduo procura um médico por alguma razão, algum tipo de desconforto por exemplo dor no peito, falta de ar, entre outros.

b) Uma vez estabelecido o contato, no consultório o médico faz uma anamnese e um exame físico.

c) Uma vez delineada a situação do paciente, o médico deve informá-lo a respeito do seguinte: - O espaço amostral das possibilidades do seu estado de saúde Θ={

θ

0,

θ

1,K,

θ

J}

note-se que

θ

0 significa que o paciente não tem nenhuma doença).

- A epidemiologia, isto é, {

π

E(

θ

0),

π

E(

θ

1),K,

π

E(

θ

J)}, quer dizer, as probabilidades a

priori de cada possível estado de saúde do paciente, obtidas a partir de bancos de dados. Naturalmente essa informação inclui os parâmetros básicos do paciente (sexo, idade, peso, altura, cintura, quadril, etc.). A rigor estes dados deveriam estar facilmente disponíveis ao público em geral.

- O conhecimento a priori dele, médco, a respeito do caso, sob a forma de uma distribuição {

π

M(

θ

0),

π

M(

θ

1),K,

π

M(

θ

J)}. Esta distribuição é obtida a partir de um

protocolo de edução. É muito difícil o médico se abstrair da sua “casuística”, isto é, do número de pacientes semelhantes que ele já viu. É claro que ele incorre num viés, quando faz isso. Ele não pode nunca superar os algoritmos estatísticos que façam uso de uma base de dados bem feita e daí a grande vantagem de se ter esta possibilidade. É evidente que médicos com diferentes casuísticas terão diferentes precisões e vieses (acurácias). Em qualquer caso, existe sempre, e este é muito importante, um conhecimento clínico “puro”, aquele que não tem a ver com nenhuma “casuística” (número de pacientes que o médico já viu). Tipicamente,

π

M é uma combinação de um

casuístico

π

com um

puro clínico−

(7)

uma discrepância entre

π

casuístico e

E

π

. Perceba-se que os desconfortos (conseqüências)

s

pi' , i=1 K,2, , do paciente, relatados ao médico, funcionam, para o mesmo, como

“observações” ( sx' ) de um “exame complementar” onde o instrumento é o próprio

corpo do paciente. A tecnologia desse “exame complementar” é a própria natureza, e a engenharia (os modelos matemáticos) do seu funcionamento é do conhecimento clínico “puro” do médico (modelos biológicos, fisiológicos, fisiopatológicos e, em breve, espera-se, modelos matemáticos). Da mesma maneira que existe uma sensibilidade e uma especificidade para os exames complementares propriamente ditos, existe uma probabilidade de acerto e de erro quando o médico afirma que o paciente tem, ou não, esta ou aquela doença. Estas probabilidades vão depender do efeito combinado do conhecimento (formação, experiência, etc.) do médico e de como os possíveis estados de saúde (os

θ

's) se combinaram para produzir os p's (que, neste estágio, são conseqüências para o paciente e observações para o médico) com maior ou menor variância.

O

π

M pode ser, é claro, já a combinação final de

E

π

, casuístico

π

e puro clínico−

π

. Tudo

isto deve ser claramente explicitado ao paciente. É evidente que fala-se aqui de indivíduos com um mínimo de instrução, e deve-se desenvolver uma linguagem apropriada para essa comunicação.

- Todas as possíveis conseqüências determinísticas, isto é, o conjunto

} , ,

{p0 p1 p2K

P = .

- Todas as alternativas de tratamento, incluindo drogas, mudanças no estilo de vida, etc., ou seja, o conjunto A ={a0,a1,a2K}.

- A função conseqüência, isto é, a família de distribuições de probabilidade

) , |

(p a

P

θ

.

d) O paciente submete-se a um protocolo de edução da sua função utilidade.

e) O paciente calcula a sua decisão em função da informação disponível até o momento;

f) Calcula-se a probabilidade limite de tratamento e verifica-se se existem exames complementares capazes de alterar a regra calculada. Note-se que este passo só pode ser dado aqui, pois o P(x|

θ

) capaz de alterar a decisão vai depender da função utilidade do paciente e do

conhecimento a priori do médico. Caso positivo, o médico deve requisitar, dentre esses exames, aquele de menor custo financeiro e menos “cruel” ao paciente. Dependendo do resultado do exame, o paciente mudará ou não a sua decisão calculada anteriormente.

g) O resultado do tratamento, assim como todos os dados pertinentes, devem ser registrados em meios computacionais de forma a se ir avançando na construção de boas bases de dados.

Toda a formulação do modelo decisório à luz da teoria da decisão pode ser implementada em computador, de forma a ser um instrumento prático de apoio à decisão terapêutica.

6. Aplicação

Para exemplificar uma aplicação dessa teoria na área clínica suponha a seguinte situação:

Um paciente chega ao consultório queixando-se de forte dor de cabeça. O médico pede um raio-X que mostra uma lesão frontal do lado direito do córtex. O médico tem fortes suspeitas de um tumor no cérebro, mas não tem certeza.

O exame solicitado pelo médio apresenta uma sensibilidade de 0,95 (P(x1|θ1)=0,95 )

e um falso positivo de 0,04 (P(x1|θ0)=0,04). O médico estima que a probabilidade a priori de

um tumor no cérebro, ou seja antes de ver o resultado de qualquer exame complementar e baseado na sua experiência clínica e estudos sobre o assunto, seja de 0,25 (π(θ1)=0,25). A

(8)

dúvida do médico é qual ação ele deve tomar, tratar ou não o paciente.

Com base na descrição do problema listam-se os elementos dos conjuntos básicos para solução do problema via teoria da decisão, que são:

1. Conjunto das Conseqüências P ={p0,p1,p2}

0

p - pior sensação de bem estar possível;

1

p

- sensação de bem estar intermediária;

p

2- melhor sensação de bem estar possível.

2. Estados da Natureza Θ={

θ

0,

θ

1}

θ

0- o paciente não tem nenhuma doença; 

θ

0- o paciente tem a doença.

3. Conjunto das Observações X ={x0,x1}

0

x - o resultado do exame foi negativo;

1

x

- o resultado do exame foi positivo. 4. Conjunto das Ações A ={a0,a1}

0

a - ação de não fazer nenhum tratamento;

1

a

- ação de fazer o tratamento mais adequado ao caso.

O passo seguinte é determinar a ordem de preferência do paciente para os possíveis estados de saúde. Esta ordem é representada numericamente pela função utilidade,

u

. Ter-se-á

) ( ), (p0 u p1

u e

u

(

p

2

)

representando as preferências, de tal forma que:

) ( ) ( ) (p2 u p1 u p0

u ≥ ≥ , indicando a ordem de preferência para as conseqüências.

Aqui foi utilizado o método de von Neumann e Morgenstern para a edução da utilidade do paciente que consiste em fazer a seguinte pergunta ao paciente: Qual o valor de

λ

(entre 0 e

1) para o qual o senhor se sente indiferente entre ter a conseqüência

p

1 com probabilidade 1 (diga-se, com certeza) ou ter como conseqüência um jogo (um bilhete de loteria) que dá

p

2 com probabilidade

λ

ou

0

p com probabilidade 1

λ

? Ter-se-á a função utilidade do decisor dada

por:

1

)

(

p

2

=

u

;

(

)

=

λ

1

p

u

e u(p0)=0.

Suponha-se que o paciente enunciou um valor

λ

=0,60, em resposta à pergunta que

lhe foi feita. De posse desta função pode-se saber agora qual a preferência do decisor para qualquer distribuição de probabilidades sobre as conseqüências p0, p1 e

p

2.

Uma vez eduzida as preferências do paciente faz necessário estudar os mecanismos probabilísticos que descrevem as várias fontes de incerteza presentes em um problema de decisão que são os seguintes:

 

Função Conseqüência:

A tabela a seguir dá um exemplo de tal função

que como foi dito anteriormente essas probabilidades podem vir de estudos epidemiológicos ou ensaios clínicos.

(9)

Estado de saúde, Ação. 0 p

p

1

p

2 0 0, a

θ

0,05 0,09 0,86 1 0, a

θ

0,08 0,22 0,7 0 1, a

θ

0,7 0,25 0,05 1 1

, a

θ

0,05 0,1 0,85

A partir da função utilidade e da função conseqüência pode-se calcular a utilidade do paciente para cada par ( ,a ),i, j=0,1.

j i

θ

que é o valor esperado de u(P), calculado usando-se a

distribuição P(p|

θ

,a). Ter-se-á:

= = 3 1 ) , | ( ) ( ) , ( k j i k k j i a u p P p a u

θ

θ

Substituindo os valores vem:

) , ( 0 a0 u

θ

( , ) 1 0 a u

θ

( , ) 0 1 a u

θ

(

,

)

1 1

a

u

θ

0,914 0,832 0,2 0,91

Agora, para que se possa prosseguir no processo decisório, há que se incorporar informação a respeito do estado da natureza. A informação sobre o estado de saúde do paciente é proveniente de duas fontes:

O conhecimento a priori do médico e  O resultado do exame complementar.

Na descrição do problema o médico anunciou uma probabilidade a priori do indivíduo ter a doença de 0,25, ou seja

π

(

θ

1

)

=

0

,

25

. O valor de ( )

0

θ

π

, quer dizer, a probabilidade do

paciente não estar doente, terá que ser, necessariamente, igual a

1

π

(

θ

1

)

. Também ao descrever

o problema o médico informou a sensibilidade e o valor do falso positivo do exame solicitado pelo mesmo o que permite calcular a função de verossimilhança (P(x|

θ

)) para o problema.

Tem-se então:

Observação, Estado da Natureza

0

θ

1

θ

0 x 0,6 0,05 1

x

0,4 0,95

Essas duas informações podem ser combinadas utilizando-se a Regra de Bayes da probabilidade que é um método para atualizar, corrigir, a sua distribuição a priori sobre o estado de saúde do indivíduo

θ

, à luz da evidência fornecida pelos x's do exame complementar. A

(10)

) ( ) , ( ) | ( x P x P x

θ

θ

π

= onde, ) | ( ) ( ) , (x

θ

π

θ

P x

θ

P = e

= = 1 0 ) | ( ) ( ) ( i i i P x x P

π

θ

θ

Substituindo os valores vem:

) | (

θ

0 x0

π

( | ) 1 0 x

θ

π

( | ) 0 1 x

θ

π

(

|

)

1 1

x

θ

π

0,973 0,558 0,027 0,442

Neste ponto já se tem condições de tomar a decisão. O cálculo chave é o do valor da utilidade esperada (ou seja, o valor esperado da utilidade), levando-se em consideração a distribuição

π

(

θ

|x). Ele será dado por:

=

=

=

= =

)

,

(

)

|

(

)

(

))

,

(

(

1 0 1 0

a

u

x

a

u

a

u

E

i i j i j

θ

θ

π

θ

θ ) , ( ) | ( ) , ( ) | ( ) , ( ) | ( ) , ( ) | (

θ

0 x0 u

θ

0 a

π

θ

0 x1 u

θ

0 a

π

θ

1 x0 u

θ

1 a

π

θ

1 x1 u

θ

1 a

π

+ + + =

Substituindo os valores numéricos vem:

) ( )) , ( (u a0 u a0 E

θ

= θ Eθ(u(

θ

,a1))=u(a1) 1,5 1,7

e portanto o paciente deve adotar a ação

a

1, isto é, ele deve se tratar, pois à luz das suas preferências e atitudes em relação ao risco, e à luz do conhecimento do médio e do resultado do exame complementar, esta é a melhor ação, isto é, a ação que maximiza o valor esperado da função utilidade.

7. Conclusões

Muito da qualidade e do custo dos sistemas de saúde são determinados pelas decisões tomadas pelos médicos, cujo objetivo final é conceber e administrar um programa de tratamento para melhorar a condição do paciente. Em sua grande parte, as decisões, neste contexto que é intrinsecamente complexo, dependem de muitos fatores e envolvem muita incerteza e difíceis questões de valor.

A tomada de decisões clínicas, requer a consideração dos benefícios e custos de uma ação. Tanto os benefícios quanto os custos devem ser amplamente definidos, de modo a incluir todas as conseqüências importantes da decisão. Os benefícios são os efeitos clínicos como, aliviar o sofrimento, restaurar a função e prevenir a morte prematura e, os custos. Estes referem-se freqüentemente a custos financeiros, mas também incluem os efeitos colaterais, redução do tempo de vida e a morbidade, ou seja, os custos relacionados a saúde do paciente.

A natureza complexa do fenômeno faz com que, mesmo especialistas numa determinada área possam diferir muito quanto às suas decisões no que diz respeito ao diagnóstico e à conduta, num caso específico.

(11)

a forma da tomada de decisão, diminuindo o risco de se adotar alguma medida terapêutica errada ou não eficaz. À luz da teoria da decisão pode-se dizer que:

uma boa decisão será uma função lógica daquilo que “se quer” , daquilo que “se sabe” e daquilo que “se pode fazer”, como exposto em Campello de Souza (2005).

O entendimento e a consideração da relevância da tomada de decisão na area clínica , traz enormes benefícios para a comunidade como um todo. Melhoria da qualidade de vida, tratamento mais adequado, redução do custo de tratamentos, entre outros, são exemplos dos benefícios que a teoria da decisão pode trazer para a problemática do sitema de saúde .

Referências

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