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CONTROVÉRSIAS AMBIENTAIS FRENTE À COMPLEXIDADE DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS (environmental controversies in view of the complexity of climate changes)

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Academic year: 2021

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CONTROVÉRSIAS AMBIENTAIS FRENTE À

COMPLEXIDADE DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

environmental controversies in view of the complexity of climate changes

Neli Aparecida de Mello-Théry *

Andrea Cavicchioli ** Vincent Dubreuil ***

Resumo

O artigo discute as transformações da temática ambiental entre 1992 (Conferência do Rio) e 2012 (Con-ferência Rio + 20) destacando as controvérsias, impasses e desafios dessa problemática enfocando as mudanças climáticas, fundamentados em abordagem comparativa e na noção de complexidade geopolítica, a qual norteia as análises e a compreensão dos processos. Assim, contextualiza-se essa questão no cenário internacional, enfatizando a posição e tendências dos distintos países, com relação às mudanças técnico--políticas da mitigação para a adaptação. Nesse debate assumimos que se tornou inevitável a adoção de medidas de adaptação e de gestão ambiental, no âmbito local, para enfrentar uma situação dominada pelo impasse político e diplomático.

Palavras-chave: Rio 92, Rio + 20, Mudanças climáticas, Soluções locais.

Abstract

This paper discusses the transformations of the environmental issue between 1992 (Rio Conference) and 2012 (Rio+20 Conference) and highlights the controversies and deadlocks of this question, as well as its challenges. Focusing on climatic changes and employing the notion of complexity to guides the analysis and the comprehension of the processes, the question is contextualized within the international scenario. In this debate, emphasis is given to the positions and trends of different countries in terms of technical and political changes leading to a shift from mitigation to adaptation. The conclusion seems to point to the adoption of adaptation and environmental management measures at local scale as the inevitable pathway to face a situation in which today many place little hope for a diplomatic political solution.

Key words: Rio 92, Rio + 20, Climate changes, Local solutions.

Resumen

Este artículo discute las transformaciones de la temática ambiental entre 1992 (Conferencia Rio 92) y 2012 (Rio+20), y destaca las controversias, los impases y los desafíos de esa problemática, enfocando el cambio climático. Utilizando la noción de complejidad para dirigir el análisis y la comprensión de los procesos, la cuestión se contextualiza en el ámbito internacional con énfasis en las posiciones y las tendencias de los diversos países con respecto a la mudanza técnico-político desde la mitigación hasta la adaptación. En ese debate, asumimos que se tornó inevitable la adopción de medidas de adaptación y de gestión ambiental en la escala local para enfrentar una situación en la cual, hoy, son colocadas pocas esperanzas de una solución diplomática y política.

Palabras-clave: Rio 92, Rio + 20, Cambio climático, Soluciones locales.

(*) Bolsista do CNPq – Brasil e Profª. Drª. do Programa de Pós-graduação em Geografia Humana da Universidade de São Paulo - Av. Arlindo Bettio 1000, CEP: 03828-000, São Paulo (SP), Brasil. Tel. (+55 11) 30918133 – namello@usp.br

(**) Prof. Dr. do Programa de Pós-graduação em Mudança Social e Participação Política da Universidade de São Paulo - Av. Arlindo Bettio 1000, CEP: 03828-000, São Paulo (SP), Brasil. Tel. (+55 11) 30911058 – andrecav@usp.br

(***) Prof. Dr. da Université Rennes 2 - Place du Recteur H. Le Moal, 35043 RENNES CEDEX, France, Tel. (+33) 299141838 – vincent.dubreuil@uhb.fr

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INTRODUÇÃO

Contrariamente ao que pode parecer no debate público e político, a percepção sobre a fragili-dade do meio ambiente continua sendo importante e induz mudanças de postura, tanto em alguns setores da vida econômica contemporânea como em alguns campos do saber.

Estas preocupações permeiam as recomendações em Desafios ambientais e desenvolvimento: o imperativo para agir (BRUNDTLAND et al., 2012), voltadas a aspectos estratégicos como a con-servação e valorização da biodiversidade, os serviços ecossistêmicos, a criação de mercados para economias “verdes” e investimentos em pesquisa e desenvolvimento visando criar conhecimento e inovações. São estes aspectos que, para o PNUMA, permitirão aos governos e a sociedade, em geral, “assegurar uma transição tranquila para um caminho de um desenvolvimento mais sustentável” (UNEP, 2011, p. 38). No entanto, o assunto é controverso e a complexidade do tema impõe escolhas.

A percepção de que meio ambiente é uma construção social – porém destrutível – foi elabora-da ao longo do século 20. Essa construção associa conceitos de natureza, paisagem e ecossistema. Sintetizando pontos focais deste construto social e de teorias que contribuíram para a consolidação da visão atual, destaca-se que no início da modernidade a natureza era vista de duas maneiras: como força, energia, material, elasticidade, pelo olhar moldado pela técnica do homem moderno, ainda desprovida de valor e pelo olhar do artista-pintor, quando ela é vista por inteira, como paisagem, como algo que fica fora da cidade. É no século XIX que a ecologia promove a mudança de paradigma e se torna a ciência das comunidades dos seres vivos e, no século seguinte, difunde o conceito de clímax (TANSLEY, 1935), induzindo a percepção do meio ambiente como um organismo vivo e de suas formas como indicadoras das relações ecológicas. Em meados do século XX surge o pen-samento holístico, a teoria dos ecossistemas de Odum (2005[1953]) como uma relação cooperativa e não antagônica e apontando a necessidade de metodologias sistêmicas.

Nesse mesmo período, a polêmica sobre a destruição da natureza passa a ser o objeto da eco-logia política e de outras ciências humanas. O questionamento sobre as consequências do modelo de desenvolvimento industrial e a constatação de que problemas ambientais ultrapassam fronteiras torna-se o objeto e o objetivo de diferentes ciências. Os movimentos sociais ambientalistas e outros atores articulam-se, pressionam governantes e empresários. Resultantes dessas pressões ampliam--se os processos de discussão e reflexão mundial, estabelecemampliam--se posições antagônicas e o tema insere-se na agenda política internacional, transformando-se, no final do século XX, a relação meio ambiente e desenvolvimento em desenvolvimento sustentável.

O CONTEXTO INTERNACIONAL

O meio ambiente tornou-se tema geopolítico, objeto de negociações entre países e tema obriga-tório da diplomacia. Mas, nenhum dos temas ambientais foi poupado de um longo e tortuoso caminho político. Convenções, acordos e protocolos, resoluções; instituições multilaterais, organizações não governamentais, redes de cientistas constituem mecanismos e atores do processo.

Vinte anos após a Cúpula da Terra (1992), as nações encontraram-se novamente no Rio de Janeiro, num mundo totalmente transformado, diz o relatório do PNUMA (2011). Entre a Rio 92 e a Rio + 20 as visões de ambiente, o ambientalismo e os avanços nas ciências mudaram muito e permitiram a identificação mais clara dos problemas, ainda que com incertezas. Os governantes acompanharam essa dinâmica?

Pelas controvérsias originadas é importante o resgate do percurso das negociações sobre as mudanças climaticas, desde a convenção-quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UN-FCCC) até seus protocolos. As tratativas e o detalhamento da convenção-quadro iniciaram-se em 1988 quando foram estabelecidas, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, as etapas preparatórias para a Conferência do Rio (1992). Apesar de ter sido assinada durante a Conferência, ela somente entra em vigor dois anos após quando é criado seu mecanismo de acompanhamento, a Conferência

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das Partes (COP). Embora adotadas por alguns países, as medidas implantadas revelam-se pouco eficazes. As três primeiras reuniões da COP ocorrem em 1995, 1996 e 1997, respectivamente nas cidades de Berlim, Genebra e Quioto, sendo que nesta ultima se estabelece o Protocolo homônimo visando, sobretudo, que os países industrializados cumprissem suas metas de redução: as emissões de gases de efeito estufa deveriam ser no mínimo 5% abaixo dos níveis de 1990 e seriam atingidas entre 2008 e 2012. Para alcançar estes percentuais, é criado o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (PARCERIAS ESTRATÉGICAS, 2001). No entanto, sua implementação só inicia-se após a ratificação pelo parlamento russo, em 2005. Depois disso, é necessário esperar a reunião de Bali (COP13, 2007) para aceitar as conclusões dos relatórios do IPCC e direcionar ações mais efetivas à adaptação e à mitigação nos países mais pobres e/ou vulneráveis.

As reuniões da Conferência das Partes em Copenhague, Cancun, Durban e Doha, encerraram--se sem acordo sobre as metas a serem cumpridas, muito embora vários mecanismos tenham sido criados: o Fundo Verde, o Comitê Executivo de Tecnologia do MDL e o REDD+ (pagamento para manutenção de florestas), além do estabelecimento do princípio da inserção do desmatamento de florestas como processo de produção de GEE. Os documentos assinados ficaram muito aquém das expectativas dos cientistas e da sociedade organizada. O clima de acusações entre países ricos e em desenvolvimento tem dificultado acordos sobre metas. Com isso, na COP 18 (Doha) não houve sequer participação de chefes de estado, demonstrando a hesitação ou desinteresse dos paises. Isto enfra-queceu a perspectiva de execução dos compromissos adotados, visto que somente os ministros do meio ambiente estiveram presentes, quando muito. Essencialmente tais compromissos abrangeram: i) a extensão do protocolo de Quioto por mais 8 anos até 2020, com metas nas emissões de gases de efeito estufa para todos os países do Anexo II do protocolo (responsáveis por cerca de 15% das emissões de GEE), com exceção de Rússia, Canadá, Nova Zelândia e Japão que saíram do acordo e a inclusão de outros poucos; e ii) o engajamento a definir objetivos de um novo protocolo até a COP de 2015. Tais objetivos, mais rigorosos do que os atuais, seriam implementados a partir de 2020.

Entre muitos comentaristas, predominou a sensação de que as decisões mais efetivas tenham sido procrastinadas a um 2015 transformado num ano-chave a partir do qual uma nova era se abriria no cenário das iniciativas para a mitigação das emissões de gases de efeito estufa, talvez na esperança de que, até lá, os efeitos da crise financeira nos países desenvolvidos se tornem menos dramaticamente determinantes nas posições de seus governos.

Podemos nos perguntar se os avanços atuais no campo científico e nas mobilizações plane-tárias conseguiriam manter o mesmo poder de pressão dos anos 1970-1980. Os posicionamentos governamentais, científicos e dos grupos de pressão foram tão significativos para a Rio + 20 como o foram para a Conferência do Rio em 1992?

Vive-se atualmente um momento em que há, dialeticamente, esperanças de que as saídas do impasse derivem das descobertas científicas e que as mesmas possam nutrir as decisões nos pro-cessos políticos. Entretanto, em decorrência de seus graus crescentes de complexidade, as mesmas tendem a engessar a evolução do processo como um todo, rumo a soluções concretas.

UM OLHAR SOBRE A COMPLEXIDADE POLÍTICA NAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Os problemas provocados pelo modelo dominante de desenvolvimento ultrapassaram as fronteiras políticas e provocam continuamente tensões entre países e estes, ainda que reconheçam a existência de questões ambientais globais, mantêm posições muito distintas em relação ao cum-primento de suas metas.

Desde 1992 várias crises simultâneas iniciaram-se ou aceleraram-se: crises climáticas, de biodiversidade, combustível, alimentos, água e, mais recentemente, no sistema financeiro e eco-nômico como um todo. Em particular, o deslocamento de prioridades dos EUA para o combate ao terrorismo, após o atentado de 2001 em Nova Iorque, repercutiu e influenciou os debates ambientais.

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No ano seguinte, os resultados da Cúpula de Johanesburgo limitaram-se a compromissos mais retóricos e metas pouco ambiciosas (RIBEIRO, 2002). Apesar de o secretário geral das Nações Unidas, Kofi Annan, no discurso final do evento observar que a Cúpula produziu um redirecio-namento da ação global para um leque de atores mais amplo – e com isso diluindo ainda mais as responsabilidades – o texto final do Plano foi muito criticado por blocos de países, como a União Europeia, por não incluir nenhuma meta quantitativa nem prazo para se incrementar o uso de energias renováveis. Os países insulares do Pacífico e os vários países da América Latina e Caribe aderiram ao projeto europeu, destacando-se que o mesmo coincide com acordos já existentes nas regiões. Os Estados Unidos mantiveram uma posição distinta.

Tomemos como elementos de analise o que ocorreu nesse período com as emissões de gases de efeito estufa (figuras 1 e 2). Se, de fato, resultados promissores foram observados na segunda metade da década de 1990, esse rumo muda no decorrer da primeira década de 2000. As emissões mundiais aumentaram de 47,3 bilhões de toneladas de CO2 equivalentes em 2005 para cerca de 50,1 bilhões em 2010 (EDGAR, 2010) e continuam crescentes. Neste contexto, somente as emissões de CO2 passaram de 29,7 bilhões para 34,7 bilhões de toneladas em 2011, segundo estimativas do CDIAC (2013). O relatório do PNUMA adverte que

a aceleração de emissões de gases de efeito estufa indica uma ameaça crescente de mudanças climáticas descontroladas e suas consequências poderão ser desastrosas para a humanidade (UNEP, 2011, p. 1)

as quais podem propagar os riscos de escassez de alimentos, de água e de recursos naturais, além de provocar o deslocamento de milhões de refugiados ambientais.

Analisando os dados disponibilizados pelo Banco Mundial (WORLD BANK, 2012), o perfil dos países mudou quanto ao controle de suas emissões de gases de efeito estufa. Quando comparados os dados de CO2 dos anos 1990 – época dos compromissos estabelecidos nos Anexos 1 (Convenção--Quadro) e B (Protocolo de Quioto) – até 2008, destaca-se que alguns dos países industrializados reduziram enquanto os países emergentes apresentaram aumento de suas emissões (figuras 1 e 2).

Figura 1 - Séries históricas de emissões totais de CO2 em diferentes países (ou blocos de países) desde o começo da década de 1990 até 2008 (em milhões de toneladas). Fonte: WORLD BANK (2012).

O foco das discussões sobre mudanças climáticas, cenários futuros e medidas mitigatórias tem sido tradicionalmente centrado nas emissões de gás carbônico (CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e hidrocarbonetos halogenados, muito embora atenção crescente seja devotada para substâncias (como os aerossóis) que segundo dados, cada vez menos incertos, desempenham papel importante no balanço energético da atmosfera.

A figura 1 mostra o histórico das emissões globais desse grupo de gases desde o início da década de 1990, nos quais se vê que todos eles apresentam, entre 2005 e 2008, taxas de emissão significativamente maiores às de 1990 apesar de ter havido, em termos globais, na primeira década após a Convenção, ao menos a estabilização das emissões (à exceção do grupo dos hidrocarbonetos

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halogenados e o SF6). Ressalta-se que as emissões totais de CO2 seguem uma tendência muito próxima à dos valores per capita.

Figura 2 - Séries históricas de emissões de gases estufa: CO2 (emissões totais, em milhões de toneladas; dados referentes à queima de combustíveis fósseis e produção de cimento); CH4 (emissões totais, em milhões de toneladas

de equivalentes de CO2; referentes a atividades humanas como agricultura e indústria); N2O (emissões totais, em milhões de toneladas de equivalentes de CO2; referentes a atividades humanas incluindo agricultura, queima

de biomassa, indústria e manejo de gado); hidrocarbonetos halogenados + SF6 (emissões totais, em milhões de toneladas de equivalentes de CO2, referentes a produção industrial). As emissões se referem a dados anuais que, para os últimos três tipos de gases, são apresentadas em intervalos de cinco anos. Fonte: WORLD BANK (2012).

Cabe destacar que, de acordo com os dados do Banco Mundial, não estão contemplados alguns tipos de emissões de gases estufa como, por exemplo, as de CO2 relativas à queima de biomassa, particularmente importantes no caso brasileiro.

Analisando espacialmente a distribuição das variações ocorridas entre 1990 e 2008 ou 2005 em relação aos valores do ano 1990, as figuras 3, 4, 5 e 6 demonstram estes processos.

Grosso modo, podem ser identificados 3 grandes grupos cujos comportamentos são similares, com poucas especificidades internas: União Européia; Américas; e o conjunto formado por China, Índia, Sudeste Asiático e Mundo Árabe. Estes grupos se situam em posições extremas em termos de emissão – o grupo China, Índia, Sudeste Asiático e Mundo Árabe aumentando consideravelmente enquanto os países europeus tiveram uma queda significativa na geração dos diferentes gases de efeito estufa. No meio deste espectro, as Américas, ora com a produção estabilizada, ora pouco aumentada e com a variação percentual nas classes intermediárias e baixas.

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Figura 3 - Variação de emissões de dióxido de carbono (CO2) entre 1990 e 2008

A figura 3 destaca que quanto à emissão de CO2 devido à queima de combustíveis fósseis e a produção de cimento, os valores totais de geração continuam sendo crescentes na China (+186%), Índia (+152%), Sudeste Asiático e Mundo Árabe, o que impulsionou o aumento total no mundo. Os percentuais de crescimento se inserem na faixa de 134% a 500% no período. Nestes 18 anos, o Brasil apresentou variação intermediária (+88%) inserindo-se na faixa entre 53% a 134%. Em 2008, os Estados Unidos da América (+12%) mantiveram sua produção elevada classificando-se em segundo lugar, após a China.

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Quanto ao metano, durante o período 1990 a 2005 a variação é positiva, especialmente nos países emergentes e nos mais pobres. Colocando-se o foco sobre os países emergentes, enquanto Índia, China, África do Sul tiveram um aumento entre zero e 33%, o Brasil se destaca na classe de variação entre 33 e 110% de aumento, alcançando em valor absoluto o segundo lugar nas emissões totais. Novamente os países europeus aparecem como responsáveis por um declínio entre zero e -50%, numa classe que inclui ainda Rússia e os EUA.

Figura 5 - Variação de emissões de oxido nitroso (N2O)

No que diz respeito ao oxido nitroso (N2O), as variações positivas atingem mais de 162% e as reduções -60,6%. Os países europeus, os escandinavos, Rússia, Canadá e Austrália foram os países que mais reduziram suas emissões, atingindo em 15 anos até -60%, enquanto os que mais aumentaram (entre 33 e 162%) foram a China, Índia, Sudeste Asiático, EUA, Brasil e outros países americanos. Na África esta dinâmica se mostra mais mesclada, com países que aumentaram sua produção no norte e leste do continente versus países ao sul que a reduziram.

Entre os anos 1990 a 2005, a emissão de outros gases de efeito estufa, em percentagens, mostra que Estados Unidos e China são os dois maiores emissores (variação entre 44 e 100%). Na segunda classe de emissores estão a Europa, a Rússia e o Japão. As emissões brasileiras, embora estejam na terceira classe, variando entre 0% e 44%, não são necessariamente pouco significativas. Os indicadores negativos ocorrem com maior destaque para a Índia, Paquistão, Arábia Saudita, Irã, Noruega, Holanda e Argentina.

Aqui caberia outro tipo de reflexão a respeito da redução de emissões nos países europeus: poderia ou ser entendida como o cumprimento (parcial) de metas estabelecidas no Anexo 1 ou Anexo B (considerando as metas 20-20-20 da politica de energia) ou então estar associada à des-territorialização de indústrias para outras regiões do globo. Esse balanço não deveria ser objeto de uma leitura da complexidade do processo, no quadro do novo cenário de produção e uso de bens, que tem na Europa um importante mercado consumidor?

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Figura 6 - Variação de emissões de outros gases de efeito estufa (HFC, PFC, SF6)

Após 20 anos de tentativas de mitigação do processo, cuja falta de eficiência esta implícita nos resultados demonstrados acima, podemos avaliar a Conferência Rio + 20 como a repetição dos impasses vividos nas diferentes Conferencias das Partes (COP). Em 2012, o Rio de Janeiro contou, novamente, com a presença de alguns presidentes ou seus representantes governamentais, políticos, instituições multilaterais, cientistas, organizações não governamentais e grandes empre-sas. Parte do discurso global fixou-se na economia verde, apontando novos produtos e a mudança de prioridade nos investimentos para o desenvolvimento. As negociações, entretanto, continuam produzindo parcos resultados, com bloqueios políticos. Nas análises científicas, destaca-se o posi-cionamento dos céticos, os quais, pautados também em bases cientificas, insistem que as alterações do clima são processos naturais e seus impactos no aquecimento ou resfriamento do planeta são muito mais importantes que os resultados das ações antrópicas e da velocidade das transformações. Eles entregaram à presidente brasileira um documento negando os relatórios científicos do IPCC (publicados em 1990, 1995, 2001, 2007), questionando as mudanças climáticas (Veja, Isto é, Folha de São Paulo) e contrapondo suas visões com as dos defensores. Colocam-se em campos opostos, somente para citar apenas alguns nomes, Bjørn Lomborg (2001) versus Carlos Nobre (2010); Tom Harris (2007) e Aziz Ab’Saber (2009) versus IPCC-AR4 (2007) e Al Gore (2007), premiados com o Nobel da Paz naquele ano.

Da mesma maneira, 2012 encerra-se com uma perspectiva ambígua para o futuro, a COP-18 em Doha. Vários observadores da sociedade civil enfatizam, com visões mais ou menos pessimistas, as divisões que se confirmaram, entre os países, sobre os objetivos, prioridades e responsabilidades. A assinatura do acordo final ocorre de última hora, quase a qualquer custo, para evitar um fracasso generalizado e, de certa forma, sob o peso da obrigação moral de dar uma resposta às pressões surgidas de toda parte em função de recentes estudos e relatórios com novos dados sobre os efeitos potenciais do aumento da temperatura (aumento da taxa de degelo das calotas polares e aumento do nível dos oceanos, de acordo com a NOAA) ou de eventos climáticos dramáticos ocorridos pouco antes ou até mesmo durante a conferência: a excepcional seca registrada no verão de 2012 nos EUA; o furacão Sandy que atinge Haiti, Cuba e a costa oriental dos EUA também no final de outubro 2012; e o super ciclone Bopha nas Filipinas que, na primeira semana de dezembro 2012, causa centenas de mortos e milhares de desabrigados levando a um tocante apelo do negociador

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filipino Nederev Saño na véspera do encerramento da COP, no dia 6 de dezembro (Vidal, 2012). Entretanto, há quem destaque resultados positivos, pouco frisados por outros observadores, como a representante da UE Connie Hedegaard (2012) ao realçar que as expectativas para essa con-ferência nunca foram particularmente elevadas. Observa ela, ainda, que Doha constituiu um passo adiante em integrar os países desenvolvidos e em desenvolvimento para negociar objetivos comuns e destaca como pontos positivos: i) o compromisso da manutenção da injeção de recursos financeiros para os chamados Climate Funds, ii) a definição dos critérios de transferência do saldo positivo de créditos de carbono do período anterior (surplus of unused carbono credit) para o segundo período do Protocolo de Quioto, iii) os compromissos para rever as metas em níveis ainda mais rigorosos do que os atuais até 2014 (com a UE tendo fixado o objetivo de chegar a uma redução nas emissões de gases de efeito estufa de 20% frente ao nível de 1990) e, finalmente, iv) o reconhecimento das perdas e danos (loss and damage) sofridos sobretudo pelos países em desenvolvimento em função das mudanças climáticas, com perspectivas de repasse de fundos para a compensação, termo esse que, entretanto, foi de fato barrado.

... E DA COMPLEXIDADE FÍSICA

Às complexidades no processo de negociação soma-se a própria complexidade dos fenôme-nos físicos relacionados às mudanças climáticas. Os diferentes relatórios do IPCC mostram que, atualmente, se compreende melhor os processos climáticos, mesmo num quadro geral de incertezas científicas. Estas podem ser identificadas em dois níveis: primeiramente, nos diferentes cenários socio-economicos (identificados como “cenários SRES”), considerados pelo IPCC para a emissão de gases de efeito estufa, e em segundo lugar na heterogeneidade das respostas de modelos físicos do ambiente atmosférico a essas emissões, podendo resultar em diferenças bastante significativas tanto em termos de temperaturas como, e, sobretudo, de precipitações. Finalmente, a questão de desagregação dos modelos em escalas mais detalhadas (locais ou regionais) criam, ainda, novas fontes de incertezas (MEROT et al., 2012).

Ao longo dos anos, apesar de tais dúvidas, vem se compreendendo e mensurando com precisão, cada vez maior, a contribuição de distintas fontes de emissão de gases de efeito estufa e elaboram-se previsões de alterações climáticas e seus efeitos, de modo a vislumbrar e aparelhar linhas de ação. Por outro lado, somos também obrigados a reconhecer a existência de numerosos possíveis efeitos de feedback positivos e negativos, investigar seus alcances, em esforços que ultrapassem inevita-velmente as fronteiras disciplinares e reajustar, em consequência, o modelo de previsão, no qual essa múltipla articulação de fatores é fonte de amplificação da complexidade, conforme mostrado de maneira simplificada abaixo, na figura 7.

Figura 7 - Representação esquemática da ideia de complexidade associada ao efeito dos feedback positivos e negativos. Fonte: Adaptado de SOLOMON et al., 2007

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O caso do metano, aqui usado a título de exemplificação, é bastante emblemático, pois, pro-vavelmente mais do que qualquer outro gás de efeito estufa, evidencia essa complexidade devido à multiplicidade das fontes de emissão identificadas e à interdependência entre: i) os efeitos das mudanças climáticas (temperatura e umidade do ar, cobertura de nuvens, regime de precipitação e desertificação, dimensão das calotas polares, etc.), ii) os processos naturais e antrópicos de entrada dessa substância para a atmosfera (ação microbiológica em condições anaeróbicas, queimadas, liberação das reservas presentes no permafrost, principalmente) e iii) os sumidouros (sobretudo, aqueles associados às reações químicas na troposfera). Em particular, a esse respeito é interessante a observação de Solomon et al. (2007) que destaca a contribuição de gases não identificados como GEEs – e os fatores antrópicos relacionados com suas emissões – que contribuem para aumentar ou diminuir o tempo de vida de GEEs na troposfera. É o caso de substâncias como óxido nítrico e dióxido de nitrogênio (NOx), monóxido de carbono (CO), radical hidroxila (OH): todos intensamente ligados a atividades humanas e envolvidos com processos químicos de decomposição troposférica de metano, entre outros.

De um modo geral, todos os estudos que constituem as bases científicas das mudanças cli-máticas apontam, de forma mais ou menos enfática (inclusive em função do momento histórico), para a complexidade das inter-relações entre emissões, alterações físicas da atmosfera, efeitos e feedback. Cabe lembrar, por exemplo, as questões levantadas com relação ao efeito de “ferti-lização” da atmosfera decorrente do aumento da concentração de gás carbônico, à acidificação dos oceanos resultado da dissolução do gás nas águas e, finalmente, à influência da alteração da camada de ozônio no balanço radiativo da troposfera (HOUGHTON et al., 2001; SOLOMON et al., 2007). Nesse contexto, menção especial merecem os aerossóis, que os relatórios do IPCC destacam especialmente seja porque a eles estão associadas as principais contribuições antrópicas negativas no balanço radiativo da atmosfera, seja porque seus efeitos envolvem níveis de incerteza ainda médios ou elevados (Houghton et al., 2001; Solomon et al., 2007). Faz-se importante dizer que toda a variedade de aerossóis emitidos pelo homem produz tanto efeitos energéticos diretos quanto indiretos, positivos como negativos, embora no balanço total se estime que resultem numa contribuição líquida negativa na retenção de calor na atmosfera.

Os estudos relacionados às mudanças climáticas evoluem de uma fase de sistematização de alterações atmosféricas já postas, de identificação de suas causas físicas e de possíveis respostas (HOUGHTON et al., 1990; BERNTHAL et al., 1990) à outra de aprofundamento de conhecimen-tos e cenários, inclusive com uma clara preocupação com as formas de apresentar os resultados e torná-los mais amplamente compreensíveis (HOUGHTON et al., 1995 e, sobretudo, HOUGHTON et al., 2001) a uma terceira fase, de estudos e experimentos desenvolvidos em grande escala (por exemplo, o LBA – Large-Scale Biosphere Atmosphere Experiment in Amazônia).

Além disso, a noção de “adaptação” vem sendo gradativamente reconhecida no mundo cienti-fico. Seguindo os avanços nos relatórios do IPPC, esse conceito quase não aparece no First Asses-sment Report (FAR, HOUGHTON et al., 1990; BERNTHAL et al., 1990), no Second AssesAsses-sment Report (SAR, HOUGHTON et al., 1995; WATSON et al., 1995) recebe atenção somente no título do Working Group II, sem desenvolvimento de conteúdo, e depois se estabelece com mais força como forma de resposta às mudanças climáticas no Third Assessment Report em 2001 (TAR, HOU-GHTON et al., 2001; MCCARTHY et al., 2001) e no Fourth Assessment Report em 2007 (AR4, SOLOMON et al., 2007; PARRY et al., 2007): “Adaptation is a necessary strategy at all scales to complement climate change mitigation efforts” (WATSON 2001: p. 104). No AR4 chega-se a distinguir claramente entre adaptação e mitigação, a ponderar sobre prós e contras, o alcance e as limitações de cada abordagem, com um discurso mais articulado (se veja, nesse sentido, a Tabela TS.7 em PARRY et al., 2007) e, sobretudo, a considerar interrelações e efeitos sinérgicos e anti--sinérgicos entre as duas. Em particular, fica bastante bem caracterizado o fato de as adaptações representarem uma estratégia indispensável (unavoidable), tipicamente de escala local e efeitos imediatos, sujeita a altos custos econômicos, sociais e ambientais e sempre com um limite:

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Tol et al. (2006) show what would be the difficulties in adapting to a five-metre rise in sea level in Europe. It is therefore no longer a question of whether to mitigate climate change or to adapt to it. Both adaptation and mitigation are now essential in reducing the expected impacts of climate change on humans and their environment. (PARRY et al., 2007, p.748).

O mundo político se apropria deste conceito redirecionando as políticas públicas nacionais da mitigação para a adaptação e atribui às autoridades e populações locais o papel de implantar ações mais adequadas às diferenciadas consequências das mudanças climáticas. Pode-se tomar como hi-pótese que, por um lado, se os governos nacionais são refratários e pouco eficientes para mudanças de posturas, haja vista suas preocupações macroeconômicas, por outro, são as populações e gover-nos locais que percebem diretamente os impactos das mudanças e assumem a responsabilidade de tornar mais efetiva e dirigida a ação pública.

OS CAMINHOS LOCAIS

Se as mudanças climáticas tem sido objeto de numerosos estudos à escala global, as conse-quencias às escalas regionais e locais são pouco discutidas. Os dados fornecidos pelos modelos globais comportam ainda muitas incertezas quando se trata de aperfeiçoar as previsões de evolução do clima e suas consequencias regionais e locais sobre o Homem. A resposta da sociedade aos processos globais devera igualmente se fazer à escala das coletividades territoriais, especialmente no que diz respeito aos riscos ligados ao clima ou à questão de adaptação às alterações climàticas (DUBREUIL et al., 2010a).

O relatório do PNUMA (2011) informa que muitos governos já possuem seus planos de adaptação considerando aumentos prováveis de temperatura da ordem de 2° C., muitos dos quais incluem o esverdeamento de alguns setores da economia.

No Brasil, o plano nacional de mudanças climáticas (PNMC), aprovado pela Lei 12.187/2009, aborda a adaptação em dois níveis: a construção da capacidade de adaptação de determinados grupos locais às mudanças de condições de produção e à implantação das medidas voltadas para a redução da vulnerabilidade das populações mais pobres e com piores índices de desenvolvimento. Criou-se o Fundo Nacional de Mudanças Climáticas para financiamento de ações. Os programas nacionais no Brasil envolvem, pelo menos, quatro linhas de ação: o plano de ação para prevenção e controle do desmatamento e queimadas no Cerrado-PPCerrado (2009); o projeto MDL de florestas e recuperação de áreas degradadas (2010); o programa agricultura de baixa emissão de carbono (2010-2011) e um projeto estratégico que promove atividades de acompanhamento das negocia-ções internacionais no âmbito da convenção-quadro de mudanças climáticas - Clima e negocianegocia-ções internacionais (iniciado em 2011).

Olhando para outro contexto, bastante distinto da realidade brasileira, na política francesa o Ministério da Ecologia e do Desenvolvimento adotou o Grenelle sobre o Meio Ambiente, em novembro de 2010, que exige que as coletividades com mais de 50 000 habitantes estabeleçam um Plano Clima-Energia-Território (PCET), incluindo uma componente de mitigação e outra de adaptação às mudanças do clima. O PCET diz respeito, antes de tudo, à mitigação por meio da re-dução de emissões de gases de efeito estufa no território. No que diz respeito à adaptação, trata-se de considerar a mudança climática sobre o desenvolvimento da cidade, que significa, em primeiro lugar, a avaliação do risco climático e, depois, a implantação de medidas para reduzir seus efeitos negativos. Entre os riscos climáticos urbanos susceptíveis de mudar no futuro incluem-se o aumento do risco de inundação, decorrente de uma intensificação das precipitações e do aumento das super-fícies impermeabilizadas e a amplificação das ondas de calor e de poluição ligadas à existencia de ilhas de calor urbano-ICU (DUBREUIL et al., 2010b).

Na política de clima da Região Bretagne (França), destaca-se o eixo de planejamento de ener-gia relacionada às vulnerabilidades às mudanças e a criação do Pôle Clima em 2010, no âmbito do

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PCET. Nesta região, forte proporção das emissões é de origem agrícola, seguida daquelas originadas pelos transportes, residências e atividades terciárias. Os principais eixos desta política envolvem: i) adaptação às mudanças climáticas (reforço dos conhecimentos; regionalização dos cenários do IPCC) com foco na economia de adaptação da agricultura, pesca, turismo e ii) inserção de ações de adaptação nos documentos de planejamento, com indicações operacionais.

Destacando a tomada de consciência na escala local, no plano urbano, exemplificamos com algumas ações já implantadas na cidade de São Paulo e na área metropolitana de Rennes.

Nobre et al. (2010) demonstram que as alterações já verificadas na região metropolitana de São Paulo indicam a urgente necessidade de ações locais, ao mesmo tempo em que a expansão ocorre majoritariamente sobre áreas ambientalmente frágeis, colocando em risco a população. As ações públicas recomendadas por Nobre envolvem a implementação do Plano de Macrodrenagem da Bacia do Alto Tietê para todos os municípios da Região Metropolitana e a implantação de parques pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA), com recursos do Fundo de Desenvolvimento Urbano (FUNDURB).

A prefeitura de São Paulo, por meio do programa SP 2040, integra a rede de metrópoles mundiais - Large Cities Climate Leadership Group – as quais têm buscado informar a população, demandar suas contribuições e sugestões para orientar o poder público a definir suas prioridades de ação e um novo modelo de cidade.

Neste contexto, políticas municipais estão baseadas na premissa de que os rios que cortam a cidade devam funcionar como corredores naturais, o que deu origem ao programa 100 parques lineares (DEVECCHI, 2009). Este visa a construção de parques locais em quatro regiões do mu-nicípio – a borda da Cantareira, a nascente do rio Aricanduva e as represas Billings e Guarapi-ranga – tanto para assegurar as áreas produtoras de água, como para criação de sistemas de áreas verdes. Há numerosas críticas ao programa, sobretudo porque em algumas regiões da cidade estes parques parecem pequenas praças arborizadas em vista de sua área diminuta. Diferentemente, na “Borda da Cantareira” são estimados cerca de “dez milhões de metros quadrados (10.000.000 m2) de área protegida que a Prefeitura de São Paulo está desapropriando na zona de amortecimento da Cantareira” (PREFEITURA DE SÃO PAULO, 17/02/2009). Estes parques lineares têm como objetivo criar zonas de amortecimento e proteção do Parque Estadual da Serra da Cantareira, sob o impulso da demanda global de manutenção das áreas verdes remanescentes e preservação do espaço da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde de São Paulo. Além deste objetivo de preservação das áreas associadas à Reserva da Biosfera, o programa visa também a remoção de favelas situadas em áreas de risco, sobretudo aquelas ligadas às encostas, muito embora se observe uma ausência de preocupação com a mesma premência quanto as áreas de várzeas.

Na região metropolitana de Rennes destaca-se a instituição Rennes Metropole coordenadora do Plano Clima-Energia-Territorial (PCET) que envolve espacialmente o centro e as cidades mais periféricas e que tem como objetivo a redução de 20% das emissões de gases estufa. Esse plano conta com o engajamento de 33 das 37 municipalidades e propõe que as competências no cumpri-mento do compromisso de redução de CO2 sejam definidas pelas cidades e suas comunidades. A metrópole de Rennes produz 2 milhões de toneladas de CO2 sendo 41% pelo setor habitacional, 29% por outros tipos de construções e 24% pelo tráfico rodoviário. São 620 ações dentro dos mu-nicípios, tendo como as mais importantes a de patrimônio e a de mobilização dos atores. Visando demonstrar ações exemplares, as instituições governamentais buscam reduzir o uso de energia nos estabelecimentos públicos; embora o impacto da redução do consumo seja limitado em termos reais, do ponto de vista de comunicação o potencial é grande. No eixo de habitação e transportes, a Rennes Metropole tem o poder de estabelecer as normas para a construção civil (todos os tipos), apoiar as ações junto às grandes empresas na alteração da estrutura de transportes e também a carte city roule (pool de veículos utilizados por meio de cartão de crédito). Estas perspectivas de

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mento e de mobilização da população envolvem os atores do território, especialmente instituições públicas, sindicatos, associações e empresas. Estes dois exemplos, embora atuem com estratégias diferentes, inclusive por motivos de suas dimensões e também de ordem cultural, demonstram a preocupação com as causas e consequencias nos locais.

Na Bretanha, a adaptação das cidades às mudanças do clima global e local visa reduzir o desconforto e a alta mortalidade ligada aos episódios de canículas, à imagem do verão de 2003 (FOISSARD et al, 2012a). A ilha de calor urbano invervêm, de fato, negativamente sobre o conforto urbano pela manutenção da temperatura elevada durante a noite; o que não permite gerar uma fase de recuperação depois de um dia quente. A elaboração de ações públicas focadas na atenuação das ICUs pelas cidades são integradas em planejamentos como o SCOT (Plano de Coerência Territorial) e no PLU (Plano Local de Urbanismo). Em Rennes, as pesquisas sobre a morfologia do ambiente construído permitiram estabelecer uma cartografia das ICUs em função dos usos dos solos. Essa cartografia constitui a primeira abordagem para a identificação e o estabelecimento de medidas de mitigação (FOISSARD et al., 2012b).

Os mecanismos de mitigação do calor urbano nas cidades envolvem a criação de ilhas de frescor no seu interior, cujas alavancas mais conhecidas são a vegetação, a água, o albedo das superfícies minerais e a organização espacial da construção. As recomendações são, muitas vezes, no sentido de aumentar a vegetação urbana, embora permaneçam sem definir a natureza e a distribuição da mesma.

Fica claro, em todas as abordagens analisadas, que há sempre uma necessidade de combinar a experiência e as habilidades dos profissionais da área, com a introdução, cada vez maior, de fer-ramentas de medição, monitoramento e previsão climática, no curto, médio e longo prazo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O AR5 acaba de ser divulgado, mas continua-se aguardando os passos que a diplomacia pretende dar. A disputa entre os países para saber quem pode investir mais nos compromissos de redução das emissões mantém em lados opostos Europa e países emergentes, América do Norte (Estados Unidos e Canadá), grandes países, como Russia, Nova Zelândia e Japão e também países menos desenvolvidos, refratários a compromissos mais restritivos.

Enquanto continuam o impasse e as controvérsias no contexto diplomático, o mundo científi-co é marcado por uma grande reviravolta. Alguns dos céticientífi-cos das mudanças climáticas, sobretudo Bjørn Lombord e Richard Muller que durante anos afirmavam seus pontos de vista a respeito das incertezas científicas e negando os relatórios do IPCC, em 2012 mudam seus posicionamentos e flexibilizam suas duras posições críticas, argumentando que a participação humana nas alterações do clima é altamente significativa.

Nesse momento o caminho mais trilhado é a atribuição das responsabilidades ao local, onde é menos uma questão de diplomacia e mais de capacidade de entrosamento entre aqueles que vivem problemas semelhantes. Os atores locais não se preocupam com a complexidade dos processos, mas pragmaticamente enfrentam as crises e tentam solucioná-las por causa da maior exposição da população aos riscos, das consequências dos eventos extremos sobre a produção e economia local. No entanto, a política global de responsabilizar as autoridades locais necessariamente implica em custos econômicos e sociais; em maior competitividade entre os diversos segmentos sociais na disputa por lugares menos vulneráveis; e em investimentos na capacitação de seus técnicos e da população em geral: aspectos que nem sempre os municípios e outros atores locais, tornados agentes cruciais frente à fragilidade do meio ambiente e à amplitude dos riscos, conseguem assumir.

AGRADECIMENTOS

Ao CNPq pela bolsa Ciência Sem Fronteira de Neli Ap. De Mello-Théry (CSF 201392-2012-7), à Universidade de São Paulo e ao Comité Français d’Évaluation de la Coopération Universitaire

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et Scientifique avec le Brésil pelo apoio financeiro no âmbito da parceria USP-COFECUB (projeto n. 10.1.1959.86.9 e Uc Sh 131/11).

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Trabalho enviado em novembro de 2013 Trabalho aceito em dezembro de 2013

Referências

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