CENTRO DE
HUMANAS
PROGRAMA
DE PÓszGRAnUAÇÃo
EM
PSICQLOGIA
“ENCGNTROS
PRAZEROSQS”
EMonos
E
Es1¬1Los
DE
VLDA
DE
MULmREs
LESEICAS
EM
~
ELQRIANÓPQLIS
/Rosane
Maria
de
Godoy
ELQRIANÓPQLIS
PROGRAMA
DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM
PSICOLOGIA
“ENCONTROS
PRAZEROSOS”
Mønas
E
ESTILQS
DE
VIDA
EE
MULHERES
LÉSEICAS
EM
FLGRIANÓPGLIS
Rosane
Maria
de
Gedey
Dissertação apresentada ao Departamento de
Psicologia da Universidade Federal de Santa
Catarina
como
requisito parcial para chtençãodo grau de Mestre
em
Psicologia.Prof*
Dr”
Mara
Coeiho
de
Souza
Lago
Orientadora
ELQRIANÓPQLIS
Programa
de
Pós-Graduação
em
Psicologia
-
Mestrado
ENCONTROS
PRAZEROSOS:
MODOS
E ESTILOS
DE
VIDA
DE
MULHERES
LÉSBICAS
EM
FLORIANOPOLIS
Rosane
Maria
de
Godoy
Dissertação defendida
como
requisito básico paraobtenção de Grau de Mestre no Programa de Pós-
Graduação
em
Psicologia-
‹Mestrado, Área deConcentração Psicologia e Sociedade e aprovada pela
Banca Examinadora composta pelos seguintes . profes'soif.es:~›«z_':_ ‹-f-z<.\{‹§§¿;u. V ¿ >.¡\ \ `)_'¬.§\_. §\ \\ I . . . . “I " ~ Mm -
Prrgiš
ana
Jura onellgiqueira ` *Coordenadora do Curso
Banca Examinadora:
Jíwzw-=›-›Q
áré
Prof' Dr*
Mara
Coelho de Souza Lago(UFSC)
ÊOrientadora
/
ea
~~
Prof' Dr” Sônia
Weid
rMaluf
PUC-RS)
ä
¬ zÍ
Pro1%I~eli
Siãueira(UFSC)
Agradecimentos
Na
minha
vida sempre. busquei concretizarmeus
projetos. Eles setornavam
possíveis
porque
na
trajetóriasempre
encontrei pessoasque
me
apoiaram.Algumas,
acreditando
em
mim,
outras,quem
sabe, duvidando, oque
pouco
importa.Com
issoquero dizer
que
ao escrever esta dissertação-
em
algimslmomentos
um
processosolitário e
complicado
-
conteicom
o apoio de muitas pessoasque
me
ensinaramcomo
não
desistir,não abandonar
a luta esim
a resistir, persistir.A
todas agradeço carinhosamente e por elas tenho profundo respeito.Primeiro gostaria de agradecer à Denise,
companheira
e amiga.Nosso
brilho, nosso estilo..., vai estar
sempre
na
glória, defazermos
oque
nos satisfaz...Juntas traçamos este trabalho.
A
cada inusitado,nunca
me
deixouabandonar
o
projeto. V
_
Agradeço
também
àminha
orientadora, professoraMara
Coelho
deSouza
Lago
pelo carinho, dedicação e cobrançasna produção
acadêmica.Suas
preocupações .ultrapassaram a
produção
deste trabalho.Sempre
atenta àsparticipações
em
eventosacadêmicos
foimais que
uma
amiga, poiscom
ela dividimuitas das
minhas
dificuldades, tanto profissionais quanto pessoais.Agradeço profundamente
às dez mulheres informantes que, cadauma
ao seumodo
e estilo, falaram de suas trajetórias, seus relacionamentos, suas vivências.Enfim,
mais
uma
vezromperam
com
o silêncio. Fortaleceram urna rede epossibilitaram a concretização desta pesquisa.
Os
encontrosforam
prazerosos.Nesta
trajetória tive o privilégio detambém
encontrarcom
grandes mestressempre
atentos/as aomeu
trabalho.Ajudaram,
cadaum(a)
de sua forma, aconcretizar este
meu
projeto. Nestemomento
agradeço toda a colaboração dos(as)professores(as): José Carlos Zanelli,
Maria
Juracy Toneli Siqueira, Nadir Zago,Carmem
Silvia deArruda
Andaló, SôniaWeidner
Maluf
eMiriam
Pillar Grossi.Gostaria de agradecer a atenção e apoio das duas frmcionárias
da
secretariado Programa
de Mestrado: Janete MartinsBromer
e ArleteCamargo.
Acreditoque
são colaboradoras de todos os colegas mestrandos.
Agradeço
em
particular a duas colegas de curso, RitaMaria
Machado
eMaria
JasylenePena
de Abreu, companheiras deminha
trajetória acadêmica, e destetrabalho. Participamos juntas de vários encontros e discussões.
Dividimos
alegrias edificuldades. Sei
que
os laços criados permanecerão.`“Os amigos
são amelhor
coisada
vida, pois osamores vão
evem,
mas
osamigos
são as pessoasque ficam”.
Os
que
cito e agradeço,fazem
parte deminha
vida,
foram
interlocutores deste trabalho.Preocupados
e atentos àminha
produção.Muitas vezes tive
que
abandona-los,em
outras pedi socorro. 'Sirley Bandeira deSouza
eMaria
LúciaLopes
de Simas, Fabiana Kretzer eMichele
Broering Marcílio,Luiz
Femando
Neves
Córdova
e GilcioneAmaral
Madruga, Mariana Quevedo,
Daniel Corrêa Felix deCampos,
vocês são especiais. Obrigada.Meu
carinho e sincero agradecimento aos colegasda
Academia
deComércio
de Santa Catarina-
Escola Técnica deComércio
de Santa Catarina,que
me
acompanharam
nesta trajetória,sempre
dando
o apoio necessário. 'Por
firn enem
por issomenos
importantes, agradeço àminha
família, aosImorais
Os
imorais falam denós
do
nosso gosto nosso encontroda
nossavoz
os imorais sechocam
pornós
nosso brilho nosso estilo nossos lençóis os ímoraissoniram
pranós
fmgiram
tréguafizeram média
venderam paz
mas
um
dia,eu
seia casa car
e então
a moral da estória
var estar
sempre na
glóriade fazermos o
que nos
satisfazC. Oyens/Z. Dtmcan
Agradecimentos
... ._ IIISumário
... ..VI
Resumo
... ..V
III Abstract ... ..IX
1.ACaminhada
... ..01
2.Referenciais
da
Pesquisa
... ..06
2.1A
questãodo
sujeito ... ..06
2.2
Algumas
discussões de gênero ... ..10
2.3
Abordando
homossexualidades ... ..12
3.
Método
... ..24
3.1
Relendo o
diário decampo
... ._28
3.2Ensaiando
a etnografia de alguns espaçosde
sociabilidadegay
... ..31
Saídas noturnas
na
DanceteriaChandon
... ..31
Encontros
no
Via IICafé
... ..; ... ..40
A
noite nos Bailões ... ._45
3.3 Guetos,Regiões
Morais,ou
Pedaços?
... .. 514.
As
Informantes
Falam
de
Si: reflexõessobre
seus
relatos ... ..57
Araci,
52
anos ... ..59
Ellen,
44 anos
... .. Fernanda,36 anos
... ._ Gabriela,27
anos
... .. Helena,24
anos
... ._ Ivete,34 anos
... ..100
Joana,25 anos
... ..4.1
Os
locaisde
sociabilidadegay
e as informantes4.2
Algumas
Rupmras
e (Des) Continuidades ... ._5 _
Considerações
Finais ... ..Referêpóias Bibliográficas
... ..Esta dissertação pretendeu discutir
modos
e estilos de vida demulheres
lésbicasem
Florianópolis,na
tentativa de explicitaralgumas
desuas práticas, inserções e relacionamentos sociais, tendo
como
objetivocontribuir para a
desconstmção
da representação dosmodelos
heterossexuais
como
expressão de normalidade._
Baseado
nos pressupostosdo
método
etnográfico, através deentrevistas gravadas, obteve
depoimentos
e histórias de vida de dezmulheres
homossexuais,moradoras da Grande
Florianópolis,com
idadesentre 22» e
52
anos e posições sociais diferenciadas.A
maioria dasinfonnantes pertencia às
camadas
médias, sendo entrevistadastambém
mulheres
oriundas decamadas
populares.Algumas
destasmulheres tinham
concedido entrevistas .paraestudo desenvolvido anteriormente, o
que
facilitouaformação
deuma
rede de infonnantes -e
uma
convivência estreita entre elas e apesquisadora,
na
realizaçãodo
trabalho empírico. Procurando “escutar asvozes” destas mulheres e problematizar seus relatos,
foram
propostasalgumas
questõesque
nortearam as análises desenvolvidas. Assim, asinformantes falaram
do
início de sua auto.-percepçãocomo
homossexual,de seus- relacionamentos
com
as familias de origem, suas relaçõescom
osfilhos,
com
as arceiras, relatandotambém
al - s de seus ro`etos ara oJ
futuro.
Neste sentido,
podemos
destacarque
este estudodemonstrou
aThe
present dissertationaimed
at discussing the lifestyles of lesbianwomen
from
Florianópolis, attempting to expresssome
of their practices, insertions.and
social relationships in -order to help
deconstmct
the representationof
theheterosexual
models
as expression of nonnality.Based
on
the presuppositions of the ethnographic 'method, I gathered
testimonies of ten
homosexual
women
living at Great Florianópolis, with. the ageranging
from 22
to52
years oldand
coming
from
.the most» varied social. classes.Most
of them, in fact,came
from
both the middle or the lower classes of society.Some
of
thesewomen,
had
contributed .to another- study previouslydeveloped,
somehow
favoring .the formation of aweb
of subjectsand
a closerelationship,
among
them
and
the researcher . essential .to the realizationof
an
empirical work.
By
“listening to thesewomen°s
voices”,some
-issueswere proposed
in orderto `
direct the analyses
which
were developed
as well as problematise theirtestimonies. In this sense, the . subjects .talked about their self-perceptions as
homosexuals, the relationship with their families, children
and
partners,and
alsoreferred to
some
of their plans for the future.In
sum, one
can emphasise the fact that the present study demonstrated theEsta dissertação é decorrência de
um
estudo realizado anteriormentecomo
conclusãodo
curso de especializaçãoem
Educação
Sexual,da
Universidadedo
Estado de Santa Catarina.Na
época, foi desenvolvidauma
pesquisa entredoze
mulheresque
seautodefmiam
como
lésbicas.As
entrevistadas pertenciam às
camadas médias
de Florianópolis e aum
grupoque
foi
definido
como
restrito, pois,embora
algumas
tivessemmantido
relacionamentos heterossexuais anteriormente, naquele
momento
serelacionavam, sexual e afetivamente, apenas
com
parceirasdo
mesmo
sexo.A
faixa etária era de
20
a60
anos, sendoque
todasatuavam
profissionalmente ecom
nível de escolaridade situado entre o ensinomédio
incompleto e o ensinosuperior.
Aquela
monografia
buscava compreender
os processos individuaisdestas mulheres,
que
se percebiam e seassumiam
enquanto homossexuais.Abordando
questões acerca de seu imaginário erótico'.Em
seu trabalho sobre identidade homossexual, a pesquisadora TeresaSell (1987) descreve as dificuldades
que
encontrou para entrevistarmulheres
lésbicas
na
cidade de Florianópolis. Estas dificuldades se traduziamem
desencontros, adiamentos,
não
atendimento de telefonemas, etc, oque
a fez optarpor
não mais
discutir a homossexualidade feminina, concentrando-seno
estudoda homossexualidade
masculina. Tal comentário toma-se importantena
medida
em
que destaca,na
época da
pesquisa citada, a dificuldade deaproximação
ou
deabertura para a discussão da temática.
*Conferir Godoy (1997). Os resultados e discussões daquele traballio estão publicados em dois artigos: Revista do Núcleo de
Estudos da Sexualidade do Centro de Ciências da Educação FAED/UDESC, Florianópolis, 1997 e Revista Ciências da Saúde,
Como
não
encontrei amesma
dificuldade, tantona
primeira ida acampo
como
agora,penso que
sepode
falarnuma
mudança no
sentido damaior
visibilidade da questão homossexual.
Uma
visibilidadeque
esta pesquisabusca
complexificar.
As
discussõesem
tornoda
sexualidadetêm tomado
novos
rumos,no
sentido de contextualizarem as diferenças entre
homens
e mulheres.Os
estudosde gênero
destacam
a assimetria de papéis e funções femininos e masculinos nasrelações (sexuais, cotidianas, sociais), nas diferentes sociedades
humanas,
em
que
as mulheres,em
geral,têm
sido relegadas aum
plano secundário, desubordinação.
Em
termos de sexualidade,uma
forma
tem
sido erigidacomo
modelo: a heterossexualidade
-
ligada à procriação-
enquanto as outrasformas
são escamoteadas, disfarçadas, reprimidas. Este
modelo
padronizado,normatizado de sexualidade, caracteriza-se
como
sendo,além
de heterossexual,falocêntrico.
Estudar outros estilos de viver a sexualidade
tem
se reveladoum
modo
de contribuir para a relativização e/ou. questionamento deste
modelo
hegemônico
de sexualidade
que
exclui asdemais
formas de vivência sexual.Nas
últimasdécadas,
no
rastro dosmovimentos
feministas e de luta pelos direitos dasminorias excluídas, colocadas muitas vezes
como
desviantes pelas sociedades,têm-se multiplicado os estudos sobre a homossexualidade.
Estas pesquisas,
em
sua maioria dedicam-se à análiseda
homossexualidade
masculina.A
sexualidade feminina(homo
ou
hetero) érelevada, posta
em
segundo
plano e, por isso,menos
estudada.Tomando-se
portanto,
menos
visívelcomo
salientaMott
(1987)no
casodo
lesbianismoa
falta de
documentos
se deve maisà
cegueira, indiferença e preconceito doshomens
faceà
sexualidade feminina, considerada assunto demenor
importânciaNo
cotidiano das relações sociais de gênero,que não
costumam
serrelações simétricas,
ocorrem
submissão e opressão das mulheres,independentemente de sua orientação sexual.
As
sociedades ocidentais,em
particular,
levam
asmulheres
aviverem
sua sexualidade muitas vezes deforma
reprimida e “marginal°,assumindo
um
papel passivoem
todos os tipos derelações (amorosas, familiares, trabalhistas). Neste contexto se
encontram
asmulheres
lésbicasque
vivem
sobum
“pactodo
silêncio” ena
“clandestinidade°.Uma
contingência por estarem inseridasem
sociedadesonde
aheterossexualidade é a
nonna
eque
ao padronizarem práticas,comportamentos
evivências, convertem-nas muitas vezes
em
patologia, anormalidade.Neste
sentido, oConselho
Federal de Psicologia,preocupado
com
osprofissionais
que atuam
em
questõesque
envolvam
a orientação sexual, editouuma
resolução sobre sexualidade, divulgadano
JornalCFC
(1999: 06):“...
É
preciso colaborarpara a
superação de preconceitos, discriminações eestigmatizações, principalmente
em
relação às pessoas que têm orientaçõessexuais para o
mesmo
sexo.A
resolução apresenta principios éticospara a
conduta
do
psicólogo que lida, dealguma
forma,com
a
orientação sexual deseus clientes, procurando garantir que,
quando
procuradospor
homossexuaisou seus responsáveis
para
tratamento, os psicólogosnão
recusem 0atendimento,
mas
sim aproveitem omomento para
prestar esclarecimentossobre
a
perspectivada
Psicologia.Mas
nunca propor métodos de cura, poisvale
a pena
reforçar quenão
se trata de doença, muitamenos
desordemmental”.
Estas informações são importantes, pois hoje todos falam de gays e de
lésbicas.
Cada
vezmais
os estudos da sexualidade nas diversas culturastêm
apontado para os preconceitos, falas, visões equivocadas
que
precisam serdiscutidas e revistas, pois relativizar os discursos
que
seproduzem
sobre ahomossexualidade,
pode
contribuir para a desconstiução dosmodelos
Nesta
pesquisa, a análise está centradanos
relatos de mulheres lésbicasda Grande
Florianópolis, sobre suas práticas sexuais e suas inserções sociais. Neste sentido, tevecomo
objetivo estudar osmodos
e estilos de vida destasmulheres,
no
interesseda
desconstrução dos discursosque
sustentamdiscriminações contra as vivências
que
se afastamdo
modelo
heterossexual.Pretendeu
também
investigar aforma
como
outras vivênciasda
sexualidade searticulam
com
osmodelos
heterossexuais de assimetriade
papéis nas relações.A
ampliação de estudos sobre as múltiplas possibilidades de vivênciasda
sexualidade
humana
poderá contribuir para a discussão, relativização equestionamento de concepções disciiminatórias sobre aquelas práticas sexuais
que
sedesviam
dos padrões instituídoscomo
normas
pela sociedade.Neste
sentido, a
academia
poderá contribuir para adesconstmção
demodelos
de vidahegemônicos,
em
estudosque
sedediquem
à questãoda
constituição dos sujeitos,nas intersecções entre psicologia e sociedade.
Buscando
situar a pesquisa desenvolvida, estas primeiras palavrastiveram
como
objetivo destacar a relevância deste trabalho,no
sentido de tentardesenvolver
um
outro olhar a respeito decomo
vivem
algumas
mulhereshomossexuais
em
Florianópolis.Num
segimdo
momento
da
dissertação, apresentoalgumas
concepções edebates teóricos acerca das questões de sujeito, gênero e homossexualidade.
Tenho
clarezaque
outras leituraspoderiam
ter sido apresentadas,mas
acreditoque estas contribuem para as discussões pretendidas.
O
terceiro capítulo discone sobre a metodologia da pesquisa.É
omomento
de apresentarquem
são os sujeitos pesquisados, oque
fazem,como
aconteceram os encontros para as entrevistas,em
que
períodoforam
realizadas.onde busco
descrever locais 'freqüentados por gays e lésbicas oriundos dediferentes
camadas
sociais daGrande
Florianópolis.No
quartomomento,
as informantes falam de si.São
analisadasalgumas
representações destas mulheres,
que contam
um
pouco
de suas trajetórias.São
relatos
que nos dão
idéia decomo
elasvivem
seus relacionamentosamorosos
esociais. Procurei descrever
também,
neste capítulo,algumas
mudanças
queforam
acontecendona
vida das mulheres entrevistadas e das quais tiveconhecimento
pelo constante contato
com
asmesmas.
Finalmente,
retomo algumas
discussõesque foram
recorrentes nesteestudo, tentando concluir o trabalho de dissertação. Espero
que
sua leiturapossibilite a discussão e outros olhares sobre a
homossexualidade
feminina.Olhem
para 0 céu, háum
desejo prementepela
manhã
que nasce diante de vocês.A
História, apesar de sua dor lancinante,jamais pode deixar de ser vivida; se enfrentada
com
coragem, dispensa ser revivida.Olhem para o dia
que irrompe diante de vocês.
Façam com
que o sonhorenasça. Alaya Angelou
2.1
A
questão
do
sujeitoUma
referência fundamentalnos
trabalhosque
tratamda
questãoda
sexualidade é a
do
filósofoMichel
Foucaultcom
sua Históriada
Sexualidade,editada
em
1976
na
França.Emboranão
tenha tratadoda
questão de gêneroem
seus estudos, este autor possibilitou
um
novo
olhar sobreo
tema, articulado àsquestões
do
saber,do
poder,da
verdade edo
sujeito. Conceitosque
sãopano
defundo
de qualquer estudo empírico nas ciênciashumanas.
A
importância desteautor para os estudos de gênero é incontestável e
pode
sermedida
pela(o)sautora(e)s
que
o utilizamcomo
referência para suas reflexões sobre o temaz.Michel
Foucault propiciou,com
suas concepções, outros olhares sobre osdiscursos, histórica e culturalmente produzidos, a respeito
da
sexualidade e sobrequestões
como
a homossexualidade, os poderesque
permeiam
as micro relações(familiares, amorosas, sexuais), etc. Ele historicizou e focalizou a questão
do
sujeito,
dando
uma
importante contribuição à desconstruçãoda noção
de sujeitouniversal.
É um
dos autores fundamentais para pensar as implicaçõesda
linguagem,
do
discurso,nos
processos de subjetivação.Em
entrevista bastante conhecida(Rabinow
&
Dreyfus, 1995) Foucaultafirmou
que,embora
a sua obra tenha sido lida e utilizadacomo
voltada para acompreensão
(e desconstrução) da problemáticado
poder,como
esta vinha sendo tratada, relacionada àsmacro
estruturas de controle e repressão,na
realidade -.aquestão central era, para ele, a
do
sujeito, de seu surgimentono
discursoocidental.
O
sujeito de Foucault é histórico, constituído pelo(s) discurso(s)-
sujeito assujeitado.
“É
preciso se livrardo
sujeito constituinte, livrar-sedo
2
Entre outra(o)s autora(e)s temos, Denise Portinari (1989), Joan Scott (1990), Margareth Rago (1991), Teresa de Lauretis (1994), Chantal Mouife (1997), Guacira Lopes Louro ( 1997), Judith Butler (2000).
`\z\ `\
próprio sujeito, isto é,
chegar
a
uma
análiseque possa dar
contada
constituiçãodo
sujeitona
trama
histórica”(Foucault, 1985207). Tratandodo
tema, o autorprocura esclarecer a imbricação entre sujeito e poder: de
um
lado, o poderque
legisla, e de outro, o sujeito obediente, sujeitado,
em
face deum
poder
que
élei, o sujeito
que
é constituídocomo
sujeito-
que
é 'sujeitado' -é' aquele
que
obedece”(Foucault, 1988:82). ~Segundo
Foucault, o sujeito se constitui principalmente a partir daforma
de saber-poder, básica
no
ocidente:a
confissão.“A
causalidadeno
sujeito, oinconsciente
do
sujeito,a
verdadedo
sujeitono
outroque
sabe, o saber, nele,daquilo
que
ele próprio ignora, tudo isso foi possível desenrolar-seno
discursodo sexo”
(Foucault, 1988: 68-69).Foucault (1980), destaca
que vivemos
um
regime de poder-saber-prazer,que
sustenta o discursoda
sexualidade.Em
seu estudoda
históriada
sexualidade,o autor ressalta
que
sua intenção é a de deslocar a vontade de sabercomo
elemento negativo,
buscando
entender a história e a transformação das instânciasque
produzem
os discursos.O
que
falamos sequem
fala sobre sexo. Precisamostentar conhecer este discurso,
compreender
suas entrelinhas.Este estudo está centrado
na
questãoda
homossexualidade e utiliza,como
material etnográfico de análise, os relatos de mulhereshomossexuais
obtidos
em
entrevistasem
que contam
um
pouco
de suas histórias.A
forma
como
representam,
em
suas falas, as suas vivências, as micro relações de poderque
permeiam
suas experiências e contatos sociaiscom
familiares, companheiras,namoradas, colegas de trabalho, chefes, maridos, instituições, etc, são
constituídas (e estão transpassadas) pelos discursos produzidos sobre a
Para Foucault
mais do que
analisar e criticar o conteúdodo
discurso,importa
compreender
como
este discurso é produzido social e historicamentecomo
"verdade". Neste sentido, interessa-nos sabercomo
são relatados, pelasinfoimantes, os discursos sobre a
homossexualidade
e os seus processos desubjetivação das práticas homossexuais.
Embora
esta dissertaçãonão
tenhacomo
objetivo realizaruma
análisefoucaultiana
do
discurso dos sujeitos entrevistados, Foucault éum
autorque dá
fundamentos
para refletir sobre todas as questões envolvidasna
pesquisa.Possibilita, a partir de seu aporte teórico, afirmar
que não
existem verdadesuniversais acerca
da
homossexualidade, porquantonão há
sujeitohomossexual
universal.
Buscando
problematizar a questãodo
sujeito,Lago
(2000), apresenta-nossuas reflexões a respeito das concepções de constituição
do
sujeito, nasintersecções disciplinares entre Antropologia e Psicanálise.
Chama
a atençãopara o fato de
que
a pesquisanos
exigebons
instrumentos de análise,que
possibilitem
compreender
os sujeitos nela implicados,em
suas dinâmicasrelacionais.
A
autora reflete sobre a própria constituição dos saberes disciplinaresno
campo
das ciênciashumanas,
ressaltandoque
estessurgem
divididosem
sociaise psicológicos, contribuindo desta
forma
para estabelecer a dicotornização entre oindivíduo e a sociedade,
que elegem
como
objetos.0
No
texto,Lago
reflete sobre os conceitosque procuram
dar conta desseoutro envolvido nas pesquisas empíricas, recusando o uso
do
termo indivíduo,tanto pela
forma
como
tem
sido classicamente utilizado,marcando
um
domínio
separado
do
social,como
pela própria significaçãoembutida no
conceito, de unidade indivisível.Porque
“... os outroscom quem
nosdeparamos
em
nossaspesquisas são,
como
nós, contraditórios, complexos,ambíguos”(Lago,
2000102),a autora procura
um
termo que
dê conta desta complexidade, elegendo o conceitode sujeito e recusando
algumas
de suas versões filosóficas. ~“Em
alguns paradigmas, o sujeito se constrói ativamente,como
consciência desi,
um
sujeito de escolhas conscientes, de vontade (aqui ressaltado o processode conscientização
na
auto-construçãodo
sujeito). (...)Em
outros paradigmas,precisamos atentar
para
a
etimologiada
palavra sujeito a, sujeição,sujeitado. Aqui
também não
existe consenso, e temos diferentes versões de sujeito assujeitado~
à
história, aos discursos que constituem os contextosem
que se constitui
como
sujeito ”(idem:2-3).Para dar
contado
outro das pesquisas, a autorapropõe
aconcepção
desujeito sujeitadozda psicanálise, ,_
l
r, ›
é sujeito onde
nãosabe
de si, ,queemergee
.surpreendea
simesmo
no
enunciado de
seu
discurso. “ Constituído 'na/pela linguagem,como
sujeitoinconsciente\(Freua), sujeito
do
inconsciente (Lacan). Inconsciente que seestrutura
como
uma
linguagem,no
axiomarlacaniano. Sujeito que se estruturasob as mesmas' leis
que
comandam
as fãrmaçãesdo
inconsciente-
as leisda
linguagem (condensação e deslocamento, metáfora e metonímia). Este sujeito
é falado, é significado pelo» Outro, antesz
mesmo
de se constituircomo
sujeito.Sujeito dividido, desde Freud, sujeito daƒalta, sujeito dodesejo ”(idem:03).
' ff
Como
ressalta a autora, sujeitodo
enunciado, constituídona
cultura,histórico portanto, e
não descomprometido
dos valores éticos de sua sociedade.Sujeito
que
constrói,como
representação consciente de si, nas relações decontraste e identificação
com
os out`ros,..anoção de
identidade. Identidadedo
eu,. . A 3
que
se constroesempre
como
identidade de genero .Para esta pesquisa é
fimdamental
marcar
a importância destaconcepção
de sujeito - inconsciente,
que
conta de seus desejos, de suas expectativas, de suasrelações, suas identificações, suas faltas, suas escolhas, suas motivações,
sem
apressuposição
da dominância
deuma
vontade consciente.2.2
Algumas
discussõesde gênero
Os
estudos de gênerono campo
da
psicologia são recentes emarcados
pelo subjetivismo. Siqueira (1997) aponta estas preocupações, destacando
que
apsicologia
tem
resquícios deuma
ciência a-histórica, dicotomizando sujeito eobjeto
do
conhecimento,a
Psicologia oscilou historicamente entre tercomo
objeto padrões de açãouniversais ou as diferenças individuais.
Em
ambos
os casos, acaboupor
configurar
um
sujeito abstrato, compatívelcom a
idéia deum
serhomogêneo
”(Siqueira, 1997: .275).A
autora destacaque
é preciso:deslocar o eixo das análises
do
lugarda
mulhercomo
objeto dedominação masculina,
para a
questãoda
mulhercomo
sujeito de suaconstituição enquanto ser-no-mundo e dos múltiplos agenciamentos de
subjetivação que
produzem
diferentes subjetividades”(idem: .276).A
autora ressalta a importância debuscarmos
desenvolveruma
reflexão
interdisciplinar sobre as questões de gênero, dialogando
com
outras áreasdo
conhecimento
(Psicologia Social, Antropologia, Sociologia, História, CríticaLiterária, Ciências Políticas e Educação).
Uma
referência importante dos estudos de gênero anterior à utilizaçãodo
conceito, foi a pesquisa da norte-americana Margareth
Mead
(1988), realizadana
década
de 30,com
trêscomunidades
diferentesna
Nova
Guiné
- os Arapesh, osMondugumor
e osT
chambulli-
em
que
a autora destacaque há
um
“descolamento” entre sexo biológico,
temperamento
inato ecomportamento
social.
A
partir deste estudo, inaugura-seum
outro cenário, é introduzidoum
novo
conceito operacionalizávelnos
chamados
estudos femininos: o de papéissocialmente construído, desvinculado
da
biologia e, portanto, permiteque
o sexofeminino apresente atributos masculinos e vice-versa.
Os
estudos antropológicostêm
apontado a constante desvalorizaçãodo
pólo feminino nas
mais
variadas culturashumanas.
Neste aspecto,Rosaldo
(1979), apresenta discussões a respeito
da
carência de valor cultural atribuído àmulher, centralizando o
homem
como
focoda
valorização cultural.\
“A mulher
pode
ser importante, poderosa e influente,mas
pareceque
em
relação ao
homem
de sua idade e de seu status social,a
mulherem
todo olugar carece de poder reconhecido e valorizado culturalmente ”(Rosaldo,
1979;33)
Miriam
Grossi (1998), salienta que,“O
conceito de gênero chegou até nós através das pesquisadoras norte-americanas que passaram
a
usara
categoria 'gender 'para
falar das 'origensexclusivamente sociais das identidades subjetivas de
homens
emulheres”
(Grossi, 1998:.4).
A
referência básica é o estudo de Joan Scott (1990),que
conceituagênero,
como
sendo:)
uma
maneira de indicar 'construções sociais' -a
criação inteiramentesocial de idéias sobre os papéis adequados aos
homens
e às mulheres.É
uma
maneira de se referir às origens exclusivamente sociais das identidades subjetivas dos
homens
e das mulheres.O
gênero é, segundo esta definição,uma
categoria social sobreum
corpo sexuado ”(Scott, 1990:7).Esta autora apresenta a categoria gênero
como
útil para a análisehistórica, ressaltando que as relações estabelecidas entre os sexos, são
penneadas
pela questão de poder,
como
explicita sua concepção: ogênero
éum
elemento constitutivo de relações sociais
fundadas
sobre as diferençaspercebidas entre os sexos, e o
gênero
éum
primeiromodo
dedar
significado àsrelações de
poder”
(idem: 14).Segundo
Grossi eMiguel
(1995), os estudos sobre amulher no
Brasil,acompanharam
uma
“linha evolutiva”-
da
condição feminina às relações degênero, passando pelos papéis sexuais.
Os
estudosda
condição femininaocorreram nas décadas de 70/80 e
foram
fortemente influenciadas pelofeminismo.
O
conceito de gênero apareceu juntocom
as preocupaçõesem
relativizar a condição feminina.Mas,
mesmo
assim,segundo
as autoras,em
muitos trabalhos, o conceito de gênero continuou aparecendo
como
sinônimo depapel sexual, ao lado
da concepção da mulher
como
universal.O
desenvolvimento analítico
do
conceitonão
acompanhou
sua generalizaçãonos
estudos feministas.
As
autorasnão
negam
a contribuição demomentos
anteriorese categorias específicas
na
evolução dos estudos,mas
reforçam .a importância dese resgatar o aspecto relacional
do
conceito de gênero.2. 3
Abordando
homossexualidades
Michel
Foucault (1988),afirma
que
a discussão sobrehomossexualidade
aparece apenas
no
séculoXD(
na
psiquiatria,na
jurisprudência ena
própria literatura, de todauma
sériede discursos sobre as espécies e subespécies de homossexualidade, inversão,
pederastia e 'hermafroditismo psíquico '
permitiu, certamente,
um
avançobem
marcado
dos controles sociais nessa região de 'perversidade mas, também, possibilitou a constituição deum
discurso de 'reaçãoa
homossexualidadepôs-se
a
falar por si mesma,a
reivindicar sua legitimidade ou sua'naturalidade' e muitas vezes dentro
do
vocabulário e usando as categoriaspelas quais era desqualiƒicada
do
ponto de vista médico ”(Foucault, 1988: .96).A
homossexualidade pode
ser entendidacomo
um
tipo de manifestaçãoda
sexualidadehumana
onde
as pessoastêm
como
objeto de desejo erótico,UFSCÊ*
f
No
texto deFry
eMacRae
(1983), a questão abordada está centradanos
aspectos históricos, sociais e culturais
da
homossexualidade, e os autorespartem
de pressuposto
“...que
não há nenhuma
verdade absoluta sobre o que é homossexualidade e que as idéias e práticasa
ela associadas são produzidas historicamenteno
interior de sociedades concretas e que são intimamente relacionadas
com
otodo destas sociedades ”( Fry e
MacRae,
1983 : 10).Para Fry e
MacRae,
a
homossexualidade
éuma
infinita variação sobreum
mesmo
tema: o das relações sexuais e afetivas entre pessoasdo
mesmo
sexo ” (idem:07).Atualmente, multiplicaram-se os discursos sobre a
homossexualidade
eaté
na
mídia, todos falam de gays e lésbicas. Para Fry, écomum
confundir-se aexistência de
um
fenômeno
com
sua visibilidade, e, assim,segundo
ele,não
sepode
falarnum
aumento da
homossexualidade.O
que
acontece éque
no
presente, devido aos
movimentos
sociais, oshomossexuais
seescondem menos
ese
assumem
mais.Fry
(1982),em
pesquisa sobrehomossexualidade
masculinano
Brasil,fundamentando-se nos
estudos de LouisDomunt
(1985), desenvolve doismodelos
históricosque
caracterizam as relaçõeshomossexuais
no
Brasil,em
diferentes contextos a saber: o
modelo
hierárquico -fundado
no
desempenho
depapéis desiguais
no
relacionamento sexual e omodelo
igualitária -fundado
na
escolha de parceiros.
O
primeirodefine
relacionamentos assimétricos-
dedominação
-
e é vivenciado porhomens
e bichas, sendoque
nele sóum
dosparceiros, a bicha (aquele
que desempenha
o papel passivona
relação sexual) éconsiderado h'omossexual4.
Enquanto
osegundo
modelo
é vivenciado por4 Cardoso
(1994) realizou um estudo na comunidade pesqueira de Governador Celso Ramos-SC, onde discutiu, baseado em Fry, que
os critérios de diferenciação para a “homossexualidade”, segundo seus informantes, estavam relacionados à posição desempenhada
no ato sexual (“passivo” e “ativo”) e não no sexo do parceiro com quem se transava.
,z
'entendidos',
ambos
homossexuais, praticando relações de igualdade,sem
assimetria de papéis sexuais.
De
acordocom
o autor, o primeiro modelo, hierárquico, é encontradocom
maior
freqüência entrecamadas
populares,em
periferias urbanas eem
cidades menores.
O
segundo
modelo, importado dos EstadosUnidos
e Europa, évivenciado
mais
comumente
entre populações decamadas
médias, escolarizadas,nos
grandes centros urbanos.Assim,
segundo
Fry, o surgimento, a partir dadécada
de 60, de urnanova
identidade sexual (o entendido),
redefine
a homossexualidade. Nestenovo
sistema, o/a entendido/a se relaciona
com
o/a entendido/a.Deixa
de existir arelação assimétrica,
do
homem
com
a bicha.A
partir destemomento,
surgea
possibilidade e
a
aceitabilidade de relações sexuais - afetivas entre indivíduossemelhantes ” (Fry, l982:94).
Jurandir Freire Costa (1992),
propõe
a substituição dos tennoshomossexualismo
e homossexualidade, por homoerotismo.Com
esta substituiçãoo autor visa descolar o preconceito, tendo
em
vistaque
as primeirasdenominações,
que
têm
origem
no modelo
médico,tendem
a continuarrelacionando, para ele, a orientação
homossexual
à doença, anomalia, neurose,perversão, indecência, etc. Para o autor,
homoerotismo
refere-se,meramente
à
possibilidadeque
têm certos sujeitos de sentir diversos tipos de atração eróticaou de
se relacionarfisicamente de diversas maneirascom
outrosdo
mesmo
sexobiológico ”(Costa, l992:22).
Conforme tem
sido destacado por várias pesquisas emesmo
nasobservações
do
cotidiano,homoerotismo
é adenominação mais
utilizada peloshomossexuais que
se auto identificamcomo
'entendidos'.Sell (1987),
produz
uma
obraonde
trata das dores,da
solidão eda
permanente
necessidade de construção e reconstrução deuma
“identidadehomossexual”. Através
da
apresentação dedepoimentos
pessoais, a autora vaireconstituindo o “universo homossexual”,
na
Ilha de Santa Catarina.São
históriasde vida
que vão dando
um
panorama
decomo
se constituía a vida de algtmshomossexuais na
capital catarinense.A
autora observouque
a maioria viviano
ocultamento.'Trevisan (1997), desenvolve
uma
discussão acercado
movimento
homossexual
no
Brasil, que,segundo
ele, estánuma
encruzilhada, pois a tônicanão
tem
sidomais
a busca deuma
identidadehomossexual
originals,mas
deintegração social,
de
visibilidade.De
acordocom
ele,ou
abandonamos
definitivamentea
lutapor
uma
identidade original (comofim
dos movimentos reivindicatórios dedireitos) ou nos integramos enquantomarginais sociais, apresentando
um
ponto de vistada
margem
(quanto maisapocalípticos, mais integrados; quanto mais capacidade de diversificar o desejo, maior junção de cidadania) ”(Trevisan, l997:30).
Nesta
buscaampla
da diversidade, o autor conclui: preciso inventarnossa identidade todos os dias
para
que
elapossa
continuar perfeitamentepericlitante e
ambígua
”(idem).Com
relação àprodução
literária sobre ahomossexualidade
feminina,percebemos que
os estudos e as publicações ainda são escassas.No
fmalda
década de 80, alguns trabalhos
foram
publicadosno
Brasil e são referências paranovos
estudos.Um
deles foi o desenvolvido pelo antropólogo LuizMott
( 1987), eque
traça
um
panorama
do
lesbianismono
Brasil. Realizaum
percurso histórico5 O
autor está se referindo aqui, a grupos identitários em luta por reconhecimento e cidadania. Não está tratando de idmtidade de
abrangendo
trabalhos demédicos
e juristas. Circulatambém
pela literatura,música, cinema.
O
autornão
ofereceuma
alternativa conceitual para a análiseda
homossexualidade
feminina, pois suas pesquisasaprofundam
reflexões sobre ahomossexualidade
masculina.Mas
posiciona-se politica e ideologicamente sobreela, possibilitando o
rompimento da
visão médico/jurista e acreditandoque
homens
e mulheres, aoassumirem
publicamente sua homossexualidade,contribuirão para o
rompimento
dos preconceitos.Destaca
em
seu estudoque
a aparição históricado
lesbianismo,segundo
alguns autores, deu-se
no
século VI,na
ilhaGrega
de Lesbos, hojechamada
Mitilene,
onde
viveu a poetisa Safo, autora de livros depoemas
que
foram
queimados
em
Roma,
mas
dos quais restaram algims fragmentosque
nostrazem
discretamente os encantos
do
amor
entre mulheres. Safo fora considerada amaior
poetisa
da
antigüidade, e para o helenista inglês J. A.Symonds
omundo
não
sofreu
maior
perda
literáriado que
a
perda
dospoemas
de Safo.Perderam-se
osanéis,
ficaram
os dedos ea
sementedo homoerotismo
feminino estavalançada ”(apud Mott, p.2l).
A
respeitoda
consideração de Safocomo
homossexual, Lardinois (1995)chama
a atenção para o fato deque
precisamos ter cuidado, pois as informaçõessobre as inclinações sexuais
da
poetisa são escassas e até hoje os estudiososnão
chegaram
aum
consenso,podendo
apenas“... concluir que,
no
caso de Safo, estamos, no máximo, diante derelacionamentos breves entre
uma
mulher adulta euma
jovem
prestesa
secasar.
Chamar
de 'lésbicas' essas relações éum
anacronismo.É
impossívelavaliar se
a
palavra se aplicaà
própria Scƒo ouà
sua vida íntima.Na
verdade,essa é
uma
questãosem
sentido.Mesmo
se, pelos padrões modernos, Safodevesse ser considerada lésbica, sua experiência deve ter sido muito diferente,
vivendo, tal
como
viveu,em
uma
era diferentecom
diferentes noções e tipos deOutro trabalho produzido
na época
pela psicóloga Denise Portinari(1989) centra suas discussões nas questões
da
linguagem,do
sujeito edo
imaginário, e de
como
é construído o discursoda homossexualidade
feminina.A
autora ressalta que,
a
linguagem
éum
turbilhão e nos usamais do
que nósa
usamos.
Ela
nos carrega, molda, fixa, modifica, esmaga... ”(p.18).Define
linguagem como:
entendo
por
linguagemnão
sóa
língua,mas
o discurso;não
sóa
fala,mas
o texto,
a
imagem, o gesto e o som;não
sóa
palavra, o ritmo, o tom e o estilo;não
só o dito,mas
sobretudo 0não
dito, o repetido, o implícito e o indizível,que são as sombras maiores de todo dizer ”(Po1“tinari, 1989124).
Portinari faz
uma
reflexão
a partir dos discursosque
são produzidossobre o lesbianismo,
buscando
seguir o rastro dealgumas
falas, analisando destaforma
diversos contextos. _Posteriormente, a antropóloga Jacqueline
Muniz
(1992) apresentaaspectos
que
distinguem ahomossexualidade
feminina através deum
discursoconstruido e
que
privilegia oamor
romântico. Salienta que,o
amor
lésbico, aparecendocomo
um
sentimento que se coloca para alémda
plenitude, empresta ao homoerotismo femininouma
marca
distintiva, isto é,um
tipo de divisor de águas porque promete distinguí-lo no conjunto dasvivências erótico-afetivas ”(Muniz, 1992: 145).
Este destaque concedido ao
amor
apareceem
seu textocomo
uma
decorrência
da
associação cultural entremulher
e sentimento. Conclui a autoraque
freqüentemente são atribuídas ao gênero feminino característicascomo
Maria
Luiza Heilborn (1992),em
seu estudo faz referências tanto aPortinari, quanto a
Muniz,
destacando, a partirda compreensão
destas autoras,que
o discursodo
lesbianismocompõem-se
de enunciadoscomo:
ainvisibilidade, a intradutibilidade e a sensibilidade. Ressalta
que
ahomossexualidade
femininatem
princípios nas relações afetivo-sexuaisque
secontrapõem
à versão masculina,como
salienta:“De
um
ponto de vista contrastivo tal perƒil apresenta-se estruturalmente constante,mesmo
quando
os pares de mulheres são ordenados internamente pela distribuição dos papéis de gênero. Construindo-seum
tipo idealem
queos traços pertinentes são intencionalmente enƒatizados,
a
homossexualidadefeminina mostra-se congruente
com
o leque de propriedades simbólicasatribuídas ao gênero feminino:
menor
diferenciação,menor
marcação,centripetísmo. (Heilborn, 1992: 174-175).
Aquino
(1995),em
pesquisa realizadaem
Porto Alegre-RS6, cujoobjetivo central era verificar os processos de construção e
manutenção
deuma
identidade lésbica, observa
que
há
uma
multiplicidade de estilos de vida e deescolhas
do
lesbiarzismo,que
seexpressam
nas classificações, definições,nominações
e hierarquizaçõesda
própria condutahomossexual”
(Aquino, 1995z79).O
trabalhodo
autor,que
sefundamenta
em
Fry, contribui para adiscussão dos papéis de gênero atribuídos às mulheres lésbicas.
Segundo
ele,“Vemos
configurar-se, então, dois “tipos” de passivas/ativas: I)a
partir dospapéis de gênero (vida social) e 2)
a
partirdo
comportamento sexual (vidasexual). Muitas vezes, os dois “tipos” são decorrentes e outras
antagônicos ”(idem: 85).
Na
verdade, o autor quer destacar as assimetrias entre os relacionamentoslésbicos
que
seconfiguram no
dia-a-dia, a partir dos papéis atribuídos aoshomens
e mulheres.Ou
seja, muitas parceriashomossexuais
(masculinasou
femininas)
vivenciam
papéis assimétrieos, tanto nas tarefas cotidianas,como
no
relacionamento sexual, repetindo os
modelos
de relacionamentos heterossexuais.O
mestradoem
Psicologiada
UFSC
produziu dois estudos sobrehomossexualidade
em
Florianópolis. Dias (1998),fimdamentado no
rastreamentoda
questãoda
homossexualidade eda
feminilidadena
obra deFreud
(com
Lacan), analisa as representações expressas
nos
relatos de três jovens lésbicas decamadas
popularesda
capital, neles destacando questões de construção desubjetividades, identidade, identificações infantis, relacionamentos familiares,
COIII 88 paI`C€ÍIaS, CÍC. '
Córdova
(2000), realizaum
estudo etnográfico sobre as trajetóriaspessoais e a vida conjugal entre gays e lésbicas
no
interiorda
ilha. Destacaque
são sujeitos
com
arranjos conjugais norteados por valores tradicionais,enfatizando
o
amor
romântico, apoiadosem
padrões de fidelidade, honestidade elealdade.
Revela que
existemuito
preconceito e discriminação, eque
o “silêncio”e a “discrição” ainda
aparecem
como
normas
parauma
boa
convivência social.Apresenta o discurso
do dono
de urnavenda que
afirmanão
haverproblema
na
freqüência dos
homossexuais
no
seu estabelecimento comercialmas
solicitadeles
um
certo decoro,não
'paquerar' osdemais
freqüentadores-
heteros-por
exemplo
” (Córdova, 20002206).É
reveladordo maior
encobrirnento da homossexualidade feminina, 0próprio fato
do
livro de Fry eMaclšae que
tratada
homossexualidade masculina,ter sido publicado
em
1980
e o texto de TaniaNavarro-Swain
(2000) sobre olesbianismo, só ter sido publicado agora.
A
coleção Primeiros Passos trata deassuntos de interesse atual
que
sãoencomendados
a especialistas pela editoraBrasiliense, destinados à leitura de alunos de nível
médio
e de graduação.Apesar
deixa de ser significativo
que
o texto sobre lesbianismo só tenha sido publicadoem
2000.Navarro-Swain
(2000)em
seu texto procura daruma
visãopanorâmica
do
lesbianismo, desde a Grécia Antiga até os dias de hoje, ressaltando. aimportância
da
visibilidadedo
movimento
lesbiano,na
tentativada
desconstrução de preconceitos. Paola Patassinina
seção de “Leituras” da RevistaUm
Outro Olhar (2000), editadahá
14 anos pelomovimento
lésbico deSão
Paulo, salienta
que
a autora poderia ter esclarecidomelhor
a diferença entreidentidade sexual e orientação sexual, pois as pessoas
acabam
fazendo confusãopensando que
lésbicanão
é mulher.Outro
aspecto destacado por Paola é arespeito
da
definiçãodo que
é lesbianismo, poisNavarro-Swain
não chega
a urna~
conclusao,
“Ass1`m, o final
pode
serum
pouco
fiustrantepara
quem
procurauma
definição pronta e objetiva entre as subjetivídades contextualizadas pela
autora. Isso induz
a
pensar ea
refletir,a
partir das questões levantadasno
livro, o quanto
a
construção histórica e culturalda
palavra lésbica,em
uma
sociedade patriarcal, está contaminada pelo preconceito e
por
sua constanteredução
a
atos sexuais ”(Patassini, 2000: 12).Esta
produção
é significativa para o debate acercada homossexualidade
feminina, pois abre
caminhos
para o desenvolvimento de outros estudos e olharesa respeito
do
tema.São
os referenciaisque
serviram de base para as análises dosrelatos produzidos pelas mulheres,
bem
como
para a discussão desta dissertaçãocomo
um
todo.Em
artigoem
que
analisa a historicidadedo
conceito de gênero, GuaciraLouro
(1996) enfatiza a importância de váriosmovimentos
paraou
dentro dosmovimentos
feministas,no
sentidoda
desconstrução de concepçõesuriiversalizantes de
homem
e mulher,que
as estratégias políticas de busca de"... outros grupos, como,
por
exemplo, os de homossexuais masculinos efemininos, passaram
a
pôrem
questão as conceituações singulares,com
pretensões universais e até
mesmo
trans-históricas dehomem
emulher"(l996:07).
No
volume
de sua trilogiaem
que
tratado
poder das identidades,Manuel
Castells (1999) analisa o potencial revolucionário dos
movimentos
sociais(feministas e outros)
no
sentido de, aominarem
a constituição patriarcalda
família, contribuírem para
mudanças
estruturais das sociedades,promovendo
transformações sociais verdadeiramente abrangentes e significativas.
"... tendo
como
pano
de fundoa
transformação econômica e tecnológica, opatriarcalismo foi atingido pelo desenvolvimento
do
movimento feminista,conseqüência dos movimentos sociais
da
década de 60 (..).O
impacto dosmovimentos sociais, e do feminismo
em
particular, nas relações entre os sexosdeu impulso
a
uma
poderosaonda
de choque: o questionamentoda
heterossexualidade
como norma
(...).O
impacto dos movimentos de lésbicas egays sobre 0 patriarcalismo é, obviamente , devastador (...) 0 patriarcalismo (...) ficou definitivamente combalido
em
conseqüência do enfraquecimentoda
norma
heterossexual "(idem: 17 1-172).Na
continuidade de seu texto, o autor ainda reforça“os movimentos lesbiano e gay
não
são simples movimentosem
defesado
direito
humano
básico de escolhera
quem
ecomo
amar. Sãotambém
expressões poderosas de identidade sexual e, portanto, de liberação sexual.
Esses movimentos desafiam algumas das estruturas milenares sobre as quais
as sociedades
foram
historicamente construídas: repressão sexual eheterossexualidade compulsória ”(idem: .256). V
As
contribuiçõesmais
importantes e atuais aos estudos de gênero,têm
sido dadas por teóricas/os dos
movimentos
lésbicos e gays,nos
chamados
estudos "queer"7.
7 "O termo 'queer' tem sido usado, na litaatura anglo-saxõnica, para englobar os termos 'gay' e 'lésbica'. Historicamente, 'queer' tem
sido empregado para se referir, de forma depreciativa, às pessoas homossexuais. Sua utilização pelos ativistas dos movimentos
homossexuais constitui uma tentativa de recuperação da palavra, revertendo sua conotação negaLiva original. Essa uLilização
renovada da palavra 'qucer' joga também com um de seus outros significados, o de 'cstranho'. Os movimentos homossexuais falam, assim de uma politica queer ou de uma teoria queer". (Nota do Tradutor Tomaz Tadeu da Silva in: Louro, 20002171-172).
Judith Butler,
uma
das autoras importantes para esta área de estudos,questiona as
concepções
de sexocomo
natureza e gênerocomo
construçãocultural
fimdada
na
diferença sexual, queopõem
sexo - gênero,numa
reediçãoda
clássica oposição binária natureza - cultura. Ela se coloca
no meio
da
discussãoessencialismo
X
constiucionismo,afinnando
que
o construcionismo se arrisca acair
novamente
em
explicações essencialistas: se tudo é construido (pelodiscurso),
quem
constroe (o discurso)?Partindo
da
noção, inspiradaem
Foucault, deque
toda força regulatóriase manifesta
como
uma
espécie de poder produtivo, o poder de produzir oque
elacontrola, a autora
propõe
a desconstrução desta oposição idealismoX
materialismo, pelo uso
da concepção
de performatividade, entendendo"... performatividade
como
aquele poder reiterativodo
discursopara
produziros
fenômenos
que ele regula e constrange" (155) "...a
perƒormatividade deveser compreendida não
como
um
'ato' singular ou deliberado, mas,ao
invésdisso,
como
a
prática reiterativa e citacional pela qual o discurso produz osefeitos que ele nomeia " (Butler, 2000: 154). Neste artigo a autora procura demonstrar
que
" as
normas
regulatórias do 'sexo' trabalham deuma
forma
performativapara
constituira
materialidade dos corpos e, mais especificamente,para
materializar o sexo
do
corpo,para
materializara
diferença sexuala
serviçoda
consolidação do imperativo heterossexual "(idem: 154).
Perguntando-se pelas condições de
emergência
e operaçãodo
sujeitoem
uma
matriz generificada de relações, Butler ressaltaque
estaprodução
de sujeitosé excludente, produzindo
também
osque
ficam
àmargem
_/
"... pois
a
construção dohumano
e'uma
operação diferencial que produz o mais emenos
'humano', o inumano, ohumanamente
impensável. Esses locaisexcluídos
vêm a
limitar o 'humano'com
seu exterior constitutivo, ea
assombrar aquelas fronteiras
com a
persistente possibilidade de suaEscritos
como
o de Butlercomplexificam
as própriasconcepções
Esta pesquisa realizou
uma
análise qualitativa, baseadanos
pressupostosdo
método
etnográfico. Atravésda
gravação de entrevistas abertas, procurei obterdepoimentos
e histórias de vida dealgumas mulheres
lésbicas residentesem
Florianópolis.
Confonne
CláudiaFonseca
(1998), a etrrografia é quaseum
protótipodo
método
qualitativo, pois está calcadanuma
ciência,por
excelência,do
concreto.
O
ponto
de partida destemétodo
éa
interação entre pesquisador eseus objetos, 'nativos
em
carne e osso'” (Fonseca, l998:2).A
autora,fundamentada
em
Clifford Geertz, salientaque “na
pesquisa decampo,
queremos
antes de tudo entender 0que
'estásendo
dito'por
nossosinterlocutores ”(idem).
Segundo
ela,um
destaque importantedo
método
etnográfico é que, apartir
da
observação participante (do particular ao geral) sebusca
a interpretaçãocom
um
olhar comparativo, alimentado pela leitura de outras pesquisas.Queiroz (1988), aborda a discussão de relatos orais, diferenciando as
histórias de vida, dos depoimentos. Define história de vida
“...como o relato de
um
narrador sobre sua existência através do tempo,tentando reconstruir
a
experiência que adquiriu. Narrativa linear e individualdos acontecimentos que nele considera significativos, através dela se
delineiam as relações
com
osmembros
de seu grupo, de sua profissão, de suacamada
social, de sua sociedade global, que cabeao
pesquisadordesvendar ”(Queiroz, 1988120).