• Nenhum resultado encontrado

Mulher, Carnaval e etnia negra em Pelotas : muito além do samba.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Mulher, Carnaval e etnia negra em Pelotas : muito além do samba."

Copied!
7
0
0

Texto

(1)

A questão racial no Brasil e as relações de gênero. ST 18 Beatriz Ana Loner

Lorena Almeida Gill UFPel. ∗

Palavras-chave: mulher negra; clubes carnavalescos, etnia negra.

Mulher, Carnaval e etnia negra em Pelotas : muito além do samba

Esta comunicação faz parte de uma pesquisa sobre os clubes carnavalescos negros da cidade de Pelotas, em que se trabalhou com documentos escritos – atas e jornais da cidade, no século XX. Pretendemos examinar brevemente o processo de organização étnica negra na região e avaliar o complexo processo de integração seguido pelos clubes recreativos negros na sociedade branca, com ênfase sobre suas exigências e restrições com respeito à participação feminina.

A participação negra na configuração do território do Rio Grande do Sul, Brasil, foi muito expressiva devido à indústria saladeril, especialmente na região meridional do Estado. A sociedade brasileira pós-abolição reservou pouco espaço para esta etnia, que sofreu com a discriminação e o preconceito praticamente em todo o país. Contudo, sua inserção produtiva e social apresentou diferenciações regionais, influenciada, entre outros fatores, pela situação do mercado de trabalho em cada estado. Assim, na região de Pelotas, que teve seu desenvolvimento baseado na exploração do braço escravo nas charqueadas, a etnia negra correspondia a 30,7% da população urbana em 1891, decrescendo a apenas 14,9% dos moradores do município em 19401. Ao longo do período republicano, o grupo negro de Pelotas, esteve presente em quase todas as atividades, especialmente aquelas fabris, de construção civil ou portuária, além dos serviços domésticos. O grupo negro terminou se consolidando como operários, buscando sua inserção social através da melhoria das condições de vida da classe operária e participando ativamente de seu movimento, criando associações e formando lideranças classistas.

Contudo, além da organização de classe, o grupo negro também necessitava de uma forte organização étnica, devido à intensa discriminação racial, sofrida pelos afro-descendentes na cidade. Dessa forma, os negros pelotenses terminaram desenvolvendo uma rede associativa completa,cobrindo praticamente todas as necessidades da vida de seus membros. Desde o tempo do Império, eles se organizaram em associações mutualistas, profissionais ou étnicas, que avançaram pelas primeiras décadas da República, constituindo uma fonte de amparo para as associações posteriores. Já no período republicano, desenvolveram clubes recreativos, teatrais, carnavalescos, futebolísticos (chegaram a formar uma federação de futebol) entidades mutualistas, de assistência às crianças e de representação étnica2. Entretanto, por volta de 1910, evoluindo mais rapidamente nas duas décadas seguintes, houve uma reorientação das entidades, que abandonaram seu caráter de representação, o mutualismo e objetivos educacionais, para dedicarem-se principalmente as

(2)

questões de sociabilidade e recreação. A partir de então, a maior parte das associações criadas dedicou-se ao futebol ou ao carnaval, com o que terminou-se reforçando o estereótipo sobre o grupo.

Na década de 1930, ainda houve uma forte participação política, especialmente daqueles vinculados ao jornal da etnia, A Alvorada, que, fundado em 1907, durou mais de 50 anos e tinha, em sua composição, várias lideranças negras e operárias3, que atuavam como um fator de conscientização, lutando pela “elevação” do negro e sua integração dentro da classe operária. Em 1933, formou-se a Frente Negra Pelotense que se correspondia com a Frente Negra Brasileira em São Paulo e participou do 1º Congresso Afro-Brasileiro do Recife, com um representante próprio. Ela se propunha a lutar pela educação do negro na sociedade, tendo sido um dos primeiros momentos em que críticas explícitas a discriminação racial e ao status secundário do grupo foram feitas de forma pública, na cidade4. No ano de 1934, suas lideranças participaram de partidos políticos de cunho socialista candidatando-se a deputação, sem sucesso.

Após este período, a proposta de uma maior conscientização étnica perde espaço, havendo uma espécie de involução associativa, com as entidades mutualistas já completamente eliminadas, aquelas de representação abandonadas e os times de futebol negros passando a incorporar-se entre os demais, com o relativo arrefecimento da discriminação racial no esporte. Ocorre ainda um desaparecimento das entidades com finalidades teatrais, devido ao desenvolvimento do cinema e a difusão do rádio, e as associações recreativas transmutam-se em carnavalescas, das quais se tem um extenso rol, sendo significativos os clubes: Depois da Chuva, Fica Aí pra ir dizendo, Chove Não

Molha, Está tudo Certo e Quem ri de nós tem paixão. No período que vai dos anos 20 até o fim dos

anos 50, quando começam a se desenvolver as escolas de samba, essas associações reinam soberanas e disputam a preferência dos elementos do grupo. Embora mais especializadas estas entidades carnavalescas continuaram a cumprir o papel fundamental de integração e representação da etnia negra na cidade, diferenciando-se devido ao poder aquisitivo de seus membros (que, embora no geral fosse baixo, comportava pequenas variações familiares) e nos seus objetivos para a etnia. Entre suas direções, encontramos muitas lideranças sindicais e há, por parte de alguns clubes, muito apoio às atividades da Frente Negra pelotense, com a qual também compartem diretores.

Porém, ao longo dos anos, se percebe um afrouxamento dos laços étnicos, visível no comportamento de alguns destes clubes entre si, que evoluem de uma posição mais fraterna e solidária, para atitudes de distanciamento e recriminações mútuas. Muitas destas questões são provocadas pelas atitudes de um dos clubes, o Clube Fica Ai para Ir Dizendo, considerado como da elite negra na cidade, o qual, especialmente nas décadas de 1940 a 1970, perseguia objetivos de integração passiva na sociedade branca e buscava imprimir um rigoroso código de conduta a seus sócios, muito influenciado pela religião católica e pelos padrões morais de seu tempo5. Neste

(3)

sentido, sua influência ia muito além do estreito espaço de sua sede, imiscuindo-se na vida privada dos associados, ditando regras e comportamentos a serem seguidos em todas as circunstâncias, inclusive em termos de amizades e companhias a serem evitadas.

Procedendo desse modo e mantendo uma severa vigilância, especialmente sobre as mulheres do grupo, o clube procurava disciplinar suas mentes e seus corpos, influenciando diretamente em seu comportamento e, obviamente, padronizando também a formação das famílias negras e sua adequação às regras e normas vigentes na sociedade. Sua matriz de comportamento e inspiração era aquela vigente na sociedade branca, de cunho burguês, que privilegiava diferentes padrões de moralidade conforme o gênero, a mesma seguida pelos clubes de classe média e alta da cidade, havendo ainda uma forte influência da moral católica, religião que predominava entre seus sócios. Essas atitudes despertavam muito ressentimento e mágoa entre aqueles que não conseguiam cumprir comsuas exigências associativas, o que fica evidente em vários dos depoimentos de sócios dos outros clubes.

As demais associações eram mais flexíveis, com relação aos códigos de comportamento e também quanto a padronização de vestimentas, ou até sobre a situação das mulheres em seu meio. Entretanto, encontrou-se pouco material (atas, documentos) para avaliar as posições desses outros clubes em relação à situação do negro ou a influência da “ideologia do branqueamento” que se difundia pela sociedade brasileira da época e que praticamente implicava na eliminação do grupo negro como etnia, pela sua absorção cultural e física6.

Contudo, do clube Fica Ai tem-se o suficiente para saber que, voltado para o estabelecimento de uma política de padronização dos comportamentos admitidos pelos sócios, o clube esperava ser a única associação a ser freqüentada pelas famílias filiadas, mesmo mantendo relações cordiais com as outras associações negras. A fidelidade esperada dizia respeito não só a evitar a concorrência associativa com as demais, mas incidia numa visão de que eles seriam a única associação a seguir um comportamento adequado e, portanto, os sócios que freqüentassem outros clubes estariam correndo riscos e maculando seu bom nome. Assim, a exigência da exclusividade funcionaria como uma espécie de sacrifício a confirmar as boas intenções em manter um padrão superior aos demais, pelas famílias associadas.

Na consulta as atas, sucedem-se exemplos de exigências mais rigorosas às moças, que poderiam ser punidas por freqüentar outras associações, mesmo que fosse o clube irmão, Chove não

molha. Também se tenta regular sua participação em festivais ou outras atividades, como corais,

sempre no sentido de que as mulheres restrinjam sua participação apenas a festas e comemorações do Fica Ai Isso não se aplicava a todos os sócios, havendo uma nítida diferença na forma de tratamento reservada as “senhorinhas”, ou seja, as moças em idade núbil e aos homens, configurando a prática de uma “dupla moralidade”, comum a amplos setores da sociedade, com

(4)

respeito à participação de mulheres. Isso fica evidente em todos os momentos, especialmente no fato de que apenas famílias e moças eram submetidas a investigação de sua vida pregressa, antes de serem aceitas como sócias, enquanto os homens solteiros estavam isentos disso.

O moralismo em relação ao comportamento feminino continuava na vigilância sobre seu comportamento dentro do clube, suas companhias e seus namorados. Embora não de forma explícita, isso fazia parte de uma política de formação para as moças, a serem disciplinadas dentro dos “padrões adequados” que o clube queria impor, as quais, depois, teriam papel fundamental na inculcação desses valores a seus filhos. Nada novo, se lembrarmos que é o mesmo papel a elas era reservado pela Igreja Católica, outra fonte inspiradora desse grupo, eminentemente católico romano, embora alguns também se aproximassem do espiritismo.

Quanto aos demais clubes, se sabe que tinham posições diferentes, alguns permitindo a entrada de não-sócios por convites, sendo também mais flexíveis em relação ao comportamento exigido de suas sócias, embora também haja situações em que moças foram expulsas ou impedidas de participar de festas, devido à “questões de honra” ou comportamento inadequado. Mesmo assim, os clubes tiveram que adotar, em conjunto, posições a respeito de comportamentos abusivos em seus bailes, seja de sócios ou de convidados, ainda em 1932, para resguardar-se de brigas e conflitos freqüentes em suas festas. Outro ponto comum à maioria dessas entidades, era a restrição da participação do homem branco, o que se justifica por duas questões básicas e correlatas para a comunidade negra: a reserva de mercado para os homens em idade de casamento e o medo do desfrute de moças negras pelos homens brancos.

Na consulta aos jornais, percebe-se que as associações negras tinham que lutar com um problema crônico naquela sociedade: a falta de respeito de alguns setores em relação a elas. Assim, é comum, especialmente no final da década de 1920 e no início dos anos 30, o aparecimento de notícias sobre tumultos provocados por brancos, membros da Brigada ou não sócios, em bailes negros, o que sempre levava a brigas e pancadaria. Em 1939, há um episódio em que um desfile de carnaval do Chove não Molha na principal rua da cidade, foi dissolvido por soldados, a golpes de sabre. Isso porque, pouco antes, um grupo de civis tentou penetrar no desfile e molestar as jovens sócias que participavam do cordão, sendo rechaçados7. E então se vingaram, chamando “as forças da ordem”, que vieram pressurosos. O fato é noticiado pelo principal jornal da cidade, que se mostra indignado com a covardia, mas ao mesmo tempo insinua não ter idéia de quem teria partido a ordem, ou seja: a lição foi dada e o anonimato protegeráos autores, tanto da bolinação, quanto do espancamento. Quanto aos negros, foram, mais uma vez, colocados “em seu devido lugar”.

Assim, o enrijecimento de códigos de conduta, a proibição da entrada de não sócios, e a vigilância sobre as mulheres do grupo, para evitar seu “desfrute” por outros grupos, também deve ser entendida como uma forma de defesa de um grupo ameaçado por práticas abusivas de outras

(5)

classes e setores. Historicamente, tanto no Rio Grande do Sul como em outros estados, os negros continuavam a fornecer a massa básica para capangas, soldados de facções em luta, ou para serviços menos valorizados e as mulheres negras foram vistas, mesmo muito depois da abolição da escravatura, como objeto sexual, que serviam ao homem branco desde sua adolescência até a velhice. Dessa forma, não é de estranhar que as lideranças negras, de todos os matizes, pusessem forte acento sobre este ponto. Veja-se que, embora com uma proposta de afirmação das raízes negras, também o grupo ligado ao Jornal A Alvorada, terminava se posicionando a favor de um modelo de comportamento feminino muito rígido, como pode ser observado na coluna do “Dr. Pescadinha”, que vigiava e denunciava as jovens envolvidas em situações perigosas, como amizades com homens brancos, ida a sociedades ou bailes de má fama, etc.

A discussão das diferenças comportamentais e de exigências sociais baseadas na questão de gênero entre esses grupos negros deve ser entendida em todas as suas nuances. Em todas as sociedades constituídas, sempre houve diferenciação entre o comportamento esperado do homem e da mulher, portanto, seria absurdo imaginar que neste grupo, localizado numa cidade interiorana e tradicional de um estado conservador de um país latino-americano muito marcado pelo catolicismo, isso não fosse ocorrer. Afinal, entre a classe operária ou mesmo entre alguns setores de classe média, também se notava a vigilância explícita sobre o comportamento das mulheres de cada grupo e o mesmo fenômeno da dupla moralidade, ou seja, a existência de padrões de comportamento conforme o gênero. Por outro lado, o estudo das questões de gênero, se pode nos auxiliar a compreender a profundidade das relações de poder que se estabelecem entre os sexos8

, não abrange o conjunto das relações envolvidas nessa análise em particular em que se misturam gênero, raça e classes sociais9, de forma inextricável.

No caso em questão, se observa variações distintas entre os próprios clubes, todos situados entre a etnia negra e com pequenas variações reais em termos de classe social, mas com uma variação comportamental bem mais acentuada em relação à posição da mulher em seu meio. Dos dois clubes que temos maiores dados, viu-se que a posição do Fica Ai praticamente definia-se por uma política associativa própria de clubes da elite, ou seja, de grupos de classe média, dos quais, pela sua composição social, (funcionários públicos de baixa extração, operários especializados) ele não fazia parte. Já o Chove não Molha, cuja extração social era praticamente a mesma, tinha uma política bem mais aberta em relação à participação feminina, pois nele as mulheres conquistaram o direito a votar e ser votadas já em 1938 e, através das atas, se vê que não se consolida uma política tão rigidamente moralista quanto no anterior, aproximando-se mais do modelo de clubes operários.

Aparentemente , o Chove Não Molha teria relações mais próximas com os grupos vinculados a Frente Negra Pelotense e aos elementos socialistas, pela observação de algumas de suas lideranças, enquanto os Ficaianos mostravam-se mais influenciados por uma estratégia de inserção social

(6)

individualizada que não passava pela afirmação étnica. Essa poderia ser uma das causas da diferença, embora ainda não consideremos finalizada a análise.

E qual era a percepção das próprias mulheres envolvidas nestes dois clubes? Através das entrevistas, pode-se observar que aquelas senhoras que participaram do Chove Não Molha, mesmo que em épocas posteriores, trazem relatos de uma maior participação, mesmo que havendo diretorias ainda eminentemente masculinas. Já no Fica Ai, os relatos demonstram um certo abrandamento dos códigos de comportamento internos para as últimas décadas, com maior participação feminina ativa nas diretorias. Entretanto, a maioria das entrevistadas desse último clube, não parece terem questionado a posição subalterna das mulheres anteriormente, limitando-se a reafirmar seus estritos códigos de conduta.

Obviamente, não é possível apreender a percepção feminina através das atas, apenas em alguns raros casos de cartas ou pedidos de demissão, provocadas por punições, ou ainda, em alguns momentos em que a insatisfação de sócios e sócias tomava o vulto de rumores, atingindo a própria diretoria devido aos encaminhamentos tomados. Nas atas do Fica Ai, referentes aos anos de 1938-1942 e 1946-1956, as mulheres aparecem apenas na posição subalterna de “membro da comissão de festas” ou das “comissões de senhorinhas”. Ainda encontrou-se referência a “diretoria de senhoras”, expediente que vem desde o final do século XIX e que caracterizava um grupo de mulheres, normalmente das famílias dos diretores, que se preocupava com o cuidado interno do clube, a organização de quermesses, de festas infantis e de outras atividades festivas.

As relações geradas a partir dos gêneros vinculam-se mais fortemente às construções culturais, tendo por isso uma permanência maior. Bourdieu trabalha com o conceito de violência simbólica, entendida como as formas e meios pelas quais as relações de dominação se inscrevem no

habitus e nos corpos dos dominados, de tal modo que este incorpora os conceitos mentais, as

categorias construídas do ponto de vista dos dominantes e até os próprios valores destes, naturalizando assim esta situação. “A força simbólica é uma forma de poder que se exerce sobre os corpos, diretamente e como que por magia, sem qualquer coação física; mas essa magia só atua com o apoio de predisposições colocadas, como molas propulsoras, na zona mais profunda dos corpos”.Assim, ela é resultado de um longo trabalho prévio:

necessário para operar uma transformação duradoura dos corpos e produzir as disposições permanentes que ela desencadeia e desperta; ação transformadora ainda mais poderosa, por se exercer, nos aspectos mais essenciais, de maneira invisível e insidiosa, através da insensível familiarização com um mundo físico simbolicamente estruturado e da experiência precoce e prolongada de interações permeadas pelas estruturas de dominação.10

Neste quadro, as mulheres não conseguem desenvolver uma capacidade de resistência a estes mecanismos, que lhes aparecem como dados, eternos e, mesmo que tomem consciência deles, dificilmente conseguiriam rejeitá-los, já que estão inscritos, tanto em seus corpos, quanto em suas formas de agir, pensar e sentir. No caso em questão, o espaço que elas poderiam ocupar, o espaço

(7)

permitido dentro do clube era compatível com a função delas dentro do lar, devendo atuar como auxiliares da diretoria masculina na organização dos eventos, no atendimento aos sócios e também na fiscalização do comportamento dos jovens nos bailes, de que as atas nos dão abundantes exemplos. Além disso, pelo mecanismo da tutela, responsabilizavam-se pelo comportamento de sócias solteiras cujas famílias não moravam na cidade. Mesmo o fato de que, em alguns momentos, poderiam acompanhar as reuniões do Conselho Diretivo da sociedade, se e quando estas fossem abertas a todos os sócios, não invalida o exposto acima, pois sua atuação sempre foi pautada pelo estrito obedecimento às normas, sendo punida severamente toda conduta rebelde. O espaço feminino seria o espaço interno, do cotidiano, do gerenciamento e cuidado com os sócios e da própria entidade, restrito aos limites internos do próprio clube. Se o poder masculino se expressa no público, muitas vezes relacionando-se com a própria figura do Estado, o poder feminino costuma encontrar espaço no privado, de forma difusa e periférica11 .

Portanto, e concluindo muito rapidamente, se pode dizer que o modelo comportamental que o Fica Ai tentava incutir representava, por um lado, a exacerbação de um comportamento de vigilância em relação a seus membros, compatível com uma posição de etnia dominada na sociedade; por outro, uma tentativa de educar seus sócios com relação a valores situados acima de sua classe na escala social, mas que se pretendia fossem os daquela comunidade e, por último, uma reafirmação dos padrões de dominação masculina aceitos naquela sociedade.

Participaram também da equipe Débora Clasen de Paula, Marcele Vitória dos Santos, Viviane Tavares, Fernanda

Oliveira da Silva, Juliana Marcello e Caroline Megiatto. A pesquisa sobre os clubes carnavalescos foi financiada pelo CNPq.

1

LONER, Beatriz. Negros: organização e luta em Pelotas. História em Revista, v.5, dezembro 1999, p.7-27.

2

Idem. Ver também LONER, Beatriz. Construção de classe: operários de Pelotas e Rio Grande. Pelotas: EDUFPel, 2001.

3

Seriam “intelectuais orgânicos” do grupo negro, segundo SANTOS, José Antonio. Raiou a Alvorada: intelectuais negros e imprensa. Pelotas (1907-1957). Pelotas: EDUFPel, 2003.

4

Nessa década aparecem artigos, denunciando a discriminação racial, fato praticamente novo na cidade, pois apenas em 1927, havia sido feita uma denúncia pelas principais associações negras pelotenses, reafirmando a existência do preconceito racial na cidade. LONER, Beatriz . Construção de classe, op. cit, p. 264.

5

LONER, Beatriz Classe, etnia e moralidade: estudo de clubes negros. Comunicação apresentada no XXIII Simpósio

Nacional de História – ANPUH, julho 2005, Londrina.

6

DOMINGUES, Petrônio, Uma história não contada. Negro, racismo e branqueamento em São Paulo no pós-abolição. São Paulo: Senac editora, 2004.

7

Jornal Diário Popular, Pelotas, 22/02/1939. Biblioteca Pública Pelotense.

8 “Para buscar o significado, precisamos lidar com o sujeito individual, bem como com a organização social e articular a natureza de suas inter-relações, pois ambos são cruciais para compreender como funciona o gênero, como ocorre a mudança. Finalmente é preciso substituir a noção de que o poder social é unificado, coerente e centralizado, por algo como o conceito de poder de Michel Foucault, entendido como constelações dispersas de relações desiguais, discursivamente constituídas em ‘campos de força’ sociais”. SCOTT, J. Gênero: uma categoria de análise histórica.

Educação e realidade, 16(2), 1990, p 5-22.

9

Para compreender as críticas sobre os limites da noção de gênero em relação a classes e raças, veja-se o dossiê “marxismo e feminismo” da Revista Crítica Marxista, n. 11, 2000, especialmente os artigos de Clara Araújo e Mary G. Castro.

10

BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil, 1998, p. 50.

11

Referências

Documentos relacionados

Nessa situação temos claramente a relação de tecnovívio apresentado por Dubatti (2012) operando, visto que nessa experiência ambos os atores tra- çam um diálogo que não se dá

Nesse sentido, a última parte deste trabalho objetiva estudar o efeito da adição de partículas cristalinas (quartzo, alumina e zirconita) sobre

Black circles represent true AP signal, dark gray dotted lines are ROI mean over time, gray continuous lines are BkS, light gray dashed lines are BkSD, pink dot-dashed lines are

O conteúdo dos discursos envolve os embates entre os grupos políticos. Como chefe do gabinete de ministros, Zacarias utilizou o senado para defender seu governo dos ataques

No entanto, para aperfeiçoar uma equipe de trabalho comprometida com a qualidade e produtividade é necessário motivação, e, satisfação, através de incentivos e política de

Antigamente, as firmas possuíam um número pequeno de instrumentos para influenciar as vendas. Os produtos eram vendidos sem marca, propaganda, crédito e descontos, promoção de

Taking into account the theoretical framework we have presented as relevant for understanding the organization, expression and social impact of these civic movements, grounded on

Realizar a manipulação, o armazenamento e o processamento dessa massa enorme de dados utilizando os bancos de dados relacionais se mostrou ineficiente, pois o