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Design e música independente: apontamentos sobre a presença do design gráfico na produção musical curitibana

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Academic year: 2021

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(1)

UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ CÂMPUS CURITIBA - SEDE CENTRAL

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE DESENHO INDUSTRIAL CURSO DE TECNOLOGIA EM DESIGN EM GRÁFICO

NATÁLIA BORGES CORREIA LIMA

DESIGN E MÚSICA INDEPENDENTE:

APONTAMENTOS SOBRE A PRESENÇA DO DESIGN GRÁFICO NA

PRODUÇÃO MUSICAL CURITIBANA

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

CURITIBA 2019

(2)

NATÁLIA BORGES CORREIA LIMA

DESIGN E MÚSICA INDEPENDENTE:

APONTAMENTOS SOBRE A PRESENÇA DO DESIGN GRÁFICO NA

PRODUÇÃO MUSICAL CURITIBANA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à disciplina de Trabalho de Conclusão de curso, do Curso Superior de Tecnologia em Design

Gráfico do Departamento de Desenho

Industrial – DADIN – da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR, como requisito parcial para obtenção do título de Tecnóloga.

Orientadora: Cláudia Bordin

CURITIBA

(3)

TERMO DE APROVAÇÃO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO 103

DESIGN E MÚSICA INDEPENDENTE: APONTAMENTOS SOBRE A PRESENÇA DO DESIGN GRÁFICO NA PRODUÇÃO MUSICAL CURITIBANA

por

Natalia Borges Correia Lima – 1300822

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no dia 02 de julho de 2019 como requisito parcial para a obtenção do título de TECNÓLOGO EM DESIGN GRÁFICO, do Curso Superior de Tecnologia em Design Gráfico, do Departamento Acadêmico de Desenho Industrial, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. A aluna foi arguida pela Banca Examinadora composta pelos professores abaixo, que após deliberação, consideraram o trabalho aprovado.

Banca Examinadora: Prof. Marco André Mazzarotto Filho (Dr.)

Avaliador Indicado DADIN – UTFPR

Prof. Alan Ricardo Witikoski (Dr.) Avaliador Convidado

DADIN – UTFPR

Profa. Claudia Bordin Rodrigues da Silva (MSc.)

Orientadora

DADIN – UTFPR

“A Folha de Aprovação assinada encontra-se na Coordenação do Curso”.

UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

PR

Diretoria de Graduação e Educação Profissional Departamento Acadêmico de Desenho Industrial

(4)

RESUMO

LIMA, Natália B. C. Design e música independente: Apontamentos sobre a presença do design gráfico na produção musical curitibana. 2019. 94 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Tecnologia em Design Gráfico) Departamento Acadêmico, Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba, 2019.

O presente projeto de pesquisa tem o objetivo de mapear, analisar e documentar material gráfico associado à produção de músicos independentes e de eventos musicais que ocorrem na cidade de Curitiba, compreendendo o período de 2010 até o presente. Propõe-se, desta forma, analisar a relação entre design gráfico e cenário musical independente, a partir das expressões visuais de cinco bandas independentes: ruído/mm; Through Waves; Trombone de Frutas, Mulamba e Tuyo. O estudo avalia, também, a relação dos designers gráficos com o que diz respeito à música, cultura, produção, indústria fonográfica, internet, selos independentes, trabalhos paralelos e gravadoras, visando trazer uma nova perspectiva sobre a cena independente e o mercado cultural da música na cidade. No primeiro capítulo é abordado o histórico do estudo da música popular e apresentam-se os objetivos gerais e específicos da pesquisa. No segundo, para fundamentar teoricamente este trabalho, aborda-se a temática do cenário musical independente e descreve-se o percurso metodológico e, por fim, no terceiro, apresentam-se as bandas analisadas. Percebe-se, assim, pelo decorrer do trabalho, que o cenário independente se configura como contra-hegemônico, interdependente e, cooperativo, apontando para a formação de uma identidade comum de artistas que colaboram entre si.

Palavras-chave: Música independente; indústria cultural; mídias digitais; novas mídias; cenário musical; indústria fonográfica.

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ABSTRACT

LIMA, Natália B. C. Design and independent music: Considerations about the presence of graphic design on Curitiba’s music production. 2019. 94 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Tecnologia em Design Gráfico) Departamento Acadêmico, Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba, 2019.

The research project aims to map, analyze and document graphic material associated with the production of independent musicians and musical events taking place in the city of Curitiba from 2010 to the present date. By doing so, it scrutinizes the relationship between graphic design and the independent musical scenario based on the visual expressions of five independent bands: ruído/mm, Through Waves, Trombone de Frutas, Mulamba e Tuyo. The study also gazes upon the relation between graphic designers and music, culture, production, phonographic industry, internet, independent stamps, side works and recorders, in order to bring a new perspective on the independent scene and cultural market of Curitiba. The first chapter covers the historical study of popular music and presents general and specific research goals. The second one addresses the thematic of the independent musical scenario and the methodological research path. Finally, the third present each analyzed band. Therefore, through the course of the work, the independent scenario is seen to be counter-hegemonic, interdependent, cooperative, indicating the formation of a common identity of collaborating artists.

Keywords: Independent music; cultural industry; digital media; new medias; musical scenario; phonographic industry.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Campanha visual: Introdução à cortina do Sótão, ruído/mm, 2011. ... 43

Quadro 2 – Campanha visual Rasura, ruído/mm, 2014. ... 51

Quadro 3 – Campanha visual A é côncavo, B é convexo, ruído/mm, 2018. ... 56

Quadro 4 – Mapa de presença digital: ruído/mm ... 57

Quadro 5 - Campanha visual Santuário, Through Waves, 2012. ... 59

Quadro 6 – Campanha visual A Ponte dos Mortos, Through Waves, 2012. ... 60

Quadro 7 – Campanha visual Schadenfraude, Through Waves, 2013. ... 61

Quadro 8 – Campanha visual Epicaricacy, Through Waves, 2013... 62

Quadro 9 – Website Raine Holtz. ... 64

Quadro 10 – Mapa de presença digital: Through Waves. ... 64

Quadro 11 – Álbum Chanti, Charango? ... 67

Quadro 12 – Campanha visual: Chanti, Alpïsti, Trombone De Frutas, 2016. ... 69

Quadro 13 – Mapa de presença digital: Trombone de Frutas. ... 70

Quadro 14 – Single Mulamba, Mulamba, 2017. ... 72

Quadro 15 – Álbum Mulamba, Mulamba, 2018. ... 73

Quadro 16 – Agenda de eventos ... 74

Quadro 17 – Mapa de presença digital: Mulamba ... 74

Quadro 18 – Campanha visual: Pra doer, Tuyo, 2017 ... 77

Quadro 19 – Campanha de visual single Solamento, Tuyo, 2018. ... 79

(7)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Identidade visual de On My One, de Jake Bugg. (estúdio Stylorouge) ... 12

Figura 2 – Fotografia das capas de CDs das bandas Farol Cego e Rodolfo y Roseno. ... 13

Figura 3 – Capa de álbum do Quinteto Armorial. ... 16

Figura 4 – Arte da capa do álbum Da lama ao caos (1994), Chico Science e Nação Zumbi. . 17

Figura 5 – Capa do álbum Feito em casa (1977), de Antonio Adolfo ... 22

Figura 6 – Capa do álbum Lado B Lado A (1999), O Rappa, lançado em CD e LP. ... 25

Figura 7 – Arte da capa do álbum Sobrevivendo no inferno (1997), dos Racionais MC’s. ... 26

Figura 8 – Capa e rascunho de Marques para o álbum Sobrevivendo no inferno. ... 27

Figura 9 – Pluto. Demo-tape independente. Curitiba: Aprox. 1999-2000 ... 29

Figura 10 – Cartaz de Mário de Alencar. Curitiba, aprox. 1999-2000. ... 30

Figura 11 – Diagrama de metodologia de pesquisa. ... 36

Figura 12 – Capa de disco e cartaz de evento... 42

Figura 13 – Capa de Facebook. ... 42

Figura 14 – Interface do Ping ITunes em 2010. ... 44

Figura 15 – Capa do álbum Rasura. ... 45

Figura 16 – Artecolagens de Mário de Alencar para a capa do álbum Rasura. ... 46

Figura 17 – Artecolagens de Mário de Alencar para a capa do álbum Rasura. ... 46

Figura 18 – Artecolagens de Mário de Alencar para a capa do álbum Rasura. ... 47

Figura 19 – Versão em fita do álbum Rasura. ... 47

Figura 20 – Cartaz de show. ... 48

Figura 21 – Cartaz de show. ... 49

Figura 22 – Capa de Facebook. ... 50

Figura 23 – Cartaz de show. ... 50

Figura 24 – Bandcamp da banda. ... 51

Figura 25 – Arte da capa do álbum A é Côncavo, B é Convexo, de 2018. ... 52

Figura 26 – LP A é Côncavo, B é Convexo, de 2018. ... 53

Figura 27 – Gravura do encarte do álbum A é Côncavo, B é Convexo. ... 53

Figura 28 – Perfil da banda no Youtube. ... 54

Figura 29 – Tela inicial do website da banda. ... 55

Figura 30 – Tela inicial do site, versão para dispositivo móvel. ... 55

Figura 31 – boxset do álbum Santuário, 2012... 58

Figura 32 – Arte do single A Ponte dos Mortos, 2012. ... 59

Figura 33 – Arte da capa do álbum Schadenfraude, 2013... 60

Figura 34 – Conteúdo do boxset do álbum Schadenfraude, 2013. ... 61

Figura 35 – Arte promocional para o single Epicaricacy, 2013. ... 62

Figura 36 – Tela inicial do website da artista Raine Holtz. ... 63

Figura 37 – Tela do website da artista Raine Holtz. ... 63

Figura 38 – Capa e quarta-capa do LP Chanti, Charango?, 2015 ... 66

Figura 39 – Capa de Facebook, ilustração de Renato Ventura. ... 66

Figura 40 – Capa e quarta-capa do álbum Chanti, Alpïsti, 2016. Arte de Camila Macedo. .... 68

(8)

Figura 42 – Cartaz de show por Renato Ventura. ... 69

Figura 43 – Arte do single Mulamba, 2017. ... 71

Figura 44 – Arte da capa do álbum Mulamba, 2018. Arte por Katia Hom. ... 72

Figura 45– Agenda de eventos, setembro de 2017. ... 73

Figura 46 – Arte da capa do álbum Pra Doer, 2017. ... 75

Figura 47 - Peça digital de divulgação do álbum Pra Doer, 2017. ... 76

Figura 48 - Peça digital de divulgação do álbum Pra Doer, 2017. ... 76

Figura 49 - Peça digital de divulgação do álbum Pra Doer, 2017. ... 77

Figura 50 – Visualização do perfil do Instagram da Tuyo. ... 78

Figura 51 – Peças digitais para divulgação de single, 2018. ... 79

(9)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1 MÚSICA POPULAR NAS ARTICULAÇÕES DE SIGNIFICADOS ... 14

1.1 OBJETIVO GERAL ... 18

1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 18

1.3 JUSTIFICATIVA ... 19

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 21

2.1 HISTÓRICO DA MÚSICA INDEPENDENTE NO BRASIL ... 21

2.2 TECNOLOGIAS DIGITAIS E AS NOVAS MÍDIAS MUSICAIS ... 30

2.3 DESIGN E ARTE PARA AS NOVAS MÍDIAS ... 35

2.4 PERCURSO METODOLÓGICO ... 36

2.4. 1 Formulação do problema ... 37

2.4.2 Seleção da amostra ... 37

2.4.3 Coleta de dados ... 38

2.4.4 Análise e interpretação dos dados ... 38

2.4.5 Redação do relatório da pesquisa ... 39

3 DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA... 40

3.1 RUÍDO/MM (2003 - PRESENTE) ... 41

3.1.1 Campanha visual: Introdução à Cortina do Sótão ... 41

3.1.2 Campanha visual: Rasura... 44

3.1.3 Campanha Visual: A é Côncavo, B é Convexo... 52

3.1.4 Mapa da presença digital ... 57

3.2 THROUGH WAVES (2006 - PRESENTE) ... 57

3.2.1 Campanha visual: Santuário ... 58

3.2.2 Campanha visual do single A Ponte dos Mortos ... 59

3.2.3 Campanha visual: Schadenfraude ... 60

3.2.4 Campanha visual do single Epicaricacy ... 62

3.2.5 Site ... 63

3.2.6 Mapa da presença digital ... 64

3.3 TROMBONE DE FRUTAS (2012 - PRESENTE) ... 65

3.3.1 Álbum: Chanti, Charango? ... 66

(10)

3.3.3 Mapa da presença digital ... 70

3.4 MULAMBA (2015 - PRESENTE) ... 70

3.4.1 Single Mulamba ... 71

3.4.2 Álbum Mulamba ... 72

3.4.4 Mapa da presença digital ... 74

3.5 TUYO (2016 - PRESENTE) ... 75

3.5.1 Campanha visual: Pra doer ... 75

3.5.2 Campanha de lançamento do single Solamento ... 78

3.5.3 Mapa da presença digital ... 80

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 81

REFERÊNCIAS ... 83

(11)

INTRODUÇÃO

O questionamento que cabe a este trabalho e ao escopo do design gráfico é: como se dá a relação entre os projetos de design gráfico e as mídias musicais disponíveis hoje? A atuação do designer gráfico no campo da música independente é, hoje, mais restrita ou é ainda mais abrangente do que num passado anterior à popularização das mídias digitais?

Quais são as considerações que um designer deve fazer ao realizar um projeto que será disposto nas novas mídias e na lógica do “controle do acesso de informações”1? Como a mudança dos suportes e da própria configuração do mercado altera os pontos de partida para projetos gráficos voltados para a música?

A música independente apresenta-se não necessariamente como oposição ao mercado

mainstream2, mas tão somente como uma maneira de se produzir música à parte de gravadoras, o que, muitas vezes, resulta em maior liberdade criativa para os artistas, que encontram os próprios meios de expressar temáticas e sonoridades que não caberiam nas exigências mercadológicas mais gerais. Quando se pensa numa cena local, como a de Curitiba, é interessante observar a formação de um senso de unidade entre diversos músicos, que se organizam, à sua maneira, e conseguem abarcar questões relevantes à sua atividade artística, à cidade e ao público ao qual se destinam.

Por isso, é necessário a este trabalho chegar à compreensão das possíveis dificuldades e barreiras que os artistas independentes encontrem para fazer que sua produção chegue a um público maior, sendo o público local um destaque importante pela característica do suporte à atividade que ocorre aqui; Neste contexto, investigam-se as maneiras como a atual configuração do mercado musical independente ressoa na abrangência do escopo de designers que atuam neste setor, de forma a vislumbrar as possibilidades existentes em sua própria atividade. Para tais observações, considera-se que a abrangência atual da atividade de um designer para o setor musical é muito maior, ao envolver campanhas visuais - tanto digitais quanto impressas - além da importância acrescida dos shows e dos festivais, e de seu material gráfico para divulgação e identidade para artistas independentes.

1 CRUZ, Leonardo Ribeiro. Internet e arquiteturas de controle: as estratégias de repressão e inserção do

mercado fonográfico digital. 2014. 271 f. Tese (Doutorado em Sociologia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014.

2 Termo inglês que pode ser traduzido literalmente como “corrente principal” e que é comumente usado para

designar as principais vias do mercado cultural, aquelas que atingem a maior parcela do público e que movimentam as maiores receitas.

(12)

Knigth & Glasser, numa abordagem prática do design para música, sustentam que a partir da virada do século XXI, em consequência das muitas mudanças que vêm acontecendo no mercado fonográfico, com os downloads substituindo as vendas de CD e dos discos de vinil se restringindo a um nicho muito estreito do mercado, os designers têm enfrentado um enorme desafio na concepção de designs que funcionem nos variados contextos. Estas autoras citam o designer gráfico Rob O’Connor, do estúdio britânico Stylorouge:

O design para a música é visto, tradicionalmente, como a imagem da capa do disco. Isto está mudando devido ao mercado de downloads em expansão, mas uma campanha visual ainda precisa de um foco central que assuma o papel da capa do disco de vinil: as miniaturas da loja iTunes, os banners e anúncios para a internet etc. (2012, p. 172)

Segundo as autoras, a identidade visual da música, no momento atual, tem de lutar por seu espaço em meio à grande concorrência pela atenção do público. Entretanto, a criação de projetos de design de mídia musical que abarque as diferentes facetas nas mídias digitais e a presença visual pode ter um enorme impacto na conquista do público, levando a maior popularidade do artista (2012).

Figura 1 - Identidade visual de On My One, de Jake Bugg. (estúdio Stylorouge)

(13)

Em relação ao exemplo da Figura 1, os dirigentes do Stylorouge afirmam, em sua página de portifólio, ter sido abordados para realizar o projeto gráfico do encarte e de uma campanha visual completa para o terceiro álbum do artista britânico Jake Bugg, eventualmente entitulado de On My One. De acordo com nota da página, os dois álbuns anteriores do artista eram compostos por fotografias deste; já em On My One, ficou decidido conferir ao material uma identidade própria que retratasse arte, o que foi o ponto de partida do projeto.

A cena musical independente de Curitiba se articula pela atividade multifacetada dos músicos, que formam coletivos artísticos – como exemplo do Coletivo Atlas e do Água Viva Concentrado Artístico –, que produzem material promocional e realizam festivais, debates, e apresentações, e por artistas que têm a possibilidade de, a princípio, conectar-se com o público por meio dos suportes digitais e dos eventos, muitas vezes promovido por eles próprios, que acontecem na cidade.

Na Figura 2, que retrata capas de CD’s de dois projetos curitibanos (Farol Cego e Rodolfo y Roseno), é possível observar um certo aspecto artesanal no acabamento dos materiais, feitos para distribuição em pequena escala. Ainda que estes artistas tenham sua vivência condicionada à lógica de distribuição das novas mídias, existe uma intenção estética e conceitual em atribuir ao produto físico esta característica manual.

Figura 2 – Fotografia das capas de CDs das bandas Farol Cego e Rodolfo y Roseno.

(14)

1 MÚSICA POPULAR NAS ARTICULAÇÕES DE SIGNIFICADOS

A constituição da música popular como objeto de estudo acadêmico remonta aos anos de 1930, conforme aponta o pesquisador Allan de Paula Oliveira (2014), a partir dos estudos de Adorno, nos quais este autor ressaltava sua visão altamente pessimista da música popular como mercadoria. Para Adorno, a transposição da arte para a esfera do consumo e para a lógica da “racionalidade técnica” (2002, p.9), da produção em série e da estandardização de produtos culturais é o reflexo da sociedade que se “auto-aliena”:

O cinema e o rádio não têm mais a necessidade de serem empacotados como arte. A verdade de que nada são além de negócios lhes serve de ideologia. (...) O cinema e o rádio se auto definem como indústrias, e as cifras publicadas dos rendimentos de seus diretores-gerais tiram qualquer dúvida sobre a necessidade social de seus produtos. (ADORNO, 2002, p.8)

A música “popular”, em oposição àquela denominada por Adorno como “música séria”, é avaliada como desprovida de valor estético e resultado de um processo contínuo de imitação. Para este autor, a indústria se impõe tão fortemente sobre a produção cultural que o estilo acaba por se traduzir em uma forma de categorização do gosto, reduzindo a espontaneidade da arte aos clichês, mais facilmente absorvidos pelo mercado.

A fim de contrapor esta perspectiva, é amplamente debatido e conhecido no meio dos estudos culturais o diálogo Adorno-Benjamin, a partir do qual se questiona, parcialmente, o negativismo de Adorno em relação às chamadas artes industriais.

Walter Benjamin – assim como Adorno, um nome conhecido da Escola de Frankfurt –, em seu ensaio “A Obra de Arte na Era da sua Reprodutibilidade Técnica” assume uma posição divergente a respeito da valoração da relação entre arte e tecnologia. Benjamin admite as possibilidades emancipadoras dessas artes, desde que orientadas intelectualmente.

Já as últimas três décadas do século XX testemunharam profundas transformações na forma como as artes são estudadas, pela influência de entidades como o feminismo, a semiótica e a desconstrução (LEPPERT, MCLARY, 1987, p. 11). John Shepherd (1987, p. 63) anuncia uma dissolução das categorias “música popular” e “música séria”. Como, tradicionalmente, a “música séria” é vista como integralmente estética, livre de valor utilitário, propósito ou interesse, enquanto sua contraparte é vista como utilitária, o colapso das duas categorias implica em uma “reavaliação metodológica cruzada”, na qual é levado em consideração o valor político da obra tida como “séria” e o valor estético da obra popular. Para Richard Leppert, a

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convencional dicotomia é uma visão “arbitrária na melhor das hipóteses, exclusionária na pior.” (1987, p.16 - tradução da autora).

Para Simon Frith (1987 apud MAHEIRIE, 2002, p. 41), a música tem papel ativo na formação de nossa compreensão sobre as coisas, e, nessa perspectiva, cria identidades específicas para questões específicas, a exemplo: identidade negra; identidade feminista; identidade libertária, etc. Portanto, o papel da música não é somente o de expressar, mas o de definir os sujeitos de forma singular e coletiva; este papel da música se dá a um nível emocional, já que, para Frith, a música exerce tanto impacto nas pessoas por ser uma fonte de emoções fortes.

Na obra do sociólogo, Towards an aesthetic of popular music, de 1987, cujo contexto evidencia as relações entre a música e a produção de identidades e sujeitos, o autor aponta que a música pode apresentar quatro “funções”3: a primeira, a de responder questões de identidade, isto é, nos apropriamos das canções para definirmos nossa consciência crítica e nosso lugar na sociedade. Assim, ao nos identificarmos com a música que gostamos, com os artistas, fãs, etc., excluímos aquilo que não gostamos, aqueles que não gostam das músicas que gostamos, seus artistas e seus fãs.

A segunda função social da música, segundo o autor, é administrar o relacionamento entre o público e o privado. A identificação pessoal que os indivíduos experienciam com as ideias e sentimentos expostos na música é, para o público, uma forma de dar vazão e voz ao que ele próprio pensa e sente. Nesta forma pública de expressão do privado, dá-se um autoconhecimento por meio da música e se forma um processo de grande identificação do público com os artistas.

A terceira função é organizar nosso conceito de tempo e memória. Ao “intensificar nossa experiência no presente” (p. 8), nos colocando em relação física direta com o ritmo e a melodia, desdobra-se também em uma reorganização da memória singular e coletiva.

A quarta e última função é consequência de todas as anteriores e diz respeito à maneira como, no campo da afetividade, nós reconhecemos a música como algo nosso, como uma mercadoria simbólica.

Para Maheirie (2002, p.43), ao localizar sujeitos num cenário cultural e político, a música pode estar apontando discussões sobre mudanças nas estruturas sociais.

Considerando que a identidade de uma nação é um conjunto de referências em constante transformação, entende-se que, em tempos de pós-modernidade, a questão da identidade do

3 FRITH, Simon, Towards an aesthetic of popular music. IN: McLARY, S. & LEPPERT, R. (org.). Music and

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sujeito começa a se fragmentar no momento em que o indivíduo torna-se parte do ambiente em que vive. Ciente de que não existe um centro fixo e estável, mas que, pelo contrário, ele é parte de um todo mutável, formado por transformações contínuas, que refletem essas alterações dos sistemas culturais que o cercam (HALL, 2006).

Em 1970, o escritor pernambucano Ariano Suassuna idealizou o Movimento Armorial4, um movimento cultural e estético que abarcou diferentes linguagens como artes plásticas, música e literatura, e propunha reforçar a identidade regional nordestina e marcar uma resistência à indústria cultural globalizada e massificada. Durante essa manifestação cultural, uma série de artistas gráficos se utilizaram de um repertório imagético propriamente regional para construir a linha estética que caracterizaria visualmente o movimento. É marcante no Movimento Armorial evidenciar manifestações culturais populares que podem não pertencer aos fenômenos de grande circulação.

Figura 3 – Capa de álbum do Quinteto Armorial.

Fonte: blog Armorial Brasileiro. Disponível em <https://armorialbrasileiro.wordpress.com/>. Acesso em 01 mar. 2019.

4 QUEIROZ, Rucker Bezerra de; O Movimento Armorial em Três Tempos: aspectos da música nordestina na

contextualização dos quintetos Armorial, da Paraíba e Uirapuru. 187 f. 2014. Tese (Doutorado em Música) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014.

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As diversas linguagens do Movimento Armorial – música, artes gráficas, literatura – aproximam-se por se inserirem no mesmo universo simbólico. Nas capas do Quinteto Armorial, grupo de música de câmara que buscava integrar elementos sonoros tipicamente nordestinos à música erudita, observa-se uma alusão às ilustrações em xilogravura de cordel.

Já outra vertente estética também recifense, o Mangue Beat, se caracteriza pela mistura de elementos externos, como por exemplo, o uso do idioma inglês, de recortes musicais próprios da cultura hip hop e os sons eletrônicos com a forte batida do maracatu, em contraponto ao ideal mais purista defendido por Suassuna (QUEIROZ, 2014, p. 27).

A tendência musical do mangue foi acompanhada por uma identidade plástica própria do movimento. O estúdio de design Dolores e Morales, idealizado pelos artistas Hilton Lacerda e Helder Aragão, se destacou na produção de material gráfico para os músicos do Mangue Beat, criando a linha visual mais marcante no movimento. Na época de lançamento do disco de estreia da banda Chico Science e Nação Zumbi, Da lama ao caos (1994), lançado pela gravadora Sony Music, os processos gráficos ainda eram bastante analógicos, o que ilustra o porquê de a inovação tecnológica ser uma característica marcante, tanto no som quanto na arte da capa deste disco, que retrata um caranguejo a partir de recortes manipulados. A quarta-capa retrata uma garra de caranguejo propositalmente “estourada” para evidenciar os pixels que caracterizam a manipulação digital de imagens.

Figura 4 – Arte da capa do álbum Da lama ao caos (1994), Chico Science e Nação Zumbi.

Fonte: Inspi. Disponível em: <https://inspi.com.br/2019/03/25-anos-de-da-lama-ao-caos-e-a-identidade-grafica-do-mangue>. Acesso em 01 mar. 2019.

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O que concerne a este trabalho, ou seja, a discussão sobre a amplitude e o espaço criativo do design gráfico para produções musicais em meio às relações entre tecnologia e música e seus reflexos nas formas de consumir e de experienciar música, parte de uma investigação e de uma reflexão acerca de quais estratégias de divulgação os músicos independentes têm adotado e como o design gráfico se articula em meio a essas estratégias.

O eixo para o desenvolvimento da pesquisa e do presente trabalho é a reconfiguração sofrida pela indústria fonográfica a partir dos anos de 1990 e 2000, resultado da mudança substancial nos hábitos de consumo de bens culturais a partir do compartilhamento gratuito de arquivos digitais5, sua posterior assimilação e a influência das tecnologias digitais nas possibilidades gráficas a serem exploradas por músicos, considerando a mudança de suportes. Portanto, para compreender qual é o espaço de atuação criativa para o design gráfico nas atuais mídias musicais disponíveis, é desenvolvida uma análise de produções curitibanas no cenário independente musical atual – anos de 2010 a 2019.

1.1 OBJETIVO GERAL

Fazer um registro sobre como as produções gráficas para a música independente curitibana contemporânea (2010-2019) se apresentam nas mídias digitais e físicas, levando em consideração as mudanças ocorridas no mercado fonográfico mundial.

1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

● Traçar panorama de como o desenvolvimento de novas tecnologias influenciou o mercado fonográfico e suas relações com os materiais de divulgação.

● Realizar levantamento de produções gráficas do cenário de música independente curitibana na presente década (entre os anos de 2010 e 2019);

● Mapear quais meios são utilizados para a divulgação dos artistas selecionados.

5 WITT, Stephen; Como a Música Ficou Grátis: O fim de uma indústria, a virada do século e o paciente zero

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1.3 JUSTIFICATIVA

Embora as possibilidades de divulgação digital sejam numerosas e bastante acessíveis para os músicos, mesmo de maneira independente – ou seja, sem o suporte técnico e estrutural integral de uma grande empresa do setor fonográfico –, ainda há dificuldades e barreiras para se conseguir destaque em meio a todo o “ruído digital”6. A “democratização da curadoria”7 de música na era digital torna o processo de divulgação e de assimilação da música, ainda que mais acessível, também mais difuso e mais incerto.

Cruz (2014) sugere que, embora as tecnologias digitais tenham propiciado um aumento na quantidade de artistas e de pequenas gravadoras que têm a possibilidade de produzir à margem do grande mercado fonográfico, estes ainda encontram muita dificuldade em distribuí-lo a um nível nacional e de divulgá-distribuí-lo nas mídias tradicionais, como o rádio e a televisão que, para esse autor, ainda são as vias mais relevantes de divulgação existentes.

Para Fraga (2014), a possibilidade de realizar gravações caseiras mudou a economia das gravações. Anteriormente, apenas as gravadoras possuíam estúdios de gravação - porque eram as únicas que conseguiam retorno sobre o investimento necessário em equipamentos -, mas o desenvolvimento de tecnologias digitais para lidar com o som permitiu que esse cenário se diversificasse imensamente.

Propor soluções de design em meio a um cenário em que ideias se espalham ilimitadamente, mas em que muitos clamam que “a indústria está morta”8, implicam em uma pesquisa e reflexão base sobre os novos papéis das mídias na divulgação e na distribuição de música.

Eduardo Vicente, em 2006, ao estudar a trajetória da música independente no Brasil e situá-la no panorama da indústria fonográfica mundial, aponta que a retração da grande indústria criou espaços vazios que, se não preenchidos pelas gravadoras independentes de menor projeção, poderiam gerar um esvaziamento da cena fonográfica no país e a redução de possibilidades para que artistas alcançassem carreiras sólidas. Para este autor, a continuidade da crise no mercado fonográfico, agravada pela pirataria, colocaria “em risco toda a ecologia” (2006, p. 16) neste campo.

O presente trabalho se justifica pela lacuna na indústria fonográfica, pela necessidade de reavaliação das relações entre as produções musicais e o design gráfico, influenciadas pelos

6 DWORSKI, David; KÖHLER, Victor. Presspauseplay. House of Radon: Austin, EUA, 2011. (88 min.).

7 Idem 8 Idem

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fatores de mudança que caracterizaram a reestruturação do mercado a partir da virada do século XXI, e pela necessidade de vislumbrar as soluções circunscritas ao design gráfico que ainda possam contribuir para o favorecimento do cenário musical independente.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 HISTÓRICO DA MÚSICA INDEPENDENTE NO BRASIL

Para Vicente, todo o trajeto da indústria fonográfica no mundo é marcado por alguns processos de reorganização decorrentes de inovações tecnológico-industriais, além de influências por circunstâncias econômicas e limitações políticas. E, embora o mercado independente opere à margem da grande indústria, ambos estabeleceram, ao longo de tais processos, uma relação de interdependência9. Para fim de melhor compreender o local em que se encontra a música independente, é preciso contextualizar o cenário de atuação das grandes empresas e selos que detêm a maior parcela do mercado fonográfico.

Neste trabalho, serão adotadas, para fins de diferenciação quanto a sua posição na indústria como um todo, as tradicionais denominações majors e indies (VICENTE, 2006), referindo-se, respectivamente, a gravadoras com atuação globalizada e/ou ligadas aos grandes conglomerados de comunicação existentes no país, e às organizações que atuam de maneira predominantemente local, podendo ser ligadas a um segmento musical específico.

No entanto, este último refere-se, hoje, tanto a gravadoras de pequena projeção quanto a artistas que desenvolvem seus trabalhos de maneira autônoma, considerando-se as possibilidades produtivas disseminadas por tecnologias digitais (VICENTE, 2006, p. 2).

O desenvolvimento do que se pode chamar de um cenário independente no Brasil remonta à década de 1970, relacionado à crise econômica que resultou em redução de incentivos fiscais para o setor, até então favorecida pela lei Disco é Cultura (2º da Lei Complementar nº

4, de 2 de dezembro de 1969), que permitia às empresas “abater do montante do Imposto de

Circulação de Mercadorias os direitos comprovadamente pagos a autores e artistas domiciliados no país” (IDART, 1980, apud VICENTE, 2006, p. 3).

Profundamente afetadas pela crise, as gravadoras, que até então abrangiam um amplo leque da produção nacional, atendendo à demanda dos diversos nichos mercadológicos do país, passaram, a partir da década de 1980, a segmentarem-se mais e a reduzir seu elenco, favorecendo determinados estilos musicais, como sertanejo e música romântica, em detrimento de outros (nos quais rock e MPB foram notadamente desfavorecidos), ao estruturarem-se numa nova lógica de produção em larga escala.

9 VICENTE, Eduardo. A vez dos independentes. Revista da Associação Nacional dos Programas de

Pós-Graduação em Comunicação: um olhar sobre a produção musical independente do país. E-Compós, 2006.

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Figura 5 – Capa do álbum Feito em casa (1977), de Antonio Adolfo

Fonte: Disco Furado. Disponível em: <http://discofurado.blogspot.com/2013/07/antonio-adolfo-feito-em-casa-artezanal.html>. Acesso em 01 mar. 2019.

Até a década de 1970, aponta o jornalista cultural Alexandre Matias, “o mercado fonográfico era um arquipélago de pequenas e grandes gravadoras, que podiam ser empresas com escritórios em vários países ou lojas que gostavam de lançar discos” (MATIAS, 2015), mas a partir dessa época entraram em diversos processos de aglutinação, fundindo-se e comprando umas às outras, o que resultou em uma abordagem mais comercial, incidindo sobre os gêneros musicais e sobre a imagem de artistas que interessavam às gravadoras retratar.

Em vista de uma configuração mais restrita e mais seletiva das empresas, a produção autônoma foi a via que vários artistas encontraram para se inserirem no mercado, bem como de assumirem uma posição de resistência cultural a imposições da indústria.

Invenção da empresa Philips, em 1963, as fitas cassete foram, à época, uma inovação técnica que permitia a gravação e a reprodução de sons através de dois rolos de fita magnética alojados em uma caixa plástica, facilitando a grande difusão das práticas de cópia dos discos de vinil, assim como a criação de uma cultura musical independente na segunda metade da década de oitenta, já que com essa técnica uma série de artistas que não tinham acesso à indústria fonográfica de vinis e, posteriormente, CD’s, puderam produzir e gravar sua música (MORAES, 2010, p. 17).

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Porém, em contrapartida da postura de oposição ideológica à indústria que alguns artistas assumiam, a configuração do mercado e da distribuição cultural levou o meio independente ao papel de uma espécie de “laboratório” de prospecção de nichos de mercado, possibilitando às gravadoras observar a assimilação de artistas pelo público a partir da atividade de músicos não vinculados a elas. (VICENTE, 2005)

Mesmo assim, a década de 1980 no Brasil presenciou um projeto independente (VICENTE, 2005, p. 7), em que se destacaram iniciativas como a inauguração, no final de 1979, do Teatro Lira Paulistana, que concentrou a cena e o debate da produção cultural emergente. O projeto se estendeu para a criação de uma gráfica e de um selo, em 1981, atuando como um meio de acesso de artistas ao público e exemplificando a relevância da articulação entre a gravação de música e diferentes áreas, como produção editorial, jornalismo e artes plásticas10. O propósito da criação do teatro, explicou o fundador, Riba de Castro11, era oferecer um espaço para artistas principiantes. O Lira, como ficou conhecido, encerrou suas atividades em 1986.12

Iná Camargo Costa atribui a criação do Teatro Lira Paulistana a um diagnóstico de Wilson Souto Jr (o Gordo), seu idealizador, acerca da “existência de um público insatisfeito com a produção cultural” formado principalmente por:

Estudantes universitários ou já graduados, mais ou menos atentos às crises por que vinha passando o país; um tanto quanto na vanguarda das assim chamadas mudanças de comportamento... mas com um detalhe bastante significativo: de baixo poder aquisitivo. (1984 apud VICENTE, 2005, p. 6)

A criação da Cooperativa dos Músicos Profissionais do Rio de Janeiro (Coomusa), em 1980, que ficaria encarregada pela distribuição e divulgação de trabalhos, e da APID – Associação dos Produtores Independentes de Discos, em 1982, foram empreendimentos que acabaram não prosperando em função da falta de estrutura financeira para atender com eficiência a uma cena em constante crescimento.13

Para Vicente, o aparente fracasso do projeto independente dos anos 1980 é atribuído a vários fatores da conjuntura nacional, dentre os quais aponta a precariedade do capitalismo no país como o principal, além das dificuldades de distribuição e de divulgação, atraso tecnológico, falta de acesso a matéria-prima, boicote por parte de companhias, etc.

10 CASTRO, Riba de. Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista. Pirata Creative: São Paulo, 2012. (97 min.).

11 Vanguarda Paulista. Disponível em:

<http://www.vanguardapaulista.com.br/riba-de-castro-programa-paratodos/>. Acesso em 01 mar. 2019.

12 Idem.

13 VICENTE, Eduardo. A vez dos independentes. Revista da Associação Nacional dos Programas de

Pós-Graduação em Comunicação: um olhar sobre a produção musical independente do país. E-Compós, 2006. Disponível em <http://www.e-compos.org.br/e-compos/article/view/100>. Acesso em: 09 set. 2018.

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Já a década de 1990 foi marcada pela característica de profissionalização do material independente – até então muito associado à imagem dos discos artesanais produzidos nos anos 1970 e a uma certa precariedade de acabamento – e por uma significativa expansão do mercado. Para os envolvidos nos processos produtivos musicais, passou a ser mais interessante afirmar uma noção de viabilidade comercial de seus negócios.14

Esse reforço da ideia de profissionalização indicava uma relação mais pragmática entre

majors e indies, numa compreensão mútua de sua realidade material. Desta forma surge uma

espécie de divisão do mercado, na qual as majors, valendo-se de sua vantagem competitiva, adotam a abordagem de selecionar artistas do meio independente, investindo em sua viabilização e divulgação. Na outra ponta dessa dinâmica, os independentes ficavam responsáveis pela prospecção e atendimento de segmentos específicos. Nestes termos, formar artistas para posterior repasse às majors passou a ser uma perspectiva profissional de empresários, percebendo nos selos independentes uma tendência para servir de fonte para as grandes gravadoras.15

Os sucessivos avanços das tecnologias usadas pela indústria fonográfica foram possibilitando a atuação de organizações com contingentes cada vez mais reduzidos. O selo independente Lux, por exemplo, criado por Nelson Motta em 1993, tinha em sua equipe apenas dois diretores e uma secretária e terceirizava todas as suas necessidades.16

Entretanto, Vicente atribui o fortalecimento da cena independente nos anos 1990 não somente ao amadurecimento das relações comerciais entre gravadoras, mas também à efervescência do que denomina como circuito autônomo de produção musical, no qual artistas com fortes ligações identitárias (comportamentais, geográficas, étnicas, religiosas, etc.) e o acesso às tecnologias que permitiram a formação de uma rede de produção e distribuição cultural fora do âmbito das grandes gravadoras ou das redes nacionais de mídia.

O autor cita como exemplo a cena do rock alternativo nacional que, se até os anos 1980 era representada por jovens da classe média branca universitária, com origem em Brasília e nas capitais do sul e do sudeste, passou a ter grande presença das periferias urbanas, produzindo com grande influência da música negra, especialmente funk e rap – “predominante em grupos como Rappa e Cidade Negra, entre outros; questionamentos sociais mais vigorosos e vinculação de algumas bandas a causas específicas (como a da legalização da maconha defendida, entre outros, pelo Planet Hemp)” (VICENTE, 2006, p.12).

14 Idem. 15 Idem. 16 Idem.

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Figura 6 – Capa do álbum Lado B Lado A (1999), O Rappa, lançado em CD e LP.

Fonte: Site da banda. Disponível em: <http://www.orappa.com.br/o-homem-por-tras-da-capa-de-lado-b-lado-a>. Acesso em 01 mar. 2019.

A capa do álbum Lado B Lado A, de autoria do artista Doze Green, conforme relato do baterista e compositor da banda Marcelo Yuka17, representa graficamente a proposta do álbum de não seguir um gênero estabelecido, traduzindo um contexto caótico, com forte influência da cultura carioca. Ao mesmo tempo, não segue um padrão óbvio na arte do grafite e busca um Brasil contemporâneo por meio da colagem de diversos elementos que representam a realidade carioca.

17 MENDONÇA, Paulo. Arte na Capa: Da Lama ao Caos. Rio de Janeiro: Canal Brasil, 2017. (3 min.). Disponível

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Figura 7 – Arte da capa do álbum Sobrevivendo no inferno (1997), dos Racionais MC’s.

Fonte: Galileu. Disponível em: <https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2018/06/entenda-por-que-racionais-e-leitura-obrigatoria-no-vestibular.html>. Acesso em 15 jul. 2019.

Marcos Marques, responsável pela direção de arte do encarte do considerado clássico álbum de rap Sobrevivendo ao inferno, relata em seu Facebook pessoal18 que a primeira ideia para a capa era uma fotografia dos Racionais MC’s em frente a uma igreja, mas como os membros não ficaram satisfeitos com o primeiro resultado, Marques teve a súbita percepção de utilizar um rascunho feito a partir da tatuagem no braço do membro Mano Brown, que representava um crucifixo, chegando ao resultado final do símbolo retratado sobre um fundo escuro, composto com um versículo bíblico, o nome da banda e o título do álbum em tipografia que remete a uma caligrafia clássica.

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Figura 8 – Capa e rascunho de Marques para o álbum Sobrevivendo no inferno.

Fonte: Facebook pessoal do designer. Disponível em: <https://www.facebook.com/marcos.marques.7927>. Acesso em: 15 jul. 2019.

Ainda neste contexto, a necessidade da utilização de equipamentos, bem como a relação mais instável entre artistas e gravadoras, impunha a necessidade da assimilação de conhecimentos mais gerais por parte dos artistas, bem como da auto-administração de diversos aspectos de suas carreiras. (VICENTE, 2005)

Quando novamente o país enfrentou uma recessão econômica e uma intensa desvalorização do real, no final da década de 1990, o setor fonográfico foi fortemente atingido, além de enfrentar fatores específicos dessa indústria que contribuíram para sua queda nos anos 2000. A pirataria, apesar de não ser um problema novo, se mostrou o mais grave para a indústria, afetando também as indies, mas se mostrando especialmente danosa para as grandes empresas do setor. Estes fatores levaram o Brasil, que entre 1995 e 1998 ocupava o sexto lugar no ranking mundial do mercado fonográfico, a despencar para a 12ª posição em 2001 (VICENTE, 2005, p. 10).

Na década de 2000 as consequências desta grande crise para o segmento fonográfico acabaram por afastar a relação de coexistência no mercado que havia se estabelecido entre

majors e indies nas décadas anteriores, o que veio a somar às óbvias dificuldades já sofridas

pelas independentes de se sustentarem na economia instável. Em contrapartida, a consolidação da internet como parte do cotidiano das pessoas trouxe todo um universo de oportunidades ao proporcionar alcance para a divulgação de artistas a custos muito baixos. Além de que, o

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interesse das majors se mantinha cada vez mais concentrado em alguns poucos segmentos, deixando caminhos livres para a atuação das indies sobre os outros gêneros musicais.19

Vicente aponta, ainda, uma tendência de fortalecimento do mercado independente na década de 2000 a outros fatores, como a criação da ABMI – Associação Brasileira de Música Independente, em 2001, ou a entrada de grande capital nacional por meio de nomes como os das gravadoras Trama e Biscoito Fino. Entretanto, a relevância das gravadoras independentes nos espaços que o autor denomina como “circuitos autônomos” (2006, p. 13) é o que mais se relaciona com o presente trabalho: tratam-se dos meios nos quais

Sem a presença de grandes gravadoras ou redes de mídia de alcance nacional, fornecem condições para as apresentações musicais, produção, divulgação e venda de discos dos artistas que os integram. Estes circuitos podem ter uma localização geográfica definida ou relacionar-se a identidades étnicas, religiosas, urbanas, etc” (VICENTE, 2006, p. 14).

Podem-se considerar exemplos de circuitos autônomos no âmbito nacional a música religiosa, o rap, o funk carioca, o rock alternativo, os CTGs (Centros de Tradições Gaúchas), etc.

Vicente cita três fatores que, para ele, viabilizam a atividade econômica das gravadoras independentes. São eles: 1) as possibilidades de pulverização da produção musical e redução de seus custos propiciadas pelas tecnologias digitais, que viabilizaram não só a criação de estúdios locais, como também o retorno do investimento a partir da venda de quantidades cada vez menores de discos. 2) o surgimento de redes locais de comunicação, como pequenas emissoras de TV, rádios comunitárias, livres, piratas, etc., que tendem a incorporar a produção dos artistas locais à sua programação, ao contrário do que ocorre com as grandes redes de mídia. 3) a possibilidade da intercomunicação global – principalmente pela Internet – que permite a ampliação do mercado potencial dessa produção – por meio de migrantes que deixaram o local, grupos que partilhem os mesmos valores identitários, etc. (2005, p. 11)

Moraes, discorrendo sobre um importante nicho da cultura alternativa que chegou em Curitiba do final da década de 1970, e que permaneceu uma importante expressão subterrânea nas décadas seguintes - a subcultura punk -, afirma que, à época, uma série de problemas sócio-econômicos revelavam a “fragilidade do capitalismo periférico brasileiro” (2011, p.14). Momento esse em que se inicia uma crise que levaria o país, em futuro próximo, a um aumento assustador do desemprego, da inflação e da violência e em que aparecem os resultados das contradições sociais e da miséria que o período da ditadura militar só fez aprofundar.

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Junto com esse avanço do pessimismo vai começando a surgir no Brasil toda uma cultura independente e alternativa com uma palavra de ordem “contra todas as ditaduras, a ditadura política e a ditadura do mercado”. Essa cultura alternativa vai abranger as mais diversas manifestações, desde o teatro até a poesia, mas a que teve maior repercussão e foi mais numerosa foi a música. (MORAES, 2011, p. 24)

Para Moraes, a emergência de um pessimismo generalizado e de uma cultura alternativa e independente são de grande importância para entender como o repertório imagético e estético do punk foi apropriado no Brasil (2011, p. 14).

Figura 9 – Pluto. Demo-tape independente. Curitiba: Aprox. 1999-2000

Fonte: MORAES (2011, p. 89)

Esta capa de uma demo-tape da banda Pluto é feita com um “papelão”, possivelmente reaproveitado. Há a imagem de um homem impressa; na sua boca um há corte no papel onde foi introduzida uma outra imagem, a de um pênis, que está ligada a um mecanismo com um elástico e um arame. Quando se puxa o arame se revela a mensagem impressa ao longo da forma “Você não vai conseguir colocar essa fita no carro e dançar com ela. Nenhuma música é desafiadora enquanto você puder fazer uma merda de passinho com ela”. Uma imagem incômoda, com um texto que, na proposta da banda, tem a função de confrontar o ouvinte fazendo referência às músicas dançantes das rádios populares e de marcar sua oposição estética ao mercado mainstream. Uma lógica argumentativa semelhante se repete na Figura 10:

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Figura 10 – Cartaz de Mário de Alencar. Curitiba, aprox. 1999-2000.

Fonte: MORAES (2011, p. 110)

Um cartaz que se apropria de dois anúncios publicitários da Coca-Cola, recortados de uma revista dos anos 1940, com imagens de indígenas e primatas retiradas de cadernos de antropologia do século XIX. Além das informações do show anunciado, que é a função mais óbvia do cartaz, há a frase “Uma resposta dialética ao que chamam de diversão com os Ornitorrincos e seus amigos neandertais viadinhos: Pluto, Infame, Fim de Curso”. Nessa composição, é possível visualizar diferentes temporalidades em uma mesma imagem que, “mais do que apenas oferecer uma sensação à visão do observador, lança um problema a ser resolvido pelo pensamento” (MORAES, 2011, p.111).

2.2 TECNOLOGIAS DIGITAIS E AS NOVAS MÍDIAS MUSICAIS

Os casos relatados até o presente parágrafo configuram diferentes momentos e estéticas no design para mídias musicais no cenário independente brasileiro. Entretanto, todos têm um denominador comum que influencia fortemente o design: o suporte. Até os anos 2000 as mídias

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físicas (LPs, fitas cassete, CDs), eram o veículo de circulação de música e suas embalagens, o espaço para o design gráfico desempenhar sua função de comunicar de maneira visual o conteúdo musical contido naquele produto. A partir dessa década, o mercado musical se transformou drasticamente, definindo novas configurações para o design gráfico inscrito neste setor.

A fim de compreender a reconfiguração da indústria fonográfica na virada do século XXI, convém recorrer à cronologia dos fatos que deslocaram a relevância do suporte musical físico – vendas de discos, CDs – para os suportes digitais, o que remete à invenção do formato MPEG-1 Layer 3, conhecido como mp3 e à consequente explosão do compartilhamento de arquivos digitais entre os usuários da rede mundial de computadores.20

Para o autor Stephen Witt (2015), em seu livro em que descreve a trajetória da pirataria de música no ambiente digital, o compartilhamento de músicas constitui um caso particular, cujas raízes remontam ao desenvolvimento da mídia mp3, sigla para o formato digital que tornaria possível o envio de um arquivo musical pela internet.

Resultado de uma extensa pesquisa em engenharia acústica pelo Instituto Fraunhofer na Alemanha, a invenção deste formato se deu a partir da demanda por comprimir o arquivo digital de música em 12 vezes. No ano de 1982, quando foi inventado o CD, enquanto a maioria dos engenheiros acústicos comemorava a tecnologia como um dos avanços mais importantes na história da área, um engenheiro da computação chamado Dieter Seitzer dava entrada num pedido de patente para uma jukebox digital (WITT, 2015). Por meio deste modelo de distribuição de música, os consumidores poderiam solicitar músicas pelas novas linhas telefônicas digitais, que começavam a ser instaladas na Alemanha. O pedido de patente foi negado, em razão de as linhas telefônicas dessa época serem demasiadamente estreitas, incapazes de comportar a grande quantidade de dados de áudio armazenados em um CD.

Para que a ideia de Seitzer fosse viável, os arquivos musicais no CD teriam de ser reduzidos a 1/12 de seu tamanho original, de acordo com a velocidade de transmissão de dados das linhas telefônicas da época. Seu argumento seria fundamentado numa pesquisa, por Eberhart Zwicker, no campo da psicoacústica – estudo de como os seres humanos percebem os sons – que, anos antes, comprovou que o órgão auditivo humano delimita nossa capacidade de perceber os sons apenas ao necessário para a sobrevivência, seguindo uma linha evolutiva de

20 WITT, Stephen. Como a música ficou grátis: o fim de uma indústria, a virada do século e o paciente zero da

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raciocínio. Isso implica, resumidamente, que grande parte dos dados de áudio, a maioria, eram informações ignoradas pelo ouvido humano e que poderiam, portanto, ser descartadas.21

Witt narra que Seitzer não abandonou sua ideia e que, durante os anos seguintes, orientou seu aluno Karlheinz Brandenburg no desenvolvimento de uma solução para quantificar matematicamente as descobertas de Zwicker, o que resultaria na enorme compressão de dados de áudio do formato mp3 (2015).

Para este autor, o que propiciou a explosão da pirataria no ambiente digital foi, além do surgimento da tecnologia de compressão de áudio, a resistência da indústria em assimilar a distribuição digital, insistindo no formato físico de vendas. Desta forma, a pirataria dominou os meios digitais de distribuição durante mais de uma década, a princípio utilizando fóruns para distribuição de arquivos, o que era mais ou menos restrito a alguns usuários com algum conhecimento técnico, e posteriormente facilitado pelo surgimento de softwares de compartilhamento par-a-par, com destaque para o Napster, que foi retirado do ar em 2001 por uma decisão judicial a favor das gravadoras, que acusavam seus criadores de estimular a pirataria e de infringir direitos autorais (FRAGA, 2007, p.13).

Outros programas semelhantes surgiram, e a tecnologia Torrent tornou o compartilhamento ainda mais rápido e eficiente. Iniciou-se nos EUA uma guerra judicial ineficiente contra a pirataria digital, com uma série de ações contra usuários comuns que utilizavam os programas de compartilhamento (WITT, 2015). Nesse ponto, o compartilhamento de arquivos era algo tão disseminado que havia pouco o que a grande indústria pudesse fazer para mitigar a perda de faturamento nas vendas de álbuns físicos. Havia uma nova geração do público que estava acostumada ao acesso irrestrito e gratuito, e que não estaria disposta a pagar pela música que consumia (idem).

Entretanto, uma reorganização da estrutura do mercado e a renovação dos próprios modelos de negócios são fatores que já apontam para uma relativa recuperação das cifras dessa indústria (CRUZ, 2014).

É preciso tomar cuidado ao decretar o fim da indústria fonográfica, do

mainstream musical ou de seus formatos padrões, como a canção e o álbum.

O que há, de fato, é uma reconfiguração de todas essas instâncias, até porque o circuito alternativo também é parte integrante da indústria fonográfica. (FRAGA, 2007, p. 13)

É neste contexto das novas mídias que se desenvolve a presente pesquisa. Para Lev Manovich, as novas mídias se definem como a tradução de todas as mídias existentes em dados numéricos acessíveis por computadores. De acordo com ele, a lógica cultural tradicional pode

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ser significativamente influenciada pela lógica do computador uma vez que “as novas mídias são criadas nos computadores, distribuídas via computadores, armazenadas e arquivadas nos computadores” (2002). O termo novas mídias, no presente trabalho, refere-se às mídias digitais em si, sua organização lógica e material. Mídias digitais são numéricas, usam códigos binários. As novas mídias assim se contrapõem com as “velhas” mídias, as mídias analógicas.

Manovich cita como exemplos de novas mídias: os websites, multimídias de computadores, jogos digitais, CD-ROMs, DVDs e realidade virtual; além de mencionar as interpelações entre mídias tradicionais e novas: os programas televisivos filmados em suportes digitais, editados em plataformas computacionais, os filmes que utilizam imagens produzidas em tecnologia digital 3-D, as manipulações de imagem e texto criadas em computador. Para este autor, a compreensão popular das novas mídias identifica-se com o uso de computador para a distribuição e a exibição, e não à forma como essas mídias são produzidas; entretanto, considera que, para o entendimento dos efeitos da computadorização como um todo, este fator é demasiado limitante.

Manovich aponta, ainda, para o desenvolvimento do que ele chama de “cultura informacional” (2002, p. 13 – tradução da autora), em contraponto a um conceito já conhecido, o de cultura visual. Para ele, o termo engloba as maneiras como a informação é apresentada em diferentes suportes digitais, citando exemplos como placas de sinalização de estradas; displays digitais informativos; menus de televisores; layout gráfico de noticiários televisivos, layout de livros, jornais e revistas; o interior de hotéis, bancos, e outros espaços comerciais e de serviços; as interfaces de carros e de aviões, e, finalmente, as interfaces de sistemas operacionais – Windows, Mac OS, Linux – e as interfaces de softwares.

Dizard (2000) reflete sobre a natureza da interação entre indivíduos e produtos culturais nas novas mídias, que, para ele, caracteriza-se e toma força pela possibilidade de acesso a uma enorme massa de informação:

A mídia velha divide o mundo entre produtores e consumidores: nós somos autores ou leitores, emissores ou telespectadores, animadores ou audiência; como se diz tecnicamente, essa é a comunicação um-todos. A nova mídia, pelo contrário, dá a oportunidade a todos de falar assim como de escutar. Muitos falam com muitos, e muitos respondem de volta. (p. 23)

O teórico Peter Weibel, que em seu ensaio descreve o mundo a partir da noção de interface, apóia-se nos princípios da endofísica, ciência que defende a idéia de que o observador sempre faz parte daquilo que observa, não existindo uma fronteira e separação rígidas entre o

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observador e o que é observado. Para a endofísica, somos partes constituintes do mundo que observamos; portanto, não existe uma objetividade independente do observador.

Juliano Spyer (2009) cita o termo cunhado por Tim O’Reilly em 2004 Internet 2.0 para se referir às características da rede nesse momento: onde o espaço virtual teria se tornado um espaço de co-criação de conteúdos, sem barreiras para acesso à informação. Somos parte ativa do conteúdo a partir do momento em que estamos presentes no cyber espaço.

Entretanto, num meio que se modifica tão rapidamente quanto a internet, essa definição de “espaço sem barreiras” ainda corresponde à realidade das redes? Cruz (2014), em uma pesquisa dez anos mais recente do que a concepção de Internet 2.0 de O’Reilly, preconiza que os desdobramentos das estratégias de aproximação das indústrias de entretenimento com os meios de distribuição digital levaram a uma redefinição de seus produtos e de sua atuação. Com serviços legais de disponibilização gratuita de música, as grandes empresas passaram a pautar os seus lucros cada vez mais no marketing comportamental.

A música como mercadoria muda de natureza comercial em favor de uma nova lógica de valorização, pautada na abundância e na gratuidade de produtos a partir de seu acesso. Ao reforçar a hegemonia de um modelo de negócio pautado no controle do acesso de informações, na criação de ambientes fechados e voltados à valorização – baseado na ação simultânea de suas estratégias de repressão e de inserção – a indústria fonográfica volta a buscar o controle da produção, distribuição e promoção de música gravada ao mesmo tempo que alteram definitivamente a experiência de navegação do usuário e o próprio desenvolvimento da topologia da internet. (CRUZ, 2014, p. 7)

Para Cruz, o antigo paradigma que começa a se desfazer na indústria fonográfica é o da escassez, ou seja, da lógica de transferência de posse – algo que veio da venda física de discos e que tentou-se implantar no meio digital, com as vendas de arquivos em lojas virtuais, como a iTunes, da empresa americana Apple. Insistir na imposição de escassez num ambiente que tende sempre à abundância acabou se mostrando uma estratégia de baixa eficácia, já que a distribuição paga só teria vantagem em relação ao acesso irrestrito por meio de um discurso de legalidade e da repressão judicial.

Para recuperar o poder de negociação, as empresas do setor fonográfico passaram a adotar um modelo de negócios que tende à abundância, por fornecer o acesso aos seus catálogos, e não mais a posse dos suportes de música.

Novos serviços de streaming de música se apoderam da tendência à abundância e à gratuidade da transmissão de dados da internet para redefinir o papel da música, do mercado e do consumidor – aqui, mais propriamente um usuário. Oferecer bens em abundância e gratuitamente aos usuários foi a última e derradeira lição aprendida pelo mercado fonográfico com o compartilhamento de arquivos. (CRUZ, 2014, p. 159)

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Streaming é um modelo de distribuição de música que funciona como um repositório

permanente, onde os usuários podem escolher entre um vasto catálogo de artistas; diferentemente dos downloads, as músicas contidas no streaming não ficam armazenadas nos dispositivos dos usuários. É, portanto, uma forma de acesso, e não de obter um produto digital. Os serviços de streaming, como os de venda direta de música digital, são todos serviços parcialmente independentes das grandes gravadoras.

2.3 DESIGN E ARTE PARA AS NOVAS MÍDIAS

Neste capítulo, pretende-se fazer uma investigação acerca das influências que o contexto da distribuição digital de música exerce nas possibilidades criativas do design gráfico para música.

Plaza e Tavares (1998) afirmam que os novos meios tecnológicos provocam “uma influência de difícil avaliação sobre as formas culturais tradicionais”. Para estes autores, as novas mídias “renovam a criação audiovisual, reformulam a nossa visão de mundo, criam novas formas de imaginários e discursos icônicos, ao mesmo tempo em que recodificam as imagens dos períodos anteriores”.

Para Prado e Ferreira (2009), a arte digital tem ganhado forte apelo interdisciplinar nos últimos anos e tem sido objeto de uma fértil produção acadêmica. Os autores destacam o design gráfico, o motion design e o web design como campos nos quais o impacto das mídias digitais têm mais evidência, mas citam também outras áreas de expressão, como a música e a literatura. Rush (2006), ao traçar um panorama de como se constituem as artes visuais no contexto das novas mídias, considera que a tecnologia digital torna a imagem “infinitamente maleável”, afirmando que ainda precisaria ser desenvolvida uma linguagem estética e crítica para a nova realidade digital.

No espaço eletrônico, o usuário se move através da informação, e a informação em si está em movimento – “é esta atividade cinética que circunscreve nossa percepção, domina nossos sentidos e se torna a nova estética prevalecente” (HELFAND, 2002, p.122 - tradução da autora). Para a designer e teórica, a transposição do mundo físico para o eletrônico implica em uma desmaterialização do espaço e uma relativização da percepção temporal, descrevendo, desta forma, o chamado deslocamento do observador em relação a esse espaço virtual – refutando a noção comum de que o design nas telas é uma sobreposição de planos, a autora aponta para a dinamicidade e para a transitoriedade das mídias, que constituem um espaço de profundidade própria.

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2.4 PERCURSO METODOLÓGICO

Para o desenvolvimento da presente pesquisa, definiu-se a metodologia de pesquisa científica descrita por Antonio Carlos Gil, que define a pesquisa como:

O procedimento racional e sistemático que tem como objetivo proporcionar respostas aos problemas que são propostos. A pesquisa é requerida quando não se dispõe de informação suficiente para responder ao problema, ou então quando a informação disponível se encontra em tal estado de desordem que não possa ser adequadamente relacionada ao problema. (2002, p. 17)

Este autor considera que o planejamento da pesquisa se concretiza na elaboração de um projeto, documento que relacione os objetivos da pesquisa, a justificativa para sua realização, a definição da modalidade de pesquisa e a determinação dos procedimentos de análise (2002, p. 19).

Ao se estabelecerem as etapas de pesquisa, é usual apresentá-las num diagrama de fluxo, para otimizar e facilitar seu acompanhamento:

Figura 11 – Diagrama de metodologia de pesquisa.

Fonte: Adaptado de Gil (2002, p. 21)

Formulação do problema

Seleção da amostra

Coleta de dados

Análise e interpretação dos dados

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2.4.1 Formulação do problema

Para chegar ao problema central da presente pesquisa, partiu-se primeiramente da acepção mais geral (não científica) de problema: observações próprias ao longo da experiência universitária indicavam que a relação entre os músicos que produziam de maneira independente em Curitiba e o público geral poderia se estreitar mais, desta forma contribuindo e incentivando a projeção destes artistas. Entretanto, este questionamento abarca questões em que a pesquisa pode “oferecer sugestões e inferências acerca de possíveis respostas, mas não responder diretamente a esses problemas” (GIL, 2002, p. 24), e serviram mais como motivação pessoal do que propriamente como problema de pesquisa.

Segundo Gil (2002), “pode-se dizer que um problema é de natureza científica quando envolve variáveis que podem ser tidas como testáveis”. Esta acepção e suas implicações foram o ponto de partida para realizar um projeto de pesquisa, em lugar de um projeto gráfico (que seria a ideia original para o presente trabalho de conclusão de curso).

Por não dispor de literatura e referencial que oferecesse ponto de partida razoavelmente ordenado, não haveria como embasar satisfatoriamente a necessidade de um projeto gráfico, mas é exatamente nessa ausência de informações que se justifica a necessidade da pesquisa.

Desta forma, chegou-se ao seguinte problema de pesquisa: como se dá a relação entre os projetos de design gráfico e as mídias musicais disponíveis hoje?

Pretende-se investigar as formas como músicos em atividade atualmente utilizam as mídias das quais dispõem, suas dificuldades e suas possibilidades.

2.4.2 Seleção da amostra

Para Gil, a pesquisa social abrange um “universo” de elementos tão vasto que não seria possível considerá-lo em sua totalidade (1989, p. 91). Por isso, é parte integrante do processo de pesquisa a seleção das amostras, ou seja, de uma pequena parte que compõe o todo. A amostragem que se aplica ao presente trabalho é a descrita por Gil como “não probabilística” (1989, p. 93), ou seja, aquela que não apresenta fundamentação matemática ou estatística, mas que depende unicamente de critérios do pesquisador, o que é aplicável em vista da temática e da qualidade crítica dos casos relacionados ao cenário específico de música independente curitibano.

Tal escolha visa a cumprir os seguintes critérios de seleção: o projeto musical 1) deve ser qualificável como independente; 2) deve ter mais de uma produção lançada entre os anos

Referências

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