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UMA BREVE ANÁLISE DAS DISPOSIÇÕES DA LEI N ° 12.846/13 (LEI ANTICORRUPÇÃO)

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A brief analysis of the provisions of Law no. 12,846 / 13 (Anti-corruption Act)

cintia barUdi lopes morano

Professora de Direito Administrativo das FMU- Faculdades Metropolitanas Unidas e Diretora da Comissão de Direito Administrativo da OAB 116ª Sub-seção do Jabaquara/Saúde. Advogada graduada pela FMU. Especialista em Direito Constitucional pela ESDC - Escola Superior de Direito Constitucional, mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela UNIMES – Universidade Metro-politana de Santos e doutoranda pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP em direito administrativo. E-mail: c.barudi@uol.com.br

Recebidoem:12/02/2016

ApRovAdoem:16/02/2016

doi: 10.5585/Rdb.v11i5.348

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esUmo

A ideia central deste artigo é analisar as principais disposições da Lei n° 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção, destinada à punição das pessoas jurídicas envolvidas em atos fraudulentos em suas relações com a Administração Pública Brasileira, nacional ou internacional. Responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas, mecanismos de compliance, acordos de leniência, sanções de naturezas administrativa e judicial são os enfoques principais do presente estudo.

palavras-chave: coRRupção, impRobidAde AdministRAtivA, Lei n° 12.846/13, Res -ponsAbiLidAdeobjetivAdAspessoAsjuRídicAs, LeniênciAecompliance.

a

bstract

The central idea of this article is to analyze the main provisions of Law No. 12,846 / 2013, known as the Anti-Corruption Act, for the punishment of legal persons involved in fraudulent in its relations with the Brazilian public adminis-tration, national or international acts. Strict liability of legal persons, compliance mechanisms, leniency agreements, penalties, administrative and judicial nature are the major focus of the present study.

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Keywords: coRRuption, AdministRAtive misconduct, LAw no. 12,846 / 13, stRict LiAbiLityofLegALpeRsons, LeniencyAndcompLiAnce.

INTRODUÇÃO

Com a edição da Lei n° 12.846/13, denominada de Lei Anticorrupção, cria-se no ordenamento jurídico brasileiro um sistema de punição de atos lesivos à Ad-ministração Pública, com o nítido objetivo de exterminar, ou pelo menos reduzir os altos índices de corrupção que dominam a esfera governamental.

O Brasil, nos termos do índice de Percepção de Corrupção 2013, lista ela-borada pela organização Transparency International (Transparência Internacional), que avalia os índices de corrupção das instituições políticas e administrativas dos países, fica no 72° lugar.1

Assim, para cercar a corrupção no Brasil em todos os seus ângulos, foi elaborada a Lei n° 12.846/13 a fim de se compor, ao lado da Lei n° 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), um sistema de proteção da moralidade na esfera de atuação da Administração Pública.

Destarte, importante não confundir os objetos de proteção da duas leis ci-tadas acima: a conhecida Lei de Improbidade Administrativa (Lei n° 8.429/92) des-tina-se a punir agentes públicos que cometam ilícitos civis que violam a probidade da Administração Pública por meio de condutas de enriquecimento ilícito, lesão ao erário e atentado contra os princípios administrativos; a nova Lei Anticorrupção (Lei n° 12.846/13) destina-se a punir particulares e pessoas jurídicas privadas que, em suas relações com a Administração Pública, nacional ou estrangeira, cometam atos fraudulentos.

Daí porque o artigo 30 da nova Lei estabelece que suas disposições não afetam os processos decorrentes de atos de improbidade administrativa, de crimes previstos na Lei n° 8.666/93 (Lei Geral das Licitações), inclusive quanto ao RDC, Regime Diferenciado de Contratação, regulado pela Lei n° 12.462/11.

Nesse sentido, transcreve-se:

Art. 30. A aplicação das sanções previstas nesta Lei não afeta os processos de responsabilização e aplicação de penalidades decorrentes de:

I - ato de improbidade administrativa nos termos da Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992; e

II - atos ilícitos alcançados pela Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, ou outras normas de licitações e contratos da administração pública, inclusive no tocante ao Regime Diferenciado de Contratações Públicas - RDC insti-1  Disponível em: http://www.transparency.org/cpi2013/results. Acesso em 14/08/2014.

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tuído pela Lei no 12.462, de 4 de agosto de 2011.

A lei n° 12.846/13, que entrou em vigor dia 29 de janeiro de 2014, sancio-nada com vetos pela atual Presidente, composta de 31 artigos, destina-se a aplicar sanções administrativas e civis a sócios, diretores e funcionários das corporações e a pessoas jurídicas que cometam atos contra o patrimônio e a moralidade da Adminis-tração Pública, nacional ou estrangeira.

Trata-se de mais uma tentativa de punir com rigor aqueles que atentam contra a lisura administrativa em suas relações com a Administração Pública Brasi-leira, contribuindo para diminuir as fraudes e conluios existentes nas relações entre a Administração e os privados. Não basta lembrar que o princípio da moralidade consagrado constitucionalmente (art. 37, caput, da CF) não é de observância obri-gatória apenas à Administração Pública, mas também aos particulares que com ela se relacionam.

Nesse sentido confira-se o artigo 1° da referida Lei:

Art. 1°. Esta Lei dispõe sobre a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pú-blica, nacional ou estrangeira.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto nesta Lei às sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da for-ma de organização ou modelo societário adotado, bem como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangei-ras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, cons-tituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente.

Assim, conforme o disposto no parágrafo único do artigo 1° da Lei Anti-corrupção destaca-se que as pessoas jurídicas de direito público não serão punidas pela nova lei, já que a nova legislação as considera como vítimas do ato lesivo, sendo certo que, nestas condições a União, Estados, Distrito Federal e Municípios poderão propor ação civil pública para responsabilizar os infratores e obter ressarcimento pelo dano sofrido.

Por sua vez, nos termos do artigo 2° da Lei n° 12.846/13, a responsabilida-de das pessoas jurídicas passou a ser objetiva, vale dizer que, não se questiona sobre a demonstração de dolo ou culpa, e, mesmo que o ato lesivo à Administração Pública tenha sido cometido sem o conhecimento dela, a pessoa jurídica responderá civil e administrativamente pelos seus efeitos.

Cite-se o disposto no art. 2°:

Art. 2° As pessoas jurídicas serão responsabilizadas objetivamente, nos âmbitos administrativo e civil, pelos atos lesivos previstos nesta Lei

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prati-cados em seu interesse ou benefício, exclusivo ou não.

No que tange a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas, afirma Eluf Neto2 que “a responsabilidade objetiva é o grande incentivador da adoção de

me-canismos internos de prevenção a infrações. A empresa passará a preocupar-se não apenas com a sua conduta, mas também com a de seus empregados e colaboradores”. Na mesma esteira do raciocínio, Jorge Hage3, Ministro-Chefe da

Contro-ladoria Geral da União, também se manifesta a favor da responsabilização objetiva, afirmando que ela é de “uma importância estratégica extraordinária, porque ninguém mais do que a empresa vai ter a preocupação de vigiar totalmente toda a sua estrutu-ra. A empresa vai passar a ser o melhor fiscal da conduta de empregados e diretores”.

Cuida-se de responsabilidade objetiva que depende da prova do ato lesivo e o nexo de causalidade entre ele e a conduta de seus dirigentes e funcionários, inde-pendentemente de dolo ou culpa destes. Porém, observa-se que se a pessoa jurídica comprovar que o ato não ocorreu, ou que o ato causador do dano não decorreu de seus representantes, fica excluída a responsabilidade por rompimento do nexo cau-sal.

Assim, hipoteticamente, se um empregado, a seu livre arbítrio, oferece propina a um servidor público para a obtenção de uma licença ambiental para a empresa, sem autorização ou consentimento de seus superiores, a tratada empresa poderá sofrer as sanções previstas na Lei Anticorrupção4.

Ressalte-se também que as pessoas físicas, coatoras ou partícipes do ato lesivo, dirigentes e administradores das empresas também responderão pelos seus atos na medida de sua culpabilidade, nos termos da Lei n° 12.846/13.

Art. 3° A responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilida-de individual responsabilida-de seus dirigentes ou administradores ou responsabilida-de qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito.

§1° A pessoa jurídica será responsabilizada independentemente da responsabilização individual das pessoas naturais referidas no caput. §2° Os dirigentes ou administradores somente serão responsabilizados por atos ilícitos na medida da sua culpabilidade.

Vale dizer então que os representantes, sócios e dirigentes das pessoas jurí-dicas somente responderão por seus atos se tiverem agido com culpa ou dolo. 2  Jornal do Advogado – Ano XXXIX – n° 391 – Fevereiro/2014, p. 16. 3  Ibid., mesma página.

4  Disponível em http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI202081,-21048-A+nova+lei+anticorrupcao; Acesso em 16/10/2014.

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Diogo de Figueiredo Moreira Neto e Rafael Véras de Freitas5, em artigo

publicado sobre o tema, explicam que:

Assim, de acordo com a sistemática prevista na Lei nº 12.846/2013, os dirigentes ou administradores das pessoas jurídicas só serão responsabilizados pelos atos de corrupção se for comprovado que agiram com dolo ou culpa grave. Ressalte-se, porém, por relevante, que só poderão ser responsabilizados os dirigentes e admi-nistradores de pessoas jurídicas que agirem orientados pelo dolo específico de lesio-nar a probidade da Administração Pública, não alcançando os inábeis e imperitos.

Esse, aliás, sempre foi o entendimento que pautou a responsabilização dos agentes administrativos, por atos de improbidade administrativa, como se extrai do seguinte julgado da lavra do Superior Tribunal de Justiça:

O ato ilegal só adquire os contornos de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvada pela má-intenção do administrador, caracterizando a conduta dolosa; a aplicação das severas sanções previstas na Lei 8.429/92 é

acei-tável, e mesmo recomendável, para a punição do administrador desonesto (conduta dolosa) e não daquele que apenas foi inábil (conduta culposa).

(STJ. REsp 1186192/MT, 1ª Turma. Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julg. 12.11.2013. DJe, 02 dez. 2013, grifos nossos)

Pela redação do artigo 3°, verifica-se que o legislador, nitidamente, preten-de separar a responsabilidapreten-de individual das pessoas naturais dirigentes em relação à responsabilidade da respectiva pessoa jurídica. Esta responderá de maneira indepen-dente em relação às pessoas naturais referidas no caput deste artigo 3°.

Para as empresas a responsabilidade é objetiva e para seus representantes a responsabilidade é subjetiva.

O artigo 4° da nova legislação também é digno de destaque.

O legislador, a fim de fechar o cerco contra a corrupção, notadamente, nos casos de criação de empresas de fachada, estatui no citado artigo que nas hipóteses de fusão e incorporação de empresas, a sucessora terá responsabilidade restrita ao pagamento de multa e reparação integral do dano proporcional ao limite do patri-mônio transferido. Assim, a sucessora não responderá, em princípio, pelas demais sanções previstas na Lei no que tange aos atos praticados antes das operações de fusão e incorporação, salvo comprovada fraude.

Além disso, a Lei ainda estabelece que as empresas controladoras, con-troladas, coligadas e consorciadas são responsáveis solidariamente entre elas cuja 5  MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo e FREITAS, Rafael Véras de. A

juridicidade da Lei Anticorrupção – Reflexões e Interpretações prospectivas.

Dispo-nível em http://www.fsl.adv.br/sites/www.fsl.adv.br/files/a_juridicidade_da_lei_an-ticorrupcao_-_inclusao_em_20.02.14.pdf

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responsabilidade fica adstrita à obrigação de pagar multa e reparar integralmente os danos causados.

Art. 4° Subsiste a responsabilidade da pessoa jurídica na hipótese de alte-ração contratual, transformação, incorpoalte-ração, fusão ou cisão societária. §1° Nas hipóteses de fusão e incorporação, a responsabilidade da suces-sora será restrita à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado, até o limite do patrimônio transferido, não lhe sendo aplicáveis as demais sanções previstas nesta Lei decorrentes de atos e fatos ocorridos antes da data da fusão ou incorporação, exceto no caso de simu-lação ou evidente intuito de fraude, devidamente comprovados.

§2° As sociedades controladoras, controladas, coligadas ou, no âmbito do respectivo contrato, as consorciadas serão solidariamente responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei, restringindo-se tal responsabi-lidade à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado.

Dessa forma, pela leitura do dispositivo acima transcrito, claro está que a responsabilidade solidária entre as empresas coligadas, controladas e consorciadas é uma prática interessante para possibilitar a efetiva reparação dos danos causados pelos atos fraudulentos de empresas.

Cuida-se de prática inspirada em disposição já existente e vigorante no di-reito brasileiro que estabelece a responsabilidade solidária, tanto na fase de licitação, quanto na fase de execução do contrato administrativo, nos casos de participação de consórcios empresariais nos procedimentos licitatórios.

De fato, o artigo 33, inciso V da Lei n° 8.666/93 assim prevê:

Art. 33. Quando permitida na licitação a participação de empresas em con-sórcio, observar-se-ão as seguintes normas:

V - responsabilidade solidária dos integrantes pelos atos praticados em consórcio, tanto na fase de licitação quanto na de execução do contrato. Carlos Ari Sundfeld e Jacintho Arruda Câmara, em artigo publicado sobre os consórcios de empresas em licitações6, comentam a respeito que:

Percebe-se, portanto, que a previsão de responsabilidade solidária entre 6  Disponível em http://www.direitodoestado.com/revista/REDAE-15-A-GOSTO-2008-CARLOS%20ARI%20SUNDFELD.pdfAcesso em 25/09/2014. Publicação Impressa: SUNDFELD, Carlos Ari e CÂMARA, Jacintho Arruda. A responsabilidade solidária dos Consórcios e das concessões. Revista Brasileira de

Direito Público – RBDP. Ano 2, n 07, out./dez. 2004. Belo Horizonte: Fórum, 2003.

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as integrantes de consórcios está intimamente vinculada ao fato de não existir uma pessoa jurídica única assumindo a participação no certame e a execução do contrato. O consórcio é figura desprovida de personalidade jurídica. Desta forma, para evitar que a Administração tenha de cobrar de todos os integrantes o cumprimento de uma obrigação e que se envolva na disputa interna dos consorciados quanto ao papel de cada um na execução do objeto, a Lei institui a responsabilidade solidária entre eles. Essa providência legislativa autoriza a Administração (credora) a cobrar de qualquer um das empresas, conforme sua conveniência.

Enfim, a responsabilidade solidária entre todas as empresas coligadas, con-sorciadas ou controladas é uma garantia para que os danos causados por atos lesivos empresariais possam ser perseguidos e exigidos das pessoas jurídicas envolvidas ou, de uma delas isoladamente, com direito de regresso desta em face das demais. 1. DOS ATOS LESIVOS À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NACIONAL OU ESTRANGEIRA

Os atos lesivos à Administração Pública Nacional ou Estrangeira encon-tram-se elencados no artigo 5° da Lei n° 12.846/13. Verifica-se que o Legislador Ordinário, preocupado com a crescente corrupção ocorrida nos procedimentos lici-tatórios, elencou ainda várias condutas diretamente relacionadas às licitações e aos contratos administrativos.

A lei n° 8.666/93 é criticada como sendo uma das legislações responsá-veis pela crescente corrupção desenvolvida no âmbito dos contratos administrativos. Apesar de ser considerada uma legislação rígida, a burocracia nela contida contri-buiu para a celebração de contratos com a Administração Pública marcados pelos conluios, conchavos e formação de cartéis.

Confira-se então a lista de condutas fraudulentas punidas pela nova lei: Art. 5° Constituem atos lesivos à administração pública, nacional ou es-trangeira, para os fins desta Lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1o, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da adminis-tração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos:

I - prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada;

II - comprovadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei;

III - comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos benefi-ciários dos atos praticados;

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IV - no tocante a licitações e contratos:

a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro ex-pediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público; b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedi-mento licitatório público;

c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo;

d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente;

e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo;

f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de mo-dificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou

g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública;

V - dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional.

§1° Considera-se administração pública estrangeira os órgãos e entidades estatais ou representações diplomáticas de país estrangeiro, de qualquer nível ou esfera de governo, bem como as pessoas jurídicas controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público de país estrangeiro.

§2° Para os efeitos desta Lei, equiparam-se à administração pública estrangeira as organizações públicas internacionais.

§3° Considera-se agente público estrangeiro, para os fins desta Lei, quem, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, exerça cargo, emprego ou função pública em órgãos, entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro, assim como em pessoas jurídicas controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público de país estrangeiro ou em organizações públicas internacionais.

Antônio Carlos Nóbrega7 comenta de forma bem clara a respeito das

con-dutas legais:

Vamos imaginar quatro exemplos: locadora de veículos que pretende par-ticipar de licitação de governo estadual para prestação deste serviço e paga quantia 7  NOBREGA, Antônio Carlos. A Nova Lei de Responsabilização de Pessoas Jurí-dicas como Estrutura de Incentivos aos Agentes - The Anticorruption Act of Enterprises as Incentives Structure of Agents. Economic Analysis of Law Review- EALR, V. 5, nº 1, p. 138-152, Jan-Jun, 2014.

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para que outras empresas concorrentes do ramo não participem do certame; res-taurante de luxo que oferece refeições a fiscais para obter facilidades em vistorias; empresa declarada inidônea que se utiliza de outra pessoa jurídica para prestar ser-viços e receber valores da administração, e; estabelecimento comercial que omite documentação necessária à fiscalização de órgãos de defesa do consumidor. Pois bem, apesar da diversidade, todas as práticas mencionadas estão abarcadas pelo art. 5º da lei. Nos termos desse dispositivo, constituem “atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira (...) todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1°, que atentem contra o patrimônio públi-co nacional ou estrangeiro, públi-contra princípios da administração pública ou públi-contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil”. Adiante, o legislador elencou um rol de cinco incisos com condutas que caracterizam a prática de atos contra a administração pública. Não é o objetivo do presente estudo o debate de todos os dispositivos lapidados nos incisos subsequentes ao art. 5º. Todavia, deve-se des-tacar que a lei dispensou uma atenção especial aos delitos relativos a licitações e contratos, considerando as sete alíneas que se encontram no inciso IV, incluindo aí as seguintes condutas: impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público, fraudar licitação pública ou contrato dela decorren-te e manipular ou fraudar o equilíbrio econômicofinanceiro dos contratos celebrados com a administração pública.

Basta saber se a lista de condutas lesivas à Administração Pública prevista neste artigo 5° comtempla um rol taxativo ou meramente exemplificativo. É um questionamento que poderá surgir na doutrina a respeito da nova legislação.

Talvez a melhor interpretação seja considerar o rol do artigo mencionado como exemplificativo, seguindo os moldes do que ocorre com as condutas de im-probidade administrativa, cujos artigos 9°, 10 e 11 da Lei n° 8429/92 preveem em amplitude as condutas para que as punições possam ser as mais completas possíveis. Ressalte-se, ainda, que a Lei não deixou de lado atos ilícitos que ocorram contra a Administração Pública estrangeira, devidamente definida no §1° do art. 5°, equiparando-se à Administração Estrangeira os organismos internacionais.

Finalmente, o artigo 28 estabelece que “a Lei aplica-se aos atos lesivos praticados por pessoa jurídica brasileira contra a administração pública estrangeira, ainda que cometidos no exterior”.

2. A EMPRESA EM COMPLIANCE

Conforme já dito acima, a Lei Anticorrupção transfere à empresa o dever de compliance, (palavra inglesa que vem do verbo to comply, que significa cumprir), ou seja, o dever de cumprimento das regras internas e externas de uma determinada atividade.

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com-portamentos cometidos por seus integrantes. É a ideia da boa prática da governança corporativa. Adoção de medidas preventivas e de combate à corrupção que deverão ser incrementadas através de um programa de compliance. As empresas devem mostrar que agem de boa-fé em suas relações com a Administração Pública.

Com o passar dos anos ficou assentada a necessidade de uma efetiva pre-venção contra os atos de corrupção, tendo em vista os males sociais e orçamentários gerados pelas condutas fraudulentas de empresas e de governantes.

Moreira Neto8, sobre o tema, alerta que:

Como já teve a oportunidade de asseverar um dos subscritores do presente, a corrupção “é a antítese da democracia, pois que, afinal, esta praga social nada mais é que a negação de ambas essas áureas regras civilizadoras — da antiga e da nova — daí a importância e a urgência de sua erradicação em nosso País, uma vez que uma democracia corrompida nada mais produz que um grotesco simulacro de justiça”9.

Trata-se de fenômeno social, diretamente, relacionado com a eficácia e a credibilidade da gestão pública, razão pela qual a sua proliferação propicia não só a redução de investimentos no País, como o agravamento das desi-gualdades sociais.

Com efeito, de acordo com o relatório da Federação das Indústrias de São Paulo (FIESP), estima-se que o custo médio da corrupção no Brasil varia de 1,38% a 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB), o que vale dizer que os recursos públicos desperdiçados com essa prática ascendem de R$50,8 bilhões a R$84,5 bilhões por ano.

Para se ter ideia de grandeza, tais valores correspondem à verba investida, pelo Governo Federal, no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), en-tre os anos de 2007 e 2010, na implantação, manutenção e reestruturação de rodovias, ferrovias, aeroportos, portos e hidrovias.

Assim, a prevenção e o combate à corrupção dependem de um programa de medidas voltadas à transparência das organizações corporativas, à criação de canais internos de denúncias, à confiabilidade delas junto aos clientes e consumidores, controle da gestão financeira da empresa, mecanismos de controle dos contratos ad-ministrativos e ainda elaboração de um código de ética aplicado aos seus emprega-dos e dirigentes.

Felipe Faria, advogado especialista em compliance, esclarece que: 8  MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo e FREITAS, Rafael Véras de. A

juridicidade da Lei Anticorrupção – Reflexões e Interpretações prospectivas.

Dispo-nível em http://www.fsl.adv.br/sites/www.fsl.adv.br/files/a_juridicidade_da_lei_an-ticorrupcao_-_inclusao_em_20.02.14.pdfAcesso em 08/09/2014.

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Tramita atualmente na Casa Civil a minuta de regulamentação da Lei An-ticorrupção que virá possivelmente elucidar alguns requisitos essenciais de um pro-grama de compliance conforme entendimento do governo. De acordo com tal minu-ta, são basicamente os requisitos de um programa de compliance o compromisso e apoio explícito do alto escalão da empresa, políticas e procedimentos claros aplicá-veis para todos, uma pessoa ou grupo responsável dentro da empresa pela aplicação do Programa, comunicação e treinamento para os empregados, monitoramento e au-ditoria, canal de denúncias e orientação, investigação e ações corretivas, e a análise de reputação de terceiros.10

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, órgão integran-te da ONU, que integran-tem por objetivo promover o desenvolvimento e a erradicação da pobreza chegou a propor em 2004 uma série de medidas a serem adotadas pelas em-presas visando a melhoria da gestão organizacional, dentre as quais se pode destacar:

1) Diminuir as oportunidades de corrupção por meio da simplificação de procedimentos e regulamentações, e por intermédio do incremento da qua-lidade no uso da tecnologia da informação.

2) Minimizar o poder discricionário daqueles que têm poder de decisão. 3) Desmistificar e despersonalizar a ação governamental por meio de me-canismos de transparência e acesso à informação dos públicos interessa-dos.

4) Promover a meritocracia no ambiente organizacional.

5) Aprimorar a gestão financeira e os mecanismos de controle, utilizando sistemas de contabilidade eficientes, combinados com atividades de audi-torias internas e independentes.

6) Estruturar e assegurar o suporte legal no combate à corrupção.

7) Educar as novas gerações no tocante à ação ética e cidadã no trato dos negócios.11

Destaca-se também que o artigo 7°, VIII da Lei Anticorrupção estabelece uma atenuante para as empresas que demonstrarem um programa interno de controle e de prevenção dos atos de corrupção. Nesse sentido, transcre-ve-se o citado artigo:

Art. 7º Serão levados em consideração na aplicação das sanções: [...] 10  Disponível em http://www.brasilpost.com.br/felipe-faria/compliance-lei -anticorrupcao_b_5029162.htmlAcesso em 09/09/2014.

11  PARDINI, Daniel Jardim, COSTA, Yuri Richard da Silva, MATUCK, Pris-cila de Jesus Papazissis e FILHO, Antonio Dias Pereira. Práticas de Corrupção e Mecanismos de Controle e Prevenção em Bancos Brasileiros: um Estudo sob a Pers-pectiva de Gerentes e Funcionários. Disponível em http://www.anpad.org.br/admin/ pdf/CON2931.pdf - XXXV Encontro da ANPAD – Rio de Janeiro de 4 a 7 de setem-bro de 2011.

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VIII - a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica; [...].

Acredita-se que as medidas a serem adotadas internamente pelas empresas deverão receber uma modelagem do governo por meio de diretrizes e normatizações. A doutrina ainda indica como parâmetro para a adoção das medidas de prevenção à corrupção o Decreto nº 1.171, de 22 de junho de 1994, que aprova o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal.

Acontece, contudo, que tal legislação ainda carece de regulamentação, por não ser autoaplicável, de modo que, a autoridade administrativa não poderá deixar de considerar tal atenuante mesmo quando entender que a estrutura interna de

com-pliance não esteja adequada às suas orientações.

Nesse sentido, Moreira Neto e Freitas explanam que:

Portanto, se ainda não há uma previsão regulamentar, genérica e abstrata, de como esses procedimentos internos de integridade devem ser constituí-dos, tem-se que a desconsideração, pelas autoridades administrativas, dos atos internos elaborados, no período de vacatio da Lei Anticorrupção, será ato pautado pelo arbítrio, maculado pela pecha do desvio de finalidade, por violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, inciso LV, da CRFB) e da presunção da inocência (art. 5º, inciso LVII, da CRFB).12

Finalmente, quando tais legislações sejam efetivamente regulamentadas, a doutrina administrativa caminha para considerar a atenuante às empresas em

com-pliance como um ato vinculado, de modo que uma vez cumpridas as exigências

le-gais pelas empresas não há qualquer margem de escolha fornecida ao administrador para verificar se concede ou não o benefício.

3. DAS SANÇÕES PREVISTAS EM LEI E O ACORDO DE LENIÊNCIA O artigo 6° da nova lei prevê as sanções administrativas aplicadas à pessoa jurídica responsável pelos atos lesivos à probidade da Administração Pública. Con-fira-se nesse sentido o dispositivo abaixo.

Art. 6º Na esfera administrativa, serão aplicadas às pessoas jurídicas con-12  MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo e FREITAS, Rafael Véras de. A juridicidade da Lei Anticorrupção – Reflexões e Interpretações prospectivas. Dispo-nível em tp://www.fsl.adv.br/sites/www.fsl.adv.br/files/a_juridicidade_da_lei_anti-corrupcao_-_inclusao_em_20.02.14.pdf

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sideradas responsáveis pelos atos lesivos previstos nesta Lei as seguintes sanções:

I - multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será infe-rior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação; e

II - publicação extraordinária da decisão condenatória.

§1º As sanções serão aplicadas fundamentadamente, isolada ou cumulativamente, de acordo com as peculiaridades do caso concreto e com a gravidade e natureza das infrações.

§2º A aplicação das sanções previstas neste artigo será precedida da manifestação jurídica elaborada pela Advocacia Pública ou pelo órgão de assistência jurídica, ou equivalente, do ente público.

§3º A aplicação das sanções previstas neste artigo não exclui, em qualquer hipótese, a obrigação da reparação integral do dano causado.

§4º Na hipótese do inciso I do caput, caso não seja possível utilizar o critério do valor do faturamento bruto da pessoa jurídica, a multa será de R$6.000,00 (seis mil reais) a R$60.000.000,00 (sessenta milhões de reais). Fazendo-se uma análise da legislação anticorrupção, verifica-se que a Administração Pública possui duas espécies sancionatórias: multa e publicação ex-traordinária da condenação. Quanto ao valor da multa aplicável à pessoa jurídica é importante destacar um ponto crucial: a imposição de um valor desarrazoado pode implicar a violação do exercício da atividade profissional da empresa, trazendo gra-vames a sua livre iniciativa.

Dessa forma, espera-se do Administrador um senso de ponderação na fixa-ção do quantum sancionatório, de modo que o princípio da proporcionalidade (que engloba o sentido de razoabilidade) passa a ser o maior limitador da conduta puni-tiva praticada pelas autoridades administrapuni-tivas, que deverão agir com bom senso e sem abusos, de modo que a sanção deve ser aplicada na medida exata para a devida punição.

Odete Medauar, em sua obra, deixa bem clara esta ideia:

O princípio da consiste, principalmente, no dever de não serem impostas, aos indivíduos em geral, obrigações, restrições ou sanções em medida su-perior àquela estritamente necessária ao atendimento do interesse público, segundo critério de razoável adequação dos meios aos fins. Aplica-se a todas as atuações administrativas para que sejam tomadas decisões equi-libradas, refletidas, com avaliação adequada da relação custo-benefício, aí incluído o custo social.13

(14)

Sílvio Luis Ferreira da Rocha, ao comentar sobre os princípios aplicáveis à sanção administrativa, também reforça a necessidade de ponderação:

A sanção imposta deve ser razoável (princípio da razoabilidade), o que significa que ela deve ser justificada pela compatibilidade lógica entre a infração – conduta que se quer punir – e a sanção. Seria irrazoável a imposição da sanção de interdição do estabelecimento comercial que não tivesse exibido em seu interior o cartaz com o número do telefone do órgão de proteção ao consumidor. Deve haver adequação entre a conduta punível e a sanção.

A sanção imposta deve ser proporcional – princípio da proporcionalidade -, o que denota que, mesmo que haja razoabilidade na sanção imposta, ela não deve ultrapassar o necessário.14

Ademais, cabe esclarecer que a lei anticorrupção se preocupou em definir a autoridade competente para instauração e julgamento do processo administrativo de responsabilidade das pessoas jurídicas apenas na esfera federal, uma vez que o artigo 8° da legislação em comento estabelece que será competente a autoridade adminis-trativa máxima de cada órgão ou entidade dos Poderes estatais.

O §2° do mesmo artigo ainda estabelece uma competência concorrente na esfera federal à Controladoria-Geral da União para a instauração dos processos administrativos ou avocação daqueles já instaurados.15

Veja, assim, que não foi definida na Lei n° 12.846/2013 a competência ad-ministrativa nos Estados, Distrito Federal e Municípios, de maneira que estes entes federados, enquanto não for regulamentada sua competência pela respectiva lei esta-dual, distrital e municipal, não poderão lançar das penalidades previstas no artigo 6°.

Pedro Henrique Poli de Figueiredo argumenta a respeito que:

Não é demais lembrar que o exercício do poder de polícia, seja preventivo e aqui se pode fazer referência ao acordo de leniência previsto na lei – seja repres-sivo, envolvendo as ordens, proibições e, principalmente, aplicações de sanções, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 150.

14  ROCHA, Sílvio Luis Ferreira da. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 2013, p. 622.

15  Art. 8° A instauração e o julgamento de processo administrativo para apura-ção da responsabilidade de pessoa jurídica cabem à autoridade máxima de cada ór-gão ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que agirá de ofício ou mediante provocação, observados o contraditório e a ampla defesa.§1° A compe-tência para a instauração e o julgamento do processo administrativo de apuração de responsabilidade da pessoa jurídica poderá ser delegada, vedada a subdelegação.§2° No âmbito do Poder Executivo federal, a Controladoria-Geral da União - CGU terá competência concorrente para instaurar processos administrativos de responsabili-zação de pessoas jurídicas ou para avocar os processos instaurados com fundamento nesta Lei, para exame de sua regularidade ou para corrigir lhes o andamento.

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dependem de que haja expressa previsão em regra de direito, que estabeleça a auto-ridade competente e o devido procedimento, sem o que não pode ser exercido. Neste caso, necessário se faz lei de cada ente federado, já que a lei federal, a Lei 12.846/93, se revela insuficiente para gerar autonomamente reflexos nas outras esferas federa-das. Em relação à responsabilidade civil, a Lei em nada inova, já que o dever de re-paração civil por parte do causador do dano se encontra em fartas fontes normativas nacionais, inclusive no Código Civil.

Assim, conclui-se ser indispensável aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, que pretendam se valer dos instrumentos normativos e prerrogativas da Lei Anticorrupção, que elaborem projetos de lei que estabeleçam o procedimento próprio e a competência para a aplicação de sanções no âmbito de seus poderes, sob pena de invalidade das sanções que pretendam aplicar.16

Quanto à sanção de publicação extraordinária da condenação cabem algu-mas considerações. Trata-se de uma publicação em meios de comunicação de grande circulação ou de circulação nacional, às custas do infrator, obviamente. A lei foi além ao estabelecer que tal publicação ainda poderá ser feita por meio de edital a ser afixado no estabelecimento da pessoa jurídica violadora, visível ao público e no site eletrônico.

A publicação extraordinária da decisão condenatória, prevista no art. 6º, II, da Lei nº 12.846 de 2013, será aplicada por meio do Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP, criado pela lei para cumprir o papel de informar e armazenar tais condenações.

Ressalta-se também o disposto nos artigos 13 e 14 da nova lei:

Art. 13. A instauração de processo administrativo específico de reparação integral do dano não prejudica a aplicação imediata das sanções estabelecidas nesta Lei.

Parágrafo único. Concluído o processo e não havendo pagamen-to, o crédito apurado será inscrito em dívida ativa da fazenda pública.

Art. 14. A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sem-pre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão pa-trimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração, observados o contraditório e a ampla defesa.

O artigo 13 autoriza a instauração de processo administrativo para a repara-ção integral do dano, independente de demanda judicial, sendo que o Poder Judiciá-rio só será acionado nesta hipótese em ação de execução caso não haja pagamento. 16  FIGUEIREDO, Pedro Henrique Poli de. A Lei Anticorrupção nos Estados e Municípios. Revista Panorama Legal – Edição Especial/Maio 2014, p. 4 a 6.

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Quanto ao artigo 14, há autorização legal para que a desconsideração da pessoa jurídica também possa ocorrer na esfera administrativa.

Vale mencionar que a desconsideração da personalidade jurídica aqui pre-vista adotou a chamada “Teoria Maior” da desconsideração, prepre-vista no art. 50 do Código Civil de 2002, que exige a verificação do abuso da personalidade em caso de desvio de finalidade ou confusão patrimonial, e não a “Teoria Menor”, que se contenta com a mera insolvência e é prevista no § 5º do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor.17

Por sua vez, o artigo 16 e os seguintes estabelecem as disposições para reger os chamados acordos de leniência. Este instituto não é uma novidade no direi-to brasileiro haja vista que a Lei n° 8.884/94 já o prevê. De fadirei-to, conforme a citada legislação, que cuida das infrações contra a ordem econômica, a pessoa física ou jurídica infratora poderá celebrar acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Eco-nômico para participar das investigações, colaborando com a obtenção de provas cabais para a punição dos violadores, ganhando, em contrapartida, a extinção da sua punibilidade ou redução de pena.

Assim, pode-se dizer que o acordo de leniência, fruto da experiência norte americana, é o ajuste que permite ao infrator participar da investigação, com o fim de prevenir ou reparar dano de interesse coletivo18.

Confira-se o disposto no artigo 16 da Lei Anticorrupção sobre tais acor-dos:

Art. 16. A autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa colaboração resulte:

I - a identificação dos demais envolvidos na infração, quando couber; II - a obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração.

§1° O acordo de que trata o caput somente poderá ser celebrado se preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:

I - a pessoa jurídica seja a primeira a se manifestar sobre seu interesse em 17  MAGALHÃES, João Marcelo Rego. Aspectos Relevantes da Lei Anticor-rupção Empresarial Brasileira (Lei n° 12.846/20130. Disponível em http://www. tce.ce.gov.br/component/jdownloads/finish/347-revista-controle-volume-xi-n-2-de-zembro-2013/2290-artigo-2-aspectos-relevantes-da-lei-anticorrupcao-empresarial -brasileira-lei-n-12-846-2013?Itemid=592; Acesso em 16/10/2014.

18  CAMARGO, Marcelo Ferreira de. O acordo de Leniência no sistema

jurídi-co brasileiro. Disponível em http://www.ambito-juridijurídi-co.jurídi-com.br/site/index.php?n_

(17)

cooperar para a apuração do ato ilícito;

II - a pessoa jurídica cesse completamente seu envolvimento na infração investigada a partir da data de propositura do acordo;

III - a pessoa jurídica admita sua participação no ilícito e coopere ple-na e permanentemente com as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento.

Talvez possa surgir uma dúvida ante as disposições acima: o acordo de leniência não representaria violação ao princípio da indisponibilidade do interesse público uma vez que se trata de uma conduta negocial da Administração que pode resultar em redução de penalidades e até isenção de algumas delas?

Acredita-se sinceramente que não. Cuida-se de um ato negocial com previ-são expressa de lei em que Administração celebra acordo para atender mais eficien-temente o interesse público primário, sem abrir mão dele, portanto. O objetivo pri-mordial é repreender empresas envolvidas em escusas negociações em suas relações com a Administração e muitas vezes com a organização de esquemas gigantescos que somente com a colaboração de envolvidos é possível desvendá-los.

Outra dúvida que vem sendo levantada na doutrina é a que diz respeito ao terceiro requisito para se efetivar um acordo de leniência. A lei exige no citado §1° do artigo 16 que a empresa confesse sua participação nos ilícitos e essa confissão seria o mesmo que produzir prova contra si mesma, conduta processual esta proibida no ordenamento jurídico brasileiro. Moreira Neto e Freitas, manifestam-se sobre a questão e com maestria aludem que:

Não obstante a utilidade desse instituto da administração pública consen-sual, o terceiro requisito para sua celebração desta Lei se encontra maculado pela pecha da inconstitucionalidade.

Isso porque “a admissão da participação no ilícito” corresponde, ao fim e ao cabo, em fazer prova contra si, o que viola o disposto no artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição da República e o artigo 14, 3, “g”, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, do qual o Brasil é signatário19.

Cabe citar que a Lei ainda prevê sanções a serem aplicadas pelo Poder Ju-diciário. Pela análise do artigo 19 da legislação, percebe-se que as sanções judiciais têm uma gradação, podendo chegar até a dissolução compulsória da pessoa jurídica (sanção mais grave), dependendo do caso.

Art. 19. Em razão da prática de atos previstos no art. 5o desta Lei, a União,

os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por meio das respectivas Advocacias 19  MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo e FREITAS, Rafael Véras de. A

juridicidade da Lei Anticorrupção – Reflexões e Interpretações prospectivas.

Dis-ponível em tp://www.fsl.adv.br/sites/www.fsl.adv.br/files/a_juridicidade_da_lei_an-ticorrupcao_-_inclusao_em_20.02.14.pdf

(18)

Públicas ou órgãos de representação judicial, ou equivalentes, e o Ministério Públi-co, poderão ajuizar ação com vistas à aplicação das seguintes sanções às pessoas jurídicas infratoras:

I - perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;

II - suspensão ou interdição parcial de suas atividades; III - dissolução compulsória da pessoa jurídica;

IV - proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.

§ 1o A dissolução compulsória da pessoa jurídica será determinada quando

comprovado:

I - ter sido a personalidade jurídica utilizada de forma habitual para facili-tar ou promover a prática de atos ilícitos; ou

II - ter sido constituída para ocultar ou dissimular interesses ilícitos ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados.

§ 2o (VETADO).

§ 3o As sanções poderão ser aplicadas de forma isolada ou cumulativa.

§ 4o O Ministério Público ou a Advocacia Pública ou órgão de representação

judicial, ou equivalente, do ente público poderá requerer a indisponibilidade de bens, direitos ou valores necessários à garantia do pagamento da multa ou da reparação integral do dano causado, conforme previsto no art. 7o,

ressalvado o direito do terceiro de boa-fé.

Tais penalidades serão aplicadas em demanda judicial que seguirá o rito da Lei da Ação Civil Pública (Lei n° 7347/85), de modo que a responsabilização da pessoa jurídica na esfera administrativa não afastará sua responsabilização na esfera judicial (deve-se evitar apenas a dupla punição ou “bis in idem” em relação ao mesmo fato).

Percebe-se, assim, que as sanções judiciais também podem se revestir de uma gravidade considerável. Por isso, os juízes, igualmente como se espera na esfera administrativa, também devem aplica-las com ponderação e equilíbrio, a fim de que não se cometam injustiças e abusos, de maneira que a palavra da vez será de novo a já citada proporcionalidade.

Quanto à prescrição, preceitua o artigo 25 da Lei nº 12.846/2013 que “prescrevem em 5 (cinco) anos as infrações previstas nesta Lei, contados da data da ciência da infração ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado”.

(19)

Por outro lado, a Lei silencia quanto ao ressarcimento ao erário (reparação integral do dano). Acredita-se que quanto a ele, aplicar-se-á o disposto no artigo 37, §5° da atual Constituição Federal, para quem o ressarcimento ao erário é imprescri-tível.

Finalmente, importante frisar que a Lei anticorrupção, Lei n° 12.846/2013, já recebeu regulamentação no Estado de São Paulo, por meio do decreto 60. 106/2014, assim como nos Estados do Paraná e de Tocantins, faltando ainda que a regulamen-tação ocorra no plano do Poder Executivo Federal, o que se espera seja realmente realizada para que haja a efetiva aplicação da nova legislação.

CONCLUSÕES

Com a Lei Anticorrupção forma-se no ordenamento jurídico brasileiro um verdadeiro sistema de punição da corrupção, cancro socioeconômico que afeta o país há milhares de anos. Ao lado da Lei de Improbidade Administração, a nova legislação agora pretende punir em especial a pessoa jurídica envolvida em atos de corrupção com a Administração Pública Brasileira, nacional e estrangeira.

Sem sombra de dúvidas, a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica envolvida em atos fraudulentos é o grande mecanismo para possibilitar a punição deste ente fictício que, passa a ser considerado pela nova Lei, como o principal fiscal da conduta de seus membros, integrantes e colaboradores.

Os mecanismos de compliance adotados legalmente, a exemplo daqueles já existentes em outras legislações brasileiras, forçam a construir no ambiente cor-porativo e empresarial uma conduta de ética e de cultura voltada à moralidade das empresas ao se relacionarem com a Administração Pública.

Da mesma forma, os acordos de leniência, por mais estranhos que possam se apresentar no plano do direito administrativo, visam beneficiar aqueles que contri-buem efetivamente para as investigações e punições dos envolvidos, destacando-se como instrumentos de relevante contribuição para desvendar esquemas mirabolantes pactuados pelas empresas, em especial durante os procedimentos licitatórios.

Claro que a nova legislação ainda carece de algumas regulamentações e de outras definições, quando, por exemplo, se refere à competência para instauração e julgamento dos processos administrativos de responsabilização dos envolvidos em que se limita a estabelecer apenas as autoridades administrativas competentes na esfera federal.

Espera-se, também, que as sanções aplicadas aos violadores, seja na esfe-ra administesfe-rativa, seja na esfeesfe-ra judicial, decoresfe-ram de pondeesfe-ração e bom senso, de modo que, como já foi dito ao longo desta pesquisa, a palavra da vez é a proporcio-nalidade ou razoabilidade.

Acredita-se, sinceramente, que a nova legislação irá contribuir para uma moralização das relações privadas com a Administração Pública. Sabe-se, também,

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que a Lei n° 12.846/2013 não será capaz de acabar com a corrupção do país. A cor-rupção está intimamente ligada à forma pela qual o Brasil construiu sua história, às precárias condições socioeconômicas de boa camada da população brasileira e o baixo índice educacional do povo.

Porém, tem-se a esperança que a Lei Anticorrupção possa nos ajudar a dar cabo ao tão conhecido e chamado “jeitinho brasileiro”, que tantos males trouxe e vem trazendo para os cofres públicos no Brasil, impedindo a realização de vários direitos sociais dos quais a nação ainda é deficitária e carente.

REFERÊNCIAS

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PARDINI, Daniel Jardim, COSTA, Yuri Richard da Silva, MATUCK, Priscila de Jesus Papazissis e FILHO, Antonio Dias Pereira. Práticas de Corrupção e Mecanis-mos de Controle e Prevenção em Bancos Brasileiros: um Estudo sob a Perspecti-va de Gerentes e Funcionários. Disponível em http://www.anpad.org.br/admin/pdf/ CON2931.pdf - XXXV Encontro da ANPAD – Rio de Janeiro de 4 a 7 de setembro de 2011.

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