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Segurança pública e direitos humanos no estado democrático de direito

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GIOVANE DA COSTA FIGUEIREDO

SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Ijuí/RS 2010

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GIOVANE DA COSTA FIGUEIREDO

SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DEJ – Departamento de Estudos Jurídicos.

Orientadora: MSc. Ester Eliana Hauser

Ijuí/RS 2010

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Dedico este trabalho a todos que de uma forma ou outra me auxiliaram e ampararam-me durante estes anos da minha caminhada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, acima de tudo, pela vida, força e coragem.

A minha orientadora Ester Eliana Hauser pela sua dedicação e disponibilidade.

A Medianeira, minha esposa, pelo amor, amizade e companheirismo nas horas difíceis.

A minha família que colaborou de uma maneira ou outra durante a trajetória de construção deste trabalho, meu muito obrigado!

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“Estar no poder é como ser uma dama. Se tiver que lembrar às pessoas que você é, você não é”.

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RESUMO

O presente trabalho de pesquisa monográfica faz uma análise de como se deu o surgimento dos direitos humanos e sua posterior evolução até chegar aos dias atuais. Busca compreender o processo de consolidação destes direitos desde as grandes revoluções (inglesa, francesa e norte americana) e sua efetivação nas constituições contemporâneas, especialmente na Constituição Brasileira de 1988. Apresenta a segurança pública como um direito fundamental e discute brevemente a dificuldade encontrada pelos órgãos de segurança pública no Brasil, em desempenhar suas atividades sem violar direitos e liberdades individuais mínimas constitucionalmente consagradas. Analisa o modelo de segurança pública adequado ao Estado brasileiro, que se autodenomina democrático e de direito, demonstrando que nestes Estados a segurança pública deve ser exercida com o mais amplo e irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana, o que exige a superação do mero repressivismo e das práticas autoritárias e de desrespeito aos direitos humanos, e sua substituição por uma política de segurança cidadã.

Palavras-chave: Segurança pública. Direitos humanos. Constituição Brasileira. Liberdades individuais.

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ABSTRACT

This study analyses the emergence of human rights and their subsequent development up to the present day. First, the processes underlying the consolidation of these rights since the great revolutions (English, French and North American) are examined in order to determine to what extent the rights are satisfied by modern-day constitutions, such as the Brazilian Constitution of 1988. The role of public security as a fundamental right is discussed, followed by a brief investigation of the difficulties public security institutions face in carrying out their duties without violating minimal individual rights and liberties, to which these institutions are constitutionally bound. Finally, the study evaluates a model of public security appropriate to the State of Brazil, a state that declares itself democratic and just, thus demonstrating that in such states public security must be carried out with full and unrestricted respect for human dignity. This requires rising above mere repressive and authoritarian practices, often involving the violation of human rights, and ultimately demands the substitution of current policy for one focused on citizen security.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...09

1 A EVOLUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS NAS SOCIEDADES OCIDENTAIS CONTEMPORÂNEAS...11

1.1 Origem histórica dos direitos humanos...11

1.2 As gerações de direitos ...13

1.3 As declarações de direitos e a consagração normativa dos direitos humanos ..15

1.4 Os direitos humanos e os direitos fundamentais na constituição brasileira de 1988 ...16

2 A SEGURANÇA PÚBLICA COMO DIREITO FUNDAMENTAL NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988 ...21

2.1A segurança pública na Constituição Brasileira de 1988...21

2.1.1 A segurança pública como direito social (artigo 6º da CF/88) ...22

2.1.2 A segurança pública e a ordem pública (artigo 144 da CF/88)...23

2.2 A política criminal repressivista e as práticas de segurança baseada na violação dos direitos humanos: uma análise da história brasileira ...26

2.3 O programa nacional de segurança pública e a Lei nº 11.530 de 2007...29

3 SEGURANÇA PÚBLICA, DIREITOS HUMANOS E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO...32

3.1 O Estado Democrático de Direito e o princípio da dignidade da pessoa humana como um de seus fundamentos ...32

3.2 O princípio da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental do Estado Democrático de Direito...34

3.3 A função punitiva no Estado Democrático de Direito...36

3.4 Direitos humanos e segurança pública no Estado Democrático de Direito...38

CONCLUSÃO...41

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INTRODUÇÃO

Segurança Pública e Direitos Humanos no Estado Democrático de Direito, é um tema por demais complexo, pois visa saber qual o modelo de segurança pública que melhor se compatibiliza nos Estados Democráticos de Direito.

Na atualidade, proliferam, na mídia e no senso comum, concepções que entendem que a realização mais efetiva da segurança pública depende de uma política criminal mais repressiva e violadora de direitos fundamentais dos apenados. Não é incomum que se questionem garantias fundamentais dos acusados, sob o argumento de que estas impedem a realização da segurança pública e o controle do crime. Tendo como base estas questões pretende-se, com o presente trabalho, verificar como e em que medida é possível adequar à necessidade de segurança e ordem pública, com o respeito aos direitos fundamentais dos acusados de infrações penais. Bem como, se é possível realizar segurança pública no atual modelo, sem violar os direitos humanos.

Historicamente os direitos humanos sugiram a partir do século XVIII, tendo como objetivo o reconhecimentos de direitos mínimos vitais, em que houve a necessidade da criação das gerações de direitos do homem (direitos civis, políticos, econômicos, sociais e de solidariedade). Tais direitos foram normatizados através da Declaração Universal dos Direitos Humanos e outras declarações de direitos em decorrência das grandes revoluções. A partir de então tais direitos passaram a compor o texto das constituições ocidentais, e também a Constituição Brasileira de 1988, sob a forma de direitos fundamentais.

No Brasil a Segurança Pública está elencada entre os direitos sociais, mas historicamente tem sido exercida através do sistema penal. Conhecendo a história da política criminal brasileira, herdeira de um regime autoritário (militar), com significativas violações

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dos direitos humanos, se fez necessário uma análise tentando compreender qual o modelo de segurança pública é mais adequado com a Constituição Brasileira de 1988 sob a luz do princípio da dignidade da pessoa humana.

Portanto, se faz necessário tentar compreender por que as políticas de segurança pública são ineficazes frente a todo um conjunto normativo que aponta para a promoção dos direitos humanos regido pelo princípio da dignidade da pessoa humana.

Com a criação do Programa Nacional de segurança Pública com Cidadania – PRONASCI – verifica-se uma nova concepção de segurança pública, baseada no reconhecimento da cidadania e dos direitos fundamentais de todos, o que é perfeitamente compatível em um Estado Democrático de Direito.

Isto posto, o trabalho apresentará o tema dividido em três capítulos, começando pela evolução histórica dos direitos humanos nas sociedades ocidentais contemporâneas, passando pelas gerações e declarações de direitos de forma normativa dos direitos humanos.

Continuando, será analisada a idéia de segurança pública consagrada no texto constitucional de 1988 como direito social, insculpido no artigo 6º, conjuntamente com o artigo 144, tendo em vista a manutenção da ordem pública. Também será apresentado o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania – PRONASCI, uma nova proposta de segurança pública, na qual se repudia o atual modelo de política criminal repressivista e violador dos direitos humanos.

E por fim, apresenta-se a segurança pública, os direitos humanos, bem como o PRONASCI, como algo compatível em um Estado Democrático de Direito, desde que observado o princípio da dignidade da pessoa humana.

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1 A EVOLUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS NAS SOCIEDADES OCIDENTAIS CONTEMPORÂNEAS

Estudiosos do Direito afirmam que os direitos humanos são históricos ou decorrentes da história, mas que não há de se falar neste instituto até a Idade Moderna no ocidente. Por outro lado, os filósofos consideram que os direitos humanos existem desde o reconhecimento dos direitos naturais, ou melhor, dizendo, que os direitos humanos e os direitos naturais são praticamente a mesma coisa.

1.1 Origem histórica dos direitos humanos

Antecedentes remotos apontam o Cilindro de Ciro como o primeiro documento que se tem conhecimento sobre os direitos humanos:

Um dos documentos mais antigos que vinculou os direitos humanos é o Cilindro de Ciro, que contêm uma declaração do rei persa (antigo Irã) Ciro II depois de sua conquista da Babilônia em 539 a.C. Foi descoberto em 1879 e a ONU o traduziu em 1971 a todos seus idiomas oficiais. Pode ser resultado de uma tradição mesopotâmica centrado, na figura do rei justo, cujo primeiro exemplo conhecido é o rei Urukagina, de Lagash, que reinou durante o século XXIV a.C. E de onde cabe destacar também Hammurabi da Babilônia e seu famoso Código de Hammurabi, que data do século XVIII a.C. O Cilindro de Ciro apresentava características inovadoras, especialmente em relação a religião. Nele era declarada a liberdade de religião e abolição da escravatura. Tem sido valorizado positivamente por seu sentido humanista e inclusive foi descrito como a primeira declaração de direitos humanos. Documentos muito posteriores, como a Carta Magna da Inglaterra, de 1215, e a Carta de Mandén, de 1222, se têm associado também aos direitos humanos. Na Roma antiga havia o conceito de direito na cidadania romana a todos romanos. (CILINDRO..., 2009, p. 2).

Durante os séculos XVI, XVII e XVIII, os direitos humanos passam a ser alvo de grandes debates, pois partem de uma afirmação progressiva do homem como sujeito de direitos, fazendo com que se evidencie na luta burguesa contra o antigo regime, também encontrando sua sustentação no cristianismo e na idéia da dignidade moral do homem enquanto pessoa. Segundo Bobbio (1992, p. 17) os "Direitos do homem são os que pertencem, ou que deveriam pertencer a todos os homens, ou dos quais nenhum homem pode ser despojado.”

Documentos como a Carta Magna da Inglaterra de 1215 e a Carta de Mandén do ano 1222 são associados também aos direitos humanos. Na Roma antiga havia o conceito de

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direito na cidadania romana de todos os seus membros.

Na Revolução inglesa do século XVI, a burguesia conseguiu satisfazer suas necessidades e ter alguma garantia contra arbitrariedades da coroa, limitando os poderes dos reis e sendo proclamado talvez uma das suas maiores conquistas para a época, a Lei do Habeas Corpus de 1679 em que o parlamento impôs ao rei, na Carta de Direitos, uma série de princípios, sobre os quais os monarcas não poderiam decidir ou alterar.

A Declaração de Direitos da Virgínia de 12 de junho de 1776 refere na seção 1, o seguinte:

Todos os homens são, por natureza, igualmente livres e independentes e têm direitos inerentes, dos quais, ao entrar numa sociedade, não podem, por nenhum contrato, privar ou despojar sua posteridade; a saber, o gozo da vida e da liberdade, os meios de adquirir e possuir propriedade, e a busca da felicidade e segurança. (BEDIN, 2002, p.187).

Esta é considerada uma das primeiras grandes declarações de direitos que, escrita por George Mason, influenciou Thomas Jefferson na declaração dos direitos humanos existentes na Declaração da Independência dos Estados Unidos da América de 4 de julho de 1776.

A teoria do contrato social, conforme o entendimento de seus principais idealizadores, Locke, Hobbes e Rousseau, têm fundamento na idéia de que os direitos dos indivíduos são naturais e que, no estado de natureza, todos os homens são titulares de todos os direitos.

Os homens mesmo abdicando de certos direitos pelo contrato social poderiam usufruir de algumas vantagens da ordem social, tendo o Estado como garantidor de um regime político e jurídico.

O contratualismo, enquanto concepção teórica sobre a origem do Estado e os direitos do homem também influenciou a Assembléia Nacional francesa em sua declaração, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 5 de outubro de 1789, que confirma no artigo 1, apontando que "Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos. As distinções sociais não podem fundar-se em nada mais do que utilidade comum." ( BEDIN, 2002. p. 191).

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Até o século seguinte não surgiram grandes inovações nos direitos humanos, somente depois com as lutas operárias, apareceram novos direitos com o objetivo de solucionar determinados problemas sociais, já com a intervenção do Estado.

O nascimento da Organização das Nações Unidas em 1945, já se preocupando com o que acontecera na II Guerra Mundial e o que aconteceria na iminência de outra já envolvendo questões de raça e religião, reforçou o papel dos direitos humanos, fazendo com que estes alcançassem uma grande importância na cultura internacional.

Em 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos dos Humanos foi proclamada na Assembléia Geral das Nações Unidas em sua Resolução 217 A (III), já como resposta ao que acontecera na 2ª Guerra Mundial, com o intuito de dar novos rumos internacionais que surgiram depois do armistício. Coincidência ou não, foi proclamada no mesmo ano da criação do Estado de Israel.

1.2 As gerações de direitos

Os direitos de primeira geração ou direitos civis que surgiram com as declarações da Virgínia em 1776 e da França em 1789, também são chamados de direitos negativos, ou seja, direitos estabelecidos contra o Estado. Dentre os quais se podem elencar os seguintes: a) as liberdades físicas; b) as liberdades de expressão; c) a liberdade de consciência; d) o direito de propriedade privada; e) os direitos da pessoa acusada; f) as garantias dos direitos.

Segundo Bobbio (1992, p. 32) os direitos de primeira geração são “todos aqueles direitos que tendem a limitar o poder do Estado e a reservar para o indivíduo, ou para os grupos particulares, uma esfera de liberdade em relação ao Estado.” Referindo-se aos direitos de primeira geração Bonavides (2002, p. 517) diz que:

Os direitos de primeira geração ou direitos de liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam uma subjetividade que é o seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado.

Os direitos de segunda geração ou direitos políticos surgem no decorrer do século XIX, também podendo ser denominado de direitos positivos ou direito de participar das

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decisões políticas do Estado, quais sejam: a) direito ao sufrágio universal; b) construir partidos políticos; c) direito de plebiscito, referendo ou iniciativa popular.

Segundo Pereira (1993, p. 191) “Os direitos de segunda geração foram fundamentais, pois contribuíram para a consolidação da cidadania tendo processado as potencialidades democráticas da cidadania civil, ou seja, na esteira dos direitos civis.”

Os direitos de terceira geração ou direitos econômicos e sociais surgiram no início do século passado, na década de vinte, em decorrência da Revolução Russa, da Constituição Mexicana em 1917 e da Constituição de Weimar em 1923, também chamados direitos de crédito em que o Estado passa a ser devedor dos indivíduos. Dentre estes se podem citar os principais, quais sejam: direitos relativos ao homem trabalhador e o homem consumidor.

Para Bedin (2002, p. 62) estes direitos “não são direitos contra o Estado ou direitos de participar no Estado, mas sim direitos garantidos 'através ou por meio do Estado.”

Para Bonavides (1998, p. 518) os direitos de terceira geração dominaram o século XX, quando refere:

São os direitos sociais, culturais e econômicos bem como os direitos coletivos ou de coletividades, introduzidos no constitucionalismo das distintas formas de Estado Social, depois que germinaram por obra da ideologia e da reflexão antiliberal deste século. Nasceram abraçados ao princípio da igualdade, do qual não se podem separar, pois fazê-lo equivaleria a desmembrá-los da razão de ser que os ampara e estimula.

Os direitos de quarta geração ou direitos de solidariedade surgiram no final da primeira metade do século passado, tendo sua consagração no ano de 1948, também denominados como direitos sobre o Estado, em que o homem passa a ter direitos no âmbito internacional. Direitos estes que afirmam o seguinte: a) direito ao desenvolvimento; b) direito ao meio ambiente sadio; c) direito à paz; d) direito à autodeterminação dos povos.

Segundo Bonavides (1993, p. 481), tais direitos:

Não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um povo, de um grupo ou de um determinado Estado. Tem primeiro por destinatário o gênero humano mesmo num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta.

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Portanto, as gerações de direitos foram, sem dúvida, decorrência de uma trajetória de conquistas para os mais importantes segmentos da sociedade e que apesar de críticas é considerada uma vitória de todos.

1.3 As declarações de direitos e a consagração normativa dos direitos humanos

O direito constitucional ocidental moderno deve toda a sua essência às grandes revoluções já evidenciadas no início desta pesquisa. Foram os documentos históricos oriundos de uma insatisfação do povo europeu e americano, instigados pelos pensadores iluministas, que conseguiram dar forma as instituições jurídicas e políticas vigentes até os dias atuais.

Na França, após várias vitórias frente ao rei francês, os parlamentares reunidos em uma assembléia em Paris, começaram e elaborar uma declaração de direitos que servisse como preâmbulo à constituição que ainda estava em discussão.

Outros documentos sobre a matéria foram juntados e depois de um intenso estudo das normas que instituiria o novo documento, foram selecionados definitivamente dezessete artigos, os quais foram aprovados na Assembléia Nacional, que foi lida de forma emocionante na seção de 26 de agosto de 1789.

Na Inglaterra, a primeira declaração de direitos em sentido moderno do termo surge na Virgínia em 12 de junho de 1776, a declaração preocupava-se basicamente com a estrutura de um governo democrático, com um sistema de limitação de poderes, tornando-se um marco para os direitos fundamentais (BEDIN, 2002).

Entre outras cláusulas de extrema relevância para o constitucionalismo moderno cite-se a primeira:

Todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes e têm certos direitos inerentes, dos quais, quando entram em estado de sociedade,não podem por qualquer acordo, privar ou despojar sua posteridade: a saber, o gozo da vida e da liberdade e a busca da felicidade e segurança. (BEDIN, 2002, p.187).

Na França, em 1789, a declaração foi marcada pelo liberalismo e pela pretensão de universalidade, buscando a liberdade do homem frente ao absolutismo e ao opressivo

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feudalismo. Porém, visto por alguns mais críticos que afirmavam ser de caráter unicamente individualista. A declaração francesa apresenta um considerável progresso na história da afirmação dos direitos fundamentais da pessoa humana, qual seja: 'Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. “As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum.” (BEDIN, 2002, p. 191).

Já no século XX, após o desastre que ocorrera nas duas grandes guerras mundiais em que aconteceram as maiores atrocidades raciais e religiosas presenciadas pela humanidade, houve a necessidade de elaborar um documento que assegurasse direitos universais, para todos, ou melhor, uma Declaração Universal dos Direitos do Homem, proclamada em 10 de dezembro de 1948, que prevê no seu preâmbulo da seguinte afirmação:

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo; Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os todos gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum; Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão; Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações; Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta da ONU, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor do ser humano e na igualdade de direitos entre homens e mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla; Considerando que os Estados-Membros se comprometam a promover em cooperação com as Nações Unidas o respeito universal aos direitos e liberdades; Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso. (BEDIN, 2002, p. 194).

Portanto, houve a necessidade de normatizar o texto, em que reconhecia a partir daquele momento de forma publicizada direitos universais que transpunham os limites territoriais dos povos.

1.4 Os direitos humanos e os direitos fundamentais na constituição brasileira de 1988

Impossível imaginar nos dias de hoje uma carta constitucional brasileira firmada nos princípios e direitos fundamentais, após um regime militar que perduraram por duas décadas, sem observar a Declaração dos Direitos Humanos.

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A dignidade da pessoa humana pode ser considerada como o fundamento último do Estado brasileiro. Ela é o valor máximo a determinar a interpretação e a aplicação da constituição, assim como a atuação de todos os poderes públicos que compõem a República Federativa do Brasil.

Em síntese, o Estado existe para garantir e promover a dignidade de todas as pessoas. É nesse amplo alcance que está a universalidade do princípio da dignidade humana e dos direitos humanos. Portanto, os direitos fundamentais na constituição brasileira podem sim ser interpretados à luz dos direitos humanos, visto sua similaridade em seus dispositivos legais, os quais nitidamente se identificam ou se complementam a seguir:

Em relação aos direitos de liberdade (direitos de primeira geração) a Declaração Universal dos Direitos Humanos observa em seu artigo primeiro que: “Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.” (BEDIN, 2002, p. 195). A carta constitucional brasileira inspirando-se neste artigo determina em seu art. 5° que: “Todos são iguais perante a lei, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...].”

Referindo-se também ao direito de liberdade e ao direito a igualdade o artigo 2º da Declaração Universal dos direitos Humanos determina que:

Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. (BEDIN, 2002, p. 195).

A carta constitucional brasileira inspirando-se no dispositivo mencionado determina, em seu art. 5°, inciso I, que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.” Do mesmo modo assegura, no inciso VIII, a liberdade de crença, de opinião e de pensamento ao dispor que “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política.”

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Também prevê a carta constitucional brasileira, em seu artigo 5°, que o homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança, sendo que esta igualdade de direitos não tem distinções.

O artigo 11 da Declaração Universal dos Direitos Humanos preceitua que:

Todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhes tenham sido assegurada todas as garantias necessárias a sua defesa e que ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Também determina que não será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso, ou seja, o homem que está sendo acusado tem o direito de se defender e até que se alcance a decisão final, deve ser preservada a presunção de inocência.

Da mesma forma, na Constituição Brasileira, estão explícitos os direitos e garantias fundamentais do acusado, dispositivos estes que asseguram o princípio do devido processo legal. No artigo 5° da Carta Constitucional são encontrados vários dispositivos que se referem a proteção do individuo contra o arbítrio ou excesso punitivo por parte do Estado:

No inciso XV está estabelecido o direito a liberdade de locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer e dele sair com seus bens, assegurando o direito da livre locomoção.

No inciso LIII está determinado que ninguém será privado de sua liberdade e de seus bens sem o devido processo legal, como o refere o próprio dispositivo legal em que deve ser observado o Princípio do Devido Processo Legal.

No inciso LVII, está previsto o princípio do estado de inocência, que também é um direito de liberdade individual, eis que determina que ninguém será considerado culpado (privado da liberdade) até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. No inciso LXI, está determinado que ninguém será preso, salvo em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente. No caso de haver prisão, determina o

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inciso LXII, que esta deverá ser informada imediatamente ao Juiz competente e à família do preso ou qualquer pessoa por ele indicada.

Para a garantia do direito de liberdade a constituição estabelece o remédio do Habeas Corpus (inciso LXVIII) que poderá ser utilizado para assegurar o direito de liberdade, para trancar a ação penal, para fazer cessar a coação a liberdade de locomoção ou diante de ilegalidade ou abuso de poder.

Todos estes preceitos constitucionais relativos à proteção da liberdade, colocados no capítulo relativo aos direitos individuais foram motivados pelo período dos governos militares, em que eram comuns as ofensas as liberdades individuais, como prisões ilegais, invasões de domicílios, negativa de informações, negativa de assistência a advogado e da família, incomunicabilidade de pessoas presas, entre outros.

A carta constitucional brasileira também contempla, nos artigos 6 e 7 os direitos de terceira geração, denominados direitos sociais. Segundo Bedin (2002, p. 198)

Todo o homem, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade. No Brasil, a primeira constituição a reconhecê-los foi a de 1934, no governo de Getúlio Vargas. Assim, dentre os direitos humanos de cunho social e econômico, podemos relacionar os direitos à educação, à saúde, ao lazer, à maternidade, à infância, à moradia, ao trabalho, à previdência social, à assistência aos desamparados, direitos estes elencados no artigo 6° da constituição brasileira de 1988, que tornam apto o exercício dos direitos civis e políticos.

Como se viu, direitos sociais são garantias fundamentais ao homem, reconhecidos como liberdades positivas, sendo requisitos obrigatórios a um Estado Social de Direito. Tais direitos tem como objetivo melhorar as condições aos hipossuficientes, visando maior igualdade social, que é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, segundo dispõe o art. 1°, IV da constituição brasileira.

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Como ressaltam Canotilho e Moreira (apud MORAES, 2009, p. 195) que:

A individualização de uma categoria de direitos e garantias dos trabalhadores, ao lado do caráter pessoal e político, que reveste um particular significado constitucional, do ponto em que ela traduz o abandono de uma concepção tradicional dos direitos, liberdades e garantias como direitos do homem ou do cidadão genérico e abstratos, fazendo intervir também o trabalhador (exatamente: o trabalhador subordinado) como titular de direitos de igual dignidade.

Portanto, os direitos humanos através de seu processo evolutivo ao longo da história contribuíram e muito para a formação do ordenamento jurídico, político e sócio-econômico que temos na atualidade, fazendo com que sejamos sujeitos de direito e não meros objetos de uma sociedade que não observa suas normas legais.

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2 A SEGURANÇA PÚBLICA COMO DIREITO FUNDAMENTAL NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988

A Constituição Brasileira de 1988 consagrou a segurança pública como um direito social, prevendo tal direito no rol dos direitos sociais constantes do artigo 6º. Trata-se de um direito fundamental, pois a ausência de segurança pública num Estado democrático de direito afeta não somente o próprio Estado e suas atividades, mas também o exercício dos demais direitos fundamentais que se harmonizam com o princípio da dignidade da pessoa humana.

2.1 A segurança pública na Constituição Brasileira de 1988

Ainda hoje, após duas décadas de vigência formal da constituição, um dos maiores desafios encontrados pelo Estado é aplicar as alterações constitucionais de forma efetiva no que se refere aos entes e seus operadores ligados diretamente a segurança pública.

Além de consagrar a segurança como um direito fundamental, devido à importância do tema, o texto constitucional destinou para a segurança pública um capítulo específico, qual seja, o capítulo III dentro do título V que trata da defesa do Estado e das instituições democráticas.

Referindo-se à segurança pública, Ferraz Jr. (1990, p. 102) salienta a importância da consolidação de uma política nacional de segurança pública que não seja transitória e que represente aqueles valores consagrados no texto constitucional, concluindo que:

Devemos conscientizar-nos de que os temas da segurança pública não pertencem apenas às polícias, mas dizem respeito a todos os órgãos governamentais que se integram, por meio de medidas sociais de prevenção ao delito. A comunidade não deve ser afastada, mas convidada a participar do planejamento e da solução das controvérsias que respeitem a paz pública.

Portanto, os diversos órgãos que desempenham as atividades de segurança pública elencados no texto constitucional, necessitam sim da participação do cidadão agindo conjuntamente para pelo menos tentar atender os reclamos sociais.

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2.1.1 A segurança pública como direito social (artigo 6º da CF/88)

No Estado Democrático de Direito, o valor/princípio da dignidade da pessoa humana, exige e pressupõe o reconhecimento e a proteção de todos os outros direitos fundamentais, sejam eles de primeira, segunda ou terceira geração. Segundo Sarlet (2004, p. 85) “sem que se reconheçam a pessoa humana os direitos fundamentais que lhe são inerentes, em verdade estar-se-á negando-lhe a própria dignidade”. Isso indica que o exercício efetivo dos direitos fundamentais é condição indispensável para a afirmação da dignidade humana.

Para Sarlet (2004, p.79) “os direitos e garantias fundamentais encontram seu fundamento direto, imediato e igual na dignidade da pessoa humana, do qual seriam concretizações [...] ” sendo que tais direitos podem “ser reconduzidos de alguma forma a noção de dignidade da pessoa humana, já que todos remontam a idéia de proteção e desenvolvimento das pessoas, de todas as pessoas.”

Como se viu no primeiro capítulo deste trabalho, a Constituição Brasileira de 1988 consagra em seu texto, direitos individuais, sociais e coletivos. Nos artigos 6º e 7º são definidos os denominados direitos sociais, dentre os quais se encontra a segurança pública.

O texto constitucional proclama serem direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados.

Referindo-se aos direitos sociais Moraes (2009, p. 194), afirma que:

Direitos sociais são direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória num Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria de condições de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, e são consagrados como fundamentos do Estado democrático, pelo art. 1º, IV, da Constituição Federal.

Por isso, a segurança pública deve sim ser entendida também como um direito social, uma vez que, aquela assume o papel de garantia e se portando como tal, deve corresponder a necessidade de afirmação da dignidade humana.

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Baratta (1996) observa que o conceito de segurança pública é um conceito complexo e que, não obstante isso tem sido utilizado, num sentido claramente restrito, sendo vinculada exclusivamente a noção de ordem pública. Em geral tal conceito é utilizado para respaldar a criação de políticas sociais punitivas e restritivas das liberdades individuais. Com isso, cria-se a falsa impressão que o problema da segurança pública se resume a falta de uma legislação penal mais severa, porém a complexidade do tema vai muito mais além do que uma falha no sistema jurídico penal brasileiro. Entende Baratta (1996, p. 59) que:

Não só do ponto de vista jurídico, mas também do ponto de vista psicológico, podem e deveriam ser seguros, sobretudo, os sujeitos portadores de direitos fundamentais universais (que não se limitam aos cidadãos), ou seja, todas as pessoas físicas que se encontram no território de um Estado, de uma cidade, de um bairro ou de outro lugar público, de uma casa ou de outro espaço privado. Seguros em relação ao desfrute e à proteção efetivas desses direitos, frente a qualquer agressão ou omissão por parte de outras pessoas físicas que atuem no âmbito de competências, que tenham poderes de direito ou de fato, como funcionários públicos ou privados, em quaisquer dos âmbitos territoriais.

Salienta ainda Baratta (1996, p. 62) no mesmo texto que:

No entanto, se nos propusermos a avaliar as políticas existentes e a elaborar novas políticas de controle das situações problemáticas ou socialmente negativas, a referência ao atual sistema de justiça criminal não permite sequer uma definição cientificamente utilizável do universo das situações e dos comportamentos criminais.

Logo, as políticas públicas devem ser efetivas, de tal forma que as pessoas sejam protegidas em todos os seus direitos, sejam eles fundamentais, individuais ou sociais.

2.1.2 A segurança pública e a ordem pública (artigo 144 da CF/88)

O artigo 144 do texto constitucional proclama que a segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, devendo ser exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seus órgãos.

Segundo tal artigo a política de segurança pública visa, em primeiro lugar, assegurar a ordem pública. Ocorre que a definição do que seja “ordem pública” não é simples. Este é, para os operadores do direito, um dos conceitos mais difíceis, especialmente quando é utilizado para a justificação das prisões cautelares.

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Na hipótese da decretação da prisão preventiva, nos termos do artigo 312 do CPP, entre um dos motivos que ensejam a medida acautelatória é com o intuito de garantir a ordem pública, entretanto, para Almeida (2003, p. 71) em seu entendimento aponta para que:

Em que pese existirem várias tentativas de definição do conceito de ordem pública, até hoje se vê que os decretos de prisão preventiva com esse tipo de justificação apresentam as mais diversas fundamentações: ora se fala em confiabilidade da justiça, ora em acautelar-se o meio social, ora na periculosidade do acusado, ora no clamor público, ora na gravidade do crime, ora na segurança do próprio ofendido. Logo, a ordem pública mesmo sendo consagrada na Constituição Brasileira, onde justifica a privação de liberdade de inúmeros acusados antes mesmo da sentença condenatória de primeiro grau que ainda nem transitou em julgado, é alvo de severas críticas quanto à sua aplicação.

Na opinião de Almeida (2003) e Lopes Júnior (2005, p. 203):

Manter uma pessoa presa em nome da ordem pública, diante da reiteração de delitos e o risco de novas práticas, se está atentando não ao processo penal, mas sim a uma função de polícia do Estado, completamente alheia ao objeto e fundamento do processo penal.

Resumidamente, o termo ordem pública é explicitamente complexo e ambíguo, pois seja como pressuposto da prisão preventiva, ou como objetivo da política de segurança pública, deve ser vinculado ao objetivo maior que é o de preservação dos direitos fundamentais de todas as pessoas.

A Constituição Brasileira também determina que a Segurança Pública seja exercida para a preservação da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

De plano já se encontra um grave problema, quanto à equiparação destas duas funções, pois incolumidade em seu significado entende-se como “livre de perigo; são e salvo; intacto; ileso”. Na construção do dispositivo constitucional, existe uma igualdade equivocada, porque não se pode colocar no mesmo grau de importância pessoas e patrimônio, transferindo para a segurança pública a preservação da “incolumidade das pessoas” e a “incolumidade do patrimônio”.

(26)

A pessoa humana é infinitamente mais importante que o patrimônio, sendo que a proteção deste só se justifica se estiver a serviço como instrumento de promoção da segurança pública à pessoa humana. Portanto, a Segurança Pública deve preservar, em primeiro lugar, a incolumidade das pessoas. Por isso, a aplicação exacerbada de prisões cautelares em prol da ordem pública, às vezes mais para atender um clamor social ou até mesmo midiático, fragiliza e muito a persecução penal que vai de encontro aos dispositivos constitucionais, acarretando uma insegurança jurídica.

A Polícia Federal, Civil e Militar são forças policiais do Estado, que se dedicam à aplicação da lei vigente no estado brasileiro e ao controle da ordem pública.

A polícia federal tem como objetivo combater o crime organizado, vigilância constante nos limites territoriais com outros países, principalmente quanto ao tráfico de armas e contrabando de armas e produtos, tráfico de pessoas e animais, prostituição infantil, crimes políticos e eleitorais.

Já por sua vez as polícias civis e militares atuam na prevenção e controle da criminalidade nos estados, são órgãos da administração pública estaduais, peculiarmente mantidos pelas unidades federadas com recursos e estruturas próprias ou subsidiariamente mantidos pela União.

Souza (2004, p. 283) compreende que:

A matéria policial no Brasil é questão urgente e prioritária. É certo que a reforma das instituições policiais deve entrar definitivamente na pauta dos programas de governo dos Estados brasileiros. A sinalização que recebemos das democracias mais consolidadas é que a polícia precisa tornar-se uma polícia cidadã, que promova segurança de todos, respeitando direitos.

Por isso, os profissionais de segurança pública devem exercer suas atividades policiais observando a lei, respeitando e protegendo garantias constitucionais sob a luz do princípio da dignidade da pessoa humana.

(27)

2.2 A política criminal repressivista e as práticas de segurança pública baseada na violação de direitos humanos: uma análise da história brasileira

O conceito de política criminal apresenta certa complexidade, pois num primeiro seria um conjunto de atividades que teriam como sua finalidade o controle da criminalidade, porém, o que se sabe é que além da criminalidade, devem-se levar em conta outros fatores como a vitimologia, a criminologia, o ambiente social, os agentes causadores da violência e a própria sociedade.

No entendimento de Baratta (1996, p. 57-58), a política criminal se apresenta com o seguinte contexto:

No entanto, o conceito de política criminal não é somente complexo, senão também um conceito problemático. Nos seus níveis mais elaborados, a política criminal, enquanto gênero é como um universo muito mais amplo do que a espécie política criminal. A esses níveis, porém, a linha de distinção entre a política criminal e a política em geral e outras de suas espécies (política social, econômica, ocupacional, urbanística, etc.) não se apresenta de forma nítida.

Portanto, política criminal deve ser analisada conjuntamente com outros segmentos da sociedade e não somente de forma isolada, ou seja, política criminal também deve ser entendida como política social.

Historicamente no Brasil, como se sabe, a política criminal teve cunho exclusivamente repressivo e com níveis significativos de violação dos direitos humanos.

Uma simples análise da legislação penal promulgada nas duas últimas décadas no país demonstra o apego do legislador ao modelo repressivista. As condições de execução das penas privativas de liberdade no país também indicam a adoção de políticas repressivistas e de desrespeito aos direitos fundamentais dos apenados.

Este modelo respaldado por movimentos midiáticos de lei e ordem tem sido apoiado pela população em geral e tem “legitimado” barbáries produzidas pelo próprio sistema de justiça criminal.

(28)

Ainda nem completado o segundo ano de vigência da Constituição brasileira, já houve necessidade, atendendo talvez um clamor mais midiático do que social, o endurecimento penal com o advento da Lei nº 8.072 de 25 de julho de 1990, Lei dos Crimes Hediondos que já nos seus primeiros artigos demonstra uma forma punitiva mais severa por parte do Estado.

Na metade da década de noventa aparece outro dispositivo legal, Lei nº 9.034 de 03 de maio de 1995, Lei contra o Crime Organizado, em que potencializa o enrijecimento penal que posteriormente alterou alguns artigos em abril de 2001 pela Lei 10.217/01. Sendo o que realmente chama a atenção é que as duas legislações que tratam o mesmo tema não se preocuparam ao menos em definir de forma transparente os institutos crime organizado e organização criminosa aproximando o conceito de crime ao de quadrilha ou bando.

Ainda no mesmo ano, se acalorou o debate sobre os homicídios ocorridos em ações realizadas pela polícia militar, tanto é verdade que em 1995 os crimes de homicídio praticados por policiais militares que antes eram exclusivamente da competência da justiça militar, ou seja, justiça especial passou a ser também de competência da justiça comum.

No Brasil já se fala muito em Lei e Ordem, alguns cogitam até mesmo na implantação do exemplo do programa norte americano “Tolerância Zero”, ou seja, a minimização de um Estado social facilmente suprido por um Estado Penal.

Todas estas normas nasceram inspiradas na política criminal repressivista de lei e ordem, movimento que teve forte repercussão e aceitação na cidade de Nova Iorque e que forneceu as bases para o estabelecimento do programa norte americano “Tolerância Zero” e que representa, em verdade uma minimização de um Estado social e sua substituição por um Estado Penal.

Criticando tais políticas criminais, de cunho repressivista, Canterji (2008, p. 46-47) entende que:

Ao se falar em Tolerância Zero nos dias atuais, pode-se dizer que não se trata de política criminal nova. Pretende-se acabar com o mal (a criminalidade) pela raiz, como se essa fosse constituída por pequenos delitos e não pela falta de um estado Social, por exemplo. A utilização de uma legislação penal de terror, que aumenta as penas, criminaliza condutas e minimiza garantias, não é eficiente na redução da criminalidade.

(29)

Não muito diferente é a aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado na execução da pena, que como já se sabe atendeu mais a uma satisfação da opinião pública do que uma resposta eficaz ao combate da criminalidade, sem falar que afrontam de forma avassaladora princípios basilares constitucionais.

Recentemente, com a Lei nº 11.343 de 26 de agosto de 2006, Lei Antidrogas, nos dá a falsa impressão que com a descriminalização de quem porta a droga para consumo pessoal não cabe mais prisão, fazendo com que o usuário fique impune. Porém, o que deve ser observado é que o usuário, mais do que uma pena imposta pelo Estado, ele precisa de um tratamento clínico deste mesmo Estado. Portanto, como já visto, o agravamento da lei penal em nada melhora, atenua ou reduz o cometimento de delitos, somente um Estado mais social do que penal poderá de forma efetiva e sólida diminuir a violência e a criminalidade.

Como se vê no Brasil, infelizmente, a política de segurança pública, forjada, desde seu início, como meio de controle social ainda traz na sua essência a herança de um regime autoritário.

Sobre tal questão, Balesteri (2003, p. 21) assinala o seguinte:

Do Brasil - Colônia (1500–1822), com as Ordenações Filipinas, com a Constituição do Império (1824), com o Código Criminal da República (1890), com a Constituição de 1891, passando pela República Velha, pelo Estado Novo, pelo período 1945/1963 e a Ditadura de 1964 até hoje, sempre imperou no Brasil uma filosofia policial repressiva, a serviço das classes dominantes.

Nos últimos anos, mais precisamente na última década, intensificaram os debates sobre a questão da segurança pública no país, a temática traz muitas divergências quanto a uma possível solução.

Os punitivistas acreditam que uma legislação penal mais rigorosa diminuiria a criminalidade, o que por sua vez, não se sustenta, pois temos exemplos claros nas cidades norte-americanas. Por outro lado, alguns críticos do atual modelo de segurança pública, assinalam a necessidade de uma legislação mais atualizada com os eventos sociais e uma reforma efetivamente profunda das instituições de ensino policial, sem falar na valorização do profissional de segurança pública.

(30)

Balesteri (2003, p. 33) entende que: “A educação nas escolas e academias de formação policial, fundamentada em uma cultura de promoção dos valores humanistas, é um grande e importante passo, se quisermos ter mudanças significativas nas instituições de segurança pública do país.”

Ainda, neste mesmo raciocínio, seguindo a linha de que deve haver um rompimento do atual modelo de segurança pública para uma mudança significativa na estruturas das forças policiais, Franco (apud BALESTERI, 2003, p. 53) observa que:

As instituições são criadas para atender as necessidades humanas, devendo submeter-se a um constante processo de adaptação, de sorte a responder às expectativas e anseios do momento presente. Ao longo dos anos, foi-se reconhecendo que valores como liberdade, democracia, direito e paz social só tinham sentido quando entendidos numa acepção mais ampla, quando vinculados à construção de uma sociedade justa e próspera. A liberdade dos excluídos não é idêntica à dos afortunados; a paz para os oprimidos não significa apenas a manutenção da lei e ordem; a democratização nas regiões menos favorecidas pressupõe a conquista do bem-estar para todos.

As forças policiais do Estado brasileiro necessitam urgentemente readaptar em suas escolas um currículo, em que os direitos humanos sejam o protagonista desse novo paradigma de segurança pública, observando-se sempre o respeito às liberdades individuais e ao princípio basilar constitucional da dignidade da pessoa humana.

2.3 O programa nacional de segurança pública e a Lei 11.530 de 2007

O Programa Nacional de Segurança com Cidadania – PRONASCI, instituído pela Lei 11.530 de 24 de outubro de 2007, oriunda do Ministério da Justiça, é uma nova proposta de segurança pública mais próxima do cidadão, pois tem como objetivos a prevenção, o controle e a repressão da violência, direcionada aos problemas sócio-culturais do crime.

Tendo o PRONASCI como novo paradigma de segurança pública, no entendimento de Paulo Freire (apud BALESTERI, 2003, p. 48-49) deve-se observar a diferença entre mudança e transformação, qual seja:

O processo mudancista, ainda que passos necessários sejam aqueles que mexem corretivamente nas conjunturas ou, no máximo, nas estruturas funcionais dos sistemas. Na mudança há retificação de rumos, mas não profunda alteração de

(31)

“cultura”. A transformação, ao contrário, supõe a novidade, a construção de sínteses dialéticas que, mesmo valorizando as raízes do passado, são já outra realidade, diferente não apenas na forma, mas também no espírito, não apenas na mecânica, mas igualmente no conteúdo.

Portanto, as instituições e os agentes de segurança pública muito mais do que mudar devem transformar suas visões resgatando e construindo uma nova cultura.

O programa vincula atividades de segurança pública com ações sociais, mais especificamente ao trato com os jovens de 15 a 24 anos, vítimas de violência doméstica, urbana, detentos maiores de idade ou não, moradores de rua ou pessoas que de uma forma ou outra estejam em conflito ou à margem da lei.

Um ponto que merece destaque no programa é sem dúvida a criação da “Polícia Comunitária”, que por sua vez, interage diretamente de forma contínua ou até mesmo permanente com os integrantes de determinada comunidade, ou seja, o agente de segurança pública começa a conhecer as pessoas que ali residem bem como um processo de identificação dos problemas existentes, fazendo um estudo mais detalhado e por conseqüência mais eficaz, aplicando soluções mais adequadas.

Experiências mostram o sucesso da polícia comunitária nos grandes centros que geralmente apresenta seu cinturão constituído de favelas. O Rio de Janeiro foi o precursor do PRONASCI, na implantação da polícia comunitária no morro Dona Marta, conforme informação a seguir:

Em 10 de dezembro de 2008, a POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO implantou na Comunidade de Dona Marta, no Bairro de Botafogo, a Companhia de Policiamento Comunitário, com sede destacada no Morro Dona Marta. A Cia de Policiamento Comunitário de Dona Marta é precursora das Unidades de Polícia Pacificadora – UPP, criadas pelo Decreto n° 41.650 de 21 de janeiro de 2009, do Exmo. Sr. Governado Sérgio Cabral.

O objetivo primordial das UPP é, utilizando a filosofia do policiamento comunitário, executar um policiamento diferenciado nas áreas sob sua responsabilidade, em uma parceria com a população.

O policiamento comunitário realizado pelas UPP visa, não apenas a prevenção e redução da criminalidade, mas, sobretudo, a redução de riscos de danos às vítimas e moradores. Trata-se de uma estratégia de prevenção que tem por finalidade o bem comum, que pretende proporcionar uma qualidade de vida superior a população atendida. A estratégia de policiamento comunitário é a mais apropriada para nortear conduta de uma polícia do século XXI. (UNIDADES..., 2010, p. 01).

(32)

Outro ponto que deve ser observado do programa é o “Território da Paz”, que tem por objetivos diminuir os índices de violência, implantando um pacote de medidas preventivas, em que o Estado resgata sua posição no controle dessas áreas críticas, oferecendo acesso aos serviços públicos, serviço de informação e ações sociais que proporcionem uma melhor qualidade de vidas aos moradores daquela comunidade. Portanto, o PRONASCI, tem como prioridade uma constante interação entre os órgãos de segurança pública e a comunidade, estabelecendo este novo modelo de segurança pública baseado na confiança e proximidade.

A lei já regulamenta em seus primeiros dispositivos legais a importância da participação da família e da comunidade em programas, projetos e ações sociais de assistência técnica com mobilização da sociedade como um todo interagindo diretamente na melhoria da segurança pública.

Também se faz necessário apontar os aspectos mais importantes das diretrizes do artigo 3º da Lei que institui o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania.

Primeiramente a promoção dos direitos humanos combatendo os preconceitos de gênero, etnia, raça, orientação sexual e divergências culturais. O fortalecimento social das comunidades, bem como, dos conselhos tutelares para uma convivência pacífica.

Posteriormente, modernização e valorização das instituições e agentes de segurança pública. Inserção dos jovens e adolescentes egressos do sistema prisional e da mulher vítima de violência de qualquer natureza.

Após, um enfrentamento efetivo junto à comunidade ao crime organizado e à corrupção policial, sendo garantido o acesso à justiça, especialmente em áreas mais críticas como os territórios vulneráveis, assim como a recuperação de espaços públicos para o desenvolvimento de ações sociais.

Por essas e outras razões, que o PRONASCI sendo uma nova proposta que além de abranger pontos específicos das comunidades mais fragilizadas, tendo a violência e falta de uma perspectiva melhor o fator determinante dessa crise de segurança, faz com que o programa, ou seja, este pacote de medidas que visa através de ações principalmente sociais alcance no que for possível uma segurança pública no mínimo mais próxima do cidadão.

(33)

3 SEGURANÇA PÚBLICA, DIREITOS HUMANOS E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Como se viu no capítulo anterior, a Constituição Brasileira consagra que segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, objetivando a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

Trata-se, portanto de um direito fundamental que, sem dúvida, é fruto dos direitos humanos, sem o qual, seria impossível a plena realização do Estado Democrático de Direito, uma vez que serve como instrumento garantidor mínimo de segurança das liberdades individuais e coletivas, bem como, do patrimônio, seja ele, material ou não.

Tendo como pilares de uma nova sociedade, a segurança pública e os direitos humanos, de forma equânime e harmônica, são perfeitamente compatíveis em um Estado Democrático de Direito.

3.1 O Estado Democrático de Direito e o princípio da dignidade da pessoa humana como um de seus fundamentos

Conceitualmente falando, significa dizer que o Estado de forma muito genérica é uma ficção jurídico-política que tem como função garantir direitos em todas as suas dimensões, sejam elas: civis, políticas, sociais, econômicas e de solidariedade.

Democraticamente o Estado não tem vida própria, pois precisa das pessoas para exercer suas atividades.

Na concepção de Moraes (2009, p. 4), a evolução do Estado contemporâneo deu-se em direção a afirmação normativa de direitos fundamentais. Para o autor:

Essa evolução foi acompanhada pela consagração de novas formas de exercício da democracia representativa, em especial, com a tendência de universalização do voto e constante legitimação dos detentores do Poder, fazendo surgir à idéia de Estado Democrático.

(34)

No Estado de Direito o que vigora é a lei, tanto é verdade que esse mesmo Estado deve obedecer as normas por ele criadas. Ainda, na mesma concepção de Moraes (2009, p. 4),

A evolução do Estado consagrou a necessidade da fórmula de Estado de Direito, que, conforme salientado por Pablo Lucas Verdú, “ainda exerce particular fascinação sobre os juristas”. Essa fórmula aponta a necessidade do direito ser respeitoso com as liberdades tuteladas pelo poder público.

Quer dizer, o Estado se encontra em uma posição jurídica e institucional que está intimamente ligado às normas por ele mesmo editadas, que alcança os direitos mais básicos de cada indivíduo até a complexidade do ordenamento jurídico brasileiro.

Qualquer Estado que se destina a garantir liberdades individuais e coletivas com a observância dos direitos humanos e das liberdades fundamentais através de um conjunto normativo, entende-se, portanto, um Estado democrático de direito.

No Estado democrático de direito, somente o direito positivo é reconhecido como fonte de direito, pois, é o direito codificado vindo do poder competente para tanto, ou seja, o poder legislativo que poderá limitar a ação do próprio Estado e invocar através dos tribunais o império da Lei.

Estabelecida no artigo primeiro da Constituição brasileira de 1988, o constituinte se preocupou em conciliar de forma arranjada os fundamentos, ora de um Estado de Direito, ora de um Estado Social, quais sejam, a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.

Nesta linha, Luisi (apud STRECK; FELDENS, 2002, p. 50) esclarece que:

Ao incorporar os princípios do Estado Liberal e do Estado social, e ao conciliá-los, as Constituições modernas renovam, de um lado, as garantias individuais, mas introduzem uma série de normas destinadas a tornar concretas, ou seja, reais, a liberdade e a igualdade dos cidadãos, tutelando valores de interesse geral como os pertinentes ao trabalho, à saúde, à assistência social, à atividade econômica, ao meio ambiente, à educação, à cultura etc.

Portanto, o Estado Democrático de Direito, surge como um sistema social e jurídico que asseguram garantias e colocam a pessoa humana e a liberdade como uma efetiva e concreta evolução em relação ao Estado Liberal e ao estado Social.

(35)

Ainda resume Franco (apud STRECK; FELDENS, 2002, p. 53-54) que:

O Estado Democrático de Direito é aquela concepção sintética que reúne, em relação dialética, a idéia de Estado de Direito, isto é, de um Estado regido pelo direito que provém da vontade geral expressa pelo povo e de um estado Social que interfere, direta e imediatamente no jogo social; é uma fusão entre Estado-guardião do cidadão e o Estado intervencionista das relações sociais, a que se acresce a idéia da democracia, isto é, do Estado que exclui a prepotência e é, por sua formação e por seu conteúdo organizacional, democraticamente organizado.

Segundo Streck (2002), os princípios que norteiam o Estado Democrático de Direito podem ser assim sintetizados: a) a Constitucionalidade como reguladora do equilíbrio jurídico; b) a Organização Democrática da Sociedade; c) o Sistema de direitos fundamentais e coletivos, assegurando ao indivíduo uma autonomia frente aos órgãos públicos ou reconhecendo a dignidade da pessoa humana na defesa da liberdade, justiça e solidariedade; d) Justiça social como instrumento diminuidor das desigualdades; e) a Igualdade real de direitos e não meramente formal; f) a Divisão de poderes e funções; g) a Legalidade como mecanismo a impulsionar e legitimar as regras, formas e procedimentos; h) a Segurança e a certeza jurídica.

Assim sendo, o Estado Democrático de Direito, resultado de um propósito oriundo de um Estado de Direito Liberal e de um Estado Social, representa uma síntese aprimorada daqueles e tem como fundamento o princípio da dignidade da pessoa humana.

3.2 O princípio da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental do Estado democrático de direito

A Constituição brasileira definiu em seu artigo 1°, caput, o perfil político constitucional do Brasil como o de um Estado Democrático de Direito. Trata-se do mais importante dispositivo da Carta de 1988, pois dele decorrem todos os princípios fundamentais do nosso Estado. Também determinou que são fundamentos do Estado a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

A dignidade da pessoa humana representa, portanto, um dos fundamentos do Estado Brasileiro, sendo que todas as ações do Estado devem ser voltadas a efetivação deste postulado fundamental.

(36)

Guerra e Emerrique (2006, p. 381, grifo dos autores) têm a seguinte compreensão:

A pessoa humana é considerada como indivíduo em sua singularidade e partindo desta premissa obtém o princípio de que esta deve ser “livre” (liberdade externa oprimida, apenas, pelos obstáculos próprios da natureza e, ainda, não afastada pelo avanço das ciências correlatas). Por seu turno, como ser social, estando com os demais indivíduos numa relação de igualdade, a pessoa humana passa a receber a carga opressora, também, dos obstáculos à sua vontade, oriundos da organização política da sociedade.

Os direitos humanos fundamentais não podem ser compreendidos como fruto das estruturas do Estado, mas da vontade de todos, ou seja, as liberdades não são criadas e não se manifestam senão, em sua maior parte, quando o povo as quer. Daí, a idéia de Benoit: “as liberdades não nascem senão de uma vontade, elas não duram senão enquanto subsiste a vontade de as manter.

Também pactua desse entendimento Moraes (2009, p. 21-22), afirmando que:

A dignidade da pessoa humana: concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente ás personalidades humanas. Esse fundamento afasta a idéia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.

Não é por acaso que o princípio da dignidade da pessoa humana vem insculpido no primeiro artigo da ordem constitucional como fundamento de um Estado Democrático de Direito, antes até mesmo dos direitos e garantias fundamentais.

Também comunga da mesma compreensão Castro (2005, p. 19) no sentido de que “o Estado Constitucional Democrático da atualidade é um Estado de abertura constitucional radicado no princípio da dignidade do ser humano.”

O princípio da dignidade da pessoa humana deve ser compreendido no âmbito do direito constitucional positivo, pois se apresenta mesmo que às vezes de forma intrínseca em outros assuntos abordados no teor do texto constitucional, quais sejam: na ordem econômica, quando refere assegurar a todos uma existência digna (artigo 170, caput), na esfera social, quando funda o planejamento familiar baseado na dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável (artigo 226, § 6º), além de assegurar à criança e ao adolescente o direito à dignidade (artigo 227, caput).

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Seguindo com o mesmo entendimento Sarlet (2005, p. 62) , compreende que: “Assim, antes tarde do que nunca – pelo menos antes da passagem para o terceiro milênio-, a dignidade da pessoa, nesta quadra, a própria pessoa humana, merece a devida atenção por parte da nossa ordem jurídica positiva.”

Ainda, se faz necessário frisar que o princípio da dignidade humana mesmo sendo um limitador das intervenções punitivas do Estado, encontra sérias dificuldades de sua aplicação no que tange ao direito penal. Infelizmente a pena decorrente de uma decisão judicial é justificada pelo cometimento de um delito tão somente, em que ocorrem significativas violações dos direitos humanos, conseqüentemente inviabilizando o atual sistema punitivo do Estado.

3.3 A função punitiva no Estado Democrático de Direito

De plano nota-se que o Estado Democrático de Direito que pretendemos alcançar um dia é completamente antagônico ao atual modelo de Estado Penal aplicado em nosso ordenamento jurídico. Nos Estados Democráticos a função punitiva deve ser exercida em prol da defesa dos direitos humanos de todos, com o duplo objetivo de reduzir a violência do crime e a violência da pena. Ferrajoli (apud QUEIROZ, 2002) acentua que “a função da pena deve ser compatível com a idéia de dignidade humana e por isso, o Direito Penal deve buscar limitar a intervenção punitiva do Estado”, sendo utilizado somente em casos extremos. Mas o que acontece é que a legislação penal brasileira possui várias incompatibilidades com o texto constitucional.

O Estado Democrático de Direito juntamente com o Direito penal tem a função específica bem clara de controlar o crime preventivamente com políticas sociais e limitar o próprio Estado quanto a sua intervenção punitiva. Erroneamente, percebe-se hoje, uma tendência em se aceitar a pena como instrumento de retribuição ou vingança, o que estimula práticas punitivas cada vez mais repressivas. A pena retributiva foi defendida por Kant (apud QUEIROZ, 2002, p. 45), que dizia:

A pena atende uma necessidade absoluta de justiça, que deriva de um “imperativo categórico”, isto é, de um imperativo moral incondicional, independente de considerações finais ou utilitárias, bastando à pena a si mesma, como realização de

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