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A lei 11.343/2006 e o aumento de mulheres encarceradas

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Academic year: 2021

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UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

LETÍCIA COSTA PIZOLOTTO

A LEI 11.343/2006 E O AUMENTO DE MULHERES ENCARCERADAS

Ijuí (RS) 2014

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LETÍCIA COSTA PIZOLOTTO

A LEI 11.343/2006 E O AUMENTO DE MULHERES ENCARCERADAS

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DEJ- Departamento de Estudos Jurídicos.

Orientador: MSc. Sergio Luiz Fernandes Pires

Ijuí (RS) 2014

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Dedico este trabalho a todos que lutam pela igualdade social, pelos direitos humanos e pelas condições de uma vida digna.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente a Deus pela oportunidade de concretizar um sonho, por iluminar o meu caminho e me conduzir pela sua vereda. Obrigada Senhor, por me dar forças e fé para sempre seguir em frente.

Agradeço aos meus pais pelo apoio, incentivo e dedicação. Ao meu pai por ser meu exemplo de vida, um homem guerreiro, que batalha pelos seus objetivos. À minha mãe, por me ensinar que na vida precisamos nos moldar às situações e fazer de cada acontecimento um aprendizado.

Agradeço aos meus irmãos por serem meus anjos, pelo permanente amor que nos une. Ao Junior, por termos compartilhado muito de nossas vidas juntos, fazendo-nos companheiros e amigos um do outro. Ao Éderson, por ser uma criança cheia de glória e pureza.

Ao meu orientador Sérgio Luiz Fernandes Pires pela sua dedicação, serenidade, disponibilidade.

À professora Diolinda Kurrle Hannusch, pelo seu empenho na transmissão dos conhecimentos acerca do Direito Penal e Processual Penal, o que me trouxe imenso apreço por tais ramos.

A todos que colaboraram de uma maneira ou outra durante a trajetória de construção deste trabalho: amigos, colegas de classe e professores, muito obrigada!

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“Olho por olho, e o mundo acabará cego.”

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise acerca do aumento do encarceramento feminino em face da Lei nº 11.343/2006, Lei de Drogas. Analisa os aspectos históricos de como se iniciou o aprisionamento feminino, bem como sua evolução até a atualidade, trazendo uma reflexão sobre os efeitos desta evolução, uma vez que o índice de mulheres presas vem crescendo vertiginosamente. Faz, então, um estudo sobre a ineficácia desta penalização exacerbada, dado o aumento de prisões e a continuidade da conduta criminosa, pondera ainda, os efeitos negativos do cárcere feminino, visto que, muitas destas mulheres presas deixam do outro lado da cela seus filhos e toda a estrutura de um lar. Busca-se com este trabalho elencar alternativas possíveis para a punição destas mulheres criminosas, porém, prejudicando o menor número possível de pessoas, ou seja, alternativas que possam diminuir a violência que o sistema penal impõe às criminosas e ao mesmo tempo possam coibir a prática delituosa.

Palavras-Chave: Encarceramento feminino. Lei nº 11.343/2006. Lei de Drogas. Tráfico de Drogas.

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ABSTRACT

The present study Completion of course is an analysis of the increase in female incarceration in light of Law No. 11,343 / 2006 Drug Law. Examines the historical aspects of how the female began trapping as well as its evolution to the present, bringing a reflection on the effects of this trend, since the rate of women prisoners has been growing dramatically. Then do a study on the ineffectiveness of this heightened penalty, given the increase in arrests and the continued criminal conduct, yet, considering the negative effects of female imprisonment, since many of these women prisoners leave across the cell his children and the whole structure of a home. Search with this work to list possible alternatives to punishment of criminal women, however, impairing the smallest possible number of people, ie, alternatives that might reduce the violence that imposes criminal justice system and at the same time to curb the practice criminal.

Keywords: female incarceration. Law No. 11.343 / 2006. Drug Law. Drug Trafficking.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO……….………09

1 O APRISIONAMENTO FEMININO...12

1.1 O contexto histórico das prisões femininas...13

1.2 A população feminina e o tráfico de drogas...17

1.3 A Lei de Drogas 11.343/2006...24

2 AS GARANTIAS LEGAIS DAS PRISIONEIRAS...26

2.1 As Garantias do Ordenamento Jurídico Brasileiro...26

2.2 O viés Internacional Garantista...30

3 A CAPACIDADE RESSOCIALIZADORA DAS PENAS...33

3.1 Condições Mínimas Capazes de Proporcionar a Ressocialização...37

3.1.1 Assistência Material...37 3.1.2 Assistência à Saúde...38 3.1.3 Assistência Jurídica...38 3.1.4 Assistência Educacional...38 3.1.5 Assistência Social...39 3.1.6 Assistência Religiosa...39 3.1.7 Assistência ao Egresso...39 CONCLUSÃO... ...40 REFERÊNCIAS... ...43

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho faz um estudo sobre o aumento do encarceramento feminino, tendo como referência o alto índice de aplicação da tipificação penal prevista na Lei 11.343/2006. Para tanto, será feita inicialmente uma análise histórico-evolutiva do aprisionamento feminino.

Será observada a perspectiva da sociedade diante da criminalidade que envolve a figura feminina, bem como o desenvolvimento com o passar dos anos dessa postura social diante das mulheres infratoras. Atentaremos para a condição social de tais mulheres transgressoras e a correlação com o tráfico de drogas. A presente pesquisa abordará ainda, os motivos que levam o público feminino ao envolvimento criminoso, em especial, os motivos conexos com o crime de tráfico de drogas.

Neste contexto, vem corroborar os índices divulgados pelo Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (InfoPen), os quais apresentam que em cinco anos houve um aumento de 42% de mulheres na população carcerária; sendo que deste aumento, o maior precursor é o tráfico de drogas. Destarte, será refletida a conduta estatal enquanto órgão detentor do poder-dever de punir, bem como os benefícios e/ou prejuízos deste sistema punitivo.

Os apontamentos demonstram que o Estado em uma tentativa exaurida de buscar a melhoria da sociedade como um ambiente ideal para se viver, tem apelado cada vez mais para o poder coercitivo que detém, valendo-se do sistema penal para atacar as condutas irregulares. Ao visar à erradicação do consumo de entorpecentes, advindo do tráfico ilícito de drogas, o Estado vem se manifestado veemente contra os fornecedores de drogas ilícitas.

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Entretanto, é preciso mencionar que tal prática se faz necessária dado a falência estatal diante de políticas sociais que possibilitem a inserção social de forma universal aos cidadãos sem que estes precisem se envolver com atividades ilícitas. Sendo assim, é impossível transmitir a culpa integral aos agentes infratores.

O estudo abordará a ineficácia de tal objetivo estatal, qual seja a erradicação do consumo de drogas, em contraponto com as medidas repressoras adotadas. Buscando propor um sistema mais dinâmico e equitativo, no qual se possa coibir a comercialização de entorpecentes, por meio de medidas repressoras, porém alternativas, ou seja, que ao mesmo tempo, possibilitem à reinserção ao convívio social, por meio da capacitação dos agentes infratores.

Projeta-se questionar o atual modelo punitivo, pois as mulheres necessitam de um olhar diverso daquele que a interpretação literal da Lei 11.343/06 dispõe de forma genérica. É preciso afrontar um sistema que insistentemente é utilizado para atacar a criminalidade, e que nos evidencia um aumento exacerbado de agentes em cumprimento de penas, sem alcançar os efeitos psicopedagógicos a que se propõe a norma impositiva.

A escolha do tema desta pesquisa traz consigo um ideal de melhoria, com um desejo de justiça; alicerçado aos índices que, ano após ano, vêm aumentando, pretendemos demonstrar os efeitos reais em face daquelas que deveriam ser o seio do lar, o apoio dos filhos, e que, no entanto, tem suas vidas modificadas abruptamente, rompendo o elo familiar.

Tendo em vista que o grande número de mulheres encarceradas se deve ao tráfico de drogas, e ainda, que na maioria dos casos os familiares destas mulheres já foram presos, por uma sequência lógica se deduz que as mulheres não tiveram uma opção, mas sim, precisaram dar continuidade aos “negócios” ilícitos, visto que, esta é a forma de subsistência do lar.

Desta forma, discorreremos em três capítulos uma percepção acerca das condições acima expostas. Abordando inicialmente, o contexto histórico que se iniciou o encarceramento feminino, bem como o crescente número de mulheres presas atualmente devido a Lei 11.343/2006 – Lei de Drogas, legislação que também será

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debatida. Em um segundo momento, passaremos a tratar das garantias asseguradas a estas mulheres, garantias do próprio ordenamento jurídico brasileiro, e os direitos observados em debates internacionais. Por derradeiro, abordaremos a capacidade destas penas impositivas ressocializarem as detentas, esboçando as condições mínimas asseguradas pela Legislação específica da Execução Penal.

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1 O APRISIONAMENTO FEMININO

O desejo das mulheres terem voz ativa na sociedade e ainda cooperar com os rendimentos familiares vem garantido um lugar de destaque a essa nova personalidade feminina. Ao mesmo tempo, essa busca traz consigo um lado negativo, uma vez que os índices de criminalidade, que eram essencialmente masculinos, atualmente se apresentam com um elevado número de mulheres. Os anseios ilimitados, diante de recursos escassos e da baixa escolaridade, seriam os motivos centrais para o avanço dessa estatística. Ainda, é preciso observar que as mulheres brasileiras, estão cada vez mais em posição de chefes de família, como evidencia Mary Alves Mendes, (2002, p.1):

O crescimento freqüente da presença feminina na esfera do trabalho traz também à tona uma situação cada vez mais constante na atualidade que é a mudança de gênero na manutenção da família. No Brasil, segundo dados do censo do IBGE (2000), as famílias chefiadas por mulheres representam 24,9% dos domicílios brasileiros.

No sentido de acelerar esta evolução feminina, o crime surgiu como um caminho fácil e rápido para atingir os resultados financeiros pretendidos. O tráfico de drogas, tendo em vista o retorno financeiro rápido, sem a necessidade de conhecimentos específicos, e ainda, praticamente imperceptível ao sistema, é o mais comum entre as mulheres. Os lucros com o negócio ilícito são o que influenciam ao cometimento do crime, conforme elucida a autora Thais da Costa Pereira, (2010, p13):

Tráfico de Drogas – É o tipo de crime mais lucrativo no mundo, maior inclusive que a renda interna de muitos países, opera algo em torno de US$ 320 bilhões anuais.

No entanto, o cárcere supõe uma trajetória falha dos poderes públicos, diante da falta de estrutura para abarcar a sociedade como um todo e garantir o acesso ao desenvolvimento social para a coletividade de forma digna e lícita. Conforme trazem Bárbara Musumeci Soares e Iara Ilgenfritz (2002, p.78):

Essa preocupação foi norteada pela hipótese de que existe uma relação, não necessariamente de causa e efeito, mas no mínimo de continuidade, entre participação em atividades criminosas e

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experiências de relações abusivas, ou de imersão em ambientes violentos, vividas na infância, na adolescência e/ou na vida adulta.

Diante da ineficiência do sistema estatal em garantir condições para que todos cresçam em um meio propício a boa índole, o poder-dever estatal se incumbe de punir aqueles que não se enquadram no moldes pré-definidos pelo próprio sistema. Porém, o ordenamento jurídico brasileiro além de punir, também garante que todos os direitos inerentes à pessoa humana devem ser respeitados, logo, se a pena preconizada é a de privação da liberdade, os infratores somente devem ser privados da sua liberdade e os demais direitos deverão ser assegurados, o que infelizmente na prática não é sempre observado.

Da mesma forma, em relação ao aprisionamento feminino, o qual exige um maior cuidado, diante das especificidades do gênero, percebemos a inexistência de políticas públicas que atendam efetivamente às necessidades das mulheres encarceradas.

1.1 O contexto histórico das prisões femininas

A prisão feminina foi instituída no Brasil no início dos anos de 1940, conjuntamente à reforma penal. Sendo que, em 1941 surgiu em São Paulo o Presídio de Mulheres, junto ao Complexo do Carandiru, tornando-se posteriormente a Penitenciária Feminina da Capital. Já em 1942, no Rio de Janeiro, foi criada a Penitenciária das Mulheres, vindo a ser denominada Presídio Feminino Talavera Bruce.

Em se tratando do contexto histórico do aprisionamento feminino, pode-se destacar a sua origem ligada às relações destas com a bruxaria e a prostituição, condutas que começavam a dividir concepções morais, tão logo, pondo em risco o ideal de sociedade defendido até então pelos dogmas religiosos. A mulher deveria desempenhar o papel de dama, dando o exemplo moral e de castidade à sociedade, servindo à família e ao esposo, destarte, a Igreja se sentindo ameaçada decidiu adotar medidas rígidas, dando início à "caça às bruxas".

Percebe-se na origem histórica do aprisionamento feminino no Brasil, a associação do discurso moral e religioso à prisão das mesmas. Assim, o encarceramento

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feminino acabou por dar origem a uma entidade prisional diferenciada, desenvolvida por Lemos de Brito - em nota, Soares e Ilgenfritz (2002) indicam que Lemos de Brito foi professor, penitenciarista, legislador, deputado, membro do Instituto dos Advogados do Brasil e do Chile, Presidente do Conselho Penitenciário do antigo Distrito Federal, autor de uma extensa bibliografia sobre questão prisional e de prolixos estudos sobre a questão sexual nas prisões. Conforme Soares e Ilgenfritz (2002, p. 53):

Lemos de Brito foi encarregado, no começo 1923, pelo então ministro da Justiça João Alves, a elaborar um projeto de reforma penitenciária. Para tanto, percorreu o país visitando todas as prisões e ofereceu um plano geral, em 1924, no qual aconselhou a União a construir um “reformatório especial” (em pavilhão completamente isolado) não somente para as mulheres condenadas há mais de três anos do Distrito Federal, mas às que forem remetidas pelos estados. Cabe observar que Lemos de Brito não sugeriu a construção de uma prisão nos moldes tradicionais da época, ou seja, não se pautou pelo modelo das prisões masculinas. Ele propôs, ao invés disso, a construção de um reformatório especial, com o que indicava a necessidade de um tratamento específico para a mulher por parte do Sistema Penitenciário.

Sendo que esta estruturação diferenciada dos presídios, a fim de separar homens de mulheres, mais se buscava pela pacificação dos presídios do que por garantir melhores condições destes, visto que, era torturante para os homens estarem cumprindo uma pena de detenção da liberdade e ainda terem que conviver com mulheres em plena abstinência. Também se buscou a separação das presas condenadas por crimes comuns como infanticídio e aborto, daquelas que eram condenadas por prostituição, embriaguez ou vadiagem.

Denota-se que as prisões eram caracterizadas muito mais por um juízo moral alicerçado nos dogmas religiosos, do que em uma tipificação penal pré-estabelecida. Buscava-se com a prisão destas mulheres criminosas a sua domesticação e também o cuidado à sexualidade destas. Na prisão as mulheres criminosas poderiam aprender como deveriam se portar socialmente, seguindo os padrões admissíveis pela doutrina religiosa, como bem evidencia Olga Espinoza em seu trabalho “A Prisão Feminina desde um Olhar da Criminologia Feminista” (2003, p. 52):

“Uma vez criada a prisão como instituição, entendeu-se necessário a separação de homens e mulheres para aplicar a eles e elas tratamentos diferenciados. Com essa medida buscava-se que a educação

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penitenciária restaurasse o sentido de legalidade e de trabalho nos homens presos, enquanto, no tocante às mulheres, era prioritário reinstalar o sentimento de pudor”.

Também é referida pelas autoras esta busca por parte das entidades prisionais em “devolver” para a sociedade mulheres reestruturadas de acordo com os moldes que entendiam ideais, para tanto, as entidades prisionais eram coordenadas por freiras:

Dedicadas às prendas domésticas de todo tipo (bordado, costura, cozinha, cuidado da casa e dos filhos e marido), elas estariam aptas a retornar ao convívio social e da família, ou, caso fossem solteiras, idosas ou sem vocação para o casamento, estariam preparadas para a vida religiosa (SOARES; ILGENFRITZ, 2002, p. 58).

No entanto, a estratégia não surtiu os efeitos esperados, tendo em vista que as mulheres passaram a ser mais violentas, bem como suas condutas criminosas mais graves. Como explicita Ruth Maria Chittó Gauer (2012, p.102):

O sujeito condenado à pena de prisão não está apenas vivendo uma situação de pena privativa de liberdade. Está, também, condenado a um tempo de espera, de imobilidade, em que há desaceleração, inércia. Trata-se de um movimento regressivo. Durante a espera, seu corpo poderá pedir socorro, adoecendo, se despersonalizando. O indivíduo depara-se, então, com um tempo em que será preciso lidar com essa espera. O tempo passa acelerado fora dos muros da prisão, embalado pela velocidade da tecnologia. A interrupção do tempo causará perdas, tanto das relações interpessoais como das informações do mundo externo.

As mulheres foram inicialmente presas por representarem um estorvo social, ou seja, aquelas mulheres que não correspondiam aos desejos idealizados por uma parcela da sociedade, precisavam ser excluídas para evitar a propagação de condutas indesejáveis. Para haver a transformação psicológica é preciso que o ambiente de vivência seja propício, bem como o relacionamento interpessoal possibilite o crescimento pedagógico. Não poderia ser diferente, a ressocialização não aconteceu, visto que estas mulheres se sentiram desprezadas ao serem hostilizadas e trancafiadas em presídios. O ambiente, a convivência social e o desejo de ressocialização precisam ter o mesmo enfoque, um ser subsídio do outro, como elucida Lucien Auger (1992, p.20):

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Entre outras coisas se torna impossível explicar como um ser humano pode chegar a se desenvolver, quando as condições ambientais parecem muito desfavoráveis ao seu crescimento. Deve-se igualmente postular que esta tendência à atualização é radicalmente positiva, isto é, que tende ao crescimento e não à destruição do ser. Que esta tendência esteja em ação em nós, é mais fácil percebê-lo no domínio do crescimento físico: o organismo corporal utiliza os recursos de seu meio ambiente para aumentar, crescer, desenvolver-se segundo sua linha própria. Acontece o mesmo no domínio psicológico, não se trata de minimizar a importância do meio ambiente para o crescimento e a maturação de um ser humano, trata-se antes de não esquecer que a influência do meio ambiente se exerce sobre um ser, ele próprio, dotado de sua potência interior de desenvolvimento.

Como também apresenta Olga Espinoza (2004, p. 78), “O cárcere é uma instituição totalizante e despersonalizadora, na qual predomina a desconfiança e onde a violência se converte em instrumento de troca. O único objetivo de quem está ali é sair, fugir, atingir a liberdade.” Sendo a humilhação algo constante, tão logo, a depressão se manifesta de forma intensa entre os detentos.

No mesmo sentido, GAUER (2012, p.138) apresenta:

A prisão é o lugar da exclusão, mas, quando em liberdade, esses indivíduos já estavam excluídos. Eram, também, estimulados pela sociedade de consumo a ir à busca dos objetos e bens desejáveis. A sociedade do instantâneo, que despreza e descarta os valores e limites, seduz um grupo que deseja desesperadamente fazer parte dos indivíduos “globais”, aqueles que têm autonomia.

A prisão, embora cause a pior impressão diante do que podemos entender como mundo, contempla o dia-a-dia de muitos; as reações daqueles que mantém contato com qualquer entidade prisional não pode ser definida, pois são das mais variadas. O que é sabido, é que os presídios caracterizam aquilo que ninguém quer para si, seja pelas pessoas ali presentes, ou, pelas condições do ambiente.

Poucos ambientes são tão tensos como o universo carcerário: violência, criminalidade, poder, ambição, controle. Muitos sentimentos estão envolvidos, o anseio pelo poder, em um sistema de regras informais, gera o fenômeno que Donald Clemmer denominou de prisonização: “Todo homem confinado ao cárcere sujeita-se à prisonização”, ou seja, em graus diferentes, todos aqueles que ingressam no sistema penitenciário acabam se moldando aos hábitos e regras que são praticados no presídio.

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Para manter-se vivo, é preciso respeitar as normas regimentais da instituição, bem como adaptar-se as regras de convivência que são estabelecidas por aqueles que detêm o controle interno, presos com o poder de dominar outros presos.

1.2 A população feminina e o tráfico de drogas

O sistema prisional foi pensado para uma população masculina, pois como já mencionado, as prisões femininas se iniciaram posteriormente às masculinas. Assim, a sobrevivência das pessoas encarceradas é precária, ainda mais em se tratando do público feminino, em que as condições de maus-tratos e superlotação são os problemas mais corriqueiros.

A mulher na sociedade brasileira, bem como de uma forma global, aos poucos foi conquistando seu espaço, com isso adquirindo garantias e direitos, deixando de ser uma figura discriminada e repreendida pela sociedade, entenda-se aqui sociedade os homens que eram considerados superiores e detentores do poder, fazendo das mulheres pessoas submissas às suas ordens.

Segundo Lilia Aparecida Kanan (2010, p. 245):

Para que tal fato ocorresse, alguns fatores foram contributivos, tais como: modificação do ideal da mulher do lar; o fato de poder controlar e decidir a quantidade de filhos (descoberta dos anticoncepcionais); o direito ao voto; a maior liberdade sexual; a necessidade de compor a renda familiar; os novos modelos de células familiares, a promulgação das leis que protegem as mulheres trabalhadoras, a busca pela qualificação em termos culturais, e a legitimidade do acesso ao estudo.

As oportunidades auferidas pelas mulheres acabaram por envolvê-las no círculo socioeconômico, o que também ensejou novas possibilidades de trabalho, bem como favoreceu o envolvimento com práticas criminosas. Porém, não podemos definir que a ênfase feminina no mercado de trabalho seja o único fator que as levou ao cometimento de crimes, entende-se que foram fatores conexos que geraram tais condutas. O maior envolvimento social contribuiu, entretanto, associado ao ambiente em que vivem estas mulheres criminosas.

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Como afirmado, as mulheres conquistaram muitos direitos e passaram a cumprir obrigações advindas destes direitos. Ao passo que tais obrigações não eram cumpridas, tiveram que suportar as penas impostas para tais condutas delinquentes. É sabido, no entanto, que o cumprimento de tais penas gera muito dissabor na vida de qualquer cidadão, em especial destas mulheres, marcadas como o sexo frágil e que agora passam a sofrer as penas atribuídas aos agentes delituosos de uma forma genérica, visto que não há distinção entre os crimes praticados por homens ou mulheres.

O número de mulheres condenadas por praticarem crimes é bem menor se comparado ao número masculino, porém, se comparado com o índice relativo o aumento de mulheres criminosas é maior do que o índice de homens criminosos. É preocupante o ritmo acelerado em que vêm aumentando as prisões femininas, pois segundo o Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (InfoPen) em cinco anos houve um aumento de 42% de mulheres na população carcerária.

Nota-se que o grande índice de encarceramento feminino se dá em virtude do tráfico de drogas, como apresenta:

No Rio Grande do Sul, anteriormente aos anos 60, à maioria dos crimes praticados por mulheres faziam referência aos crimes passionais. Entre as décadas de 60 e 70 as práticas delitivas se apresentavam de duas formas: a rebeldia e a delituosa. De um lado pelo repúdio a ideologias e militâncias não aceitas pelo poder maior do Estado. Do outro as práticas delituosas, sendo o crime de furto o mais praticado e responsável por apenar e encarcerar o sexo feminino. Do início dos anos 70 até 2008, ou seja, após três décadas, o tráfico de drogas surpreende e continua sendo o crime que superlota prisões. (MISCIASCI; NOVAES apud DUTRA, 2012, p. 6).

Evidencia-se que desde a década de 70 as mulheres já se envolviam com o crime de tráfico de drogas, o qual foi se expandindo de forma mais acelerada que os demais crimes. Este índice tem aumentado diante da facilidade que têm as mulheres para praticar o tráfico de drogas, pois não caracterizam o foco da ação policial, tão logo, são alvos dos traficantes para a prática criminosa. Como enfatiza o delegado regional de Balsas/MA, Eduardo Galvão, os traficantes aliciam adolescentes e mulheres para facilitar a venda da droga nos bairros da cidade.

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O assujeitamento advindo das relações afetivas existentes entre as mulheres e os homens traficantes, também é outro fator que contribui para que as mulheres passem a traficar drogas, defende a autora Elaine Cristina Pimentel Costa, (2008, p.23):

Em outras palavras, pretendemos demonstrar que o universo das mulheres presas como traficantes em Alagoas, as ações relacionadas às drogas nem sempre estão ligadas ao caráter mercadológico do tráfico, mas são, na realidade, exercidas em nome das relações afetivas que essas mulheres estabelecem com os homens.

Ou seja, se percebe que a grande maioria das mulheres encarceradas pelo tráfico de drogas, assim o são por influência psicológica de alguém, seja para dar prosseguimento aos negócios antes conduzidos pelo marido, ou ainda filhos; ou até mesmo para levar drogas no presídio para o seu companheiro ou familiar que está preso em virtude do tráfico.

COSTA, (2008, 26):

Observamos que a mulher traficante quando vende, guarda ou transporta a droga para dentro de um presídio, por exemplo, não o faz somente porque passa por dificuldades financeiras e tem no tráfico um meio de subsistência, mas, em muitos casos, porque tenta dar provas de seu afeto ao companheiro, tio ou irmão.

Corrobora ao entendimento a autora Miriã Claro de Araujo (2011, p.12):

A inserção da mulher no tráfico pode ocorrer de forma independente, porém, comumente ocorre por influência de uma figura masculina que pode ser pai, irmão, filho e, principalmente, namorado ou marido (SOUZA, 2009). O envolvimento da mulher em práticas ilícitas influenciadas por homens nos remete às representações sociais sobre a afetividade relacionadas às mulheres.

Segundo Vergara (1998, p. 30 apud SALMASSO, 2003, p.5) "[...] a mulher atua muito mais como coadjuvante, sendo que o protagonista nessa situação geralmente é do sexo masculino e sempre estão ligados por laços de afetividade, como irmãos, parceiros, parentes [...]"

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Ao presenciarem a prisão de homens com os quais essas mulheres têm laços afetivos, vislumbram no tráfico de drogas uma necessidade: seja para continuar a manter o sustento da família, seja para honrar com os compromissos pendentes relacionados ao então preso, seja para manter o vício do homem no presídio.

Desta forma, denota-se a necessidade de políticas públicas para o real extermínio do tráfico de drogas, mulheres que tem familiares presos pela prática do crime precisam de um apoio inclusivo, precisam ser inseridas na sociedade por um novo ângulo, tendo como melhor exemplo, a qualificação profissional; pois elas precisam de oportunidades para prover o sustento de suas despesas, bem como o da família, e garantir a independência financeira, sem que esta seja por meio do tráfico de drogas ou qualquer outra prática ilícita.

Logo, ao fugir da perspectiva limitadora do senso comum, podemos perceber que os laços afetivos acabam por envolver muitas mulheres no tráfico de drogas. Muitas das prisioneiras não se sentem criminosas, e muito menos perigosas, afinal, antes de serem condenadas, eram mulheres com uma família e desempenhando os papeis sociais incumbidos a elas. Em sua grande maioria, praticaram um ato ilícito movido pelo sentimento de amor: ao pai, ao filho, ao irmão, ao marido, ao companheiro; justificando seus atos pelo afeto despendido, muitas vezes nem mesmo aceitando tal imputação criminal.

COSTA, (2008, 27):

Por outro lado, todo o processo de violência que está ao redor do tráfico de entorpecentes favorece a criação de imagens – representações sociais – de caráter negativo sobre as mulheres traficantes, sobretudo diante da forma como a mídia expõe a questão. Isso se contrapõe frontalmente com as percepções que elas mesmas têm das experiências que viveram com as drogas, quase nunca suficientes para que se auto-intitulem criminosas. No contexto da afetividade e da drogadição, os significados que os traficantes atribuem às suas próprias ações podem revelar possíveis justificativas para seu envolvimento e permanência no tráfico ou, em muitos casos são consequências não previstas do uso de drogas.

Entendemos a humanidade presente nessas mulheres, que vislumbram a libertação do sistema prisional para poderem reencontrar suas vidas: o convívio

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familiar, a relação conjugal, uma condição de ser humano digno, com um trabalho lícito. Enfim, mulheres arrependidas, com sonhos, desejos e marcadas para sempre pela dor da prisão. Para antecipar esse sonho de liberdade, muitas mulheres buscam o trabalho ainda nas entidades prisionais, como bem traz a autora:

Não surpreende que a reclusa almeje obter a liberdade. Não deve chamar nossa atenção o fato de as pessoas recolhidas em uma prisão procurarem ser livres por todos os meios possíveis. O trabalho constitui um caminho para modificar o tempo de pena e instrumento legítimo para a obtenção de liberdade. (ESPINOZA, 2004, p.143)

Porém, o sistema punitivo de repressão às drogas não vem conseguindo atingir o resultado que objetivava, qual seja o de proteção da saúde pública e garantia da segurança pública, conforme assevera o autor Felipe Elias:

A criminalização dessas mulheres praticamente não afeta a “indústria do tráfico”. Tão cedo quanto essas mulheres são postas na prisão elas são substituídas e as organizações criminosas seguem intactas. Porém, para o já populoso sistema penitenciário como um todo e, principalmente, para as famílias de ditas mulheres, as consequências são trágicas.1

Diante disto, o autor ainda traz que:

Na Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos, na Guatemala, no ano passado, os ministros de exterior dos países do Continente emitiram uma declaração destacando que as políticas de drogas precisam ser formuladas desde uma perspectiva de direitos humanos e distinção de gênero, focando na prevenção e garantindo a participação da sociedade civil no processo de formulação de tais leis.2

A violência intrafamiliar também é fator contributivo para a incidência criminosa, sendo a família responsável por dar a educação basilar, na ausência de tal conduta, presenciamos cidadãos sem um preparo adequado. Ademais, quando além da ausência educacional o ambiente vivenciado é o da violência, verifica-se um amplo número de detentas que apresentam um histórico de violência sofrida na família (DUTRA, 2012, p.9).

1 Artigo publicado originalmente, em inglês, no site da Open Society Foundations. 2

Declaração: International Drug Policy Consortium – Women, drug offenses and penitentiary systems in Latin America – Corina Giacomello.

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Outro fator contributivo para a incidência criminosa é a situação econômica associada ao baixo grau de escolaridade, conforme traz Mello (2010, p.123-124 apud DUTRA, 2012, p.10):

O comércio ilegal de drogas não exige técnica ou qualificação, até porque se estas mulheres tivessem tais possibilidades, a probabilidade era de não estarem incluídas nesta estatística da marginalidade. Vender drogas não requer idade, ou seja, podem ser recrutadas mulheres novas ou de idade bem avançada, realmente é um mercado onde o fator idade elevada, não prova a exclusão para o trabalho como ocorre no mercado formal, ou onde a tenra idade, não importa para fins trabalhistas, surgindo como possibilidade de auferir renda.

Mulheres sem qualificação profissional, ou ainda, sem escolaridade, não encontram um espaço para se inserirem no mundo globalizado que presenciamos hoje. As mudanças são constantes, exigindo, cada vez mais, pessoas preparadas intelectualmente, sendo característica determinante para a valorização do trabalho desempenhado, ou até mesmo para que possa ser contratada. Em contraponto, o tráfico de drogas oferece propostas tentadoras, independentemente de qualificação ou se quer experiência na área. Portanto, mesmo que tenham um emprego, em virtude do pouco conhecimento específico/intelectual, este proporciona recursos financeiros, em regra, insuficientes para a manutenção dos anseios consumistas advindos do aculturamento social.

A desigualdade social acaba marginalizando os excluídos e incitando à prática criminosa, a qual tem aumentado nas últimas décadas. Frustrados, buscam a facilidade de auferir ganhos altos de maneira rápida nas práticas ilícitas. O tráfico de drogas tem sido o mais praticado pela população feminina, pelos rendimentos instantâneos, sem que precisem de experiência, o que minimiza o desgaste familiar, e ainda, é pouco visível perante o sistema.

O tráfico de drogas imprime uma idéia destorcida de oportunidade, dando a entender que é por meio dele que as diferenças sociais serão eliminadas, pois a prática criminosa acaba rendendo ofertas jamais oferecidas no mercado de trabalho lícito, dada a falta de qualificação profissional destas pessoas que acabam ficando à margem da sociedade.

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A disparidade social afasta o indivíduo do círculo de convivência, gerando conseqüências negativas, qual seja o alto índice que apresenta a criminalidade. Certamente não podemos deixar impunes aquelas que praticam atos delituosos pelo fato de serem mulheres, entretanto, devemos avaliar os fatos - os crimes praticados, confrontando-os com os efeitos que a prisão pode vir a trazer. Visto que, indubitavelmente haverá reflexos no desenvolvimento dos filhos que se vêem obrigados a crescer na ausência da mãe, pois se encontra presa.

Nesse sentido,

As mulheres queixam-se de não poderem exercer a função materna de forma satisfatória e adequada. Acabam, muitas vezes, sentindo-se culpadas por não corresponder ao que é socialmente esperado delas. A responsabilidade do lar e da educação dos filhos é da mãe, sendo de extrema importância o seu papel no desenvolvimento infantil, e por saberem disso, acentua-se ainda mais o sentimento de culpa. (LOPES, 2004; OLIVEIRA, 2008; SALMASSO, 2004 apud ARAUJO, 2011, p.18):

Uma das principais preocupações da presa é a sua família, sendo que, ao mesmo tempo são elas que sofrem maior abandono durante o cárcere, pois para os homens é vexatório, sejam eles: marido, irmão, pai ou ainda filho de uma mulher presa. Ao mesmo tempo, são os laços familiares que constituem potencial de reabilitação para as mulheres presas, sendo que as responsabilidades familiares são capazes de trazer às mulheres certa integração social (ESPINOZA, 2004).

Diante do aumento das mulheres encarceradas podemos perceber que a forma impositiva de solução estatal diante da criminalidade, e, de forma mais contundente ainda, diante do tráfico de drogas, não tem surtido o efeito esperado, ou seja, a coibição da prática delituosa. Perante tal problemática, não se pode dizer que a prisão soluciona, ou ainda, que tem efeito educativo para a abstenção criminosa. A mantença desta prática criminosa está diretamente ligada ao alto índice de usuários, fazendo-se necessárias também, políticas governamentais capazes de tratar e prevenir o uso de drogas ilícitas.

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1.3 A Lei de Drogas 11.343/2006

Visando uma readequação à realidade presenciada, a Lei de Drogas 11.343/2006, criada em 23 de agosto de 2006, e entrando em vigor em 08 de outubro de 2006, revogou expressamente a até então Lei 6.368/76. A Lei de Drogas é uma norma penal em branco, visto que traz em seu texto a sanção aplicada à determinada conduta, porém é dependente de uma normatização extra, sendo no caso a regulamentação procedente da ANVISA (portaria 344/98), o que caracteriza uma norma penal em branco heterogênea, ou seja, de outra instância legislativa, a qual determina o que são as “drogas” incriminadas na Lei Penal. O conceito de drogas é expresso no parágrafo único do artigo 1º da Lei n° 11.343/2006:

Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União.

A Lei 11.343/06 tem por objetivo o combate às drogas, sendo a saúde pública o bem jurídico tutelado por ela, para tanto adota medidas protetivas, como o tratamento e a prevenção ao consumo, bem como medidas repressivas para coibir o tráfico de drogas. Analisando a tipificação apresentada pelo artigo 33 da referida Lei:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

Foram mantidos os mesmos 18 verbos do anterior artigo 12 da Lei 6.368/76, igualmente sendo consideradas condutas de tráfico, havendo, no entanto, uma modificação com relação ao período previsto como sanção, que anteriormente era de 3 a 15 anos, e agora é de 5 a 15 anos de reclusão. Bem como, a pena de multa passou de 50 a 360 dias-multa para 500 a 1.500 dias-multa, inviabilizando a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos.

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Os crimes abrangidos na Lei de Drogas são de perigo abstrato, isto é, presume-se a ameaça ou ofensa ao bem jurídico, com exceção do previsto no art.39, que caracteriza perigo concreto:

Art. 39. Conduzir embarcação ou aeronave após o consumo de drogas, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem.

A nova Lei também procurou distinguir o traficante do usuário de drogas, a fim de aplicar a este, medidas capazes de tratar e reinseri-lo na sociedade; já àquele, responsável pelo comércio é enquadrado como criminoso.

Porém, podemos entender que a penalização excessiva acaba acarretando efeitos distintos dos reais desejados pelo poder estatal, como enfatiza GAUER (2008, p.98), o criminoso é visto sempre como o sujeito que deve ser punido e não como alguém que também tem direitos assegurados:

O remédio penal é utilizado pelas instâncias de poder político como resposta para quase todos os tipos de conflitos e problemas sociais. A resposta penal se converte em resposta simbólica oferecida pelo Estado frente às demandas de segurança e penalização da sociedade, expressas pela mídia, sem relação direta com a verificação de sua eficácia instrumental como meio de prevenção ao delito.

Como afirma a Juíza de Direito Telma de Verçosa Roessing, da Vara de Execuções de Medidas e Penas Alternativas de Manaus, em entrevista:

Por ser muito genérica e não levar em conta a posição do acusado no negócio, a Lei de Drogas impede que o juiz faça distinção entre pequenos e grandes traficantes. Com isso, as punições se assemelham e os brasileiros condenados por vender pequena quantidade acabam prejudicados. Muitas mulheres que levavam drogas para o marido nos presídios, então, recebem penas semelhantes àquelas direcionadas aos chefes de bocas de fumo.

Seja pela força da expressão trazida na lei, ou ainda, pela contundente elucidação veiculada na mídia, as mulheres são tachadas como criminosas, sendo que, no entanto, nem mesmo estas mulheres se consideram como tais, bem como apresenta COSTA, (2008, p.93):

A força convencional da norma jurídica instituidora da figura típica do tráfico ilícito de substância entorpecente leva à criação, no universo representacional da população, de imagens a respeito do que seria um

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“traficante”, ou seja, aquele que vive cotidianamente o mundo das drogas como meio de subsistência e que tem sua identidade totalmente vinculada a sua realidade.

Percebemos que a norma jurídica acaba designando uma identificação criminosa às tais mulheres delinquentes, ou seja, não é simplesmente o fato do crime que é processado, julgado e condenado, mas sim a pessoa criminosa, de forma que o crime praticado acaba fazendo parte da personalidade, sendo inerente à sua identidade.

Juntamente com essa pré-concepção do conceito de mulher criminosa, é necessário mencionar que a forma como essas mulheres se envolvem no tráfico de drogas, na maioria dos casos não há violência por parte delas, e as mesmas não se identificam como criminosas, justificam seus atos pelo amor despendido àquele que antes era responsável pelo tráfico e mantinha os sustento do lar desta forma, ao ser preso a companheira busca perpetuar o vínculo afetivo se submetendo ao tráfico de drogas como prova de amor.

Denota-se a preocupação feminina com relação ao sustento do lar, a manutenção familiar vinha da prática criminosa, sendo que no momento em que o provedor do sustento se ausenta, não vislumbrando alternativas, acabam se envolvendo também com o crime. Ainda assim, o tráfico de drogas se faz o “preferido” entre a população feminina, por não ser necessário o uso da violência, bem como por não dar maiores demonstrações sociais da sua efetiva prática.

Na medida em que estas mulheres adentram para o mundo do tráfico, mais improvável que saiam ilesas; acabam se envolvendo, visto a alta lucratividade advinda desta prática ilícita, sendo que somente percebem a dimensão no momento em que se encontram respondendo criminalmente pelos seus atos. Nesse momento, a fragilidade já as tomou, pois agora passaram de mulheres da sociedade para criminosas, explicitamente taxadas desta forma pelo senso comum.

Existem contradições entre as figuras que se encontram privadas da liberdade, e as figuras elucidadas pela legislação e pela mídia. Não são seres incomuns, são simplesmente mulheres, que erraram, porém, nem sempre é acertado defini-las como perigosas ou violentas, mas em muitos casos seria mais sensato qualificá-las como

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mulheres apaixonadas, ou ainda, desesperadas pelo sustento do lar, pela busca de inserção social através dos moldes definidos pelo consumismo.

2 AS GARANTIAS LEGAIS DAS PRISIONEIRAS

A mulher presa é cidadã, ou seja, deve ter os seus direitos assegurados, sendo o Estado responsável pelo seu bem estar, devendo disponibilizar atendimento à saúde física e mental e assistência jurídica. Diante do poder-dever do Estado em dispor da liberdade dos seus administrados, surge a necessidade de garantir condições mínimas de vida aos que tem a sua liberdade privada. Para tanto, o sistema penal impõe penas aos criminosos, mas também lhes confere garantias, as quais também são asseguradas pela Constituição Federal.

2.1 As Garantias do Ordenamento Jurídico Brasileiro

A privação de liberdade é a pena física imposta aos condenados pelo tráfico de drogas, sendo que os demais direitos devem, ou pelo menos, deveriam, ser respeitados. Os autores Igor Andrade da Silva e Maria Vanessa Carvalho explicitam tal preceito:

O ordenamento jurídico brasileiro garante que devem ser respeitados todos os direitos que não são atingidos pela privação da liberdade, resguardando, deste modo, a integridade física e moral dos condenados. De modo a assegurar esses direitos, a Lei de Execução Penal estabelece um rol de assistências que devem ser garantidas aos presos, incluindo-se a assistência médica, jurídica, educacional, social, religiosa e material. Além disso, a referida lei dispõe que a execução penal busca proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado ou internado. O reconhecimento da necessidade de separação dos encarcerados por gênero fez com que fossem incluídos na legislação direitos específicos das mulheres presas, e algumas especificidades no período de execução da sua pena.

As mulheres, pela sua condição de gênero, necessitam de uma atenção especial, principalmente as gestantes e lactantes, afinal a pena não pode atingir os filhos, estes não podem ser estigmatizados pela prisão, pois são crianças cheias de inocência que não merecem sentir as sequelas do mundo do crime, além do mais, é um direito assegurado pela Constituição Federal do Brasil, no seu art. 5º, L:

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Às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação.

Corroboram ao entendimento consagrado pela Carta Magna, SILVA e CARVALHO:

A mulher no período gestacional e de amamentação encontra-se em uma situação singular, ocupa posição diferenciada e deve receber condições especiais de tratamento, como estabelecem normas internas e internacionais. A exigência de uma atenção diferenciada às mulheres nessas situações específicas decorre, portanto, das condições inerentes à gestação e lactância, e deve ser observada nos estabelecimentos carcerários. A Constituição também assegura o direito de os filhos permanecerem com as mães durante o período da amamentação (art. 5º, inc. L).

A Lei de Execução Penal – Lei nº 7.210/84 – trouxe a obrigatoriedade de oferecer estabelecimentos penais adequados às mulheres, sendo estes próprios às suas condições específicas, sendo dotados de berçários, onde as condenadas podem cuidar e amamentar seus filhos:

Art. 83, § 2º - os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade.

Posição reiterada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pelas Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil (Ministério da Justiça, 1995):

Art. 7º.

§ 1º. As mulheres cumprirão pena em estabelecimentos próprios. § 2º. Serão asseguradas condições para que a presa possa permanecer com seus filhos durante o período de amamentação dos mesmos. Art. 17. O estabelecimento prisional destinado a mulheres disporá de dependência dotada de material obstétrico. Para atender à grávida, à parturiente e à convalescente, sem condições de ser transferida a unidade hospitalar para tratamento apropriado, em caso de emergência.

A Resolução nº 01, de 27 de março de 2000, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça, versa sobre revista nos visitantes e/ou nos presos e define os procedimentos. Sendo assegurado o direito à visita íntima, esta, porém, condicionada ao comportamento dos presos.

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Ainda, em conformidade com a Lei de Execução Penal, é garantido que o atendimento das presas será efetuado por agentes do sexo feminino:

Art. 83, §3º - Os estabelecimentos de que trata o § 2º deste artigo deverão possuir, exclusivamente, agentes do sexo feminino na segurança de suas dependências internas.

Conclui-se que a Legislação em si é garantidora de direitos básicos, porém nem mesmo estes são assegurados pelo Poder Público, conforme mencionam Márcia Cristiane Nunes Scardueli e Adriana Silveira (2010, p.2):

Observa-se que a LEP é bastante completa e abrangente, porém, sua aplicabilidade, via de regra, não está ocorrendo como idealizou o legislador. Os Estados não têm estrutura para manter um sistema penitenciário como o previsto em lei, logo, o ideal ressocializador acaba deparando-se com a realidade de superlotação, desrespeito aos direitos humanos, falta de estrutura física frente à demanda de presos e falta de recursos humanos capacitados para as atividades penitenciárias.

Ainda, de uma forma generalizada o que se percebe é uma proteção à mulher como procriadora, no mais, não existem grandes distinções no trato entre presidiários (as) do sexo masculino e feminino. Ou seja, a legislação penal brasileira não dispõe grandes especificidades ao gênero, existindo até mesmo inobservância às questões inerentes às presidiárias. Há um aculturamento de que o processo penal se dirija aos cidadãos com neutralidade e objetividade, porém não é isto que se percebe, diante de um sistema que foi pensado para homens e, por conseguinte valorado da mesma maneira para todos os cidadãos, sejam homens ou mulheres.

Luís Roberto Barroso, (2001, p. 27):

[...] a neutralidade, entendida como um distanciamento absoluto da questão a ser apreciada, pressupõe o operador jurídico isento não somente das complexidades da subjetividade pessoal, mas também das influências sociais, o que não se constitui uma verdade. No que diz respeito à objetividade, se imaginarmos que se realizaria na existência de princípios, regras e conceitos de validade geral, independentemente do ponto de observação e da vontade do observador, também não seria verdade, uma vez que o conhecimento não é uma foto, um flagrante incontestável da realidade. Desta forma, todos os objetos estão sujeitos à interpretação. Isto é especialmente válido para o Direito,

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cuja matéria prima é feita de normas, palavras, significantes e significados.

Além dos direitos da procriadora, existem muitos outros direitos que devem ser observados, sejam psicológicos, físicos, e o mais aclamado pelas presas, o direito de ter o seu núcleo familiar preservado.

Muitas das mulheres traficantes, apesar de conscientes de que o seu ato representa transgressão à norma penal e, sabedoras do repúdio social sobre a figura do traficante, não se reconhecem como tal, pois, para elas, as identidades relacionadas à vida doméstica – mãe, companheira, filha – sobrepõem-se àquelas que dizem respeito à sua condição de traficantes.

O sentimento de culpa que assola estas mulheres encarceradas é muito mais no sentido da privação com o núcleo familiar do que pelo crime de tráfico de drogas, pois que a prisão não retira somente a liberdade, retira os papéis sociais que eram responsáveis, como mães, avós, filhas. A autora, Maria Juruena de Moura, elucida tal anseio:

Outro aspecto refere-se ao sentimento de culpa que as presas arrastam além da condenação, não pelo ato infracional em si, pois não julgam o tráfico de drogas como crime, mas sim em função da própria reclusão que as afasta da família e pela crença de que prisão não é lugar de mulher. Assim, sentem-se duplamente castigadas: pela ruptura com a vida familiar e transgressão ao mandato social de gênero. (2005, p.102)

2.2 O viés Internacional Garantista

A relatora especial da ONU, Rashida Manjoo, no relatório “Causas, Condições e Consequências do Encarceramento Feminino”3

, discorre sobre a violência que as mulheres sofrem. Trouxe à tona grandes problemas que envolvem o encarceramento feminino, visto que, pela condição de vulnerabilidade das mulheres acabam se expondo em situações flageladoras: “As mulheres são vulneráveis a inúmeras manifestações de

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violência, incluindo estupro por detentos e guardas, prostituição forçada ou toque com uma conotação sexual durante as buscas”.4

Reforça a relatora que a grande maioria das prisões femininas ocorre em virtude de delitos com drogas, porém, ao mesmo tempo em que é necessário estabelecer uma conduta coercitiva, para reprimir esta epidemia universal que é o consumo de drogas, se faz necessário garantir os direitos daquelas que se envolvem de forma criminosa com a disseminação destas drogas: “Diz-se também que a "guerra" global contra as drogas tem levado a inúmeras violações dos direitos humanos das mulheres”.5

Ainda, afirma a relatora que as mulheres infratoras não representam uma ameaça para a sociedade de uma forma geral, sendo perfeitamente possível a adoção de medidas alternativas para coibir os delitos cometidos por elas. O que resultaria em um bem para a sociedade e especialmente para estas mulheres que necessitam de limites: “Em um contexto de recursos escassos e, dado que a maioria das mulheres infratoras raramente representa uma ameaça para o público, é imperativo que os Estados considerem alternativas ao encarceramento feminino”.

A prisão sem os cuidados necessários acaba fragilizando ainda mais as mulheres envolvidas com o mundo das drogas, o que dificulta a ressocialização. “Para as mulheres encarcerados por crimes de drogas, a falta de cuidados com a reabilitação em primeiro lugar, muitas vezes significa que as condições que as tornaram vulneráveis ao envolvimento com drogas são ampliadas na prisão.”6

Também elenca a relatora ser necessário um tratamento humanitário a estas presidiárias, visto que, além da privação da liberdade todos os demais direitos devem ser respeitados (2013, p.24):

4

Tradução própria do original: Female prisoners throughout the world are vulnerable to numerous manifestations of violence. According to testimonies received by the Special Rapporteur, women in prison are raped by inmates and guards, forced into prostitution, touched in a sexual manner during frisks and required to wear revealing prison uniforms.

5

Tradução própria do original: It is also said that the global “war” on drugs has led to numerous violations of women‟s human rights.

6

Tradução própria do original: For women incarcerated for drug crimes, the lack of rehabilitative care often means that the conditions that rendered them vulnerable to drug involvement in the first place are sometimes replicated and augmented in prison.

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Todas as pessoas privadas de sua liberdade devem ser tratadas com humanidade e com respeito à dignidade inerente à humana pessoa. Prisioneiros não podem ser submetidos a qualquer dificuldade ou constrangimento além da privação de liberdade, o respeito pela dignidade dessas pessoas deve ser garantido sob as mesmas condições de pessoas livres.7

Trouxe ao relatório, a norma internacional fixada na 65ª Assembléia Geral da ONU, em dezembro de 2010, que aprovou as “Regras Mínimas para Mulheres Presas”, sendo extremamente relevante diante das carências que enfrentam as mulheres prisioneiras. A norma estabeleceu a possibilidade de aplicação de medidas alternativas ao encarceramento feminino, levando em conta peculiaridades como a gravidez e o cuidado com os filhos:

Em 2011, a Assembléia Geral, através da Resolução 65/229, aprovou as Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Prisioneiras Mulheres e medidas não privativas de liberdade para Mulheres Delinquentes (Regras de Bangkok), que estabeleceu normas que se relacionam especificamente para mulheres na prisão, infratoras e pessoas acusadas. As Regras de Bangkok reconhecem que o direito internacional, através do princípio da não discriminação, exige que os Estados abordem o particular desafio que as mulheres enfrentam na justiça criminal e nos sistemas penitenciários. Criaram normas abrangentes para o tratamento de mulheres prisioneiros e criminosas, abordando questões como a vitimização prévia e sua ligação com o encarceramento; alternativas ao encarceramento; física e mental, assistência médica; proteção e segurança; como manter contato com os membros da família; treinamento de pessoal; mulheres grávidas e mães com filhos na prisão; e a reabilitação e reintegração, entre outras medidas. (2013, p.24) 8

7

Tradução própria do original: All persons deprived of their liberty shall be treated with humanity and with respect for the inherent dignity of the human person”. Prisoners may not be subjected to any hardship or constraint other than that resulting from the deprivation of liberty, and respect for the dignity of such persons must be guaranteed under the same conditions as that of free persons.

8 Tradução própria do original: In 2011, the General Assembly, by its resolution 65/229, adopted the

United Nations Rules for the Treatment of Women Prisoners and Non-custodial Measures for Women Offenders (the Bangkok Rules), which established for the first time standards that relate specifically to women prisoners, offenders and accused persons. The Bangkok Rules recognize that the international law principle of non-discrimination requires States to address the particular challenges that women confront in the criminal justice and penitentiary systems (rule 1).148 They provide comprehensive standards for the treatment of women prisoners and offenders, addressing issues such as prior victimization and its links with incarceration; alternatives to incarceration; mental and physical health care; safety and security; contact with family members; staff training; pregnant women and mothers with children in prison; and prisoner rehabilitation and reintegration, among other things.

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O relatório publicado pelo Consórcio Internacional de Políticas de Drogas, escrito por Corina Giacomello – “Mulheres Crimes de Drogas e o Sistema Penitenciário na América Latina”9

, enfatiza a preocupação internacional com as condições desumanas que são presenciadas nos presídios da América Latina, qual seja a situação dos presídios brasileiros:

Sistemas penitenciários da América Latina têm uma série de problemas globais que afetam toda a população, incluindo superlotação, condições subumanas, violência, uso de tortura, uso excessivo de pré-julgamento detenção, a corrupção e a falta de treinamento no trabalho e programas educacionais. Enquanto isso, além a discriminação e violência que afetam a todos presos, há outros problemas que especificamente afetam determinados grupos. As mulheres são um dos grupos afetados. (2013, p.12)10

Ainda, o mesmo relatório traz a grande problemática que é responsável pelo maior índice de prisões femininas:

Um estudo do Governo Federal do Brasil mostra que das mulheres na prisão, em média, 60 por cento são acusadas de tráfico e, quatro por cento por tráfico internacional.11

3 A CAPACIDADE RESSOCIALIZADORA DAS PENAS

As políticas públicas que permeiam o sistema penal são repressivas, porém a ressocialização não é atingida, pois as sanções previstas possuem um caráter punitivo e o sistema em si não propicia a reintegração do preso. Ao passo que o tema Direitos Humanos vem cada vez mais entrando em voga, nos deparamos com empecilhos que

9

Tradução própria do original: Women, drug offenses and penitentiary systems in Latin America

10 Tradução própria do original: Latin America‟s penitentiary systems have a series of overall problems

that affect the entire population, including overcrowding, sub-standard conditions, violence, use of torture, excessive use of pre-trial detention, corruption and a lack of job-training and educational programs.86 Meanwhile, besides the discrimination and violence that affect all inmates, there are other problems that specifically affect certain groups. Women are one of those affected groups.

11

Tradução própria do original: A study of women in prison by Brazil‟s federal government shows that, on average, 60 percent are accused of trafficking and 4 percent of international trafficking.

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travam o andamento da ressocialização dos presidiários, que é um dos assuntos deste grande tema.

O arcaico discurso moralista de que a sociedade precisa se ver livre de delinquentes, acaba por estigmatizar uma classe, que, no momento que se vê em liberdade não encontra portas abertas para uma nova condição, para estabelecer novos padrões. Quando o discurso versa sobre as mulheres ex-presidiárias o preconceito a enfrentar é ainda maior, visto que as atividades desenvolvidas pelas mulheres requerem uma maior confiança, pois em sua grande maioria são trabalhos internos, já para o homem é possível uma reinserção em trabalhos externos, braçais.

Segundo SCARDUELI e SILVEIRA (2010, p.1 apud COYLE, 2002):

[...] não basta que as autoridades meramente tratem as pessoas presas com humanidade e dignidade, antes, devem oferecer-lhes oportunidade de mudança e desenvolvimento, e isso exige habilidades consideráveis e muito empenho. Assim as penitenciárias devem ser lugares onde haja um amplo programa de atividades construtivas que ajudem as pessoas presas a melhorar a sua condição de vida, além do cumprimento da pena imposta.

A experiência segregadora vivida por uma mulher apenada, as modificações sofridas na sua vida a partir da prisão, são frutos do constrangimento sofrido, explicita a autora ARAUJO:

As prisões têm características muito peculiares que devem ser pontuadas a fim de analisarmos como é vivenciada a carceragem feminina. Goffman (2005), em seu estudo sobre as instituições totais, define-as como um lugar fechado, onde seus residentes estão em situações semelhantes, separados da sociedade por longo período de tempo e formalmente administrados. Esse caráter fechado é visto no rompimento da relação dos internos com a sociedade, e principalmente em seus aspectos físicos, pois nestas instituições, há muitos portões fechados, paredes altas e rodeadas de arame farpado.(2011, p.15)

No entender de Lema, (2011, p.59):

Se o encarceramento já mostrou exaustivamente que não serve para ressocializar e muito menos para diminuir o crime e a violência,

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poderia se adotar com mais freqüência as penas alternativas previstas na legislação brasileira, ao invés de continuar, ingenuamente e/ou perversamente, apostando no aumento das penas privativas de liberdade. Todavia, é bom se esclarecer que isto não significaria deixar sem punição aquelas que cometeram crimes, mas sim lhes aplicar penas condizentes com a gravidade de seus crimes, na realidade, o que se espera é que fossem aplicadas as determinações legais já existentes.

Segundo Vanessa Maciel Lema, (2011, p.60),

Se a privação de liberdade somente deteriora a condição humana, devem ser buscados os caminhos legais para diminuir o tempo aguardado para o retorno ao convívio social. Neste sentido um instrumento importante é a remição da pena, sobretudo aquela obtida pela inserção da detenta no sistema educativo. Cabe esclarecer que existe a Súmula 341 do STJ, que reconhece esta possibilidade, bem como há o Projeto de Lei 7824/2010 em trâmite no Congresso Nacional.

Trazendo a noção de que a prisão não pode ser definida como a melhor sanção a ser aplicada para mulheres envolvidas com o tráfico de drogas, argumenta ROESSING:

Defensora das penas restritivas de direito, a juíza explica que essa modalidade permite às condenadas se manter ao lado dos filhos e parentes, e pode também facilitar sua inserção em políticas públicas de inclusão social. Isso justifica que o Executivo crie serviços públicos voltados para a execução penal alternativa, pois apenas assim esse modelo trará respostas eficazes.

O encontro promovido pelo Conselho Nacional de Justiça, em 22/08/2013, reuniu magistrados, defensores e promotores públicos e membros da Academia e da sociedade civil, sendo que estes apoiaram as conclusões do Grupo de Trabalho Tráfico de Entorpecentes e Penas Restritivas de Direito, e foram favoráveis a adoção de penas alternativas para as mulheres usadas como “mulas” pelo narcotráfico ou vítimas da “coação moral irresistível” de maridos e familiares encarcerados para entrar com entorpecentes em unidades prisionais.

O juiz auxiliar da Presidência do Conselho, Douglas de Melo Martins, afirmou que as propostas se enquadram com a mudança na política antidrogas do governo dos

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Estados Unidos da América (EUA), que propõe a redução das penas relacionadas ao tráfico e uso de drogas:

O governo americano percebeu que a política chamada Guerra das Drogas não surtiu os resultados pretendidos, ou seja, reduzir a criminalidade: o que aconteceu foi uma superlotação das prisões. No Brasil, caminhamos para o mesmo quadro, em que metade dos presos será composta de sentenciados por crimes relacionados ao tráfico de drogas.

Na obra “A Ostentação Penal” – os autores Alexandre Morais da Rosa e Augusto Jobim do Amaral trazem de forma aberta e explicativa a banalização do direito penal, sendo que a promessa de segurança e felicidade expressada pela punição, muitas vezes acaba sendo assimilada por „atores jurídicos‟:

O sistema penal não alivia os sofrimentos, senão, quando muito, os substitui por ressentimento, recalque ou outro mecanismo que não tardará a ser canalizado na produção de maior dor. Ele manipula as dores, viabilizando a legitimação do exercício ainda mais violento, incentivando os mais perversos sentimentos de vingança. (2014, p.51)

3.1 Condições Mínimas Capazes de Proporcionar a Ressocialização

O ambiente é responsável por imprimir influências negativas ou positivas no desenvolvimento humano, para tanto se o objetivo é a ressocialização através da pena de privação da liberdade é necessário a observância de condições mínimas, de acordo com a Lei de Execução Penal, nº 7.210, art. 10 e seguintes:

3.1.1 Assistência Material

É direito das presas terem assegurada a assistência material que consiste no fornecimento de alimentação em quantidade suficiente e de qualidade, vestuário e instalações higiênicas. Além disto, cada presa disporá de uma cama individual com as respectivas roupas de cama.

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