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Cardiomiopatia/displasia arritmogénica do ventrículo direito: abordagem diagnostica.

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Academic year: 2021

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Artigo de Revisão Bibliográfica

CARIDIOMIOPATIA/ DISPLASIA ARRITMOGÉNICA DO VENTRÍCULO DIREITO: ABORDAGEM DIAGNÓSTICA

Maria João Guimarães Pitta Ferreira da Silva

6º Ano Profissionalizante – Mestrado Integrado em Medicina

Orientadora: Dra. Filomena da Assunção Gomes de Oliveira

Assistente Hospitalar Graduada de Cardiologia e Professora Convidada do ICBAS

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Artigo de Revisão Bibliográfica

CARIDIOMIOPATIA/ DISPLASIA ARRITMOGÉNICA DO VENTRÍCULO DIREITO: ABORDAGEM DIAGNÓSTICA

Maria João Guimarães Pitta Ferreira da Silva

6º Ano Profissionalizante – Mestrado Integrado em Medicina Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto

Centro Hospitalar do Porto

Morada: Avenida Fernão de Magalhães, nº 996, 2ºEsq., 4350-154 Porto Correio electrónico: mjguimas@gmail.com

Orientadora: Dra. Filomena da Assunção Gomes de Oliveira

Assistente Hospitalar Graduada de Cardiologia e Professora Convidada do ICBAS

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RESUMO

Introdução: A cardiomiopatia/displasia arritmogénica do ventrículo direito é uma doença do músculo cardíaco, com determinação genética em grande parte dos casos, sendo em termos patológicos, caracterizada pela substituição dos miócitos por tecido fibroadiposo, condicionando alterações na condução eléctrica do miocárdio que podem resultar em arritmias fatais.

Objectivos: Este trabalho tem como objectivo a revisão bibliográfica sobre a abordagem e técnicas de diagnóstico utilizadas na avaliação de doentes e/ou familiares com cardiomiopatia / displasia do ventrículo direito e de que forma, o conhecimento científico mais recente tem sido incorporado nesta mesma avaliação.

Desenvolvimento: A cardiomiopatia/ displasia arritmogénica do ventrículo direito tem uma prevalência estimada de 1/2000 até 1/5000, afectando mais o sexo masculino que o feminino numa proporção de 3:1. Estima-se que em 30 a 50% seja uma doença hereditária, sendo mais comummente de transmissão autossómica dominante, podendo, no entanto ser transmitida de forma recessiva. Foram identificados 12 genes que podem estar envolvidos na doença, os quais codificam diferentes componentes dos desmossomas cardíacos, que quando disfuncionais resultam em perda de acoplamento eléctrico entre os miócitos. A história natural desta doença tem 4 fases com características clínicas e graus de gravidade diferentes. A forma clássica desta patologia, tem uma predilecção precoce pelo ventrículo direito, mas o reconhecimento dos subtipos, com predominância ventricular esquerda ou biventricular levou à proposta de um termo mais amplo - cardiomiopatia arritmogénica. A heterogeneidade genética e a natureza não específica das características clínicas associadas complicam o diagnóstico clínico, o qual, requer uma investigação cardiovascular prolongada com base em múltiplos critérios, em vez de um único teste de diagnóstico. Os critérios de diagnóstico criados por uma Task Force em 1994, foram recentemente revistos e modificados de forma a integrar o novo conhecimento e tecnologia com o objectivo de aumentar a sensibilidade mantendo a especificidade no diagnóstico. Conclusão: São necessários mais estudos para avaliar a eficácia dos critérios recentemente revistos no diagnóstico da doença. O desenvolvimento de um algoritmo para a estratificação do risco que, envolva todo o espectro da doença e que seja validado prospectivamente, é um dos desafios clínicos remanescentes.

PALAVRAS-CHAVE: Displasia arritmogénica do ventrículo direito; arritmia; morte cardíaca súbita; diagnóstico; ecocardiografia.

(4)

ABSTRACT

Introduction: Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy / dysplasia is a heart muscle disease, which is in most cases determined genetically. In pathological terms, it’s characterized by the replacement of myocytes by fibrofatty tissue, conditioning

changes in myocardial electrical conduction that can lead to fatal arrhythmias.

Purpose: This work aims to review the approach and techniques used in the diagnostic evaluation of patients and family members with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy / dysplasia and how the latest scientific knowledge has been incorporated in the same assessment.

Developments: Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy / dysplasia has an estimated prevalence of 1/2000 to 1/5000, affecting men more frequently than women, with an approximate ratio of 3:1. It is estimated that 30 to 50% is a hereditary disease most commonly with autosomal dominant transmission; however it can also be transmitted as a recessive form. There have been 12 genes identified that may be involved in the disease, which encode different components of cardiac desmosomes, thus when dysfunctional resulting in loss of electrical coupling between myocytes. The natural history of this disease has four stages with different clinical characteristics as well as different degrees of severity. The classic form of this disorder has an early predilection for the right ventricle, but the recognition of subtypes with predominant left ventricular or biventricular led to the proposal for a broader term - arrhythmogenic cardiomyopathy. Genetic heterogeneity and nonspecific clinical features, often turns clinical diagnosis complicated, and therefore it requires a prolonged cardiovascular research based on multiple criteria, rather than a single diagnostic test. The diagnostic criteria established by a Task Force in 1994, were recently reviewed and modified to incorporate new knowledge and technology in order to increase sensitivity while maintaining specificity for the diagnosis.

Conclusion: Further studies are needed to evaluate the effectiveness of the recently revised criteria in the diagnosis of disease. Development of an algorithm for risk

stratification of the entire spectrum of disease, validated prospectively is one of the remaining clinical challenges.

KEY-WORDS: Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/ cardiomyopathy; arrhythmia; sudden cardiac death; diagnosis; echocardiography.

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INTRODUÇÃO

A cardiomiopatia/displasia arritmogénica do ventrículo direito (C/DAVD) é um distúrbio crónico, progressivo, transmissível e com um amplo espectro de fenótipos. (1)

Caracteriza-se pela substituição parcial ou difusa do tecido miocárdio normal por tecido fibroadiposo. (2) Estas alterações providenciam um substrato para instabilidade eléctrica e provocam arritmias ventriculares que variam desde contracções ventriculares prematuras até taquicardia ventricular sustentada, fibrilhação ventricular (FV) e morte súbita cardíaca (MSC). O nome desta patologia deriva da sua maior incidência no ventrículo direito (VD), no entanto, a degeneração do miocárdio pode também estender-se até ao ventrículo esquerdo (VE), especialmente em estádios mais avançados. As alterações patológicas são especialmente proeminentes à medida que a doença progride, no entanto, não é incomum que os doentes apresentem arritmias fatais com apenas uma pequena área de tecido adiposo e fibroso. (3) Assim, a sua apresentação clínica é muitas vezes desproporcional à extensão das alterações estruturais, da contractilidade miocárdica e da função ventricular. (3)

A C/DAVD é a principal causa de morte súbita de origem cardíaca em pessoas com idades inferiores a 35 anos, particularmente em atletas e contribui para 10% das mortes por doenças cardíacas não diagnosticadas no grupo etário até aos 65 anos. (1,2,4) A prevalência da doença na população em geral foi estimada como variando desde 1/2000 até 1/5000. O seu valor exacto não é conhecido, devido à existência de muitos casos não identificados ou a erros de diagnóstico. (5) Oitenta por cento das situações são diagnosticadas em doentes com idades inferiores a 40 anos. (6) Os homens são comummente mais afectados que as mulheres, numa proporção de 3:1. (7) É uma doença de transmissão familiar em 50% dos

casos, sendo usualmente transmitida de forma autossómica dominante com uma penetrância variável. (8)

No que diz respeito ao diagnóstico desta entidade, a dificuldade maior reside no facto de não existir um único exame patognomónico que por si só diagnostique ou exclua a

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS AF - Área fraccional

BEM - Biópsia endomiocárdica BRD - Bloqueio de ramo direito BRE - Bloqueio de ramo esquerdo C/DAVD - Cardiomiopatia/displasia arritmogénica do ventrículo direito

CDI - Cardio-desfibrilador implantável DAT - Duração de activação terminal ECG - Electrocardiograma

ECGAR - Electrocardiograma de alta resolução

ECO2D - Ecografia bidimensional EV - Extra-sístole ventricular FV - Fibrilhação ventricular IOT - Inversão das ondas T MEA - Mapa electro-anatómico MSC - Morte súbita cardíaca

RMC - Ressonância magnética cardíaca TACMC - Tomografia axial computorizada multi-corte

TITSVD - Taquicardia idiopática do tracto de saída do ventrículo direito TSVD - Tracto de saída do ventrículo direito TV - Taquicardia ventricular

VD - Ventrículo direito VE - Ventrículo esquerdo

(6)

presença desta doença. (1) Actualmente o diagnóstico baseia-se num conjunto de critérios (criados por uma Task Force em 1994 e revistos em 2010) que englobam diferentes caraterísticas da patologia.(1,9)

Um dos grandes desafios no diagnóstico da C/DAVD é detectar a doença numa fase precoce da sua evolução, uma vez que, nesta fase existem habitualmente alterações estruturais subtis, com potencial de desencadear eventos clínicos fatais. (9)

Este trabalho tem como objectivo a revisão bibliográfica sobre a abordagem e técnicas de diagnóstico utilizadas na avaliação de doentes e/ou familiares com C/DAVD e de que forma o conhecimento científico mais recente tem sido incorporado nesta mesma avaliação.

PATOFISIOLOGIA

A C/DAVD consiste na substituição dos miócitos do VD por tecido fibroadiposo. O fenómeno é progressivo, inicia-se no epicárdio convertendo-se posteriormente em transmural. Esta condição, implica uma fraqueza da parede livre da cavidade ventricular resultando numa dilatação do VD e na formação de aneurismas que estão tipicamente localizados nas paredes inferior, apical e infundibular – triângulo de displasia. (1) A substituição fibroadiposa do miocárdio interfere com a condução do impulso eléctrico promovendo um atraso na condução e fenómenos de reentrada, os quais constituem o mecanismo das arritmias ventriculares. (10,11)

A detecção de substituição de fibras miocárdicas por tecido adiposo no VD, não é considerado “per si” um achado patognomónico desta doença. Uma certa quantidade de gordura intramural está presente em corações normais, nas regiões apical e antero-lateral.

(5)

Habitualmente a atrofia do miocárdio é progressiva e não está presente ao nascimento. Na C/DAVD a perda de miócitos é consequência da morte celular que ocorre normalmente durante a infância. (5) O aparecimento clínico da doença durante a adolescência tardia e em adultos jovens, sustenta o conceito de uma atrofia do miocárdio adquirida e progressiva. (12,13)

Em vez de ser um processo contínuo, a progressão da patologia pode ocorrer por surtos numa doença que de outra forma é estável. Estas exacerbações, podem ser clinicamente silenciosas na maioria dos doentes, mas por vezes caracteriza-se pelo

(7)

aparecimento de arritmias ameaçadoras de vida. Factores ambientais, como o exercício ou a inflamação podem facilitar a progressão da doença, por prejudicarem a adesão celular. (2)

Através da histologia, comprova-se a morte de miócitos, estas alterações estão frequentemente associadas com infiltrados inflamatórios que provavelmente têm um papel importante na etiologia de arritmias mortais. Se estas células inflamatórias são uma reacção à morte celular (por necrose ou apoptose) (14) ou a consequência de mecanismos imunes ou infecciosos, não se sabe. (2)

Várias teorias etiopatogénicas foram propostas: a teoria de um mau desenvolvimento (displasia congénita, aplasia ou hipoplasia), a teoria inflamatória (miocardite), morte celular programada (apoptose)(14,15) e a da distrofia do miocárdio

(substituição do tecido miocárdico por tecido fibroadiposo). Sendo esta última a teoria mais atractiva, uma vez que a histologia da C/DAVD é muito similar aquela observada nas distrofias musculares de Duchenne’s ou Becker’s. (2,15)

GENÉTICA

Segundo os dados existentes até à data, estima-se que 30 a 50% dos casos de C/DAVD são familiares. Contudo, estes valores podem ser subestimados, uma vez que os genes responsáveis por esta doença podem ter baixa penetrância e uma expressão variável, duas condições que dificultam a detecção da patologia ao longo de uma linha familiar. (8,16,17)

Os genes responsáveis pela C/DAVD têm duas formas de hereditariedade: autossómica dominante e autossómica recessiva. A forma autossómica dominante é a mais comum. As formas recessivas da doença estão associadas principalmente ao envolvimento cutâneo e cardíaco. A doença de Naxos é a entidade mais conhecida transmitida de forma recessiva e caracteriza-se por apresentar aspectos típicos de C/DAVD em simultâneo com queratose palmo-plantar não epidermolítica. (18,19)

Foram descritas 12 variantes genéticas de C/DAVD. A grande maioria destas mutações codificam proteínas que são responsáveis por manter a integridade estrutural do miocárdio - desmossomas. Os desmossomas são estruturas complexas multiproteicas da membrana celular, que providenciam integridade estrutural e funcional entre as células adjacentes e estão presentes em tecidos que são sujeitos a stress mecânico, tais como a epiderme e o miocárdio.(20)

(8)

As mutações resultam num defeito das proteínas de adesão, tais como: placoglobulinas, desmoplaquina, placofilina-2 e demogleina-2. (7) Foram reconhecidas outras mutações em genes não desmossómicos: o gene do factor de crescimento transformador - beta 3, o qual codifica uma citocina estimuladora da fibrose e modula a adesão celular; o gene do receptor da rianodina 2, a qual induz a libertação de cálcio pelo retículo sarcoplasmático; o gene da proteína transmembranar 43, que é um elemento de resposta para o receptor activado por proliferadores de peroxissoma gama, sendo este um factor de transcrição adipogénico que pode explicar a substituição fibroadiposa do miocárdio. (16)

Foi colocada a hipótese de que a perda de função das proteínas dos desmossomas pode contribuir para a separação dos miócitos nos discos intercalados e assim desfazer a adesão célula-a-célula e predispor à degeneração fibroadiposa, particularmente em condições de stress mecânico. (19) Outros autores sugerem que as infecções virais têm um papel patogénico na C/DAVD, podendo ser ainda mais deletério na presença de mutações dos desmossomas. (21)

HISTÓRIA NATURAL E APRESENTAÇÃO CLÍNICA

A apresentação da doença é mais comum entre os 10 e os 50 anos de idade existindo uma predominância do sexo masculino. O diagnóstico realiza-se em geral em doentes com idades próximas dos 30 anos. A doença, habitualmente nunca é diagnosticada em lactentes e em crianças com menos de 10 anos. Os principais sintomas associados a esta patologia são palpitações, tonturas e síncope. Numa série de 130 doentes a frequência dos sintomas foi: palpitações (67%), síncope (32%), dor torácica atípica (27%) e dispneia (11%). A MSC pode ser a primeira manifestação da doença. (12,22) A paragem cardíaca devido a FV pode ocorrer a qualquer altura no decurso da doença e a sua incidência varia entre 0,1% até 3,0% por ano em adultos com C/DAVD. No entanto, estes valores podem ser ainda mais elevados em doentes jovens. (23)

Foram identificados três subtipos de C/DAVD por caracterização clínica de familiares, utilizando ressonância magnética cardíaca (RMC) com contraste: o fenótipo ventricular direito, o fenótipo com predominância ventricular esquerda e o fenótipo biventricular. (24)

(9)

O Fenótipo Ventricular Direito, representa o subtipo mais conhecido da doença e corresponde a um envolvimento isolado do VD ouassociado a um envolvimento discreto do VE, é caracterizado por 4 fases clínicas: a fase subclínica, a fase arrítmica, a fase de insuficiência cardíaca direita isolada e a fase de insuficiência cardíaca biventricular. (1)

A Fase Subclínica - as anormalidades estruturais estão ocultas ou quando presentes, são subtis e podem confinar-se a uma só região - “triângulo de displasia”. Os doentes são assintomáticos, no entanto existe o risco de morte súbita, principalmente durante actividade física exaustiva. O diagnóstico precoce nesta fase permanece um desafio clínico. (5)

A Fase Arrítmica - a desorganização estrutural existente, condiciona o desenvolvimento de arritmias ventriculares de origem no VD, com morfologia de bloqueio de ramo esquerdo (BRE), são normalmente despoletadas pelo esforço e podem variar de gravidade, desde batimentos ventriculares prematuros isolados até FV com paragem cárdio-respiratória. (11,13) As manifestações clínicas consistem em episódios de palpitações ou síncope, e as alterações estruturais miocárdicas podem ser detectadas em exames de imagem não invasivos. (10)

Na terceira fase – insuficiência cardíaca direita isolada – a clínica caracteriza-se por sintomatologia de falência do coração direito. (10)

Na quarta fase – insuficiência cardíaca biventricular - a doença envolve para além do VD o septo ventricular e o VE, evoluindo para um quadro de falência biventricular. (10)

O fenótipo com predominância ventricular esquerda é definido por doença

precoce do VE na ausência de disfunção sistólica. Clinicamente os doentes apresentam taquicardia ventricular (com morfologia de bloqueio de ramo direito) com evidência de anormalidades estruturais no VE, tais como dilatação global do VE e insuficiência sistólica nos últimos estádios. (24,25)

O fenótipo biventricular, é caracterizado por envolvimento simultâneo do VE e

do VD com dilatação progressiva dos dois ventrículos e taquicardia ventricular (TV) com morfologia de bloqueio de ramo direito ou esquerdo. (1)

A doença com predomínio ventricular direito e a com predomínio ventricular esquerdo podem ser os extremos de um espectro de fenótipos, existindo alguns doentes que apresentam características que não se encaixam em nenhuma categoria. (24)

(10)

Quando presente, o fenótipo com predominância ventricular esquerda é mais comummente observado em doentes com mutações nas desmoplaquinas. (26,27)

A característica principal da C/DAVD é uma predisposição para arritmias ventriculares e MSC, no contexto de miocárdios bem preservados a nível histológico, morfológico e funcional. (1)

QUANDO SUSPEITAR DE C/DAVD

Na ausência de outras doenças cardíacas conhecidas, qualquer um dos seguintes cenários clínicos deve fazer pensar em C/DAVD: palpitações ou síncope com alterações da consciência; FV; miocardite; cardiomiopatia dilatada com manifestações arrítmicas; e achados acidentais sugestivos de C/DAVD num exame de rotina. (1)

As patologias que habitualmente são confundidas com C/DAVD são a taquicardia idiopática do trato de saída do ventrículo direito (TITSVD) e a sarcoidose cardíaca. (1)

A TITSVD, apresenta-se no ECG com grandes ondas R monofásicas nas derivações inferiores (DII, DIII e aVF), não tem um padrão familiar e tem morfologia de bloqueio de ramo esquerdo (BRE). É importante fazer esta distinção entre C/DAVD e a TITSVD, uma vez que esta última tem um bom prognóstico e normalmente resolve-se com ablação por cateter. (1)

A sarcoidose, sendo uma doença miocárdica infiltrativa, pode mimetizar anormalidades ventriculares estruturais e funcionais normalmente observadas na C/DAVD. (28) Deve-se excluir sarcoidose nos doentes que têm evidências de anormalidades no sistema de condução cardíaco, especialmente na presença de outros sintomas extra-cardíacos. Em algumas situações, uma biópsia endomiocárdica pode ser necessária para distinguir entre estas duas patologias. (28)

Uma minoria de doentes com C/DAVD apresenta-se inicialmente com sintomas de insuficiência ventricular, devendo-se fazer o diagnóstico diferencial com enfarte do VD, hipertensão pulmonar e cardiomiopatia dilatada. (29)

(11)

ABORDAGEM DIAGNÓSTICA

A avaliação inicial de todos os doentes com suspeita de C/DAVD deve incluir uma história clínica e exame físico, electrocardiograma (ECG), ECG de alta resolução (ECGAR), monitorização elecrocardiográfica com Holter 24 horas, prova de esforço e testes

imagiológicos não invasivos dos dois ventrículos como ecografia (ECO) e a RMC. (1,29)

Caso existam alterações nos exames anteriores, outros testes mais invasivos deverão ser efectuados, de modo a estabelecer o diagnóstico e a orientar o tratamento, tais como a testes elecrofisiológicos, angiografia e biópsia endomiocárdica. (29)

O diagnóstico, baseia-se na demonstração de anormalidades estruturais, funcionais e electrofisiológicas, que reflectem ou são causadas pelas alterações histológicas subjacentes.(9) Este pode ser extremamente díficil de efectuar, principalmente quando as alterações são subtis. (30) O reconhecimento desta dificuldade e o facto de não existir nenhum exame considerado como gold standard para o diagnóstico desta entidade clínica, levou à criação de um conjunto de critérios por uma Task Force em 1994 que permitem diagnosticar esta patologia. (30)

Na altura da publicação dos mesmos, a experiência clínica com a C/DAVD era dominada por casos índice sintomáticos e por vítimas de MSC, os quais representavam estádios mais avançados da doença. Consequentemente, estes critérios eram altamente específicos mas pouco sensíveis para a detecção da patologia numa fase precoce e em familiares de casos índice. (9)

Nos últimos 17 anos, aumentou o conhecimento acerca da etiologia/patofisiologia da doença, nomeadamente o reconhecimento da sua base genética. Além de que, ocorreram também progressos a nível dos exames de diagnóstico utilizados: foram propostos novos marcadores electrocardiográficos, maior experiência com medidas quantitativas nos exames imagiológicos e surgiram novas técnicas utilizadas, tais como, RMC e a angiografia. (9)

Foi este crescente conhecimento clínico e científico que realçou a importância de se proceder a alterações nos critérios criados em 1994. (31)

(12)

Marcus, et al. (2010) (9) procederam a uma revisão e alteração dos critérios estabelecidos, de forma a incorporar o novo conhecimento existente na área, com o objectivo de melhorar a sensibilidade diagnóstica, mantendo a especificidade (Tabela 1). (9)

Os critérios são classificados em 6 categorias: alterações globais e regionais da função e da estrutura miocárdica; caracterização histológica da parede, anormalidades de repolarização/despolarização/condução no ECG, arritmias e história familiar. (9)

Num estudo realizado por Cox et al. (2010) (31) com o objectivo de comparar a

eficácia do diagnóstico clínico de C/DAVD utilizando os critérios revistos em 2010, em relação aos anteriores, os autores concluíram que os novos critérios diagnosticaram a doença em mais 35 doentes (11% familiares e 64% de casos índices anteriormente classificados como prováveis) do que aqueles que foram diagnosticados com os critérios de 1994. (31)

(13)

Tabela 1. Comparação entre os critérios de diagnóstico originais e os revistos (9)

Critérios originais Critérios revistos

I. Disfunção global ou regional e alterações estruturais*

Major

• Dilatação severa e redução da

fracção de ejecção do VD sem

(ou apenas ligeiro)

comprometimento VE

• Aneurismas no VD

localizados ( acinético ou discinéticas áreas com abaulamento diastólico)

• Dilatação segmentar severa

do VD

Eco 2D:

• Acinésia regional do VD, discinésia, ou aneurisma

• Mais 1 dos seguintes (fim da diástole):

- PEEL TSVD ≥ 32 mm (corrigido para o tamanho corporal

[ PEEL/SC] ≥ 19 mm/m2 )

- PEEC TSDV ≥36 mm ( corrigido para o tamanho corporal

[ PEEC/SC] ≥ 21mm/m2 )

- Ou alteração da área fraccional ≤ 33%

RM:

• Acinésia ou discinésia regional do VD ou contracção do VD

dessincronizada

• Mais 1 dos seguintes:

- Rácio do volume no fim da diástole do VD para a

SC ≥ 110mL/m2 (homens) ou ≥ 100 mL/m2 (feminino)

- ou fracção de ejecção VD ≤ 40%

Angiografia do VD:

• Acinésia, discinésia ou aneurisma regional do VD

Minor

• Dilatação ligeira global do

VD e/ou fracção de ejecção reduzida com VE normal

• Dilatação segmentar ligeira

do VD

• Hipocinésia regional do VD

Eco 2D:

• Acinésia ou discinésia regional do VD

• Mais 1 dos seguintes (fim da diástole):

- PEEL TSVD ≥ 29 mm até <32 mm( corrigido para o

tamanho corporal [PEEL/SC] ≥ 16 até <19 mm/m2 )

- PEEC TSVD ≥ 32 mm até 36 ( corrigido para o tamanho

corporal [PEEC/SC] ≥ 18 até < 21 mm/m2 )

- ou alteração da área fraccional > 33% até ≤ 40%

RM:

• Acinésia ou discinésia regional VD ou contracção VD

dessincronizada

• Mais 1 dos seguintes:

- Rácio do volume no fim da diástole do VD para a

SC ≥ 100 até <110 mL/m2 (homens) ou ≥ 90 até <100

mL/m2 (feminino)

- ou fracção de ejecção VD ≤ 40% até 45%

II. Caracterização tecidular da parede

Major

• Substituição fibroadiposa do

miocárdio na biópsia endomiocárdica

• Miócitos residuais <60% pela análise morfométrica (ou < 50%

se estimado), com substituição fibrosa da parede livre do miocárdio em ≥ 1 amostra, com ou sem substituição adiposa do tecido na biópsia endomiocárdica.

Minor • Miócitos residuais desde 60% até 75% pela análise

morfométrica (ou 50% até 65% se estimada), com substituição fibrosa da parede livre do miocárdio em ≥ 1 amostra, com ou sem substituição adiposa do tecido na biópsia endomiocárdica.

III. Anormalidades de repolarização

Major

• Inversão das ondas T nas derivações pré-cordiais (V1, V2 e V3)

ou nas seguintes derivações em indivíduos com > 14 anos (na ausência de bloqueio completo de ramo direito QRS ≥ 120 ms) Minor

• Ondas T invertidas nas

derivações pré-cordiais (V2 e

V3) ( pessoas com idades > 12

anos, na ausência de bloqueio de ramo direito).

• Inversão das ondas T nas derivações V1 e V2 em indivíduos

com mais de 14 anos de idade (na ausência de bloqueio

completo do ramo direito) ou em V4, V5, ou V6

• Inversão das ondas T nas derivações V1,V2 e V3 e V4 em

indivíduos com mais de 14 anos na presença de bloqueio completo de ramo direito

(14)

Tabela 1. Continuação

Critérios originais Critérios revistos IV. Anormalidades de condução/despolarização

Major

• Ondas epsilon ou

prolongamento localizado (> 110 ms) do complexo QRS nas derivações pré-cordiais direitas (V1 até V3)

• Onda epsilon (sinais de baixa amplitude reproduzíveis entre o

final do complexo QRS até ao inicio da onda T) nas derivações pré-cordiais direitas (V1 até V3)

Minor

• Potenciais atrasados

(ECGAR) • Potenciais atrasados na ECGAR em ≥1 de 3 parâmetros na ausência de QRS com duração >110 ms num ECG padrão

• Duração do QRS filtrado (QRSf) ≥ 114 ms

• Duração do QRS terminal <40 µV (duração do sinal de baixa

amplitude) ≥ 38 ms

• Raiz quadrada média da voltagem nos últimos 40 ms ≤ 20µV

• Duração da activação terminal do QRS ≥ 55 ms medidos desde

o ponto mais baixo da onda S até ao fim do QRS, incluindo R’

em V1, V2 ou V3 na ausência de bloqueio completo do ramo

direito.

V. Arritmias

Major

• Taquicardia ventricular não-sustentada ou sustentada com

morfologia do ramo esquerdo com eixo superior (QRS negativo ou indeterminado nas derivações II, III e aVF e positivo na derivação aVL) ou de eixo desconhecido

Minor

• Bloqueio de ramo esquerdo,

tipo taquicardia ventricular (sustentada e não sustentada) (ECG, Holter, exercício)

• Extrasistoles ventriculares

frequentes (>1000 em 24 horas) ( Holter)

• Configuração de taquicardia do trato de saída do VD

sustentada ou não sustentada, morfologia de bloqueio de ramo esquerdo com eixo inferior (QRS positivo nas derivações II, III e aVF e negativa na derivação aVL) ou de eixo desconhecido

• > 500 extrasístoles ventriculares em 24 horas (Holter)

VI. História familiar

Major

• Doença familiar confirmada à

necropsia ou cirurgia •

C/DAVD confirmada em parentes de primeiro grau que preenchem os Task Force Critéria

• C/DAVD confirmada patologicamente na autopsia ou cirurgia

num familiar de primeiro grau.

• Identificação de uma mutação patogénicaa categorizada como

associada ou provavelmente associada com a DAVD em doentes sob investigação

Minor

• História familiar de morte

súbita (<35 anos) devido a suspeita de C/DAVD

• História familiar (diagnóstico

clínico baseado nos presentes critérios)

• História de C/DAVD em parentes de primeiro grau, nos quais

não é possível ou não é prático determinar se os membros da família preenchem os critérios de diagnóstico

• Morte súbita prematura (< 35 anos) devido à suspeita da

presença de C/DAVD em familiares de primeiro grau

• C/DAVD confirmada patologicamente ou pelos critérios

actuais do Task Force em familiares de segundo grau.

PEEL para-esternal de eixo longo; TSVD, trato da saída VD; SC, superfície corporal; PEEC, para-esternal de eixo curto; *Hipocinésia não está incluída neste ou em outras definições de anormalidades da parede nestes critérios de diagnóstico propostos. aUma mutação patogénica é uma alteração do DNA associada com C/DAVD que altera ou se espera que vá alterar a proteína codificada, não é observada ou é raramente observada numa população de controlo sem C/DAVD e/ou altera ou prevê-se que altere a estrutura ou função da proteína ou demonstrou uma ligação ao fenótipo da doença

(15)

O diagnóstico definitivo requer a presença de 2 critérios majors, 1 major mais 2 minor, ou 4 minor de diferentes categorias. O diagnóstico borderline, requer 1 major e 1 minor ou 3 minor de diferentes categorias. O diagnóstico possível requer 1 critério major ou 2 minor de diferentes categorias. (9)

Diagnóstico de familiares de casos índice

No que respeita à avaliação diagnóstica dos parentes de casos índice sintomáticos, os critérios de diagnósticos da Task Force de 1994 são pouco eficazes. Dessa forma, Hamid, et al. (2002) (8) propuseram uma modificação dos mesmos, de forma a facilitar o diagnóstico em

parentes de 1º grau, os quais têm muitas vezes uma expressão da doença incompleta.

De acordo com estas recomendações, no contexto de C/DAVD em parentes de 1º grau, o diagnóstico familiar da doença baseia-se na presença de um dos seguintes parâmetros num membro da família:

- Inversão das ondas T nas derivações pré-cordiais direitas V1, V2 e V3 em indivíduos

com mais de 14 anos;

- Potenciais tardios no ECGAR;

- Taquicardia ventricular com morfologia de BRE no ECG, na monitorização com Holter ou durante a prova de esforço; ou mais de 200 contracções ventriculares prematuras em 24 horas;

- Dilatação ligeira global ou redução da fracção de ejecção do VD com VE normal ou ligeira dilatação ou hipocinésia segmentar do VD. (8)

EXAMES COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO

Electrocardiograma

O ECG é o registo gráfico dos potenciais eléctricos gerados pelo coração. A utilidade clínica deste exame, advém da sua disponibilidade imediata, além de que é um teste não-invasivo e acessível. (32)

O ECG de 12 derivações é anormal em mais de 90% dos doentes com C/DAVD. Na apresentação inicial da doença, cerca de 40 a 50% dos pacientes apresentam um ECG sem alterações. (12,33)

(16)

As anormalidades electrocardiográficas, reflectem a patofisiologia desta entidade, a qual, condiciona atrasos na activação do VD. (30,34) Assim, através dos exames electrocardiográficos é possível comprovar as anormalidades de repolarização e despolarização/condução eléctrica que estão presentes na C/DAVD, como as arritmias características desta doença. De referir que todos estes achados fazem parte dos critérios de diagnóstico em vigor. (9)

Alterações na repolarização

Em relação às alterações na repolarização, a inversão das ondas T (IOT) é a principal alteração na C/DAVD e ocorre predominantemente nas derivações pré-cordiais direitas, no entanto, pode estender-se para as derivações V4-V6. (29)

Em indivíduos saudáveis com idades compreendidas entre os 19 e os 45 anos, a IOT em V1,V2 e V3 está presente em menos de 3%. (35) Este achado electrocardiográfico é bastante

específico e relativamente sensível para o diagnóstico de C/DAVD. (30)

Um estudo recente de Jain, et al. (2009) (36) demonstrou que a IOT na derivação V3 tem uma óptima especificidade e sensibilidade em doentes com C/DAVD, especialmente naqueles que não apresentam bloqueio de ramo direito (BRD) ou quando este é incompleto, uma vez que a sua presença dificulta a interpretação das alterações da repolarização. (36)

O padrão juvenil da inversão das ondas T nas derivações V1 a V3 ou nas seguintes é uma variante normal em crianças com menos de 14 anos, daí que os critérios actuais apenas contemplem esta anormalidade para pessoas acima dos 14 anos de idade. (30,37)

A presença de IOT está relacionada com a extensão do envolvimento e dilatação do VD. (30) Nava, et al. (17) encontram uma relação directa entre a inversão das ondas T nas

derivações pré-cordiais com o grau de dilatação do VD. (17)

Anormalidades de despolarização/condução

No que concerne às anormalidades de despolarização/condução, os critérios de diagnóstico incluem a presença de: ondas épsilon, potenciais tardios observados no ECGAR e a presença de uma medida de duração de activação terminal (DAT) do QRS (9)

As ondas épsilon definem-se como potenciais eléctricos de “pós-excitação”, de pequena amplitude, que ocorrem no segmento ST . (29) Fontaine et al. (1978) (38), concluiu que estas resultam da condução lenta em áreas localizadas do VD. (38) Observam-se melhor nas derivações de V1 a V3 e quando presentes no ECG de 12 derivações, são observados no

(17)

ECGAR como potenciais tardios. A presença de ondas épsilon também está relacionada com a extensão do envolvimento do VD na C/DAVD. (34)

Holter

Na avaliação das arritmias, o Holter em ambulatório é um método simples e válido para avaliar doentes com suspeita de C/DAVD, uma vez que faz um registo contínuo de 24 horas da actividade eléctrica cardíaca. Caso o Holter de 24h não detecte nenhuma arritmia, outras opções incluem: monitorização com Holter mais prolongada, colocação de um registador de eventos implantável e ainda prova de esforço, numa tentativa de induzir arritmias. (29)

No que respeita às arritmias cardíacas, estas variam desde extra-sístoles ventriculares (EV), taquicardia ventricular não sustentada/sustentada e FV.(39)

Em relação às EV, aceita-se como limite normal, um número inferior a 200 EV num registo de Holter de 24 horas, uma vez que, um número superior sugere doença miocárdica subjacente. Nos critérios actuais, a presença de mais do que 500 EV constitui um critério minor de diagnóstico, diferente dos critérios de 1994, que apenas consideravam como critério mais do que 1000 EV. (34)

A presença de taquicardia ventricular não sustentada/sustentada com morfologia de BRE com eixo superior é um critério major, diferindo dos critérios anteriores de 1994, nos quais apenas existia um critério minor - taquicardia ventricular com BRE. (9) O registo de taquicardia ventricular não sustentada/sustentada com BRE e com eixo inferior é típica de TITSVD, no entanto também pode ocorrer na C/DAVD, mas está normalmente associada à inversão das ondas T e a arritmias ventriculares de várias morfologias. Assim, esta arritmia faz parte dos critérios minor de diagnóstico actuais. (40)

Eletrocardiograma de alta resolução

O ECGAR, é uma técnica não invasiva, a qual consiste em avaliar complexos sequenciais de ECG ao longo do tempo, detectando “potenciais tardios” de amplitude muito baixa, promovendo assim, um aumento da sensibilidade na detecção de atrasos da activação. (42)

(18)

Define-se como anormal quando um ou mais dos seguintes critérios estiver presente para qualquer um dos filtros: QRS filtrado ≥114 ms; duração do QRS terminal <40µV com duração do sinal ≥38 ms; raiz quadrada média da voltagem nos últimos 40ms do complexo QRS<20µV. (41) Estes critérios obtiveram uma sensibilidade de 74% e uma especificidade de 92% quando foram aplicados a 108 probandos recentemente diagnosticados. (30)

A extensão das anormalidades na ECGAR é proporcional ao grau de extensão da fibrose na cavidade ventricular direita. (42) A incidência de alterações neste exame está

aumentada em pacientes com uma fracção de ejecção ventricular direita reduzida (< 50%). (43)

Este exame adquire particular importância no diagnóstico diferencial da C/DAVD com TITSVD. Nesta última, a incidência de um ECGAR positivo é muito baixa em comparação com a C/DAVD, onde o teste é positivo em 50 a 60% das situações. (34)

Relativamente à DAT do QRS, os critérios de 1994 consideravam como critério major um prolongamento localizado do QRS. Reconheceu-se que este mesmo prolongamento envolve selectivamente o VD nesta patologia, e que por isso, deveria primariamente afectar a sua parte final. Assim, Nasir et al. (2004) (44) observaram que a parte terminal do QRS definido como o tempo desde a zona mais baixa da onda S até à linha isoeléctrica, estava prolongado mais do que 55ms em V1 até V3 em 95% dos doentes com C/DAVD. (44) Dessa

forma, a avaliação da DAT do QRS, incorpora o R’ e o alargamento da onda S, numa única medida denominada - duração de activação terminal (22,39) Assim, a DAT do QRS≥55 ms em V1 e V3 na ausência de BRD, é considerado actualmente um critério minor. (9)

Ecocardiografia

A ecocardiografia transtorácica bidimensional (ECO 2D) é um exame não invasivo, amplamente disponível, de baixo custo e de fácil execução, razão pela qual é o método de diagnóstico de primeira linha na avaliação de C/DAVD. (45,46)

Os achados que sugerem C/DAVD incluem: anormalidades globais ou segmentares na motilidade da parede (hipocinésia ou acinésia) com dilatação das cavidades, paredes ventriculares mais finas associadas a abaulamentos durante a sístole, aneurismas, trabeculação hipertófica do VD e finalmente disfunção sistólica (29)

(19)

Os critérios de 1994 incluíam dados subjectivos e qualitativos. Actualmente, os critérios englobam medidas quantitativas do VD, permitindo um diagnóstico mais fidedigno. (45)

Assim, hoje em dia a avaliação ecográfica dos doentes com C/DAVD tem por base a presença ou não de acinésia, discinésia ou aneurismas associada a medidas quantitativas da estrutura e função cardíacas, tais como: dimensão do trato de saída do VD (obtida em para-esternal de eixo longo e eixo curto) e a função sistólica do VD, estimada através da área fraccional (AF). (9)

Num estudo realizado por Yoerger et al. (2005) (45) concluíram que a dilatação do

tracto de saída do VD (diâmetro>30mm) tem a maior sensibilidade e especificidade (89% e 86% respectivamente) do que qualquer outro parâmetro ecográfico no diagnóstico de C/DAVD. (45)

Em relação à medição da função sistólica do VD, esta parece estar significativamente diminuída em doentes com C/DAVD, tendo a AF<32% uma sensibilidade e especificidade de 47% a 65% e 83% respectivamente. (45)

Contudo, Scheinman & Crawford (2005) (46), chamam a atenção para o facto do estudo anterior ter sido realizado em doentes que preenchiam os critérios criados em 1994 e como tal a aplicabilidade destes dados em doentes com doença ligeira é incerta. (46) Deste modo, estes parâmetros ecográficos, não têm sensibilidade diagnóstica para os casos ligeiros de C/DAVD com doença estrutural mínima. (2)

Num estudo que incluía membros de diferentes famílias, 2/3 dos doentes com C/DAVD, estes, apresentavam uma forma ligeira da doença com um volume ventricular direito normal ou ligeiramente aumentado. A dilatação do tracto de saída do VD (TSVD) apenas em 29% (11)

O doppler tecidular e o ecocardiograma de esforço podem ser úteis na detecção da doença em fases precoces. (29)

Num estudo realizado por Prakasa et al. (2007) (47), os autores concluíram que os resultados do doppler tecidular e do ecocardiograma de esforço, foram concordantes com a ecocardiografia convencional. No entanto, em 4 dos 30 doentes com C/DAVD sem qualquer

(20)

alteração do VD detectada pela ECO 2D e que preenchiam os critérios da Task Force, os valores do doppler tecidular revelaram alterações sugestivas, sugerindo potencialidade deste método em detectar casos ligeiros de C/DAVD. (47)

Contudo são necessários mais estudos que confirmem estes dados, de forma a incorporá-los nos critérios de diagnóstico de C/DAVD. (47,48)

Ressonância Magnética Cardíaca

O objectivo da utilização da RMC no diagnóstico de C/DAVD baseia-se na sua capacidade de avaliar alterações morfológicas, tecidulares e anormalidades funcionais presentes nesta doença. (49,50)

É um exame caracterizado por não utilizar radiação ionizante e ser altamente reprodutível, por essa razão, do ponto de vista de validade e segurança é o exame mais adequado para follow-up de casos indíce. (47)

De forma a obter-se uma imagem de qualidade, a RMC deve ser realizada durante o ritmo sinusal na ausência de batimentos ventriculares prematuros (51,52)

Alterações morfológicas

São várias as alterações morfológicas encontradas na C/DAVD, tais como: dilatação ventricular direita, adelgaçamento do miocárdio, aneurismas, hipertrofia e/ou trabeculações do VD. (50)

A dilatação do VD, não é um achado específico, mas é comum na C/DAVD. (50) Segundo Tandri et al. (2008) (49) existe uma correlação linear entre a duração dos sintomas com o índice do volume ventricular direito no fim da diástole. (49)

O adelgaçamento do miocárdio (define-se como uma redução focal e abrupta da espessura para < 2mm) (49) é uma alteração que se pesquisa na RMC, contudo é difícil de avaliar uma vez que, a parede do VD já é naturalmente fina. (30) Este achado associado a divertículos aneurismáticos, reforça a suspeita clínica. Os pequenos e múltiplos divertículos, podem dar origem a áreas focais com aspecto “rugoso” denominado sinal de acordeão, o qual é mais proeminente durante a sístole, e em determinadas áreas do VD, como no TSVD e na região subvalvular tricúspide.(27) Num estudo realizado por Dalal et al. (2009), (53) os autores concluíram que o sinal de acordeão estava presente em 60% dos portadores de mutações nos desmossomas e em nenhum dos indivíduos sem mutações.(53)

(21)

Como tal, considera-se este sinal como um indicativo precoce de C/DAVD em doentes assintomáticos. (27,53)

Alterações tecidulares

A RMC permite detectar infiltração adiposa do miocárdio, que se define por presença de intensidade muito alta do sinal em T1. (54,55)

No entanto, o tecido adiposo está presente fisiologicamente em doentes idosos ou obesos e como tal, a sua detecção na parede livre do VD tem uma especificidade diagnóstica limitada na ausência de anormalidades concomitantes da morfologia da parede. (56) Além

disso, este achado é pouco reprodutível entre observadores. (30,57) Num estudo realizado por

Bluemke et al. (2003), (56) os autores concluíram que a variabilidade nas interpretações deste

achado foram particularmente elevadas. Porém, os mesmos ressalvaram, que o grau de variabilidade objectivada, poderia em parte dever-se à falta de experiência no diagnóstico desta patologia com a RMC. (56)

Na identificação de tecido fibroso no miocárdio (baixo sinal em T1 e T2) que representa uma característica da C/DAVD, a RMC com reforço de gadolínio permite o seu reconhecimento. O realce do VE é facilmente identificável permitindo uma boa avaliação sobre o seu envolvimento. O desafio está, em identificar o reforço do VD, devido à fina espessura da sua parede livre, assim como, a presença de uma camada adiposa epicárdica que emite sinais de alta intensidade. (58)

Tandri, et al. (2005) (58) concluíram que a presença de um atraso no reforço de gadolínio tem um alto grau de correlação com a biópsia endomiocárdiaca e prediz a possível indução de FV durante os estudos electrofisiológicos. Além disso, também demonstraram uma associação entre a extensão do atraso no reforço e a disfunção do VD. As áreas mais afectadas foram a região antero-basal e o TSVD, dados consistentes com a distribuição das alterações anatómicas previamente descritas na C/DAVD. (58)

Alterações funcionais

A disfunção regional do VD está presente na maioria dos doentes com C/DAVD. (52) É o achado mais específico e sensível na RMC e corresponde a perda regional de miócitos. (49) Traduz-se por áreas de acinésia ou discinésia, que podem ser dificeis de

detectar, sendo necessária uma avaliação detalhada e sistemática de todo o VD. (50) A contracção assíncrona do VD também foi descrita, mas é subjectiva e aparentemente mais dificil de reconhecer. (50)

(22)

A RMC é uma excelente ferramenta na avaliação de pacientes com C/DAVD suspeita ou já confirmada. Em todo o caso, é necessária uma curva de aprendizagem e equipas experientes no diagnóstico desta patologia (29)

Uma das potencialidades da RMC, consiste na sua capacidade de detectar a doença em estádios precoces, que de outra forma escapariam ao diagnóstico pelos Task Force Criteria. Os critérios de diagnóstico actuais da Task Force, incluem acinésia, discinésia ou contracção assíncrona do VD como critério major, quando está associado a dilatação ou disfunção sistólica do VD e como critério minor, quando associado com dilatação borderline e disfunção sistólica do VD. (9) Estes critérios diferem dos criados em 1994 que eram menos

específicos, e sem parâmetros quantitativos, uma vez que a tecnologia estava apenas a ser introduzida nessa altura. (59)

Tomografia axial computorizada

A tomografia axial computorizada multicorte (TACMC), permite identificar características morfológicas presentes na C/DAVD, tais como o aumento do tamanho e presença de trabeculações ventriculares direitas, a presença de tecido adiposo intramiocárdico e a avaliação da função contráctil do VD. (60)

Esta técnica pode ser realizada em doentes com cardiodesfibriladores implantáveis (CDI) e tem uma boa concordância inter-observadores em relação às características morfológicas da doença. A TCMC tem algumas limitações que são, ter um único plano fixo axial, em doentes com CDI pode provocar artefactos nas imagens, a necessidade de administração de contraste (o qual pode ser nefrotóxico) e finalmente a utilização de uma quantidade considerável de radiação na sua realização. (2)

Comparando a RMC com a TAC, as vantagens desta última são: estar mais facilmente disponível, os scanners são menos dependentes de factores técnicos e a realização é mais rápida e fácil. Apesar de as imagens serem adquiridas apenas num plano, a aquisição de dados em 3 dimensões permite reformatar em qualquer plano desejável. Por estas razões a TAC pode ser uma ferramenta válida para avaliar a patologia cardíaca. (61)

São no entanto, necessários mais estudos para se alcançar mais evidências da sua utilidade e assim, utilizar a TACMC em doentes com contra-indicação para a realização da RMC. (61)

(23)

Angiografia

A angiografia, é um método imagiológico, que consiste na visualização radiográfica

do VD, após a injecção intravascular de contraste. Não é um exame de 1ª linha, tendo em consideração o facto de ser invasivo, utilizar contraste e uma quantidade considerável de radiação. Permite, ainda assim, uma excelente delineação do contorno ventricular ao longo do ciclo cardíaco. (62 )

Na C/DAVD, os achados angiográficos que podem ser encontrados são: anormalidades na mobilidade da parede ventricular, aneurismas no TSVD, (63) pequenas protuberâncias, assim como trabeculações transversas. (62)

A angiografia tem uma especificidade de diagnóstico de mais de 90% para detectar abaulamentos acinéticos ou discinéticos no triângulo da displasia. (63)

Todavia, sendo o VD uma câmara assimétrica com contracções não homogéneas, a análise visual da mobilidade das paredes é difícil, condicionando por vezes, interpretações com elevada variabilidade inter-observadores. (64,65)

As alterações na morfologia ventricular direita, correspondem à presença de trabeculações hipertróficas transversais separadas por fissuras profundas e trabeculações grosseiras na região apical, distal até à zona da banda moderadora. As trabéculas ventriculares direitas são consideradas hipertróficas quando existe um espessamento ≥4 mm. (63)

Pelos critérios da Task Force de 1994, os critérios major eram restritos à dilatação severa do VD ou a aneurismas localizados com dilatação segmentar severa. (66) Deste modo, estes critérios não se aplicavam à maioria dos doentes com C/DAVD, particularmente naqueles em que as alterações da parede eram relativamente ligeiras e pouco extensas. (62)

Actualmente o angiograma do VD, é considerado um teste de confiança na avaliação da mobilidade da parede do VD, daí que tenha sido integrado como critério major a presença de acinésia/discinésia regional do VD, para além da presença de aneurisma ou dilatação severa do VD. (9)

(24)

Biópsia endomiocárdica

A biópsia endomiocárdica (BEM), é um exame invasivo, não é comummente solicitado dado os riscos inerentes à própria técnica. (29)

A BEM, pode ser utilizada quando o diagnóstico de C/DAVD não é claro ou na exclusão de outros diagnósticos possíveis que podem mimetizar a doença, como a sarcoidose. (29)

Possibilita a análise histológica do tecido miocárdico, identificando características histológicas heterogéneas que caracterizam esta doença, tais como: necrose aguda com infiltrados inflamatórios, lesão subaguda com substituição fibro-adiposa e lesão crónica com tecido fibro-adiposo maduro em redor dos miócitos residuais sobreviventes. (10, 67)

A apoptose e os infiltrados inflamatórios, são características importantes na C/DAVD, particularmente durante os surtos da doença. Não está claro se estes são uma manifestação primária, ou secundária à lesão dos miócitos. Contudo, dada a sua natureza episódica e distribuição focal não são normalmente observados nas biópsias. (68,69,70)

Deve-se salientar a ideia, de que o fenótipo da doença é progressivo. Assim, numa fase precoce, as anormalidades histológicas consistem em morte dos miócitos e alterações degenerativas, em vez de deposição de tecido fibroadiposo maduro, podendo também estar confinado apenas às regiões subepicárdicas e não transmural. Deste modo, apesar da avaliação histológica dos parâmetros tecidulares ser mandatória, a avaliação citológica dos miócitos residuais pode ser crucial para o diagnóstico. (71)

No passado, a infiltração adiposa do miocárdico era por si só considerada um critério de diagnóstico major pelas recomendações do Task Force, no entanto, esta mesma infiltração foi observada em 85% dos indivíduos que morreram de causas não cardíacas, com especial predominância em idosos. (69) Estas observações sugerem que a infiltração do miocárdio apenas por tecido adiposo, sem a demonstração de degeneração dos miócitos e sem tecido fibroso não faz parte do espectro patológico da C/DAVD. (69)

Segundo um estudo de Basso et al. (2008) (70), o indicador mais fiável neste exame é a quantidade de miócitos residuais em biópsias que, simultâneamente também contêm uma combinação de tecido adiposo e fibroso. Este estudo demonstra que amostras tecidulares com <59% de miócitos residuais, tem uma especificidade de 95% e uma sensibilidade de 80%. Estes valores têm variações desde <31% na parede do VD inferior até <72% no TSVD. Estes achados foram incorporados nos actuais critérios de diagnóstico. (70)

(25)

É de salientar, que para cada parâmetro de tecido avaliado, tanto a sensibilidade como a especificidade variam de acordo com o local de origem da amostra. Este facto, deve-se à natureza segmentar da patologia, a qual afecta mais frequentemente as áreas do “triângulo de displasia” e poupa o septo interventricular em grande parte dos casos. Desta forma, existe uma grande variabiliade entre as diferentes amostras de BEM, conferindo a este exame uma sensibilidade diagnóstica baixa (70,72), Consequentemente, uma biópsia negativa não tem valor para excluir a doença. (69)

De acordo com estes dados, o papel da BEM no diagnóstico de C/DAVD continua a ser controverso. (73)

As recomendações dos autores, Basso, et al. (2008)(70) são retirar múltiplas amostras

de diferentes regiões do VD, que têm maiores probabilidades de serem afectadas (parede inferior, ântero-apical e TSVD) com pelo menos 2 mm2 ,de forma a aumentar a sensibilidade do procedimento. (74).

As amostras da parede livre do VD especialmente na zona do “ triângulo de displasia” são as que têm maior probabilidade de providenciar uma amostra adequada, contudo são também estas áreas que comportam maiores riscos de complicações, apesar de serem raras (1-2%), tais como, perfuração e tamponamento e inclusive morte em raríssimas ocasiões (<0,2%). (70) Mas, estes valores podem ter sido sobrestimados, já que em outros estudos, como o que foi realizado por Chimenti
et
al. (2004) (75) em 30 doentes sujeitos a BEM, não

registaram nenhuma complicação. (75) Também não foram reportadas complicações major

num estudo, Avella et al. (2008), (67) no qual, de um grupo de 22 doentes, apenas 2

apresentaram derrame pericárdico mínimo e assintomático. Contudo, a BEM da parede livre do VD deve ser realizada apenas em centros especializados. (70)

Análise imunohistoquímica

Num estudo realizado por Asimaki, et al. (2009) (69), concluiu-se que a análise imunohistoquímica da distribuição de proteínas dos desmossomas na biópsia do endomiocárdio pode providenciar alta sensibilidade e especificidade (91% e 82%

respectivamente) no diagnóstico de C/DAVD. Os resultados deste estudo indicam que o sinal imunoreactivo reduzido das placoglobulinas nos discos intercalados é uma característica consistente em doentes com C/DAVD e não é vista em outras formas de doenças do músculo cardíaco. Pelo contrário, a imunoreactividade da molécula de adesão N-caderina não desmossómica é normal nesta e em outras patologias cardíacas. Assim, a combinação de um nível anormal de placoglobulina com um nível normal de N-caderina, são sugestivos de

(26)

C/DAVD. (69) Apesar da degeneração e da substituição fibroadiposa característica desta doença ocorrer preferencialmente no VD, os autores observaram uma redução dos níveis de placoglobulina de uma forma difusa e não apenas em áreas do VD que mostram características patológicas típicas. Estas observações sugerem que, não é necessário biopsar o coração em áreas que com alterações estruturais de forma a diagnosticar a C/DAVD. São contudo necessários mais testes de validação até que este exame possa ser utilizado clinicamente. (69,76)

Uma forma de aumentar a eficácia da BEM é efectuá-la utilizando o ecocardiograma, a RMC e o mapeamento electro-anatómico como exames complementares que ajudem na orientação dos locais a biopsar (67,77)

Estudos electrofisiológicos

Os estudos electrofisiológicos são um método invasivo que utiliza cateteres para registar os eventos eléctricos do coração. A sua utilidade na C/DAVD relaciona-se com o facto de permitir fazer um mapa das regiões de baixa-voltagem. (67)

Num estudo realizado por Corrado et al. (2005), (77) os autores demonstraram a relação entre as regiões de baixa voltagem e os achados histopatológicos de substituição dos miócitos por tecido fibro-adiposo evidenciados na biópsia endomiocárdica. Estes dados confirmam que, a perda de voltagem no VD reflecte a substituição de tecido miocárdio gerador de potenciais de acção por tecido fibroadiposo eléctricamente silencioso. (77) Para além deste facto, existia também concordância entre a presença de áreas de menor voltagem identificadas no mapa electro-anatómico (MEA) e as regiões acinéticas/discinéticas detectadas por ecocardiograma e/ou angiografia. No que respeita à localização das alterações, os valores de baixa amplitude foram identificados na parede livre do VD, envolvendo predominantemente as regiões anterolateral, infundibular e inferobasal, poupando o septo interventricular. Esta distribuição é similar aquela observada em corações de necrópsia de doentes que faleceram por C/DAVD, nos quais a atrofia mais severa do VD e os aneurismas da parede estavam preferencialmente localizados nas mesmas regiões. (77)

Assim, os estudos documentam que as áreas de baixa-voltagem no MEA têm uma sensibilidade de diagnóstico alta em doentes que preenchem os critérios não-invasivos dos Task Force. (77, 78)

(27)

Num estudo realizado por Avella et al. (2008), (67) os autores demonstraram uma alta prevalência (73%) de MEA patológicos, mesmo em doentes que apenas tinham suspeita de C/DAVD. Este facto, realça o potencial papel deste exame em identificar formas ligeiras ou precoces de C/DAVD. (67)

O MEA pode ser muito útil na realização da biopsia endomiocárdica uma vez que, serve como guia para o local onde se deve biopsar. Num estudo com 11 doentes com suspeita de C/DAVD, todos os pacientes foram sujeitos a biopsia de áreas de baixa-voltagem identificadas no MEA. Em 81% dos casos, a biopsia guiada pelo MEA fez o diagnóstico desta doença, sugerindo uma alta sensibilidade diagnóstica com esta técnica. As complicações foram incomuns, apenas dois doentes apresentaram derrame pericárdico mínimo no seguimento do procedimento. (67)

São necessários mais estudos para validar os resultados dos trabalhos anteriores para que, no futuro se considere incorporar os achados do MEA nos critérios do Task Force. (67)

Testes genéticos

O conhecimento da base genética das patologias, provoca em geral um grande entusiasmo a nível científico, no entanto, a sua aplicabilidade na prática clínica não é fácil. (79)

No presente, a maior utilidade destes exames na C/DAVD é no screening genético de todos os genes conhecidos ou suspeitos de provocarem a doença, com uma taxa de sucesso de pelo menos 40%. (24)

Este screening é importante porque permite a identificação precoce de portadores clinicamente assintomáticos, os quais, irão precisar de monitorização ao longo da vida. (12) De facto, a MSC é a primeira manifestação clínica da doença em mais de 50% dos casos índice, podendo ser este o principal argumento a favor da adopção de uma abordagem pró-activa na avaliação familiar. (12,80)

Os candidatos a este screening incluem tanto os casos índice com achados de diagnóstico borderline pelos Task Force Criteria, como os membros de famílias de probandos (nos quais o teste genético foi positivo). Os não portadores, que representam cerca de 50% dos que são testados, não necessitam de check-ups futuros, podendo-lhes ser assegurada uma vida normal sem o risco de transmitirem a doença aos seus filhos. (24)

(28)

Apenas em 50% dos probandos estudados é que são encontradas mutações com potencial patogénico. (80) Esta condição, deve-se possivelmente à alta incidência de mutações raras em muitos doentes. (81)

Assim, a falta de identificação de uma mutação não exclui a doença. À medida que novos genes forem descobertos, a sensibilidade dos testes genéticos pode aumentar (24,29)

A identificação de uma mutação conhecida ou suspeita com potencialidade de causar esta doença, é actualmente considerada um critério de diagnóstico major, (9) ao contrário do que acontecia nos critérios originais de 1994, nos quais só a história familiar era incluída. (66)

O principal obstáculo à implentação deste screening, são os custos elevados de se proceder a uma análise genética sequencial de uma região genómica que excede 40 kb. (24)

Num estudo realizado por Barahona-Dussault et al. (2010) (81) os autores demonstraram que a análise genética, é uma abordagem diagnóstica válida, uma vez que confirmou a doença em 3 dos 5 doentes com C/DAVD borderline. Além destes dados, o estudo suporta o conceito de que certas variações genéticas como, por exemplo, os polimorfismos, poderiam desempenhar um papel importante na modulação do fenótipo final dos doentes com C/DAVD. Contudo, uma advertência dos autores é o facto de que a amostra de doentes neste estudo foi muito pequena (23 pacientes) e por essa razão estes dados devem ser interpretados com precaução. (81)

No presente, os dados sobre o estudo genótipo-fenótipo são muito escassos para permitir especulações sobre o possível impacto da análise genética na estratificação ou na terapia. (24)

É importante salientar que a base genética desta doença pode ser mais complexa do que foi até agora apreciado. Discrepâncias na prevalência de mutações na placofilina - 2 de 20% até 43% levantam a possibilidade de que algumas alterações missense podem ser responsáveis pela doença apenas quando acompanhadas por hits. Estes, podem ser variantes genéticas comuns, incomuns ou influências ambientais. Até que os factores genéticos e ambientais sejam totalmente compreendidos, é necessário precaução antes de dar alta aos doentes com anormalidades clínicas borderline tendo por base um teste genético negativo. (1)

(29)

CONCLUSÃO

A C/DAVD é uma doença com valores de prevalência e incidência imprecisas devendo-se em parte às dificuldades e aos erros no seu diagnóstico. É uma entidade caracterizada por uma substituição progressiva do tecido miocárdico por tecido fibroadiposo, com propensão para o desenvolvimento de arritmias ventriculares fatais numa fase precoce da sua evolução.

Atinge maioritariamente uma faixa etária jovem, sendo uma importante causa de morte súbita cardíaca.

No que respeita ao diagnóstico da doença, este baseia-se num conjunto de critérios criados em 1994 por uma Task Force uma vez que,não existe nenhum exame que seja gold-standard.

Estes mesmos critérios foram recentemente revistos por um grupo de peritos, de forma a aumentar a sensibilidade, mantendo a especificidade diagnóstica. Para isso, foram desenvolvidos parâmetros quantificáveis e não apenas qualitativos na avaliação cardíaca, assim, novos métodos de diagnóstico foram introduzidos, tais como, a RMC, a angiografia, e a identificação de mutações patogénicas.

A consciencialização de que a C/DAVD é apenas a forma mais conhecida de uma doença com um amplo espectro de fenótipos, está cada vez mais sedimentada. Esta condição realça a falta de orientações diagnósticas específicas para as formas da doença não clássica (fenótipo com predominância esquerda e fenótipo biventricular), o que contribui para a falta de reconhecimento das mesmas. Sendo essencial que os critérios sejam revistos no futuro, de forma a incorporar novas características clínicas.

Com o crescente conhecimento sobre a base genética da C/DAVD, existe um enorme potencial para utilizar a análise de mutações no seu diagnóstico e dessa forma melhorar o diagnóstico em familiares de casos índice.

São necessários mais estudos para avaliar a eficácia dos métodos de diagnóstico recentemente revistos, para melhor compreensão da história natural e dos mecanismos da C/DAVD, de forma a facilitar o desenvolvimento de algoritmos de estratificação de risco mais completos e que englobem todos os subtipos da doença.

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Referências

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