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A intervenção do serviço social no âmbito dos problemas ligados ao álcool

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Academic year: 2021

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

A intervenção do Serviço Social no âmbito dos

Problemas Ligados ao Álcool

Dissertação de Mestrado em Serviço Social

Rui Miguel Guerreiro dos Santos Parreira

Orientadora: Professora Doutora Daniela Monteiro da Silva

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

A intervenção do Serviço Social no âmbito dos

Problemas Ligados ao Álcool

Dissertação de Mestrado em Serviço Social

Rui Miguel Guerreiro dos Santos Parreira

Orientadora: Professora Doutora Daniela Monteiro da Silva

Composição do Júri:

Professora Doutora Ana Paula Monteiro Professora Doutora Paula Sousa

Professora Doutora Daniela Monteiro da Silva

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A elaboração da presente dissertação foi desenvolvida com vista à obtenção do grau de Mestre em Serviço Social, sendo as ideias da inteira responsabilidade do autor, excetuando as contribuições não originais que se encontram devidamente referenciadas.

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“Não é a consciência e a educação dos homens que determina o seu ser, ao contrário, é o seu ser social que determina a sua consciência” (Marx, 2008, p. 47).

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Agradecimentos

Agradeço em primeiro lugar aos meus pais António e Manuela pela oportunidade da realização deste Mestrado.

À minha orientadora Professora Doutora Daniela Joana Magalhães Monteiro da Silva pela dedicação, interesse, disponibilidade, paciência e competência.

A toda a equipa da Cáritas Diocesana de Vila Real - Projeto Homem com especial agradecimento às Dras. Sílvia Machado e Sophie de Almeida e ao terapeuta Américo.

Aos utentes da Cáritas Diocesana de Vila Real - Projeto Homem e em especial aos entrevistados que através das suas partilhas e experiência de vida em muito contribuíram para a realização desta dissertação.

Aos Professores Doutores José Luís D`Almeida e Paula Sousa da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro pela direção do curso e aos Professores Doutores Pedro Silva, Octávio Sacramento, Lúzia Oca, Hermínia Gonçalves, Vera Mendonça e Telmo Caria pelos conhecimentos transmitidos, assim como aos Professores Doutores Ricardo Vieira e Cristóvão Margarido do Instituto Politécnico de Leiria.

À minha colega e amiga Manuela Santos que desde a licenciatura me acompanhou neste percurso.

Ao meu grande amigo e ex-colega Dr. Luís Reis pela transmissão de conhecimentos e formações ministradas na área de Addiction Counselling.

À Dra. Marta Pratas da Unidade de Alcoologia de Lisboa pelas “dicas” e indicação de alguma literatura.

Às minhas amigas Telma Sousa, Lúcia Filipe, Inês Nogueira, Carina Janeiro e Cristélia Santos.

Quero também deixar umas palavras de força, fé e esperança para todas as pessoas com comportamentos aditivos e dependências que se encontram quer a consumir, em tratamento ou em recuperação.

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Resumo

A investigação denominada “A intervenção do Serviço Social no âmbito dos Problemas Ligados ao Álcool” assenta num trabalho de investigação realizado na Comunidade Terapêutica da Cáritas Diocesana de Vila Real - Projeto Homem, onde através do recurso abordagem qualitativa e a técnicas de investigação social, nomeadamente, entrevistas e questionários (como instrumento complementar) se pretendeu perceber quais os entendimentos de dez pessoas dependentes de álcool a realizar tratamento, assim como da Assistente Social desta instituição sobre esta problemática.

Na abordagem deste tema conferiu-se uma especial importância às perceções dos utentes, assim como da Assistente Social da instituição para responder aos seguintes objetivos da investigação: i) Perceber as causas do consumo, fatores que conduzem à recaída e diferenças entre o consumo de álcool e de substâncias ilícitas; ii) Compreender quais os papéis desempenhados pelas famílias das pessoas dependentes de álcool; iii) Perceber qual o entendimento dos utentes e da Assistente Social sobre as regras da instituição; iv) Compreender quais os papéis e as funções desempenhadas pela Assistente Social da Cáritas Diocesana de Vila Real - Projeto Homem e qual a perceção dos utentes perante a sua intervenção; v) Perceber a perceção dos utentes no que respeita à reinserção social e quais os contributos do Assistente Social para a melhoria das políticas sociais relacionadas com os Problemas Ligados ao Álcool.

Entre as principais conclusões retiradas da investigação, destacamos a dimensão multifatorial da doença, que se traduz, igualmente, num processo de tratamento, recuperação e reinserção complexo, dada a necessidade de serem tratados aspetos de ordem física, psíquica e social. Verificamos que os papéis desempenhados pelas famílias oscilam entre impulsionadoras do consumo (numa primeira fase), passando na maioria dos casos a co-dependentes e vítimas, contudo, com a realização do tratamento por parte da pessoa dependente, passam a ser apoiantes na sua recuperação.

Compreendemos das conclusões retiradas que a intervenção do Serviço Social nesta área manifesta fundamental importância no que respeita à articulação com outras instituições, no apoio às famílias, no cumprimento das regras institucionais por parte dos utentes, no seu acompanhamento, na sua capacitação, e no papel e funções que desempenha na instituição e na reinserção social dos mesmos.

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Abstract

The research called “Social Work intervention, in the extent of Alcohol problems context”, is based on a research work carried out in the Therapeutic community of Cáritas Diocesana of Vila Real - Man Project, where through the use of a qualitative approach and social research techniques, particularly, interviews and questionnaires (as a complementary tool) was intended to perceive, the understandings of ten alcohol dependent people, performing treatment, as well the institution social worker view, regarding this issue.

In the approach of this theme, a special importance was given to the users perceptions, as well to the institution social worker, to respond to the following research objectives: i) Understand the consumption causes, factors that lead to relapse and differences between the alcohol consumption and illicit substances; ii) Understand which roles are played by the families of the alcohol dependent people; iii) Realise the users and social worker understandings about the institution rules; iv) Understand the roles and functions performed by the Cáritas Diocesana social worker of Vila Real - Man Project and what is the users perception regarding the social worker intervention; v) Understand the users perception regarding the social reintegration and what are the social worker contributions to improve the social policies, related to alcohol problems.

Among the main draw conclusions from the research, we highlight the multifactorial dimension of the disease, which also translates a complex treatment, recovery and reintegration process, given the need, to deal with physical, psychological and social aspects. We verified that the roles played by the families oscillate between consumers boosters (in a first phase), passing in most cases to co- dependents and victims, but with the dependent person treatment performance, they start to support their recovery.

From the drawn conclusions, we understand that the social work intervention in this area, expresses fundamental importance, in relation with other institutions articulation, in the families support, in the institutional rules compliance by users, in their accompaniment, in their qualification, and in the role and functions performed at the institution and in the users social reintegration.

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Índice Geral

Agradecimentos ... ix

Resumo ... xi

Abstract ... xiii

Índice de figuras ... xvii

Índice de tabelas ... xvii

Índice de siglas e abreviaturas ... xix

Introdução ... 1

Capítulo I: Os Problemas Ligados ao Álcool ... 5

1. 1 - Do álcool à dependência... 5

1. 2 - O consumo de álcool na sociedade portuguesa ... 12

1. 3 - Quadros sociais que levam à dependência de álcool ... 24

1. 4 - O papel das famílias nos Problemas Ligados ao Álcool ... 27

1. 5 - Fatores que conduzem à recaída ... 30

1. 6 - As comunidades terapêuticas ... 35

1. 7 - As Instituições Totais ... 39

Capítulo II: A intervenção do Serviço Social no âmbito dos Problemas Ligados ao Álcool .. 43

2. 1 - O Serviço Social nos Problemas Ligados ao Álcool ... 43

2. 2 - Os campos paradigmáticos do Serviço Social ... 49

2. 3 - Modelos de intervenção em Serviço Social ... 54

Capítulo III: Desenho e metodologia da investigação empírica... 57

3. 1 - Paradigma de referência ... 58

3. 2 - Opção metodológica: estudo de caso ... 59

3. 3 - Recolha de dados e instrumentos utilizados ... 60

3. 4 - Tratamento e análise dos dados ... 66

3. 5 - Contexto empírico da investigação ... 68

3. 6 - O programa terapêutico Projeto Homem... 74

Capítulo IV - Análise e discussão dos resultados... 79

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Referências Bibliográficas ... 133 Anexos ... I Anexo A - Guião da entrevista: Assistente Social ... III Anexo B - Guião da entrevista: Utentes ... VII Anexo C - Guião do questionário: Utentes ... XI Anexo D - Consentimento informado ... XV Anexo E - Os doze passos de AA ... XIX

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Índice de figuras

Figura 1 - Definição de dose padrão de bebidas alcoólicas ... 16

Figura 2 - Campos paradigmáticos do Serviço Social ... 51

Índice de tabelas

Tabela 1 - Fases e sinais de alerta de recaída ... 32

Tabela 2 - Agrupamento das variáveis ... 67

Tabela 3 - Principais regras da instituição... 77

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Índice de siglas e abreviaturas

AA - Alcoólicos Anónimos

APA - American Psychiatric Association

APSS - Associação dos Profissionais de Serviço Social ARS - Administração Regional de Saúde

CAD - Comportamentos Aditivos e Dependências CET - Curso de Especialização Tecnológica CLAS - Conselho Local de Ação Social CRI - Centro de Respostas Integradas CT - Comunidade Terapêutica

DGS - Direção Geral da Saúde

DSM - Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders IABA - Imposto sobre o Álcool e as Bebidas Alcoólicas IASSW - International Association of Schools of Social Work IDT - Instituto da Droga e da Toxicodependência

IEFP - Instituto do Emprego e Formação Profissional IFSW - International Federation of Social Workers INEM - Instituto Nacional de Emergência Médica IPSS - Instituição Particular de Segurança Social ISS - Instituto da Segurança Social

IVV - Instituto da Vinha e do Vinho

OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico OMS - Organização Mundial de Saúde

ONG´s - Organizações Não Governamentais PNB - Produto Nacional Bruto

PNRCAD - Plano Nacional para a Redução dos Comportamentos Aditivos e das Dependências

PPR - Plano de Prevenção de Recaída RSI - Rendimento Social de Inserção

SICAD - Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências WHO - World Wealth Organization

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Introdução

A investigação denominada “A intervenção do Serviço Social no âmbito dos Problemas Ligados ao Álcool” assenta num trabalho de investigação realizado na Comunidade Terapêutica da Cáritas Diocesana de Vila Real - Projeto Homem.

A dependência de álcool é uma doença primária, crónica, progressiva e fatal, que se revela causadora de diversas doenças e problemáticas sociais (IDT, 2011b) e ao longo dos últimos anos, os Problemas Ligados ao Álcool na sociedade portuguesa têm-se traduzindo num problema de enorme dimensão para a Saúde Pública, verificando-se elevadas taxas de mortalidade, de internamentos hospitalares ou em unidades de tratamento específicas para tratamento de dependências, assim como um vasto leque de problemáticas sociais associadas ao consumo, nomeadamente, a violência doméstica, a negligência parental e os crimes contra a sociedade (Ribeiro & Guerreiro, 2017) que conferem elevadas despesas ao Estado, sendo estas superiores ao que o Estado aufere através dos impostos sobre a comercialização de bebidas alcoólicas (Marinho, 2008; Monteiro, 2016).

Dado que a sociedade portuguesa é bastante tolerante ao consumo de álcool (Pereira, 2003), esta temática não é muito abordada no nosso país, assim, torna-se pertinente esta dissertação, dado que se encontra associada à necessidade de investimento ou aprofundamento do conhecimento científico nesta área, porque a maioria das políticas sociais se têm revelado insuficientes e ineficazes para combater esta problemática, sendo necessária uma mudança de mentalidades, atitudes e comportamentos por parte da sociedade (Almeida, 2014; Pereira, 2003; Ribeiro & Guerreiro, 2017), de forma a promover a reinserção social das pessoas com comportamentos aditivos e dependências e a prevenir a ocorrência de novos casos de dependência.

No que concerne aos internamentos em comunidades terapêuticas, segundo os últimos dados, em 2016 encontravam-se em tratamento 1343 pessoas, sendo este número superior aos dos anos anteriores (Ribeiro & Guerreiro, 2017). Ao longo desta dissertação poderemos constatar que as comunidades terapêuticas se revelam respostas adequadas para a realização de tratamentos de dependências, apesar de na sociedade, em alguns casos, estas instituições ainda tenderem a serem vistas como seitas ou como algo marginal e nocivo (Angel, Richard & Valleur, 2002), pelo que também se pretende a desconstrução deste mito que leva um grande número de pessoas dependentes de álcool ou de substâncias ilícitas a não solicitar ajuda para a resolução dos seus problemas.

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Relativamente ao Serviço Social, esta profissão, ao longo da sua história tem passado por diversas transformações, de forma a enfrentar os problemas sociais, contudo, em Portugal, têm-se verificado que as suas práticas profissionais se encontram por vezes desatualizadas apesar de na Academia terem acompanhado o progresso (Amaro, 2018).

Em Portugal, para além das dificuldades inerentes ao trabalho do Assistente Social, também o Estado não se revela muito empenhado na resolução de problemas sociais (Dominelli, 2004; Pimentel & Albuquerque, 2010) ao que acrescem as dificuldades de afirmação do Serviço Social nas ciências sociais e no universo das profissões instituídas (Caria, 2017).

Assim, compete aos Assistentes Sociais uma atualização das suas competências e habilitações para que o Serviço Social português se paute por valores como os inerentes ao paradigma alternativo do Serviço Social (Amaro, 2008), devendo os profissionais que desempenham funções no campo dos comportamentos aditivos e dependências assumir um compromisso no que concerne a um trabalho de prevenção e sensibilização da sociedade em geral, de forma a erradicar o preconceito perante os comportamentos aditivos e dependências, assim como propor o estabelecimento de melhorias para o combate a esta problemática (Almeida, 2014; Barbosa, 2011).

A escolha da temática relacionada com os Problemas Ligados ao Álcool para a realização da dissertação prende-se com o facto da primeira experiência do investigador em Serviço Social ter ocorrido na área dos comportamentos aditivos e dependências durante a realização do estágio do curso CET (Curso de Especialização Tecnológica em Serviço Social e Desenvolvimento Comunitário), dado que foi realizado numa Comunidade Terapêutica no Distrito de Santarém, tendo o investigador posteriormente realizado funções de técnico de Serviço Social e de monitor nessa instituição durante cerca de três anos, período em que também foi realizada parte da licenciatura em Serviço Social no regime pós-laboral no Instituto Politécnico de Leiria.

Para a realização da dissertação, numa primeira instância, foi elaborado o projeto para que a investigação decorresse na Unidade de Alcoologia de Lisboa, dada a proximidade com a área de residência do investigador, contudo, após o envio do projeto para esta instituição, bem como da realização de uma reunião com a Diretora da mesma, para se verificar a exequibilidade da investigação, foi possível constatar que a aprovação do projeto teria de passar pela Comissão de Ética da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo,

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processo que demoraria cerca um ano até se verificar a aprovação, ou não do projeto de investigação.

Após a ocorrência desta situação, equacionou-se a questão da melhor forma e dado que a Cáritas Diocesana de Vila Real - Projeto Homem se localiza nas imediações da outra residência do investigador, foi enviado um email com a proposta da investigação para esta instituição, sendo posteriormente realizada uma reunião informal com a Diretora Técnica e com a Assistente Social.

Esta reunião decorreu num ambiente descontraído, tendo o investigador explicado tanto à Diretora Técnica como à Assistente Social as ideias chave da investigação, assim como as exigências éticas garantidas, tendo estas manifestado agrado com o tema e aprovado o projeto.

Desta forma, ficou estipulado que a investigação incidiria sobre a Assistente Social desta instituição e sobre um grupo de dez utentes dependentes de álcool na realizar tratamento na Comunidade Terapêutica da Cáritas Diocesana de Vila Real - Projeto Homem, nomeadamente cinco homens e cinco mulheres, privilegiando-se os seguintes critérios: a heterogeneidade ao nível do género, a disponibilidade dos mesmos para a participação na investigação e uma maior capacidade de comunicação, sendo estas pessoas selecionadas pela Assistente Social.

Devido à complexidade desta temática, através do recurso à abordagem qualitativa e a técnicas de investigação social, nomeadamente, entrevistas e questionários (como instrumento complementar) pretendeu-se perceber quais os entendimentos destas pessoas sobre a problemática em questão.

Na abordagem deste tema conferiu-se uma especial importância às perceções dos utentes, assim como da Assistente Social da instituição para a elaboração dos seguintes objetivos da investigação: i) Perceber as causas do consumo, fatores que conduzem à recaída e diferenças entre o consumo de álcool e de substâncias ilícitas; ii) Compreender quais os papéis desempenhados pelas famílias das pessoas dependentes de álcool; iii) Perceber qual o entendimento dos utentes e da Assistente Social sobre as regras da instituição; iv) Compreender quais os papéis e as funções desempenhadas pela Assistente Social da Cáritas Diocesana de Vila Real - Projeto Homem e qual a perceção dos utentes perante a sua intervenção; v) Perceber a perceção dos utentes no que respeita à reinserção social e quais os contributos do Assistente Social para a melhoria das políticas sociais relacionadas com os Problemas Ligados ao Álcool.

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Esta dissertação encontra-se dividida em quatro capítulos. No capítulo I apresenta-se o enquadramento teórico, sendo para o efeito realizada uma revisão da literatura relacionada com os Problemas Ligados ao Álcool, onde se destaca a sua evolução histórica do consumo de álcool desde os primórdios da humanidade até ao atual conceito de dependência de álcool, assim como as problemáticas associadas ao consumo de álcool na sociedade portuguesa.

O capítulo I versa também sobre os quadros sociais que levam à dependência de álcool, sobre o papel das famílias nos Problemas Ligados ao Álcool, bem como os fatores que conduzem à recaída, sendo também apresentadas diversas estratégias de prevenção da mesma, seguindo-se uma breve resenha histórica sobre as comunidades terapêuticas, sendo por fim caraterizadas as Instituições Totais que contrastam com as atuais concepções das comunidades terapêuticas, pretendendo-se através deste contraste desmistificar o errado entendimento que a sociedade portuguesa possui sobre as comunidades terapêuticas.

No capítulo II são abordados diversos aspetos importantes para intervenção do Serviço Social nos Problemas Ligados ao Álcool, assim como os campos paradigmáticos e os Modelos de intervenção em Serviço Social.

No capítulo III será descrito o processo metodológico, desde o momento dos preparativos para a investigação, passando pelas definições dos métodos e técnicas de investigação social utilizadas para este estudo, sendo também apresentada uma descrição da instituição, bem como do programa terapêutico usado para a recuperação de pessoas com comportamentos aditivos e dependências, nomeadamente o programa Projeto Homem.

No capítulo IV serão apresentadas a análise e a discussão dos dados obtidos no terreno, tendo-se para o efeito associado os dados recolhidos no terreno à fundamentação teórica, para formar textos lógicos e sequenciais de modo a responder aos objetivos da investigação.

Nas conclusões encontram-se descritas as principais ideias da investigação, bem como serão apresentadas algumas sugestões que objetivam melhorias no âmbito do Serviço Social perante os Problemas Ligados ao Álcool, dando-se um especial destaque à reinserção social, dado que este processo contém diversas lacunas que de certa forma acabam por agudizar a recuperação de diversas pessoas que terminam o tratamento em comunidade terapêutica, verificando-se, no entanto, casos de sucesso.

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Capítulo I: Os Problemas Ligados ao Álcool

Este capítulo, enquadrador do tema, pretende revisitar a evolução histórica do consumo de álcool desde os primórdios da humanidade, passando por diversas épocas e sociedades, até à atualidade da sociedade portuguesa onde se verificam nefastas consequências causadas pelo consumo desta substância lícita. Serão também apresentados uma revisão da literatura sobre os quadros sociais geradores da dependência de álcool, assim como, sobre o papel das famílias nos Problemas Ligados ao Álcool. Serão igualmente apresentados os diversos fatores que conduzem à recaída, assim como estratégias de prevenção. Posteriormente, apresenta-se uma breve resenha histórica sobre as comunidades terapêuticas, sendo no final realizada uma breve caraterização sobre as Instituições Totais. 1. 1 - Do álcool à dependência

Ao longo dos últimos anos a alcoologia, ou seja, a disciplina científica que se dedica a tudo aquilo que diz respeito à produção, à distribuição, ao consumo normal ou patológico de bebidas alcoólicas, assim como às suas causas e consequências, quer ao nível individual quer coletivo tem desempenhado um papel importante na produção de conhecimento para as ciências humanas, médicas, sociais, jurídicas e económicas (Mello, Barrias & Breda, 2001).

Constata-se que o consumo de álcool1remonta aos primórdios da humanidade, dado que os primatas fermentavam frutas com o intuito de sentirem o efeito de leves intoxicações (Gigliottia & Bessa, 2004). Na história da humanidade, encontram-se inculcados diversos significados sociais, culturais e ritualísticos associados ao consumo de bebidas alcoólicas que se baseiam em regras acordadas pelos grupos sociais, tornando o consumo de bebidas alcoólicas numa prática simbólica aceite pelas sociedades, à exceção do mundo islâmico que restringe ou proíbe o seu consumo (Sales, 2010).

Tal como defendem Martins & Júnior (2012) as bebidas alcoólicas são substâncias psicoativas, que apesar de permitirem um consumo moderado, dependendo da dose, da frequência e das circunstâncias, modificam o funcionamento do cérebro, no entanto a sua inadequada utilização torna-se geradora de problemas orgânicos, psicológicos e sociais.

Na maioria das sociedades influenciadas pelo cristianismo, o consumo de bebidas alcoólicas tem ocupado um lugar de destaque, acabando por adquirir um caráter

1 O álcool ou etanol é o principal componente das bebidas alcoólicas, que o contêm em diferentes concentrações, sendo a sua fórmula

química CH3 CH2 OH (Cabral, 2004; Morel, Fontaine & Hervé, 1998). Consiste num líquido incolor, volátil, de sabor queimoso, de cheiro caraterístico e densidade 0,8 g/cm³, possuindo caraterísticas psicotrópicas que são produzidas pela fermentação do açúcar existente em produtos de origem vegetal, nomeadamente em frutos, caules ou raízes, podendo também ser produzido através da destilação (SICAD, 2018).

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predominantemente religioso devido ao papel cultural que o vinho possui nestas sociedades, que sempre o enalteceram e dignificaram, como é verificável através das expressões "Sangue de Cristo", "dádiva de deuses" e "essência da própria vida" (IVV, 2018). Neste sentido, no Antigo Testamento já se alertava para um consumo moderado como no caso de Noé que se manteve abstinente enquanto guiou a arca, tendo posteriormente ao dilúvio, plantado uma vinha e bebido vinho para se embriagar (Pinto, 2008).

Efetuando uma análise diacrónica, salienta-se que no mundo greco-latino clássico eram realizados rituais que incluíam o consumo de vinho de forma a induzir transes e desinibir os participantes, e nestes rituais, as festas e o vinho possuíam tal importância para os gregos e para os romanos, que se consolidou a ideia dos deuses Dionísio e Baco, contudo, apesar do seu aspeto simbólico, o abuso e a embriaguez eram censurados por estes povos (Cabral, 2004).

Segundo Fishman (1998), apesar do povo árabe ter sido pioneiro na destilação de álcool, a sua industrialização ocorreu somente no século XII, nos países cristãos do mediterrâneo. Por sua vez Borges & Filho (2004) salientam que também o povo egípcio mereceu especial relevo na evolução histórica do álcool devido a ter documentado em papiros as diversas etapas sobre o fabrico, a produção e a comercialização de vinho e de cerveja, mencionando também que as bebidas fermentadas eliminavam os parasitas e deveriam ser utilizadas como medicamentos.

Durante a Idade Média a comercialização e o consumo de bebidas como a cerveja e o vinho aumentaram, levando a igreja a considerar a embriaguez como um pecado (Pinto, 2008). Nesta época, na Europa o consumo de álcool também se encontrava associado à supremacia dos povos, dado que para os povos da região Sul, o consumo de vinho ditava um modelo de vida civilizado, ao contrário da região Norte, onde o consumo da cerveja era considerado pelos povos da região Sul da Europa como um ato dos pobres, dos bárbaros e dos pagãos (Braudel, 1970).

A partir da descoberta da destilação, o consumo de álcool foi-se expandindo e universalizando devido ao desenvolvimento desta tecnologia e a partir do século XIV, as bebidas destiladas passaram a desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento da supremacia europeia, tornando-se num dos mais rentáveis negócios ao nível dos mercados mundiais, o que se deveu a bebidas como a aguardente, o rum e a genebra não serem afetados pelo clima, nem pelo transporte e concentrarem um elevado potencial psicoativo que substituiu as produções locais de vinho e de cerveja (Borges & Filho, 2004).

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Segundo Fishman (1998) com as transformações sociais e económicas, a produção e o consumo de bebidas alcoólicas foram aumentando, conduzindo as sociedades ao desenvolvimento de uma relação de maior proximidade com as bebidas alcoólicas, no entanto esta relação foi-se perdendo no século XVIII com o surgimento do tabaco e no século XIX com o consumo de outras drogas.

Durante o renascimento surgiram novas formas de restrição do consumo de álcool, nomeadamente a fiscalização nos cabarés e nas tabernas, sendo estipulados horários de funcionamento para estes estabelecimentos, dado que nestes locais era permitido que as pessoas se manifestassem livremente, pois as tabernas para além de lugares de consumo de bebidas alcoólicas eram e são atualmente também locais de estabelecimento de relações e atividades públicas ou políticas (SICAD, 2018a). De acordo com Marques (2001), no final do século XVIII, as Revoluções Francesa e Industrial originaram transformações demográficas e sociais na Europa, passando neste período, o abuso de bebidas alcoólicas a ser visto por alguns estudiosos como uma doença ou uma desordem.

No século XIX a industrialização e o desenvolvimento das tecnologias permitiu a estabilidade dos destilados, levando consequentemente a uma maior expansão deste negócio, uma vez que “(...) ao longo dos tempos, o álcool adquiriu uma dupla importância e um duplo significado: por um lado, enquanto substância de caráter quase mágico, com um papel de celebração, de ritualização, de aproximação, prazer e libação; por outro lado, enquanto fonte de receita e produto comercial de elevado valor, fator de desenvolvimento económico para alguns países” (IDT, 2011b, p. 5).

No entanto, o consumo de bebidas alcoólicas e os problemas associados, nomeadamente, doenças do fígado, do sistema nervoso, do miocárdio, entre outras aumentaram, até que durante o século XIX, mais concretamente em 1851, o médico sueco Magnus Huss, mencionou que o alcoolismo era uma forma de doença correspondente a uma intoxicação crónica, cujos quadros patológicos se desenvolviam em indivíduos possuidores de hábitos prolongados e excessivos de consumo de bebidas (Mello, Barrias & Breda, 2001).

Na segunda década do século XX, nos Estados Unidos, surgiram tentativas de redução do consumo de álcool, culminando com a proibição, também designada por Lei Seca, que em contrapartida apenas favoreceu o contrabando e o fabrico clandestino de bebidas, levando a provar que as medidas penais não resolvem esta problemática (Borges & Filho, 2004).

Em 1935, em Akron, nos Estados Unidos, surgiram os Alcoólicos Anónimos, tendo este grupo com sua experiência, metodologia e sucesso, encorajado vários alcoólicos a

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solicitar ajuda, encontrando-se na sua génese um homem de negócios (Bill W.) e um médico (Dr. Bob) que pela primeira vez após vários anos de consumo atingiram a sobriedade, e a partir desse momento conseguiram perceber que à medida que ajudavam outras pessoas a alcançar a sobriedade, o seu desejo de beber também diminuía, tendo sido posteriormente publicado o livro Alcoólicos Anónimos e inaugurado um escritório em Nova Iorque, para dar resposta a quem solicitasse ajuda para o seu problema (Alcoólicos Anónimos, 2001).

Durante a década de 40, os estudos realizados sobre a problemática do alcoolismo, estimavam que nos Estados Unidos existissem 1370000 trabalhadores afetados pelo consumo de álcool, estabelecendo também uma relação entre o consumo de álcool e os acidentes de trabalho (Gameiro, 1988). Em 1952, com a primeira edição do DSM - I (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders), o alcoolismo foi definido como uma doença (Machado & Júnior, 2011).

Nos países mais desenvolvidos, durante os anos 60, dada a frequência de acidentes de trabalho e de casos de alcoolismo em funcionários de empresas2, o que provocava sérias consequências, nomeadamente, ao nível da baixa produtividade, das elevadas taxas de absentismo, da escassez de mão-de-obra qualificada, etc., tiveram início diversas campanhas de prevenção, consistindo estas, em primeiro lugar no preenchimento de questionários por parte dos trabalhadores, para determinar quem teria problemas de alcoolismo, sendo que às pessoas que apresentassem um diagnóstico positivo, as empresas aconselhavam ou obrigavam legalmente essas pessoas a procurar ajuda especializada (Gameiro, 1988).

Decorrente da 8ª Conferência Mundial de Saúde, a OMS, em 1967 passou a definir o alcoolismo como uma doença com sinais e sintomas bem definidos, considerando que esta problemática consiste numa condição patológica que provoca nos indivíduos uma incapacidade que os impede de optar ou não pelo consumo, o que significa que o alcoolismo se carateriza pela perda de controlo sobre o consumo de bebidas alcoólicas, sendo que a partir desta contribuição o alcoolismo deixou de ser visto como um vício, passando a ser definido como uma adição3 (Mello, Barrias & Breda, 2001).

Em 1976, após a realização de um rigoroso estudo no hospital Moudsley em Londres, a problemática do alcoolismo passou a ser vista como uma desordem que se desenvolvia ao longo da vida, relacionando-se com aspetos de ordem biológica e cultural, dado que, para um

2 Atualmente o SICAD tem várias orientações para a intervenção em meio laboral que passam pela prevenção (SICAD, 2016).

3“Uma adição consiste no uso habitual de substâncias alteradoras do humor (álcool, drogas) ou de comportamento (jogo, abuso de comida,

etc.) que é caraterizado pela tolerância à substância ou comportamento (um crescente recurso à substância/comportamento torna-se necessário para obter o mesmo efeito) e pela perda de controlo (o uso continuado apesar das suas consequências)” (Nakken, 1996, p. 4).

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indivíduo se tornar dependente de álcool, necessitava de passar por diversas fases, sendo que no início, os indivíduos bebiam moderadamente e em horários flexíveis, mas com o passar do tempo o consumo ia-se agudizando, até se realizar todos os dias e em quantidades cada vez maiores, surgindo assim a designação de Síndrome de Dependência Alcoólica (Griffith & Gross, 1976).

Segundo Maciel & Kerr-Corrêa (2004) com o desenvolvimento da ciência e de estudos relacionados com a problemática em questão constatou-se que ao contrário das outras drogas, o álcool atua sobre a maioria dos órgãos vitais simultaneamente, sendo que depois de ingerido chega ao cérebro através da corrente sanguínea, onde estimula os neurónios, de forma a que estes libertem uma quantidade extra de serotonina4. Numa primeira instância, após o consumo de bebidas alcoólicas, os indivíduos tornam-se mais desinibidos ou eufóricos, mas com a continuidade do consumo serão afetados os neurotransmissores glutamato e GABA (ácido gama-aminobutírico), levando os indivíduos a perderem a coordenação e o auto-controlo (Maciel & Kerr-Corrêa, 2004).

Ainda de acordo com Maciel & Kerr-Corrêa (2004), verifica-se que para além dos efeitos causados no cérebro, o álcool provoca irritações na mucosa do estômago, causando dificuldades na digestão, assim como aumenta a produção de ácido gástrico que por sua vez vai originar uma sensação de enjoo. Ao nível dos rins, o consumo de álcool provoca uma maior necessidade de urinar, não só pela quantidade ingerida, bem como, pelo facto de o álcool agir sobre a hipófise, no cérebro, o que leva a uma maior absorção de água pelos rins, que consequentemente conduzem a uma maior eliminação da urina, sendo que o excesso de urina afetará o coração, porque através da urina são eliminados o magnésio e o potássio que ajudam a manter o batimento cardíaco, podendo assim, o ritmo cardíaco apresentar alterações durante o estado de embriaguez (Maciel & Kerr-Corrêa, 2004).

Segundo Mello, Barrias & Breda (2001), em 1982, no âmbito da 35.ª Assembleia Mundial de Saúde, em Genebra, a OMS referiu que as consequências dos Problemas Ligados ao Álcool não atingem somente o consumidor, mas também a sua família e a sociedade em geral, revelando-se este conceito atualmente o mais amplo, dado que o vulgar conceito de alcoolismo acaba por se limitar aos efeitos do consumo excessivo e prolongado de bebidas

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Neurotransmissor que estabelece a comunicação entre as células nervosas, sendo o principal regulador do sono, do humor, do apetite, do ritmo cardíaco, da temperatura corporal, da sensibilidade e das funções intelectuais, desta forma, a serotonina quando se encontra em baixas concentrações, pode causar mau humor, ansiedade, insónias e depressão (Frazão, 2018).

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alcoólicas que podem culminar num estado de dependência. Assim, o conceito Problemas Ligados ao Álcool deixa de se focar unicamente nos aspetos médico-sociais da doença, alargando-se a tudo o que diz respeito à produção, à distribuição, ao consumo, à publicidade, à legislação sobre o álcool e bebidas alcoólicas, dedicando-se também a estratégias de intervenção, que exigem a multidisciplinaridade (Mello, Barrias & Breda, 2001).

De acordo com o IDT (2011b) a dependência de álcool é uma doença primária, crónica, progressiva e fatal, que se revela causadora de diversas doenças e problemáticas sociais, desta forma, não fará muito sentido apenas focarmo-nos na palavra “alcoolismo”, não só pelo estigma e preconceito que acarreta, mas pelo facto de a dependência de álcool ser uma doença crónica que diz respeito à Saúde Pública, devendo para tal ser tratada como outras doenças crónicas, nomeadamente o cancro ou a diabetes, em que não se encontra o estigma social associado.

Importa também salientar que na literatura mais atual e específica (Ex: SICAD, Revista Dependências Revista Toxicodependências, Hazelden, etc.) para a abordagem aos Problemas Ligados ao Álcool já não são utilizadas palavras como “alcoolismo” ou “alcoólico” tendo sido substituídas por “dependência de álcool” ou “pessoa com dependência”, encontrando-se este facto associado à necessidade das sociedades se manterem atualizadas assim como de se pautarem por uma cidadania mais inclusiva onde não se verifique discriminação perante as pessoas mais necessitadas ou em risco, verificando-se também uma necessidade extra de os profissionais que prestam cuidados aos utentes e às famílias se dedicarem ao máximo na execução das suas funções, quer física ou emocionalmente (Frampton et al., 2008), pois a prestação destes cuidados não deve apenas basear-se nos sintomas, nas doenças ou nas deficiências, mas sim no ser humano como um todo (Moore, 1999).

Para os especialistas em PLA mais tradicionalistas, nomeadamente os Alcoólicos Anónimos, o termo “alcoólico” continua a ser usado, no entanto, poderia também ser recontextualizado um pouco à semelhança do que se verifica no caso das pessoas com deficiência, onde geralmente se usa o termo “deficiente”, contudo em 2004 a “Liga Portuguesa dos Deficientes” passou a ser designada por Fundação Liga (2019) de modo a erradicar situações de discriminação associada à terminologia usada, pois ao usarmos os termos “alcoólico” ou “deficiente” acabamos por estigmatizar a pessoa dado que a caraterizamos pela sua condição em detrimento da sua condição humana, o que contrasta com os modelos de inclusão que objetivam a não discriminação e a igualdade (Silva, 2009).

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Para Gomes (2010), o consumo de bebidas alcoólicas traduz-se num processo de aprendizagem individual e social, dado que a relação entre os indivíduos e o consumo se vai tornando cada vez mais próxima, mas com a continuidade e o respetivo abuso, verificar-se-ão consequências diretas, nomeadamente, ao nível do sistema nervoso central, originando défices cognitivos e de memória, limitações a nível da aprendizagem, começando também a surgir os sintomas de abstinência. A partir do surgimento dos sintomas de abstinência, o consumo torna-se inevitável, dado que os indivíduos passam a ingerir bebidas de forma descontrolada, para aliviar os sintomas, o que por sua vez irá agravar o desenvolvimento e a manutenção da dependência (Gomes, 2010).

Por sua vez, Gigliottia & Bessa (2004) referem que a dependência assenta num comportamento mais abrangente do que a tolerância ou a abstinência, sendo que nas fases mais avançadas da doença, os indivíduos consomem compulsiva e incontrolavelmente as bebidas de forma a aliviar os sintomas da abstinência, não se preocupando com os danos que o consumo lhes possa causar, nomeadamente a nível orgânico, psicológico e social.

Para Gaio (2011) a dependência de álcool origina um conjunto de problemas fisiológicos, cognitivos e comportamentais, dado que os seres humanos aditos ao álcool não controlam consistente e continuamente a sua forma de beber, não se podendo também garantir que comportamento pessoal e social apresentarão após o ato de consumo de bebidas alcoólicas.

A OMS (1992) conforme citado pelo IDT (2011b, p. 11) considera que a dependência de álcool “corresponde a um conjunto de fenómenos fisiológicos, cognitivos e comportamentais que podem desenvolver-se após uso repetido de álcool. Inclui um desejo intenso de consumir bebidas, descontrolo sobre o seu uso, continuação dos consumos independentemente das consequências, uma alta prioridade dada aos consumos em detrimento de outras atividades e obrigações, aumento da tolerância ao álcool e sintomas de privação quando o consumo é descontinuado”.

Em 2014, o Manual de Diagnóstico e Estatístico das Perturbações Mentais - DSM - 5, acrescentou conhecimento à área dos Problemas Ligados ao Álcool, salientando o facto de a abstinência de álcool se caraterizar pela existência de sintomas que se desenvolvem entre 4 a 12 horas após a redução ou cessação do consumo (APA, 2014). Perante a abstinência, os sintomas são bastante desagradáveis e intensos, levando os indivíduos a um consumo continuado de forma a evitá-los ou aliviá-los, o que leva Pombo & Lesch (2011) a considerarem que entre os sintomas de abstinência mais comuns, destacam-se os problemas

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com o sono e o “craving”, também designado por desejo intenso de beber, que impede o indivíduo de pensar noutros aspetos da sua vida.

Também associado à abstinência de bebidas alcoólicas encontra-se o “Delirium tremens”, traduzindo-se este quadro clínico, num estado de breve confusão, acompanhado de perturbações somáticas que geralmente ocorrem ao fim de três dias após a cessação do consumo, podendo perdurar durante vários dias (APA, 2014).

O “Delirium tremens” é responsável pelo falecimento de cerca de entre 15% a 40% das pessoas dependentes de álcool, encontrando-se entre os seus sintomas, a confusão, a diminuição da claridade de perceção do ambiente, tremores intensos, sudorese, arritmia cardíaca e alucinações, sendo que nos casos mais graves verifica-se a ocorrência de episódios de hipertermia e convulsões, que podem levar à morte, e desta forma, nos casos mais graves verifica-se a necessidade de um tratamento urgente (Mello, Barrias & Breda, 2001).

Tal como defendem Anderson, Gual & Colom (2005), a dependência do álcool apresenta diversas mutações, períodos de abstinência e recaídas, até que os indivíduos tomem a decisão de parar de beber, o que geralmente só ocorre em resposta a uma crise grave, pois quando as crises são moderadas, os indivíduos passam por um período de semanas ou meses em abstinência, seguindo-se depois um consumo controlado durante um período de tempo muito limitado, consequentemente o consumo de álcool é retomado e vai aumentando progressivamente até que ocorram novamente crises graves.

A APA (2014) refere também que os problemas causados pelo abuso de álcool são semelhantes aos problemas derivados do consumo de substâncias ilícitas como a cannabis, a cocaína, a heroína, os sedativos, podendo o consumo abusivo de álcool em diversas situações ser usado quando os efeitos do consumo das substâncias ilícitas não são os desejados ou então para substituí-las quando estas não se encontram disponíveis. Também os problemas de conduta, a depressão, a ansiedade e a insónia, na maioria dos casos se encontram associados ao consumo intenso de bebidas alcoólicas, no entanto estes problemas, em diversas situações podem anteceder ao consumo de álcool (APA, 2014).

1. 2 - O consumo de álcool na sociedade portuguesa

Nas últimas décadas, as profundas transformações da sociedade portuguesa têm influenciado decisivamente os modos e as formas de beber (Balsa, 2007). De acordo com Pereira (2003), devido a fatores de ordem sociocultural, a sociedade portuguesa carateriza-se como sendo extremamente permissiva e incentivadora ao consumo de álcool, dado que

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Portugal é um país fundamentalmente vitivinícola e dos maiores produtores de vinho a nível mundial e simultaneamente um dos países em que o consumo abusivo de bebidas alcoólicas se tem agravado. Assim, cada vez mais se verifica um aumento dos consumos de bebidas alcoólicas, bem como um gradual aumento de dependentes de álcool a realizar tratamentos, quer em hospitais, unidades de alcoologia ou comunidades terapêuticas e uma elevada taxa de recaídas (Ribeiro & Guerreiro, 2017; Balsa, Vital, & Urbano, 2017).

A forma como a sociedade portuguesa encara o consumo de bebidas alcoólicas acaba por agravar esta problemática, dado que o ato de beber é socialmente aceite e justificado por diversos mitos e aspetos culturais que são interiorizados desde a infância, encontrando-se nele inculcados valores simbólicos (Pereira, 2003). No entanto, embora na literatura existam algumas obras relacionadas com esta problemática, tentando prevenir, minimizar ou evitar o consumo de bebidas alcoólicas e alertando para as suas nefastas consequências a longo prazo, estas são na maioria das vezes ignoradas pela sociedade (Mello, Barrias & Breda, 2001).

Contextualizando o papel do álcool na sociedade portuguesa, na ótica de Freire (2010), durante o período do Estado-Novo, a sociedade portuguesa era predominantemente rural, sendo os cereais e a vitivinicultura, algumas das mais-valias do país, dado que as atividades ligadas à produção e comercialização de vinho se encontravam em expansão por todo o continente e eram consideradas de extrema importância para mais de metade da população.

Devido à crise económica que se fazia sentir em Portugal, durante os anos 30, um vasto grupo de vitivinicultores deslocou-se a Lisboa para pressionar o governo do Estado-Novo a implementar melhorias para este setor, pelo que Salazar acedeu e desta forma foi lançada uma campanha de promoção incentivadora do consumo interno de vinho (Cardeira, 2009). Assim, surgiu o slogan “beber vinho é dar o pão a um milhão de portugueses”, dado que em algumas regiões do país, a viabilidade económica dependia da vitivinicultura, sendo esta atividade também fundamental para o estabelecimento de relações sociais entre grandes e pequenos proprietários (Freire, 2010).

Esta campanha originou a criação do Museu do Vinho, a organização do V Congresso Internacional da Vinha e do Vinho realizado em Lisboa e a criação de três cartazes alusivos ao consumo de vinho (IVV, 2018). Em 1933 foi também criado o organismo corporativo Federação dos Vinicultores do Centro e Sul de Portugal, que rapidamente se impôs como regulador do mercado e em 1937 foi criada a Junta Nacional do Vinho, cuja intervenção tinha como finalidades, o estabelecimento de um equilíbrio entre a oferta e o escoamento deste

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produto, a supervisão das produções e a sua evolução assim como armazenamento dos excedentes, de forma a compensar o que se perdera nos anos de escassez (IVV, 2018).

Devido a estas fortes campanhas enraizou-se na sociedade portuguesa o hábito do consumo de vinho, tornando-se esta propaganda bastante benéfica do ponto de vista político, pois, dado que a mente do povo se encontrava entorpecida pelo consumo de vinho, mais fácil era a forma de o iludir e subjugar, enquanto simultaneamente, os grandes vitivinicultores se assumiam como defensores da sua região, tornando-se também membros de elite que o regime de Salazar cooptou, de forma a consolidar a base de apoio social (Freire, 2010).

Durante cerca de 50 anos, o período ditatorial de Salazar conduziu o país ao subdesenvolvimento, ficando marcado pela censura, pelo trabalho infantil, pela ausência de direitos, pela elevada taxa de mortalidade, pelo isolamento, pelo analfabetismo, pela colonização das províncias ultramarinas, pela pobreza e pelo medo, sendo que a política do Estado Novo usava a educação para uniformizar os sentimentos de identificação da população, pretendendo a constituição de um Estado monocultural (Vieira, 2011).

De acordo com Cardeira (2009) durante o Estado-Novo, foram criadas diversas Adegas Cooperativas que se constituíram como monopólios, dado que a qualidade do vinho produzido era padronizada e razoável, o que conduziu à falência dos pequenos produtores privados cujo vinho produzido era de melhor qualidade, mas mais dispendioso. Nas grandes cidades, o vinho era consumido e comprado em tabernas e carvoarias, sendo prática comum as pessoas se dirigirem a estes estabelecimentos munidas de garrafão para atestar, destinado ao consumo caseiro e beberem uns copos ao balcão. Para as pessoas oriundas do campo, que se haviam deslocado para as grandes cidades, era e ainda continua a ser prática comum a ida “à terra para buscar vinho”, devido à crença de que o “vinho do produtor é que é bom” (Cardeira, 2009).

Nos anos 60 a população portuguesa era ainda predominantemente rural, dedicando o seu trabalho a formas de agricultura tradicionais ou de assalariado precário e nesta década, o país apresentava também altas taxas de natalidade e uma demografia caraterizada por uma população jovem ou pouco envelhecida, mas, no que respeitava às taxas de analfabetismo, estas ultrapassavam os 30% enquanto cerca de 60% da população não possuía a frequência do 4.º ano de escolaridade (Balsa, 2007). Segundo Cabral (2004) com o estabelecimento da democracia ocorreram mudanças na sociedade portuguesa, passando o poder de compra a ser mais elevado entre os vários estratos da sociedade e a população foi adquirindo novos hábitos,

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onde se destacavam o consumo de uma maior diversidade de produtos, crescendo também a oferta de trabalho nas regiões do litoral do país que levou à desertificação no interior.

De acordo com Pereira (2003), desde a infância que os indivíduos interiorizam mitos e virtudes associados ao consumo de bebidas alcoólicas, já na fase de pré-adolescência o álcool possui um valor positivo, sendo parte integrante da vida social, dado que para os jovens, o consumo de álcool se encontra estreitamente ligado às necessidades de integração na sociedade, em que o ato de beber se manifesta num comportamento social aceitável, servindo também para o estabelecimento de relações no dia-a-dia dos indivíduos.

Ainda segundo Pereira (2003) uma das principais causas do consumo de álcool na sociedade portuguesa, assenta em tradições culturais, onde se encontram enraizados valores simbólicos, tornando o ato de beber socialmente aceite, independentemente da dimensão gastronómica, valores estes transmitidos através da socialização que conduzem a que o primeiro consumo de bebidas alcoólicas tenda a ocorrer no período da adolescência, encontrando-se associado a uma certa virilidade.

O álcool para além de ser uma substância psicotrópica causadora de efeitos depressores no sistema nervoso central é também responsável por cerca de sessenta tipos diferentes de doenças e de problemas, incluindo perturbações mentais e comportamentais, problemas gastrointestinais, neoplasias, doenças cardiovasculares, perturbações imunológicas, doenças ósseas e musculares, perturbações reprodutivas e danos pré-natais (Gomes, 2012).

Já no ano 2000, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 166/2000 apontava o consumo de álcool como a maior toxicodependência dos portugueses, contudo, para a sociedade portuguesa a palavra toxicodependência encontra-se apenas associada ao consumo de substâncias ilícitas, o que leva Morel, Fontaine e Hervé (1998, p. 25), a afirmarem que “a separação entre o alcoolismo e a toxicodependência tem apenas legitimidade histórica e cultural”. Desta forma, os Problemas Ligados ao Álcool continuam a ser ignorados por grande parte da sociedade, que se revela bastante preconceituosa perante outras formas de toxicodependência, não entendendo que o consumo de álcool é também uma forma de toxicodependência (Mendes, 2015).

A maioria das pessoas que consome bebidas alcoólicas, não possui uma noção concreta acerca dos nefastos efeitos que o consumo de álcool provoca ao nível da saúde, quer física, psíquica ou social, assim para que o consumo de bebidas alcoólicas seja considerado de baixo risco, um adulto saudável não deve exceder por dia e repartidos pelas duas refeições principais os seguintes valores: no homem, a quantidade de 24g de álcool, o que equivale a 25

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cl de vinho com a graduação de 12º ou três copos de cerveja de 20 cl, sendo que para as mulheres os valores são de 16g de álcool, o que equivale a 15 cl de vinho ou dois copos de cerveja e desta forma, a maioria das pessoas que consomem bebidas alcoólicas, normalmente ingerem mais do que estas quantidades, minimizando os danos para a saúde (IDT, 2011b; DGS, 2014; Mello, Barrias & Breda, 2001; WHO, 2001).

Existe também uma tendência para as pessoas referirem que não bebem bebidas fortes, nomeadamente, as destiladas, mas o facto de beberem um copo de Whisky, por exemplo, ou uma imperial, a quantidade da graduação de álcool ingerida será praticamente a mesma, pois, apesar da graduação das bebidas alcoólicas ser diferente, verifica-se a seguinte situação, os copos regularmente usados para o consumo das diferentes bebidas possuem uma quantidade idêntica de álcool, correspondente a uma unidade padronizada com cerca de entre 10 a 12g de álcool puro, tornando aproximadamente idêntica a quantidade de álcool por copo estandardizado de cerveja, vinho, aperitivos e bebidas destiladas e assim, este cálculo também simplifica a quantificação do número de bebidas ingeridas diariamente ou semanalmente. (IDT, 2011b; DGS, 2014; Mello, Barrias & Breda, 2001; WHO, 2001).

A Figura 1 apresenta através de um esquema simplificado a forma de medição da quantidade de álcool puro por copo, tendo em conta as seguintes bebidas, cerveja, vinho, aperitivo e aguardente (digestivo).

Figura 1 - Definição de dose padrão de bebidas alcoólicas

Fontes: (IDT, 2011b; DGS, 2014; Mello, Barrias & Breda, 2001; WHO, 2001).

De acordo com o IDT (2011b), o consumo esporádico excessivo ou binge drinking é aquele que excede o número de entre 5 a 6 bebidas nos homens e de 4 a 5 bebidas nas mulheres, numa só ocasião e num espaço de tempo limitado, encontrando-se este ato de consumo associado a uma maior probabilidade de acontecerem consequências inesperadas,

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contudo, apesar desta forma de consumo ser nociva e provocar danos à saúde física e psíquica não se revela suficiente para satisfazer os critérios de dependência estabelecidos no DSM - 55.

O IDT (2011b) considera ainda como consumo de risco, qualquer consumo decorrente durante a gravidez, pois a toxicidade do álcool pode afetar o desenvolvimento do embrião e do feto se a mãe ingerir bebidas alcoólicas durante este período.

Outro tipo de consumo de álcool prevalente em Portugal é o “beber até à embriaguez” também designado por intoxicação aguda, revelando-se gerador de um efeito de deterioração da capacidade de raciocínio, da tomada de decisões e da capacidade de autocontrolo do comportamento, apresentando o indivíduo nestas condições, desinibição dos impulsos sexuais e agressividade, acrescentando-se o facto de os indivíduos embriagados se encontrarem mais vulneráveis à ocorrência de acidentes, quer rodoviários quer laborais (IDT, 2011b).

No que respeita à dependência de álcool não é possível estabelecer uma quantificação mais precisa sobre o número de pessoas que sofrem desta doença, pois para além das pessoas internadas em hospitais, nas unidades de alcoologia/unidades de desabituação, nas comunidades terapêuticas e nos serviços ambulatórios, existem inúmeros casos que não se encontram detetados por essas pessoas não solicitarem ajuda para o seu problema, destacando-se também o grande número de pessoas que se encontram em recuperação mantendo o anonimato, mas devido à dependência ser uma doença crónica, estas pessoas apesar de não consumirem bebidas alcoólicas serão sempre dependentes (Alcoólicos Anónimos, 2001; André & Filho, 2002).

De acordo com os Alcoólicos Anónimos (2001), esta doença não possui cura, mas tal como outras doenças possui um tratamento que consiste na cessação total dos consumos de álcool, não podendo ser também apenas vencida pela força de vontade, dado que a pessoa dependente perdeu o poder de escolha sobre o álcool.

5Fonte: APA (2014). Um padrão problemático de uso de álcool conduz a um comprometimento ou sofrimento clinicamente significativo

durante um período de 12 meses, onde se manifestam pelo menos dois dos seguintes critérios:

i) O álcool é consumido mais frequentemente e em maiores quantidades ou num período mais longo do que o pretendido; ii) Existência de um persistente desejo assim como de esforços mal sucedidos com o intuito de reduzir ou controlar o uso de álcool; iii) O enorme dispêndio de tempo em atividades necessárias para a obtenção de álcool, na utilização de álcool ou na recuperação dos seus efeitos;

iv) Fissura (craving) ou um forte desejo ou necessidade de usar álcool;

v) Uso recorrente de álcool que resulta no fracasso do desempenho profissional, escolar ou em casa;

vi) Uso continuado de álcool, apesar da persistência de problemas sociais ou interpessoais ou recorrentes causados ou acentuados pelos seus efeitos;

vii) Abandono ou redução das mais importantes atividades sociais, profissionais ou recreativas devido ao uso de álcool; viii) Uso recorrente de álcool nas situações que representam perigo para a integridade física;

ix) Continuação do consumo de álcool apesar da consciência que este provocará problemas físicos ou psicológicos;

x) Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspetos: a. Necessidade de consumir quantidades progressivamente maiores de álcool para alcançar a intoxicação ou o efeito desejado; b. Efeito acentuadamente menor com o uso continuado da mesma quantidade de álcool; xi) Abstinência, manifestada por qualquer um dos seguintes aspetos; a. Síndrome de abstinência caraterística de álcool; b. Consumo de álcool ou de substâncias estreitamente relacionadas, nomeadamente as benzodiazepinas, de forma a aliviar ou evitar os sintomas de abstinência.

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A recuperação incide principalmente no desejo de a pessoa dependente ficar bem e levar uma vida considerada “normal”, não surtindo efeito para as pessoas que ainda possuem algumas reservas em relação a voltar a consumir álcool e desta forma, quem se tenha tornado dependente jamais deixará de o ser, pois não é possível que uma pessoa dependente de álcool volte a beber moderadamente ou socialmente, dado que passado algum tempo ou anos após a cessação dos consumos poderá existir a ilusão de que é possível beber só um copo, ou beber apenas às refeições, mas na verdade basta a ingestão do primeiro copo para que, após um curto espaço de tempo, se volte à condição em que se encontrava anteriormente (Gorski, 1992).

Assim, apenas restam duas hipóteses, ou a pessoa dependente de álcool cessa totalmente os consumos e opta por um novo padrão de vida construtivo e sóbrio ou recaí nos consumos, o que permitirá que a sua forma de beber se agudize e que as suas condições pessoais, familiares e sociais se deteriorem (Alcoólicos Anónimos, 2001).

De acordo com dados da OCDE (2018), em 2017, Portugal encontrava-se em décimo lugar, no que concerne aos países onde se verifica um maior consumo de bebidas alcoólicas a nível mundial com uma taxa de 10,7 litros per capita6 numa população constituída por pessoas com idades a partir dos 15 anos, encontrando-se a lista encabeçada pela Lituânia com 13,2 litros per capita, seguindo-se a França e a República Checa, ambas com a taxa de 11,7 litros per capita.

Segundo Balsa, Vital & Urbano (2017) relativamente à prevalência do consumo de álcool em Portugal, nos 12 meses decorrentes entre 2016 e 2017 verificou-se que a prevalência do consumo excessivo esporádico era de 16,7%, apesar de se ter registado um decréscimo no consumo desta substância por parte do sexo masculino, enquanto no sexo feminino ocorreu um aumento na ordem dos 6%.

Este consumo excessivo de bebidas alcoólicas também se designa por binge drinking, correspondendo à ingestão de mais de cinco bebidas alcoólicas durante um dia ou num determinado momento, verificando-se este tipo de consumos aos fins-de-semana, sobretudo entre a população mais jovem que procuram um rápido efeito de embriaguez ou a vulgarmente designada “pedrada” (Balsa, Vital & Urbano, 2017).

De acordo com Ribeiro & Guerreiro (2017), no que concerne aos padrões de consumo abusivo e de dependência de álcool, em 2016/17, 2,8% da população residente em Portugal,

6 O consumo de álcool per capita é a quantidade de álcool consumida em litros de álcool puro, por adulto com idade igual ou superior a 15

anos no decorrer de um ano civil num determinado país, tendo este indicador apenas em consideração o valor de álcool registrado na produção, na importação, na exportação e nos dados de vendas, muitas vezes, através da tributação (DGS, 2017).

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com idades compreendidas entre os 15 e os 74 anos de idade, apresentava um consumo de álcool de risco elevado/nocivo, assim como sintomas de dependência, constatando-se também que o consumo de risco elevado/nocivo, no grupo masculino diminuiu, enquanto no grupo feminino tem aumentado, no entanto a dependência aumentou em ambos os sexos, apesar de ser mais incidente no grupo masculino.

Segundo o Decreto-Lei n.º 106/2015, constata-se que consumo precoce de álcool é responsável por uma maior probabilidade de ocorrência de dependência de álcool, tendo como consequências diretas, disfunções no sistema nervoso central com especial incidência sobre os défices cognitivos e de memória, assim como limitações a nível da aprendizagem e do desempenho escolar e profissional, verificando-se também que os consumos prolongados e continuados de álcool se encontram associados a uma maior probabilidade de desenvolvimento de cancro.

Tal como defendem Balsa, Vital & Urbano (2017), no que respeita ao consumo de álcool têm-se verificado melhorias desde o ano de 2012, encontrando-se esta evolução positiva relacionada com a menor facilidade de aquisição de bebidas alcoólicas por parte de menores, impostas pelo Decreto-Lei n.º 106/2015, dado que desde 1 de julho de 2015, é proibida a venda de qualquer bebida alcoólica a menores de 18 anos (Decreto-Lei n.º 106/2015).

O Decreto-Lei n.º 106/2015, veio alterar o Decreto-Lei n.º 50/2013, prevendo a diminuição do consumo per capita, assim como a melhoria das condições de saúde, nomeadamente ao nível da morbilidade, da diminuição de internamentos hospitalares e da diminuição da taxa de mortalidade por doenças relacionadas com o consumo de álcool ou por acidentes de viação.

Na ótica de Sanches (2013), o comportamento do consumidor de bebidas alcoólicas é um processo transmitido através da cultura, da família, dos amigos e dos media, proporcionando experiências de aprendizagem que influenciam os hábitos de consumo, dada a existência de uma forte propaganda alusiva ao mercado das bebidas alcoólicas, bem como de uma enorme diversidade de bebidas que poderão ser adquiridas facilmente e a um preço acessível a todas as pessoas, verificando-se inclusive que o ato de consumo de álcool confere ao consumidor certo status.

Atualmente é possível constatar a expressiva diferença no tamanho dos copos utilizados para o consumo de vinho ou de outras bebidas alcoólicas comparativamente com o que se verificava há alguns anos, situação esta que conduz ao consumo abusivo, mas na ótica

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de pessoas ligadas à produção e comércio vinícola, o vinho deve ser servido em copos grandes e largos para que possa respirar (Martins, 2011), levando-nos ao entendimento que os vitivinicultores assim como os empresários da restauração apenas se interessam pelo lucro obtido pela comercialização de bebidas alcoólicas, não tendo em consideração os problemas associados ao consumo.

No que concerne à população consumidora abusiva ou dependente de álcool, Balsa, Vital & Urbano (2017), destacam um consumo mais elevado por parte de pessoas do sexo masculino com idades compreendidas entre os 35 e os 64 anos, sendo que 5,7% da população residente em Portugal experiencia ou já experienciou uma situação indiciadora de consumos abusivos ou de dependência alcoólica.

Apenas 43,1% da totalidade da população portuguesa se carateriza por um consumo de baixo risco, pelo que assim se avizinha um longo caminho a percorrer, sendo necessária uma maior intervenção na área da prevenção do início dos consumos assim como da redução da frequência do consumo, especialmente na população feminina (Balsa, Vital & Urbano, 2017), pois, devido à evolução da sociedade, à emancipação e à maior liberdade financeira das mulheres, assim como ao facto de estas não se encontrarem demasiado expostas a juízos morais como no passado, o consumo de álcool por pessoas do sexo feminino tem vindo a aumentar (Pereira, 2003).

No âmbito dos problemas de saúde relacionados com o consumo de álcool, segundo o relatório em vigor “A Situação do País em Matéria de Álcool” (2017), em 2016 encontravam-se em tratamento no ambulatório da rede pública, 13678 pessoas, encontravam-sendo que 3759 eram novos utentes e 686 eram readmitidos. Nesse mesmo ano, nas unidades de alcoologia/unidades de desabituação, o número de internamentos decresceu, atingindo o registo de 774 internamentos, contudo, o número de internamentos em comunidades terapêuticas aumentou, tendo-se registado em 2016 o total de 1343 internamentos (Ribeiro & Guerreiro, 2017).

Segundo Ribeiro & Guerreiro (2017) constata-se também que um grande número das pessoas dependentes de álcool que se encontrava em tratamento em 2016 apresentava doenças infetocontagiosas, tendo-se verificado os seguintes números: VIH+ (2% - 6%), VHC+ (6% - 30%) e AgHBs+ (0% - 3%).

No que concerne à mortalidade diretamente relacionada com o álcool, em 2016 ocorreram 810 óbitos, sendo que 33% destes óbitos derivaram de acidentes, incluindo de viação, 33% das mortes foram causadas por doenças relacionadas com o consumo de álcool,

Imagem

Figura 1 - Definição de dose padrão de bebidas alcoólicas
Tabela 1 - Fases e sinais de alerta de recaída  Fase I - Alteração interna:
Figura 2 - Campos paradigmáticos do Serviço Social
Tabela 2 - Agrupamento das variáveis
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