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No centro, vestida de preto, é a senhora Augusta Faro Fleury (Curado), casada com seu primo, o senhor Sebastião Fleury Curado.

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Academic year: 2021

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Álbum da família goiana: A família Fleury e as representações sociais da sociedade vilaboense.

Rafaella Sudário Ribeiro Cultura Visual/ UFG

A família Fleury sempre foi uma família conhecida na sociedade goiana desde o século XIX. Considerada tradicionalmente como uma típica família goiana, segundo seus pesquisadores e biógrafos, tinha em seu histórico homens participantes da política e da vida pública e, as mulheres da mesma família desenvolviam atividades relacionadas às artes e a literatura.

A família Fleury Curado sempre foi reconhecida pela sociedade goiana desde o século XIX.

Tradicionalmente goiana, segundo os pesquisadores e biógrafos, os homens participavam da política e as mulheres, além da esfera privada e seus afazeres domésticos, eram dotadas das artes e da literatura.

No centro, vestida de preto, é a senhora Augusta Faro Fleury (Curado), casada com seu primo, o senhor Sebastião Fleury Curado.

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No centro, vestida de preto, é a senhora Augusta Faro Fleury (Curado), casada com seu primo, o senhor Sebastião Fleury Curado. Ela é considerada a matriarca da família, publicou o livro Devaneios e do Rio de Janeiro à Goiás, a viagem era assim. Era responsável por organizar os saraus da Cidade de Goiás, antiga Vila Boa; também organizava os eventos políticos do marido e participava das festas e atividades religiosas da cidade. O senhor Sebastião Fleury Curado, posicionado na fotografia atrás de dona Augusta, de palitó branco, nasceu na Cidade de Goiás e fez o curso de Direito em São Paulo aonde conheceu Augusta Faro.

Ela nasceu em Curitiba, mas morava em São Paulo desde os meados da década de 1880, pois seu pai foi nomeado diretor da faculdade de Direito de São Paulo. Sendo assim, Augusta conheceu os parentes de seu pai e assim conheceu e se casou com o senhor Sebastião Fleury Curado. Alguns anos depois ela o acompanhou para a Cidade de Goiás, onde moraram durante toda a vida, na chácara Baumman, construída pelo Sr. Sebastião.

A fotografia acima foi tirada no jardim da Chácara Baumman, hoje tombada como patrimônio histórico e cultural. Esta fotografia é de 1926, aproximadamente, e, através dela podem-se perceber alguns indícios para interpretações de como era esta família e, quais eram os valores, comportamentos e papéis distribuídos entre homens e mulheres da época, compondo assim o cenário das práticas sociais da sociedade vilaboense. Através da análise desta fotografia é possível verificar as representações sociais referentes a esfera privada e familiar e suas influências ou intersecções no tecido social e político.

Segundo Miriam Moreira Leite, a fotografia conforma um acervo involuntário de memória e fornece um rico material para o conhecimento da vida cotidiana Ela ainda esclarece:

Convém ainda distinguir, na leitura da fotografia, o que ela reproduz da condição do grupo retratado, o que silencia desse grupo e os indícios que permitem ao observador perceber ou sentir outros níveis da realidade: sentimentos, padrões de comportamento, normas sociais, conformismo e rebeldia. A fotografia de família poderia talvez ser tomada como um equivalente da memória coletiva, como a imagem fixada de um tempo que parou. ( LEITE,2000:76)

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Sabe-se que a família sempre foi valorizada por seu posicionamento perante os padrões sociais e prevalecia a crença de que uma família estruturada e saudável era o caminho para uma sociedade equilibrada e justa. Alguns indícios podem ser avaliados ao refletirmos sobre a imagem acima, inclusive a camada social da família em questão. Ao observar os homens na imagem percebe-se que todos estão usando terno e permanecem em uma postura ereta e mãos para trás, num sentido de ordem, status e respeito. Como foi dito anteriormente, destacavam-se na política e em sua maioria eram advogados.

O senhor Sebastião Fleury foi eleito deputado estadual e, logo depois, deputado à Constituinte Federal de 1891. Foi também um dos fundadores da Academia de Direito de Goiás, regendo a cadeira de Filosofia do Direito em 1904. Uma família de advogados e políticos tinha uma imagem a zelar e a imagem analisada apresenta indícios de uma família tradicional, sendo típica dentro de um sistema patriarcal, dentro de uma determinada camada social. O valor de um homem estava concentrado em um lar feliz; onde suas esposas eram tidas como “verdadeiras rainhas do lar”, cheias de honra e amabilidade, o que pode ser percebidos nas expressões faciais das mulheres na imagem. Esses valores eram responsáveis pelo sucesso profissional de tais homens.

Sentadas ao redor de Augusta Faro, estão as filhas do casal e atrás delas seus respectivos maridos, um papel que pode ser interpretado na fotografia como protetores e responsáveis por suas mulheres. É interessante destacar o corte de cabelo e as vestimentas apresentado por todas as filhas do casal. Todas elas estão com o corte Chanel, modelo comum na década de 20, o que rompia com o costume de que as mulheres só podiam manter o cabelo longo. Esta moda abria espaço e discussões para um novo momento da história; a modernização, novas formas de pensar e o espaço para a inovação e a ousadia. Com a modernização acontecia o estreitamento entre as fronteiras do mundo e a tecnologia e a globalização chegava ao interior do Brasil. A própria fotografia e a sua disseminação tornou-se um importante símbolo de “uma nova era”; símbolo da modernização conquistada com as revoluções industriais, principalmente a segunda fase.

Destaca-se também nesta fotografia, o menino ao lado de dona Augusta. Ao observar a roupa do menino pode-se pensar que ele é uma miniatura, ou melhor, uma cópia dos homens na imagem. Durante o século XIX e as primeiras décadas XX, a infância e a vida das crianças

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não existiam de forma tão definida pela psicologia e pelo os estudos da pedagogia. Essas crianças se vestiam como se fossem adultos, deveriam ser reflexos de seus pais, inclusive no comportamento.

Sendo assim, pode-se pensar como Ana Maria Mauad e utilizar a fotografia como documento; uma fonte de análise e de construção do conhecimento. Um recurso para a interpretação de uma dada época para a apresentação de uma realidade histórica e seus meios de produção e valores. É importante lembrar que a fotografia não deve ser o único documento para a construção da história, mas para a verificação e construção do conhecimento faz-se necessário a interpretação de outras fontes e documentos, num processo chamado de intertextualidade.

Um dos fotógrafos que acompanhou a família Fleury participando de muitos de seus eventos e inclusive contratado pela mesma foi Sílvio Berto1·. Ele era muito elogiado por seu trabalho no estúdio. Cuidadoso na iluminação e perfeccionista no retoque com as chapas de vidro. Conferia um acabamento criativo para suas fotografias.

Acompanhou os principais momentos da nova capital - Goiânia, como as primeiras obras arquitetônicas e até mesmo o batismo cultural realizado na cidade em 1942. Participava de programas de rádio e promovia concursos e exposições artísticas. Foi reconhecido pelo seu talento e profissionalismo e era contratado pelas famílias tradicionais goianienses para registrar casamentos, batismos, piqueniques, lançamentos de livros, aniversários de 15 e 18 anos entre outros eventos festivos.

Para que haja uma análise e estudo minucioso da imagem é importante também levar em conta as condições do nível técnico e suas variações como explica Miriam Moreira Leite:

A interpretação da imagem tem de levar essas condições em consideração, bem como o estágio tecnológico alcançado pelos recursos fotográficos, por ocasião da tomada. O conhecimento de aperfeiçoamentos tecnológicos, do período de sua introdução e difusão em diferentes agrupamentos sociais são fundamentais para que se evitem vieses deformadores na leitura da imagem. (LEITE, 2000:38)

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Fotógrafo desde os 13 anos. Nasceu em Milão, Itália, no dia 30 de outubro de 1908 e ainda menino, por volta de 1913, veio com a família pra o Brasil.

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Era comum as famílias contratarem fotógrafos para retratar o aniversário de 18 anos das filhas; este momento era considerado especial por muitos por ser um momento em que a filha era apresentada à sociedade e também apta para contrair matrimônio.

O casamento sempre foi considerado um dos principais ritos de passagem visto pela sociedade e não poderia deixar de ser registrado através da fotografia. Era uma situação de união entre duas famílias para a formação de uma terceira. Na maioria das vezes o casamento está ligado a passagem da “moça donzela” para cumprir um novo papel, a de “rainha do lar”. As fotografias de casamento simbolizam a conquista de uma união parental, onde a fotografia legaliza e se torna uma constante na memória coletiva ao apresentar um ato privado, porém que apresenta toda uma intersecção com o espaço público. A lembrança da cerimônia registrada na fotografia é uma confirmação da solidez, certeza do casal e por conseqüência a formação da família.

Nos álbuns de família que retratam o casamento é possível verificar os rituais e símbolos do casamento, como exemplo, a cor branca do vestido simbolizando castidade, e, agora ela está sob a autoridade e proteção de seu marido, o provedor do lar. A postura do esposo em muitos momentos nas imagens pode apresentar indícios deste homem provedor e guardião de sua esposa. Ao se posicionar atrás dela, encontra-se numa posição de observador o que simboliza um estado de alerta, de observação, e, na lógica das representações sociais da época, a mulher tornava-se sua propriedade e ele a protegeria do mundo, da sociedade, guardando-a na esfera privada.

Dentro dessa mesma análise completa a autora Miriam Moreira Leite:

De uma forma ou de outra, todos esses rituais simbolizam uma reciprocidade de serviços e de propriedades de bens de produção e de consumo, a ascendência masculina e o trabalho feminino na procriação, na distribuição de bens e serviços e na preservação da família. E a formalidade do cerimonial reunida à exuberância dos festejos e das danças correspondem ao equilíbrio das forças da sexualidade do casamento. (LEITE:2000:113)

É importante destacar que o estudo dos álbuns de família tornam-se também uma história das mulheres, além do ponto de vista familiar, sempre quem monta o álbum de família e narra

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sobre eles, as histórias, lembranças, memórias são as mulheres e, nesse sentido também é importante o trabalho das fontes orais através das “vozes femininas”, uma forma de privilegiar e construir uma outra possibilidade de epistemologia, uma vez que na história positivista não se usava nem a fonte oral, muito menos o espaço dado as mulheresou outros grupos considerados marginalizados.

Com este trabalho de pesquisa pretende-se entender o papel da família, a disciplina dos corpos e a construção dos papéis feminino/masculino; sua intercecsão com o social, ou seja, a interrelação entre público e privado, verificando as representações sociais que constituíram a sociedade vilaboense no século XIX e início do século XX . Neste sentido é importante confirmar a utilização da fotografia como documento de análise e interpretação para a escrita da história, sem deixar de lado a intertextualidade e o diálogo com outras fontes. No caso da fotografias de álbum de família tornaram-se um símbolo para a legitimação de uma família harmônica, saudável e pronta para desempenhar cada qual seu papel dentro das práticas sociais.

Fontes:

Acervo fotográfico da família Fleury, cedido por Dona Marilda Godoi, primeira arquivista de Goiânia.

Cadernos de Fotografia Sílvio Berto. MIS caderno 2. Governo do Estado de Goiás. Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico Teixeira. Diretoria de Patrimônio Histórico e Artístico. Museu da Imagem e do Som.

CURADO. Sebastião Fleury. Memórias históricas. 2º edição. Goiânia: Estante Goiana – Série “Rio Vermelho”. 1989.

Referências bibliográficas:

LEITE. Mirian Moreira Leite. Retratos de Família. 2º Ed. revisada. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2000. – ( texto e arte; 9).

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MAUAD, Ana Maria. Fotografia e História: possibilidades de análise. In: CIAVATTA, M; ALVES, N.(orgs). A leitura de imagens na pesquisa social. História, Comunicação e Educação. 2º Ed. São Paulo: Cortez,2008.

SILVA. Armando. Álbum de Família a imagem de nós mesmos. Tradução: Sandra Martha Dolinsk. São Paulo: Editora Senac São Paulo: Edições SESC SP: 2008.

Referências

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