• Nenhum resultado encontrado

Cad. Saúde Pública vol.29 número10

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Cad. Saúde Pública vol.29 número10"

Copied!
1
0
0

Texto

(1)

A CONSTITUIÇÃO E OS 25 ANOS DO SUS 1949

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 29(10):1927-1953, out, 2013

Gilberto Hochman

Casa de Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. hochman@fiocruz.br

Saudades do futuro ou um sistema de

saúde em tempos democráticos

Efemérides são ocasiões para celebrações, refle-xões e críticas. São oportunidades acadêmicas, cívicas e políticas. Os 25 anos da Constituição Federal de 1988, que estabeleceu as bases da criação de um sistema de saúde único, univer-sal, nacional, público e participativo, devem ser comemorados pela sociedade brasileira. Em par-ticular, para lembrarmos, juntos, o fato de estar-mos vivendo o mais longo período de franquias democráticas de nossa história republicana. É esse aspecto – a democracia, como substantivo – que deve balizar o olhar sobre o passado, as aná-lises do presente e os desafios do futuro quando nos debruçamos sobre nosso, ainda jovem, siste-ma de saúde.

A Constituição Cidadã e os 25 anos do Sistema de Saúde têm a virtude de nos fazer recordar as origens políticas do SUS nos seus vínculos com o processo de redemocratização do país. A cons-trução do SUS foi constituinte e constituidora dele, conforme bibliografia assentada 1,2. O texto reconhece avanços e denuncia muito apropriada e contundentemente, ecoando a literatura mais recente, os problemas atuais do SUS tais como subfinanciamento, a captura de dimensões da política por interesses privados, a precarização do trabalho e as desigualdades no acesso e na oferta 3,4. Contudo, as opções teóricas centradas num telos jamais alcançado – nunca avistado mas a ser perseguido apesar das perversões do capi-talismo nacional e global, produz uma narrativa cujo futuro é o passado, é o que não aconteceu, o que não se realizou, num ânimo de retorno aos projetos originários. Ao transformar reforma sa-nitária – grafadas com letras maiúsculas – em ca-tegoria conceitual (semelhantes à de Revolução), o texto celebra e congela o passado inconcluso, e talvez não compreenda as mudanças que produ-ziram um presente, considerado incômodo.

Apesar de minha simpatia em relação ao in-conformismo com este presente – acirrado pelas manifestações de junho de 2013 – e pela empa-tia com a imaginação e compromisso generoso dos que propuseram e lutaram pela democracia e pela reforma do sistema de saúde três décadas atrás, cabe reconhecer que a Reforma Sanitária (com maiúsculas) está encerrada como conjunto de ideias e práticas políticas contextuais de um certo tempo de transição. Como movimento tor-nou-se, democraticamente, um movimento com menor protagonismo. Esse término tem razões virtuosas; foi resultado de seu próprio sucesso na

proposição de uma agenda política e na monta-gem e arquitetura de um sistema de saúde sem paralelo ao sul (e ao norte, em alguns casos), e da conquista da democracia em 1985.

É resultado também do funcionamento das instituições democráticas nas últimas duas déca-das. Um funcionamento com muitos problemas, advirto. Todavia, não transitamos mais de/para. Vivemos uma democracia. Convivemos com par-tidos políticos, governos estaduais e municipais, eleições rotineiras, liberdade de expressão, orga-nizações sindicais e empresariais, movimentos sociais, conselhos, com um sistema judicial ope-rando e funcionamento regular dos legislativos. O ordenamento federativo derivado de 1988 mo-dificou os termos das negociações entre entes fe-derativos e entre executivo e legislativo com pro-fundos impactos sobre a saúde. Os loci decisórios se deslocaram. A dinâmica das políticas públicas (inclusas as de saúde) se transformou em relação à década de 1980, como indicam, com fartura de dados, trabalhos recentes 5,6. O SUS passou a fa-zer parte da rotina democrática pela qual proje-tos e interesses disputam as possibilidades de re-alização. Nem sempre são vitoriosos aqueles que são considerados, por alguns, eventualmente, virtuosos. Por exemplo, os programas de transfe-rência de renda. Foram opções políticas, demo-cráticas, criticáveis para alguns, mas não desvios “transformistas” de uma rota pré-estabelecida. O futuro desejável, em disputa e não antecipável, não está inscrito no passado, no que não se com-pletou, no entanto pode estar num presente que exige, para ser escrutinado, uma compreensão da democracia brasileira, hoje. E estamos apenas no início...

1. Gerschman S. A democracia inconclusa. Um es-tudo da reforma sanitária brasileira. 2a Ed. Rio de

Janeiro: Editora Fiocruz; 2011.

2. Escorel S. Reviravolta na saúde: origem e articula-ção do movimento sanitário. Rio de Janeiro: Edito-ra Fiocruz; 1998.

3. Ocké-Reis CO. SUS: o desafio de ser único. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012.

4. Machado CV, Baptista TWF, Lima LD. Políticas de saúde no Brasil: continuidades e mudanças. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012.

5. Arretche M. Democracia, federalismo e centraliza-ção no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV/Editora Fiocruz; 2012.

6. Cortês SV. Participação e saúde no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009.

Referências

Documentos relacionados

O relator do processo, desembargador Daniel Viana Júnior, destacou em seu voto o termo de inspeção elaborado pelo MPT, que demonstrou que o tempo gasto

Benetton (1999) apresenta o caráter de funcionalidade na Terapia Ocupacional como tendo sido assumido por muitos autores, pelos precurssores da profissão (Meyer, Simon e Schneider)

De fato, a aplicação das propriedades da regra variável aos estudos lingüísticos além da fonologia não constitui assunto tranqüilo, seja porque a variável passa a ser

A inscrição do imóvel rural após este prazo implica na perda do direito de manter atividades agropecuárias em áreas rurais consolidadas em APP e Reserva Legal, obrigando

“Sim, umas árvores de casca e tronco finos, eucaliptos como você, aos montes, centenas, não, milhares, talvez milhões, tudo igual, mas forçados por HOMO SAPIENS

Em longa entrevista publicada em livro sobre os 10 anos de presidência petista –

Quando não vemos nenhuma promessa se realizar na nossa vida, logo surgem as justificativas, que nunca variam e são sempre superficiais: “tudo é só no tempo de Deus”; “isso é

A) Endócrino: endo (interno; que não entra em contato com o exterior); produzido por determinado órgão, conduzido pelo sangue e age a distância;