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I Plano Municipal para a Integração dos Imigrantes de Lisboa

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Academic year: 2019

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I Plano Municipal para a

Integração dos Imigrantes de

Lisboa

RELATÓRIO DE ESTÁGIO CURRICULAR | MESTRADO EM

MIGRAÇÕES, INTER-ETNICIDADES E TRANSNACIONALISMO

MARTA FERREIRA DA SILVA MANAÇAS

(2)

II Relatório de estágio para a obtenção do grau de mestre em Migrações, Inter-etnicidades e Transnacionalismo, realizado sob a coordenação científica da Professora Doutora M. Margarida Marques e a coorientação do Professor Doutor José Leitão da Faculdade de

(3)

III

DECLARAÇÕES

Declaro que este relatório de estágio é o resultado da minha investigação pessoal e independente. O seu conteúdo é original e todas as fontes consultadas estão devidamente mencionadas no texto, nas notas e na bibliografia.

O candidato,

_________________________________ Lisboa, de de 2015

Declaro que este relatório se encontra em condições de ser apresentado a provas públicas.

O(s) orientador(es),

_________________________________

(4)

IV

RESUMO

A base teórica do trabalho que se segue pretende, por um lado, oferecer um enquadramento a nível europeu, considerando o Outro enquanto construção sob um paradigma ocidental hegemónico. Por outro lado, visa refletir sobre a aplicação dos

principais modelos de integração de imigrantes e como desenvolver uma ‘cidadania imigrante’ ativa. Surgem também questões relacionadas sobre qual o modelo que tem vindo a ser aplicado em Portugal e de que forma é que o último se distingue no contexto europeu face às implicações institucionais supranacionais. A metodologia aplicada tem assim um cariz essencialmente descritivo e exploratório, com o intuito de observar mais criticamente o trabalho desenvolvido durante o estágio curricular.

O I Plano Municipal de Integração de Imigrantes de Lisboa é o projeto em que participei durante os meses de estágio. O projeto é em si objeto de análise no relatório. O plano municipal é um projeto desenvolvido cooperativamente por diferentes atores mas que, de um ponto de vista mais crítico, se vê limitado por imposições institucionais, colocando em confronto três níveis políticos: a União Europeia, aCâmara Municipal de Lisboae a rede associativa. AUnião Europeia financia o projeto através do Fundo Europeu para a Integração de Nacionais de Países Terceiros (FEINPT) cuja entidade responsável pela delegação, em Portugal, é o Alto Comissariado para as Migrações (ACM); a Câmara Municipal de Lisboa coordena o projeto desenvolvendo-o em cooperação com associações e organizações ligadas à temática, sobretudo através do Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania (CMIC); e a rede associativa constitui o terceiro nível político, através do qual participam os ‘nacionais de países terceiros’, a quem o fundo como propósito se destina.

PALAVRAS-CHAVE: Integração, Participação, Cidadania, Fundo Europeu para a Integração de Nacionais de Países Terceiros, Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania

ABSTRACT

(5)

V integration model and how the last distinguishes itself in the european context against the supranational institutional entailments.

The methodology is essentially descriptive and exploratory aiming to observe more critically the work that was developped during the internship.

The city council plan for the integration of immigrants in Lisbon is the project in which I have participated during seven months of internship. The project is itself the report’s object of analysis. The city council integration plan is a project developped in cooperation between different actors. From a sceptical view, it is restricted by institutional entailments, placing in confront three political levels: the European Union, the City Council of Lisbon and the associative network. The European Union made available a financial aid through the European Fund for the Integration of Third Countries Nationals; the City Council coordinates the project mainly through its consultative body for interculturality and citizenship; the associative network is the third political level, in which third countries nationals participate for whom the Fund exists.

(6)

VI

Nota de apresentação e agradecimentos

A motivação que me levou a ingressar no mestrado em Migrações, Inter-etnicidades e Transnacionalismo prendeu-se, primeiro que tudo, ao fator humano. Os anos de licenciatura em Estudos Europeus deram-me a conhecer desde excertos de literatura clássica à literatura colonial, a história da revolução francesa e os filósofos da democracia do século XVIII até ao direito da União Europeia e política económica, entre outras matérias. Após conhecer uma Europa de infinidades, é com mau grado que tenho assistido aos noticiários sabendo que, no século XXI, vivo numa Europa tecnocrática e economicamente ditatorial. Foi na emergência de um sentido que o mestrado em Migrações, Inter-etncidades e Transnacionalismo me pareceu um meio de fazer parte de uma mudança social. E, também, porque sinto uma identificação e empatia para com a

figura do ‘estrangeiro’, vi neste mestrado um caminho com um conteúdo de matérias muito aliciantes e ferramentas teóricas para um futuro trabalho com imigrantes. Para além da vontade de aprofundar os meus conhecimentos e definir uma direção profissional, quis

ir ao encontro da ‘estrangeira’ que existe dentro de mim e, de algum modo, ser capaz de sentir o encantamento, surpresa e dor do Outro que chega a um lugar estranho.

O segundo ano de mestrado deu-me a hipótese de elaborar uma dissertação, um estágio curricular ou um trabalho de projeto. Com pouca hesitação, decidi optar pelo estágio curricular pela oportunidade de contactar com o mundo do trabalho e, finalmente, aplicar os conhecimentos adquiridos. Desta forma, o desafio de estagiar na Câmara Municipal de Lisboa parecia-me grande e tentador. Foi uma nova etapa da minha vida que abracei com dedicação e que me trouxe um sentimento de gratificação pelas pessoas que conheci e pelo ambiente de trabalho.

Quero agradecer à minha família que sempre me apoiou nas minhas escolhas académicas e que tanta força me deu nesta etapa. Aos meus Pais, irmãs, Joana e Inês, cunhados, Manuel e Jorge, à minha Avó, à Zita, ao sobrinho João e ao Rogério, um grande obrigado por todo o amor e carinho. Um especial obrigado ao cunhado Manuel pela generosidade e ajuda na revisão do trabalho.

(7)
(8)

VIII

Índice

RESUMO……….IV e V Nota de apresentação e agradecimentos………VI e VII

Índice………...VIII e IX

1. Introdução………..1

2. Estado da questão 2.1.Integração pela participação………...3

2.2.Políticas de cidadania………...10

3. O I Plano Municipal para a Integração de Imigrantes de Lisboa: projeto desenvolvido pela Câmara Municipal de Lisboa 3.1.Orgânica da CML e estrutura do Departamento de Desenvolvimento Social……….15

3.2.Objetivos do Plano de Ação e do Pelouro dos Direitos Sociais………...16

3.3.Funções e projetos desempenhados pela equipa da Interculturalidade…….16

3.4.Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania………..19

3.5.Plano Municipal para a Integração dos Imigrantes de Lisboa: objetivos e enquadramento formal………..20

3.6.Elaboração do PMIIL, etapas e atividades desenvolvidas 3.6.1. Constituição do Grupo Restrito e do Grupo de Trabalho……….21

3.6.2. Consulta de estratégias noutros países e cidades……….…….24

3.6.3. Realização do diagnóstico……….……25

3.6.4. Recursos internos da CML……….…...30

3.6.5. Workshop do PMIIL………..35

3.6.6. Reuniões do Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania……….………..37

(9)

IX

4. Considerações finais

4.1.O paradigma europeu………...39

4.2.O processo participativo………...40

4.3.Limitações da interculturalidade………..41

5. A minha participação e autoavaliação………...42

6. Conclusões………43

Bibliografia ……….45

(10)

1

1.

Introdução

No mundo pós-moderno, os movimentos migratórios atingiram níveis nunca antes vistos que, inevitavelmente, têm causado mudanças sociais, políticas e culturais. São cada vez mais as pessoas a passar fronteiras e a desafiar o sistema internacional de estados-nação instituído há quatros séculos com a Paz de Vestefália em 16481, a qual inaugurou a

trindade estado, nação, território ou, pelo menos, deu início ao processo do estabelecimento quase universal do estado moderno. As barreiras que se ultrapassam não são assim meramente físicas e territoriais: conceitos como cidadania e democracia, aliados à participação política, são redefinidos em consequência das migrações.

Considerando o seu enquadramento europeu numa era pós-colonial2, os debates em torno

das políticas migratórias e para os imigrantes são essencialmente ideológicos. A este propósito, em Portugal, manifestam-se de variadas formas invenções e celebrações sobre um passado que, na opinião de Almeida (2002), deveria ser confrontado.

Importa ainda sublinhar que, nas últimas duas décadas, a União Europeia inaugurou o espaço Schengen3 e, numa progressiva abertura de fronteiras internas (de pessoas, bens, capitais e serviços) e um alargamento da União para ‘Leste’, as fronteiras externas foram

sendo reforçadas, manifestando-se assim uma tensão entre duas forças opostas: abertura e fechamento. Como notam Haas e Czaika (2013) as regulações e legislações discriminatórias (de raça) foram abolidas e, hoje em dia, os países favorecem cada vez mais a imigração em espaços de livre circulação, tais como a União Europeia ou a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental. A questão é que ao mesmo

1 Durante algum tempo foi consensual designar-se a Paz de Vestefália como o ponto de viragem para o

estado moderno. Sendo assim é um ponto de referência na história, no entanto, como nota Moita (2012), os Tratados de Vestefália não inauguraram o Estado moderno e muito menos o Estado laico que é precisamente um dos atributos do Estado moderno. No entanto considera-se este momento a base de algumas divisões e uma nova geografia europeia.

2 Entenda-se por era pós-colonial não o período imediatamente após a queda do colonialismo enquanto

instituição mas sim como o período que resultou do fracasso do socialismo, do anticolonialismo e em que triunfou a economia de mercado neoliberal à escala planetária (Almeida, 2002).

3 O Acordo de Schengen foi inicialmente assinado em 1985 por cinco países e previu a abolição progressiva

(11)

2 tempo, há uma restrição em relação aos imigrantes de países terceiros quando comparados com os imigrantes provenientes de países pertencentes a esses espaços de livre circulação.

A Europa atravessa várias crises internas, desde a crise económica que muitos afirmam ser antes uma crise de ideologia até a uma crise democrática. Neste contexto histórico-político têm emergido com uma força crescente partidos de extrema-direita que, através de discursos populistas e nacionalistas, ganham apoiantes e fomentam a xenofobia e o racismo.

Aliado a estes últimos fatores e perante a maior crise internacional de refugiados desde a Segunda Guerra, a União Europeia ‘assiste’ a uma vaga migratória que entra pelo Sul Oriental e pela Itália4. Nos últimos anos não é estranho associar-se as migrações para a

Europa à crise no Mediterrâneo5, muito pelo poder da comunicação social que tem tido

um papel maioritariamente negligente ou perversamente negativo na construção da imagem do imigrante, associando-o a fenómenos de pobreza, desespero, crime, ilegalidade, tanto quando o coloca no papel da vítima como quando o coloca no papel do

‘invasor’ e especialmente após os ataques terroristas no início do século XXI, contribuindo assim para o ciclo vicioso de marginalização da população imigrante.

Portugal, banhado a Ocidente pelo Atlântico, é também um país mediterrânico, um país europeu e um país da Europa do Sul. A posição geográfica do país tem permitido, ao longo dos séculos, uma alternância nas suas direções de interesses. Foi durante muito

tempo um país de ‘emigração’, tendo-se tornado num país de ‘imigração’ no final do último milénio, o que conduziu ao desenvolvimento de políticas e mecanismos de integração. No discurso político português, é comum ser referido o sucesso das suas políticas de integração de imigrantes e o seu vantajoso segundo lugar no ranking do MIPEX6. No entanto, continuam a existir desigualdades económicas e sociais entre os

4 A crise de refugiados que se atravessa no momento é a maior crise que a Europa atravessa desde a segunda

guerra mundial. Segundo dados da Comissão Europeia, estima-se que haja mais de 4 milhões de refugiados nos países vizinhos da Síria (http://ec.europa.eu/echo/files/aid/countries/factsheets/syria_en.pdf).

5 Na última décadaa União Europeia tem sido alvo de críticas pela academia e alguma comunicação social

pelo forte investimento no controlo de fronteiras, nomeadamente com a criação da agência FRONTEX em 2004, na sequência dos acontecimentos no Mediterrâneo.

6 O MIPEX (Migration Integration Policy Index) é um instrumento de avaliação das políticas de integração

(12)

3 imigrantes, dificuldades no acesso à saúde e à educação, bem como deficiências noutros campos essenciais.

2. Estado da questão

2.1. Integração pela participação

No contexto do presente trabalho a dimensão simbólica de olhar o outro conduz a uma análise mais profunda e crítica sobre como a população é diferenciada entre si e como se delineiam fronteiras. Deste modo pretende-se caminhar para a obtenção de políticas realmente eficazes sem cair em pressupostos superficiais e simplistas, como, por exemplo, os da realidade administrativa. No caso português, “imigrante” é um termo que

não existe no texto legislativo, sendo o termo usado “estrangeiro”, o que torna a

informação proveniente das fontes estatísticas oficiais bastante limitativa. Estas fornecem-nos informação dos estrangeiros residentes no país e, assim, todos aqueles que

são “imigrantes” e que já adquiriram a nacionalidade portuguesa não são contabilizados estatisticamente. Isto levou a que as agendas políticas portuguesas de integração tenham, ao longo dos anos, optado por criar conceitos como “descendentes de imigrantes” ou,

mais recentemente, “novos portugueses”7. A sua criação foi no sentido de direcionar

medidas mais específicas para os mesmos. Ainda assim, qualquer um dos termos categoriza de uma forma redutora toda uma população que é muito mais complexa e diversa entre si, abrindo-se um fosso entre a política administrativa e a realidade e políticas locais.

Por outro lado, o uso dos termos não é neutro nem meramente burocrático, está sim intrínseco a determinadas ideologias políticas. No presente, o termo internacional

‘politicamente correto’ é “migrante” e, não, “imigrante”. Em Portugal, a última agenda política no domínio das migrações optou por incluir medidas direcionadas para os

‘emigrantes’, tendo-se alterado inclusivamente a estrutura do antigo Alto Comissariado

7Os “novos portugueses” são cidadãos que, nascidos no estrangeiro ou nascidos em território nacional mas

(13)

4 para a Imigração e Diálogo Intercultural (ACIDI), agora denominado de Alto Comissariado para as Migrações (ACM)8.

Estas duas últimas questões existem numa base de divergência: o conflito político-ideológico e a diversidade local e regional face ao sistema administrativo e ao sistema institucional supranacional. No entanto, é limitativo observá-las exclusivamente no contexto presente de Portugal. Se quisermos ir mais atrás, no mundo antigo o ‘estrangeiro’ foi, sob outras formas, alguém indesejado. No sentido mais amplo, as questões do ‘outro’ e da sua construção, como nota Staszak (2008), insurgem-se no início dos anos 80 mas esta era já uma questão muito anterior, como vemos por Homero, por Heródoto e a sociedade persa ou por Hipócrates que procurou explicar a diversidade social através da influência do contexto.

O mesmo autor refere ainda que o Renascimento e a descoberta de novas civilizações, especialmente na América, trouxeram a questão geográfica do Outro para a linha da frente, abrindo caminho aos ocidentais para procurar meios de classificar as sociedades. A ideia de um progresso universal, ou uma cronologia que seja válida para todas as sociedades, permitiria que as sociedades fossem organizadas hierarquicamente da mais primitiva até à mais civilizada (europeus). Mas como nem todas as formas de alteridade são geográficas por natureza (…) as migrações e especialmente as migrações forçadas resultaram na vinda do Outro, outrora distante geograficamente, para o meio de ‘nós’

(idem, 2008:5).

Sob outro ponto de vista, se recuarmos a Barth, segundo a teoria da fronteira étnica

(1969), a identidade étnica é basicamente uma identidade social que emerge na própria interação com os outros e não no isolamento social. Deste modo, invalida a visão simplista de que a diversidade cultural é mantida devido sobretudo ao isolamento geográfico e social. Os atores usam as identidades que lhe são atribuídas com o propósito de interagir. Assim tem-se em conta não a soma de traços ‘objetivos’ mas sim aqueles escolhidos ou que se tornam significantes para os que atribuem9. O problema é que

8 O decreto de lei n.º31/2014 de 27 de fevereiro designa que o Alto Comissariado para as Migrações é um

instituto público integrado na administração indireta do Estado e visa colaborar na definição de políticas públicas, transversais e setoriais em matéria de migrações.

9Assim não interessam as diferenças ‘objetivas’ entre A e B mas sim a ‘fronteira étnica’, que se forma no

contraste e na interação porque A se afirma enquanto tal e deseja ser tratado como A em contraste com B.

(14)

5 nalgumas relações algumas diferenças radicais são ignoradas ou negadas. Com isto, o autor argumenta que os traços de uma cultura que sinalizam a fronteira podem ser alterados bem como as características dos seus membros, ainda que a dicotomia entre o

membro e o ‘outsider’ permita especificar a natureza da continuidade e investigar a mudança da forma cultural e do conteúdo (Barth, 2010).

A hostilidade de sociedades em relação ao ‘outro’, seja este uma maioria ou minoria oprimida, seja estrangeiro, culturalmente ou socialmente diferente, parece ser segundo a literatura uma constante. Mas é de notar que, contemporaneamente, se assiste a uma reemergência de um preconceito mais específico e, ainda assim, tão antigo, que é o preconceito contra os muçulmanos. Houve uma crescente atenção dada aos islâmicos e muçulmanos na discussão pública europeia especialmente nos anos 1980 quando

apareceu o conceito de ‘islamofobia’10 (Strabac e Listhaug, 2007). O sentimento ocidental

contra os muçulmanos cresceu especialmente depois dos atentados terroristas no virar do milénio. De acordo com Farred (2007), o 11 de setembro inaugurou o ‘terrorista’ islâmico como o inimigo absoluto. Facto que foi reforçado pelos atentados terroristas posteriores (Londres, Madrid e Paris).

A questão do terrorismo e a crescente ênfase na segurança pode ter levado alguns autores a defenderem e a fundamentarem que o multiculturalismo falhou na Europa11. Mas era já

anterior o confronto filosófico de posições em relação ao multiculturalismo. Colombo (2015) expõe três formas de explicar o multiculturalismo: enquanto assunto normativo (apelando à coexistência entre as normas do liberalismo e da liberdade individual e uma política apologista da diferença e dos direitos culturais), como uma anti ideologia (esta de cariz contestatório, focando-se nas relações de poder e decorrente da teoria pós-colonial ao conceber a cultura enquanto construção contra uma visão essencialista da cultura) ou, em terceiro, como uma característica das sociedades globais (não como um

10 De uma forma geral esta atenção tem-se caracterizado por um alarmismo e simplificação. Como notam

Strabac e Listhaug (2007), há duas grandes áreas em que se desenvolvem os estereótipos negativos contra os muçulmanos: o primeiro baseia-se no tipo de argumentação do ‘choque das civilizações’ e enfatiza a

presumível ameaça que o Islão faz ao mundo não-muçulmano; e o segundo campo de estereótipos desenvolve-se em torno da noção dos ‘traços culturais muçulmanos’, focando-se nas questões das relações de género e da vida familiar.

11 Gozdecka et al. (2014) apontam para a era do pós-multiculturalismo e que esta se define pela ênfase nas

(15)

6 simples facto quantitativo e demográfico mas como um esforço para encontrar um novo meio cultural, político e legal de adaptação à diferença cultural).

Aponta Kymlicka (2012:8-9) para o facto de o multiculturalismo enquanto celebração da diversidade cultural ter sido alvo de algumas críticas ao longo dos anos. Desta forma, o multiculturalismo teria ignorado as desigualdades económicas e políticas. Teria sido negligente quanto ao facto de a celebração de práticas culturais consideradas como

‘únicas’ serem causa de controvérsia face a determinados direitos humanos. Para além disto, o modelo multiculturalista encorajaria uma perspetiva das culturas como fechadas e estáticas, ignorando o processo de adaptação cultural e eternizando as minorias como o

‘outro’, tornando-o num produto consumível, através da sua música e cozinha. Para o teórico, estas críticas não correspondem à realidade pois no fundamento do multiculturalismo está presente uma ideologia de aceitação da diversidade, respeito pela diferença e pelos direitos humanos.

A ideia de que o multiculturalismo e a política assimilacionista falharam na Europa foi de alguma forma generalizada e levou a que, nos anos recentes, o Conselho da Europa tenha introduzido uma nova abordagem para a diversidade cultural. Assim surge a introdução do conceito de ‘diálogo intercultural’12 (Conselho da Europa, 2008). Estes conceitos de ‘interculturalidade’ e de ‘diálogo intercultural’ foram também adotados no

discurso político português. De acordo com Kymlicka (2012:14) estes novos conceitos são mais uma questão de mudança no discurso do que propriamente nas políticas reais que, em muitos países europeus, continuam a favorecer o multiculturalismo.

Neste contexto e considerando que a integração é um processo construtivo em que o diálogo é uma das chaves essenciais, importa ter em conta as diferentes formas de categorização e as diversas manifestações de preconceito e de racismo. Para o caso de Portugal, a linha argumentativa de um crescente preconceito contra os muçulmanos (derivado dos ataques terroristas) não é, aparentemente, facilmente aplicável, pois a percentagem de população muçulmana a viver no país é muito inferior relativamente a outros países europeus13. No entanto, Portugal encontra em si elevados níveis de

12O ‘diálogo intercultural’ é definido pelo Conselho da Europa (2008) como uma “troca aberta de pontos de vista, com base no respeito e na compreensão mútua entre os indivíduos e as comunidades com diferentes histórias e origens étnicas, culturais, religiosas e linguísticas. Sendo que o diálogo se opera a todos os níveis –nas sociedades, entre as sociedades da Europa e entre a Europa e o resto do mundo.”

13 Segundo os CENSOS 2011, residem em Portugal 20.640 indivíduos que afirmam a sua orientação

(16)

7 xenofobia, racismo e preconceito. Este último facto pode constatar-se através do aumento de queixas à Comissão para a Igualdade e Combate à Discriminação Racial (CICDR)14.

Os fenómenos de racismo, xenofobia e desconhecimento dos direitos dos estrangeiros são muitas das vezes a alavanca para acessos desiguais e, assim, as políticas de integração ao nível local e numa lógica de proximidade podem ser instrumentos fundamentais para a diminuição ou atenuação destes fenómenos.

Desta forma, tem-se dado uma crescente politização da migração a um nível central e local. Não só foram crescentes as políticas adotadas pelosestados-nação como também as grandes cidades (entre as quais Lisboa não é exceção15), como principais focos de

atração16, se redimensionaram por influência das tendências migratórias contemporâneas

e por um crescente cosmopolitismo. As cidades não só se alteraram naturalmente nas suas várias esferas de atividade bem como se manifestam nas mesmas as políticas e modelos adotados pelos estados-nação. Mas de que falamos quando exploramos modelos e políticas de integração de imigrantes? No plano ideológico parece óbvio que uma sociedade democrática aceite e valorize a diversidade, mas de modo a não cair em abstrações com pouca validade empírica, é pertinente refletir sobre como é aplicada uma política para a diversidade cultural. Dado a complexidade do fenómeno, em termos

(http://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpid=CENSOS&xpgid=ine_censos_indicador&contexto=ind&indOco rrCod=0006396&selTab=tab10). Importa referir que 14.202 residem na região de Lisboa (Censos-Resultados definitivos. Região de Lisboa 2011).

14 O número total de queixas apresentadas à CICDR (Comissão para a Igualdade e Combate à

Discriminação Racial) foi, em 2013, de 615, sendo que a maioria dos atos discriminatórios se deram na

“área laboral” (124) ou “outros serviços”14 (113). Por nacionalidade o maior número de queixas

corresponde à nacionalidade brasileira, ainda que este número possa ser proporcional ao número de estrangeiros brasileiros residentes em Portugal, que é também maioritário (Oliveira e Gomes, 2014). No entanto, nota-se também que as queixas apresentadas pelos estrangeiros brasileiros têm diminuído ao longo dos últimos anos, facto que não se tem notado em relação às outras nacionalidades. Por exemplo, quando se analisa em termos de grupo étnico/cultural, denota-se que há um aumento das queixas por parte de indivíduos de etnia cigana ou negros/pretos (Oliveira e Gomes, 2014).

15Cerca de 50% dos estrangeiros residentes em Portugal vivem na região de Lisboa, tendo sido, desde o

início,a área metropolitana de Lisboa o destino mais escolhido. A maioria dos estrangeiros estabeleceram-se nos concelhos de Sintra, Lisboa e Amadora (Censos, 2011).

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16 A este propósito, Low (1996) refere como Leeds foi influente para o estudo das cidades focando-se nas

(17)

8 teórico-práticos, é uma área que atravessa várias disciplinas desde o planeamento urbano à geografia e à história até à sociologia, antropologia ou psicologia.

Classicamente existem dois modelos em que as minorias se adaptam à sociedade recetora: o modelo da assimilação (cujo melhor exemplo foi o praticado pelo colonialismo) e o da integração. No modelo assimilacionista, as diferenças desaparecem pois as minorias conformam-se à estrutura dominante. No modelo de integração, no já mencionado modelo multiculturalista ou no pluralismo, há uma adaptação mas as diferenças são mantidas e as identidades separadas ou até preservadas.

Na academia, foi nos Estados Unidos da América que os fenómenos urbanos de segregação de minorias étnicas começaram a ser estudados com a Escola de Chicago, nos anos 1920 e 1930. Esta escola sociológica começou a olhar a cidade sob uma perspetiva ecológica onde se formavam nichos de população dispostos numa série de anéis concêntricos à volta de um núcleo central (Burgess, 1926)17. Na Europa, o clássico

exemplo das bidonvilles18deu origem a muitos estudos e foi o lugar onde viveram muitos

emigrantes portugueses entre os anos 1950 e 1970 (Gastaut, 2004).

Em Portugal, os fenómenos de segregação surgiram mais tarde com o aparecimento dos

denominados ‘bairros de barracas’. Por este motivo foi crescente a visibilidade dos níveis de desigualdades económicas e sociais. Foi então no final do século XX, nos anos 1990, que se investiu na promoção da integração dos imigrantes e o Estado português desenvolveu o programa especial de realojamento (PER)19 (Cachado, 2013). Na mesma

década, foi criado o Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (1996) e

17 Segundo Peach (2010), a Escola de Chicago, que conceptualizou corretamente a relação entre o padrão

espacial e o processo social, falhou quando assumiu como único e inevitável o processo de transição unidirecional do interior da cidade com um alto nível de concentração para a dispersão suburbana. Ainda segundo o autor, desta forma, a Escola de Chicago apenas assumiu o processo assimilacionista, não mencionou o multiculturalismo ou o pluralismo e não fez uma distinção clara entre o enclave étnico e o gueto. Para Peach (2010) o surgimento de guetos na Europa não foi relevante como nos Estados Unidos, tendo-se dado sobretudo a emergência de enclaves étnicos.

18 O termo

bidonvilles, traduzido à letra, significa “bairros de contentores” e em português pode-se equiparar ao termo “bairros de lata”. As bidonvilles tiveram a sua origem no Magreb, ainda no período colonial. Mais tarde, em França, formaram-se na periferia das grandes cidades nos anos 1950 com a migração do pós-guerra. O seu aparecimento deu-se especialmente na cidade de Paris e subúrbios. As

bidonvilles foram o local de habitação mais comum da maioria dos imigrantes (Gastaut, 2004).

19 O PER veio a ser alvo de críticas, nomeadamente pela grande heterogeneidade que compunha os

(18)

9 formou-se a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP, 1996). Os anos 1990 corresponderam assim aos primórdios das políticas de integração em Portugal.

Também a integração do país à escala europeia levou ao desenvolvimento progressivo e à transposição de determinados princípios no âmbito da política comum de imigração. Por exemplo, na área da luta contra a discriminação, é de referir a transposição de duas

diretivas do Conselho Europeu (a diretiva “raça”20e a diretiva “emprego”21) para o quadro

legislativo nacional em 2000.

Quanto ao desenvolvimento da política ao nível local, foram relevantes, no âmbito da agenda europeia comum para a integração (2005), a influência da adoção dos princípios básicos comuns22 em 2004 pelo Conselho Justiça e Assuntos Internos (JAI) e a proposta

da Comissão Europeia de novos instrumentos no âmbito da capacitação de recursos ao nível regional e local e que deu origem ao Fundo de Integração para os Nacionais de Países Terceiros (FEINPT)23. O último corresponde ao atual Fundo Asilo Migração e

Integração (FAMI)24.

20 Diretiva 2000/43/CE de 29 de Junho transposta para o quadro legislativo nacional através da lei nº

18/2004 de 11 de Maio.

21 Diretiva 2000/78/CE de 27 de Novembro transposta para o quadro legislativo nacional através da lei nº

99/2003 de 27 de Agosto que aprovou o Código de Trabalho.

22 A este respeito é de referir que o nono princípio básico comum da agenda europeia afirma que “a participação de imigrantes no processo democrático e na elaboração de políticas e medidas de integração,

especialmente a nível local, apoia a sua integração.”

23 O Fundo Europeu para a Integração de Nacionais de Países Terceiros visa a integração dos nacionais de

países terceiros que residam legalmente em qualquer estado-membro da União. O fundo é especialmente destinado aos recém-chegados e visa a aplicação de políticas através de um processo dinâmico e recíproco (fonte consultada: http://www.acm.gov.pt/-/fundo-europeu-para-integracao-dos-nacionais-de-paises-terceiros). Este fundo foi previsto para o período entre 2007 e 2013 conforme consta no artigo 1.º da Decisão do Conselho Europeu 2007/435/CE (fonte eletrónica:

http://www.sg.mai.gov.pt/FundosComunitarios/ProgramaQuadroSOLID/FundoEuropeuIntegracao/Docu ments/Decis%C3%A3o%20do%20Conselho%202007_435_CE.pdf).

Os ‘nacionais de países terceiros’ são todos aqueles que não sejam nacionais de nenhum estado-membro da União Europeia e que aí residam legalmente. Sob uma visão mais cética, o princípio em si apresenta um

misto de solidariedade e paternalismo sendo por si já discriminatório, quando distingue os ‘nacionais de países terceiros’ dos outros imigrantes.

24Tendo o FEINPT chegado ao final do seu período de vigência, foi criado o Fundo Asilo Migração e

(19)

10 De um outro ponto de vista (que não o institucional ou o do apoio social), é recente, como aponta Santos (2008:82), ao nível local, e muito especificamente em Lisboa, o aproveitamento urbano da diversidade trazida pela imigração se comparada com outras cidades europeias. Segundo a autora, foi depois do virar do milénio que se cimentou a relação entre o turismo e a imigração através da produção cultural e dinamização dos bairros históricos (idem: 92). Neste enquadramento as zonas lisboetas do Martim Moniz, Mouraria e Intendente tornaram-se conhecidas como um centro da multiculturalidade, já que se concentraram, nesta zona, múltiplas nacionalidades que estabeleceram os mais diversos tipos de negócio, revitalizando e renovando a economia local25. Não só a

renovação se deu na esfera económica, como na própria imagem e ambiente da cidade.

2.2. Políticas de cidadania

Estudar as migrações implica compreender as fronteiras, as políticas de controlo e o que as mesmas refletem sobre o processo histórico. As diferentes formas e circunstâncias em que se concede o estatuto oficial de cidadania são um ponto de partida para a reflexão e redefinição de conceitos. Emergem ainda outros fenómenos associados à cidadania, motivados por elementos da sociedade que extravasam o controlo dos estados-nação, como é o caso de uma política local participativa, do associativismo, e ainda, sem deixar de mencionar, o que as tecnologias de comunicação, as redes virtuais e o acesso à informação, numa sociedade de redes26, trouxeram para a metamorfose da vida

democrática a uma escala transnacional27. Falar de cidadania ativa e de uma sociedade

civil desenvolvida significa também a participação política dos estrangeiros.

25 Inicialmente deu-se a chegada de moçambicanos de ascendência indiana que estabeleceram negócios de

mobiliário e de revenda de produtos importados do Extremo Oriente. Estes eram, sobretudo, ismaelitas. Nos anos 1990 ocorre uma diversificação das origens dos comerciantes. Os chineses exploram a restauração ou a revenda de vestuário e minimercados abrem e os africanos abrem cabeleireiros, lojas de cosméticos, cafés e mercearias (Malheiros, 2008).

26 Refere Castells (2008:79) que (…) “a nossa sociedade, a sociedade de redes, organiza a sua esfera pública, mais do que qualquer outra forma histórica de organização, na base de redes de meios de comunicação. Na era digital isto inclui tanto os mass media, a Internet e as redes de comunicação sem

fios”e (…) “é através da esfera pública que diversas formas de sociedade civil recriam o debate público

e influenciam as decisões do estado.”

27Mormente a teoria sobre o transnacionalismo tenha sido explorada essencialmente na esfera da vida

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11 Ao recuar milenarmente ao mundo clássico, o conceito de cidadania está ligado ao desenvolvimento da estado de Roma ou da Grécia. No mundo antigo, a cidade-estado era a arena pública para os homens racionais e livres que funcionava como uma segurança coletiva contra as ameaças exteriores e disputa interna (Turner, 1990).

Se considerarmos a reemergência da cidadania e do homem enquanto animal político28

aliado ao processo de formação do estado moderno – ao Iluminismo, às revoluções americana e francesa no século XVIII e ao surgimento dos nacionalismos no século XIX

– é inevitável que, sob esta perspetiva, se mantenha intrínseca uma noção de pertença, sendo a cidadania um estatuto, concedido por determinado Estado numa base coletiva e não individual.

No que concerne à nacionalidade, existem teoricamente dois modos de pertença e identidades nacionais: a nacionalidade “cívica” e a nacionalidade “étnica”. As formas cívicas estarão relacionadas com a cidadania enquanto estatuto legal, obtido por alguém que queira aceitar um sistema particular legal, político e social. Já as formas étnicas têm que ver com a adesão à cultura nacional, por virtude ou nascimento num dado território, a uma religião e língua comum, tradições nacionais, a uma ancestralidade e à pertença a um grupo étnico ou racial dominante. A forma étnica ou nacionalista deriva numa pertença nacional única. A conceção cívica permite que pessoas que não tenham nascido num dado lugar possam assumir a sua identidade nacional e, ainda assim, tonarem-se membros da sociedade desse mesmo lugar (Fligstein et al., 2012). No sentido do estatuto cívico, veja-se o caso da cidadania britânia face às diversas nacionalidades: inglesa, escocesa ou gaulesa (McCrone e Kiely, 2000) ou a cidadania europeia face às diversas nações europeias.

O direito de nacionalidade foi sendo progressiva e respetivamente alterado do princípio do jus sanguinis para o princípio do jus soli29 ou para um misto dos dois princípios

28 Considera-se o conceito de animal político de Aristóteles que distingue os homens dos outros animais

enquanto ser dotado de palavra.

29 O direito à nacionalidade sob o princípio do jus sanguinis (direito de sangue) assenta basicamente numa

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12 nalguns estados europeus. Isto foi também um reflexo da tendência de inversão de países classicamente de emigração para países de imigração. Quanto à concessão de cidadania portuguesa ou direito à nacionalidade, a última alteração à lei da nacionalidade foi em 2006. Esta alteração foi significativa pois passou a prevalecer o princípio do jus soli30.

Como nota Turner (1990), muito importante para a conceptualização da cidadania foi a teoria de Marshall31 que foi a base para muitos autores interessados no assunto,

inclusivamente para a teoria social americana na área das relações raciais32. Turner

(1990), que faz referência a diversos críticos da teoria de Marshall, nota que o problema central da teoria de Marshall foi este não ter desenvolvido suficientemente uma teoria sobre o Estado.Refere ainda que a criação da cidadania dentro das fronteiras políticas do Estado-nação moderno normalmente envolveu e requereu a subordinação ou a incorporação das minorias étnicas ou aborígenes.

Como mostra Hindess (2001), o paradoxo das democracias modernas é o seu compromisso com os direitos humanos universais e a sua prática discriminatória contra os estrangeiros dentro das próprias fronteiras. Assim a cidadania é um pacote complexo de direitos e responsabilidades do indivíduo por virtude da sua pertença a uma política e

30 Como referido no decreto-Lei n.o 237-A/2006 de 14 de Dezembro promulgado em Diário da República, 1.a série—N.o 239—14 de Dezembro de 2006 “pela nova lei é atribuída a nacionalidade portuguesa de

origem aos nascidos em território português, filhos de estrangeiros, se pelo menos um dos progenitores também aqui tiver nascido e aqui tiver residência, independentemente de título, ao tempo do nascimento do filho, bem como aos nascidos no território português, filhos de estrangeiros que não se encontrem ao serviço do respetivo Estado, se declararem que querem ser portugueses, desde que, no momento do nascimento, um dos progenitores aqui resida legalmente há, pelo menos, cinco anos.”

É de referir que a lei da nacionalidade, antes da última alteração em 2006, ainda privilegiava os cidadãos de países de língua portuguesa sobre os outros estrangeiros.

31 Marshall focou-se no caso inglês e a sua teoria conceptualizou a cidadania em três dimensões do direito

(cívicos, sociais e políticos) que emergiram em diferentes fases históricas. Os direitos cívicos, ou seja, a liberdade de expressão, a igualdade perante a lei e o acesso igualitário ao sistema legal, desenvolveram-se durante o século XVIII. Os direitos políticos, isto é, o maior acesso ao processo legislativo, foi conquistado através do desenvolvimento dos direitos eleitorais e do maior acesso às instituições políticas para a articulação de interesses. Esta fase dos direitos políticos desenvolveu-se durante o século XIX a par da luta da classe operária. E, finalmente, os direitos sociais – o estabelecimento de um sistema de segurança social em períodos de desemprego, doença ou emergência – surgiram durante o século XX. Neste panorama, as três instituições centrais correspondentes da sociedade contemporânea seriam os tribunais, o parlamento e o sistema social (Turner, 1990).

32É de realçar o trabalho de Talcott Parsons sobre o conceito de ‘comunidade societal’ no plano da

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13 é uma marca de identificação a um Estado. Dando-se, ao mesmo tempo, a emergência daquilo que parecem ser os elementos supranacionais da cidadania, tais como a cidadania europeia e a crescente ênfase nos direitos humanos universais na comunidade internacional.

Neste sentido, se emergem elementos supranacionais de cidadania a par de uma crescente ênfase nos direitos humanos universais, seguem-se as questões: Qual é o estatuto internacional e europeu oficialmente instituído do “migrante”? Quais os seus direitos e qual a proteção que lhe é conferida pela lei supranacional?De acordo com Matias (2014), os direitos dos migrantes são objeto de tratamento sobretudo no quadro da proteção internacional dos direitos humanos, podendo apontar-se como exceção de um texto internacional dedicado aos direitos dos migrantes a convenção internacional sobre a proteção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias, que praticamente não mereceu a ratificação dos países desenvolvidos.Quer isto dizer que, ao nível do direito internacional, o migrante é reconhecido na dimensão humanitária e timidamente como uma força laboral. Ou como refere ainda Matias (2014:15) que a “desregulação internacional das migrações assenta na convicção há

muito firmada de que a decisão de aceitar imigrantes se encontra profundamente radicada na soberania dos Estados, sendo uma decisão interna essencialmente livre.”

Existe portanto uma proteção conferida aos migrantes com o estatuto de refugiado e existe uma proteção para os migrantes trabalhadores. No que respeita à União Europeia, houve um desenvolvimento no quadro do reagrupamento familiar33.

A Constituição portuguesa, à semelhança de outras constituições de Estados de direito democráticos, consagra, no seu artigo 15º, um princípio de equiparação de direitos entre cidadãos portugueses e estrangeiros, abrindo exceção quanto aos direitos políticos34

(Matias, 2014). No entanto, denota-se que a legislação portuguesa tem conferido, entre os estrangeiros, um tratamento preferencial aos cidadãos lusófonos.

33 O Tratado de Lisboa insere um capítulo no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia sobre

Políticas Relativas aos Controlos nas Fronteiras, ao Asilo e à Imigração (artigos 77º, 78º, 79º e 80º). Neste capítulo, confere-se especial atenção ao reagrupamento familiar como referido no artigo 79º na alínea a) do ponto 2.

34O ponto 2 do artigo 15º abre exceção do princípio quanto aos “direitos políticos, o exercício das funções públicas que não tenham carácter predominantemente técnico e os direitos e deveres reservados pela

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14 A propósito da extensão dos direitos políticos concedidos aos estrangeiros residentes, a lei portuguesa tem um cunho original pois assenta numa base de reciprocidade, o que faz de Portugal um caso (quase) excecional na Europa (Pedroza, 2013). O mesmo autor refere que alguns países nórdicos, que também se baseavam na reciprocidade e no tratamento preferencial de alguns estrangeiros durante os anos 1980, rapidamente estenderam os direitos a favor do sufrágio universal.

A Convenção de Igualdade de Direitos e Deveres entre Portugal e o Brasil de 197135,

incorporada na legislação portuguesa pelo decreto-lei 126/72 de 22 de abril, já previa os direitos políticos através do requerimento do estatuto geral de igualdade. Mas, num sentido mais lato, a inclusão dos direitos políticos dos estrangeiros lusófonos na Constituição portuguesa estava prevista desde 1976. Em 1989 previu-se um alargamento a estrangeiros de outras nacionalidades (não só de países lusófonos) mas ainda numa base de reciprocidade. Em 1992 como resultado de regulamentação europeia alarga-se aos cidadãos da União Europeia. Mas é apenas em 1996 que é aprovada a lei 50/96 de 4 de setembro que regulamenta atualmente os direitos políticos dos estrangeiros36.

Paralelamente e em consequência da lentidão do processo de conquista de direitos políticos, o associativismo imigrante funcionou como uma força bottom-up. O associativismo imigrante foi protagonizado pelas comunidades africanas e especialmente impulsionado pela comunidade cabo-verdiana37. O crescimento do associativismo

cabo-verdiano prendeu-se fundamentalmente ao facto de alguma da população proveniente do

35 A Convenção de Igualdade de Direitos e Deveres de 1971 é revogada pelo Tratado de Amizade,

Cooperação e Consulta de 2000. O ponto 2 do Título II do Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta refere-se ao estatuto de igualdade entre portugueses e brasileiros, nomeadamente no artigo 17.º, no que concerne à igualdade de direitos políticos.

36 Em Portugal, no que concerne aos direitos políticos dos estrangeiros residentes, estes têm capacidade

ativa e passiva, tendo assim o direito de votar e ser eleitos para os órgãos locais. Mas isto assenta numa base de reciprocidade, ou seja, se no país de origem em causa o cidadão português também puder votar. No caso dos estrangeiros provenientes de um estado-membro da União Europeia, qualquer cidadão tem o direito ao voto e eleição local (consequência da diretiva 94/80/CE do Conselho de 19 de dezembro de 1994).

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15 país ser constituída por estudantes, nas várias fases da emigração cabo-verdiana, antes e após a independência do país (Carita e Rosendo, 1993).

Para aqueles que se encontram sem família e ligações sociais, as associações tornam-se uma segunda casa; um lugar onde podem confraternizar com os seus conterrâneos, partilhar memórias e experiências e manter o contacto com o caboverdianismo, assim como discutir assuntos sobre a vida em Portugal (Sardinha, 2010). Mas, para além do associativismo cabo-verdiano, o associativismo imigrante no seu todo tem ganhado dimensão38.

Neste sentido, a criação do Conselho Municipal para as Comunidades Imigrantes e Minorias Étnicas em 1993 (atual Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania39) por parte da Câmara Municipal de Lisboa foi um dos primeiros passos para

mediar o diálogo entre a autarquia e a rede associativa imigrante e para a sua participação na construção das políticas locais.

3. O I Plano Municipal para a Integração de Imigrantes de Lisboa:

projeto desenvolvido pela Câmara Municipal de Lisboa

3.1. Descrição da instituição: orgânica da Câmara Municipal de Lisboa e estrutura do Departamento de Desenvolvimento Social

O estágio curricular decorreu na Câmara Municipal de Lisboa no Departamento de Desenvolvimento Social40. A Câmara Municipal de Lisboa tem um modelo de estrutura

38 Em Portugal, no ano de 2012, contabilizavam-se 131 associações de imigrantes cuja representatividade

era reconhecida pelo ACIDI (atual ACM) sendo que a maioria dos reconhecimentos formais se deram entre 1999 e 2002, a par da legislação que definiu o regime de constituição e os direitos e deveres das associações representativas dos imigrantes e seus descendentes em Portugal. A comunidade cabo-verdiana contava com o maior número de associações reconhecidas, quase 25 associações (por comunidade representada) em 2012, seguida respetivamente das comunidades guineense, angolana e brasileira (Fonte: GATAI – ACIME/ACIDI/ACM, Oliveira e Gomes, 2014).

39O CMIC é uma estrutura consultiva da CML. O pelouro dos Direitos Sociais integra este conselho a par

de outros conselhos, tais como o Conselho Municipal para a Igualdade, o Conselho Municipal para a Juventude ou o Conselho Municipal para a Inclusão da Pessoa com Deficiência.

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16 organicamente hierarquizada com unidades transversais, setoriais e territoriais. No momento do estágio, o Departamento de Desenvolvimento Social pertencia à Direção Municipal de Habitação e Desenvolvimento Local e compunha internamente duas divisões: a Divisão de Cidadania e Inovação Social e a Divisão de Ação Social e Saúde.

A Divisão de Cidadania e Inovação Social era composta pelas equipas do Voluntariado, Deficiência, Economia e Inovação Social, Direitos Humanos, Interculturalidade, Igualdade de Género e Direitos LGBTI, Desenvolvimento Comunitário e Espaço a Brincar (Direitos da Criança). A Divisão de Ação Social e Saúde incluía as seguintes equipas: Dependências, Sem-abrigo, Saúde, Idosos e Família.

3.2. Objetivos do Plano de Ação e do Pelouro dos Direitos Sociais

O Pelouro dos Direitos Sociais, a cargo do Vereador Arq.º João Afonso, é um dos pelouros do município de Lisboa e lançou um plano de ação com vigência para o período 2014-2017. O plano de ação conta com três eixos de ação: Participação, Coesão e Intervenção.

No eixo da Coesão, a área 9 dedica-se à temática do diálogo intercultural e inter-religioso e conta com quatro missões: 1. Apoiar e incluir imigrantes, 2. Promover a integração das comunidades imigrantes, grupos étnicos, culturais e religiosos, 3. Promover a participação no domínio da interculturalidade e interreligiosidade, 4. Potenciar as relações de cooperação existentes na área da interculturalidade e interreligiosidade.

Apesar da aparente similitude entre as missões, as diferenças entre a primeira missão e a segunda relacionam-se com os diferentes sentidos a que se propõem, a primeira num sentido individual e a segunda num sentido coletivo. Assim como da terceira para a quarta missão, existem objetivos diferentes, tendo a terceira duas medidas relacionadas com o Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania (CMIC), ou seja, num sentido

bottom-up, e a quarta um sentido top-down, prevendo cooperar com entidades diversas, inclusive o Alto-Comissariado para as Migrações (ACM, I.P.).

É de referir que outros dos objetivos do Plano de Ação do Pelouro dos Direitos Sociais são criar uma Casa de África e apoiar a população refugiada.

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17 A equipa da Interculturalidade é responsável por diversas funções com vista a cumprir os objetivos da Município de Lisboa na área da interculturalidade. É responsável pelo atendimento no Centro Local de Apoio à Integração dos Imigrantes (CLAII)41, o qual foi

estabelecido em 2005 através de um protocolo entre a Câmara Municipal de Lisboa e o antigo Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME, I.P.). Sobre o CLAII, tem vindo a ser questionado o sentido da sua manutenção na CML visto a escassez de procura. Tive a oportunidade durante o período de estágio de assistir a dois atendimentos no CLAII. No dia 14 de outubro de 2014, assisti ao atendimento de um casal italiano, vindo de França. O casal tinha-se dirigido ao CLAII porque a senhora precisava de um comprovativo em como estava à procura de emprego. Foi um atendimento bastante simples e as pessoas estavam bem-dispostas e, apesar de não ter sido resolvida a sua situação, ficaram agradecidos pelas indicações. Mais tarde, assisti a um outro atendimento de dois jovens angolanos que tinham vindo para o país por motivos de estudo. Neste segundo caso, denotou-se alguma ansiedade por parte dos mesmos, pela questão burocrática ou porque houve a necessidade de responderem a algumas perguntas.

As técnicas responsáveis pela interculturalidade encarregam-se ainda da avaliação das candidaturas ao Regulamento de Atribuição de Apoios no Município de Lisboa (RAAML)42 e posterior monitorização dos projetos aceites. No quadro deste regulamento,

existem dois tipos de apoios – a cedência de espaços e o apoio financeiro.

No dia 3 de novembro de 2014, no âmbito da monitorização de projetos apoiados através do RAAML, deslocámo-nos ao Centro de Acolhimento para Crianças Refugiadas (CACR), onde vivem jovens e crianças refugiadas. O Centro pertence ao Conselho Português para os Refugiados (CPR) e situa-se no Parque da Bela Vista. A visita de monitorização baseou-se numa supervisão geral das condições logísticas do Centro, assim como das atividades desenvolvidas pelos técnicos. Foram também escutadas as necessidades e dificuldades, as quais eram sobretudo ao nível dos recursos financeiros.

41 A rede CLAII foi criada em 2003 pelo então Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas

(ACIME). A par dos CLAII, existem também os Gabinetes de Apoio Especializado ao Imigrante (GAEI), contabilizando no total cerca de 148 gabinetes por todo o país distribuídos por 19 distritos e 76 concelhos.

42 O Regulamento de Atribuição de Apoios pelo Município de Lisboa foi aprovado em 2008, podendo

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18 De um ponto de vista pessoal, emocionei-me com esta experiência que decorreu num dia cinzento e de alguma chuva, metáfora para o clima humano um tanto fechado e concentrado que se vivia no Centro de Acolhimento. Alguns dos jovens adolescentes, sentados na sala de convívio, pareciam entretidos com os seus telemóveis enquanto uma jovem adolescente no andar de cima, descrita pela técnica como mais problemática, estava retraída no seu quarto quando passámos. A visita prosseguiu e enquanto passeávamos por uma casa recheada de quartos coloridos e janelas amplas, por onde passaria a luz em dias mais soalheiros, a técnica contava-nos o dia-a-dia no centro, como os jovens se entretinham com atividades de teatro e eram ajudados a fazer os trabalhos de casa. Na cozinha, os jovens aprendiam a cozinhar e conheciam os hábitos culturais e gastronómicos uns dos outros. Era uma casa cheia de angústias mas onde certamente haveria também muita compaixão, partilha e alegria e, sobretudo, onde se sentia uma ânsia por parte dos técnicos em torná-la cada vez mais numa “casa” no sentido emocional.

É de apontar, dentro do que concerne ao apoio ao asilo, que a Câmara Municipal de Lisboa assinou no dia 15 de dezembro de 2014 um protocolo com a Rede Europeia de Reinstalação, cuja entidade representante em Portugal é o Conselho Português para os Refugiados.

A equipa da interculturalidade tem também o papel de secretariado técnico do Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania (CMIC) e organiza o Fórum Municipal para a Interculturalidade (FMINT). Para o FMINT aconteceram duas reuniões até ser decidido que o Fórum iria ser integrado nas Festas de Lisboa, a cargo da empresa municipal EGEAC (Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural).

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19 As técnicas da interculturalidade estão também a colaborar no Projeto Mentores43 com a

equipa do Voluntariado. Sobre este projeto tive também a oportunidade de assistir a uma

reunião que decorreu no dia 13 de janeiro de 2015.

Foi ainda desenvolvido pela equipa o Roteiro Imigrante (cuja concretização era um dos objetivos do Plano de Ação do Pelouro dos Direitos Sociais) e que foi lançado publicamente no dia 21 de abril de 2015.

Para além do trabalho realizado pela equipa da interculturalidade, a CML tem outros projetos diretamente relacionados com as questões da interculturalidade, que são eles o projeto Empreendedorismo Imigrante (DELI) e o Gabinete Lisboa Encruzilhada de Mundos (GLEM) que organiza o Festival TODOS44 e participa em encontros

internacionais.

3.4. Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania

O atual Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania (CMIC) foi criado em 1993 com a então designação de Conselho Municipal para as Comunidades Imigrantes e Minorias Étnicas (CMCIME). A criação do conselho teve o intuito de reforçar o diálogo e o papel ativo de comunidades étnicas para a ação política do município. Em 2008, o Ano Europeu para o Diálogo Intercultural conferiu ao CMCIME uma intensa atividade. Em 2009 deu-se uma alteração ao regulamento do CMIC e surgiu também o Fórum Municipal para a Interculturalidade enquanto espaço de reflexão, debate e estudo. Os anos de 2011 a 2013 foram anos de pouca ou nenhuma atividade.

O CMIC é assim uma estrutura consultiva do Município de Lisboa que tem por objetivo garantir a participação e colaboração dos imigrantes, dos ciganos e de outros (as) cidadãos e cidadãs com identidades culturais diversas, através das suas associações, nas políticas que se lhes dirigem. Pode ter um máximo de 31 associações membro e reúne um mínimo de quatro vezes por ano. O CMIC é presidido pelo vereador do pelouro dos Direitos Sociais e integram ainda o Conselho um representante a designar pela Assembleia

43 O Projeto Mentores é promovido pelo ACM e é desenvolvido por um conjunto de parceiros locais.

Procura promover experiências de troca, entreajuda e apoio entre voluntários (cidadãos portugueses) e migrantes (emigrantes e imigrantes) e/ou refugiados.

44 O Festival TODOS teve lugar, nas primeiras edições, nas zonas do Intendente, Martim Moniz e Mouraria,

tendo-se alargado até à zona de São Bento e Poço dos Negros nos últimos anos. Este é um projeto com base numa ideia de abertura e de convite à participação dos lisboetas e que pretende atrair o maior número de pessoas, saindo à rua e chegando até às pessoas. Entenda-se por “lisboetas” todos aqueles que vivem na

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20 Municipal e dois cidadãos ou cidadãs de reconhecido mérito, designados (as) pelas associações/entidades membro do Conselho Municipal. Podem ainda participar nas reuniões do CMIC representantes de outras organizações ou organismos públicos, a título de observadores e a convite do Presidente. Os membros do CMIC podem apresentar propostas, moções e declarações; usar a palavra; requerer informações ou elementos da CML.

3.5. Plano Municipal para a Integração dos Imigrantes de Lisboa: objetivos e enquadramento formal

O Plano Municipal para a Integração de Imigrantes de Lisboa (PMIIL) é um projeto que surge no quadro europeu da estratégia Lx-Europa 2020 no objetivo Melhor Cidade45. O

objetivo Melhor Cidade designa, entre outras intenções, a valorização da interculturalidade e a promoção da cidadania, através de projetos locais de ação, apoio e diálogo.

De acordo com os parâmetros europeus e com as necessidades e potencialidades específicas de Lisboa, o PMIIL insere, como principais objetivos e áreas, os seguintes pontos: melhoria da articulação de recursos e meios existentes entre as várias unidades orgânicas da Câmara Municipal de Lisboa (CML), que influenciem a integração dos imigrantes; valorização e conhecimento da diversidade cultural; eliminação e desconstrução de estereótipos sobre as comunidades imigrantes; diminuição da pobreza, exclusão social e discriminação; combate à violência de género e ao tráfico de seres humanos; fomentar mais diálogo de proximidade, na dimensão dos direitos humanos, através de uma plataforma de cidadania; reforço do papel da sociedade civil como agente estruturante para a Igualdade; contribuir para o aumento da capacitação das organizações da sociedade civil, para que tenham melhor atuação no terreno; promoção do trabalho em rede e constituição de uma base de recursos teórico-empíricos para o diagnóstico e intervenção da situação de imigração em Lisboa.

Desta forma, a CML visou que o PMIIL se enquadrasse na estratégia Lx-Europa 2020, respondendo a condições externas, como também, quis melhorar internamente o próprio funcionamento e articulação de unidades diversas da CML no que concerne à área da interculturalidade. A inspiração nos Planos Nacionais para a Integração dos Imigrantes

45 A estratégia Lisboa 2020, no objetivo Melhor Cidade, propõe-se à reabilitação do edificado, regeneração

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21

(PII’s)46 estabeleceu, desde o início, a contemplação de áreas de intervenção como o

Acolhimento, a Saúde, a Educação e a Habitação.

Quanto a fontes de financiamento, a Câmara de Lisboa candidatou-se, a convite do Alto Comissariado para as Migrações (ACM, I.P.), ao financiamento da ação 4 do Fundo Europeu para a Integração dos Nacionais de Países Terceiros (FEINPT) para a implementação de planos municipais de integração, tendo a CML beneficiado de um orçamento de 10.000 €.

Ao abrigo deste financiamento vigoram 19 planos de integração nos seguintes municípios: Viana do Castelo, Braga, Vila Nova de Gaia, Figueira da Foz, Lousã, Alcanena, Óbidos, Lourinhã, Torres Vedras47, Loures, Amadora, Lisboa, Sintra, Cascais,

Oeiras, Montijo, Seixal, Odemira, Portimão, Loulé e S. Brás de Alportel.

A aprovação e o apoio através do ACM, I.P. implicou pressupostos básicos para a conceção do enquadramento teórico do Plano, tais como os princípios básicos da Agenda Comum para a Integração ou o percurso nacional das políticas de integração. Ainda assim, foi sempre um objetivo por parte da CML que o plano avançasse, mesmo sem a aprovação e apoio financeiro por parte do ACM, I.P. Esta decisão foi, na minha opinião, relevante para a afirmação de uma posição mais persistente por parte da CML nas sessões de monitorização face ao ACM, I.P. As técnicas do Alto-Comissariado responsáveis pela avaliação e monitorização dos Planos Municipais foram-se mostrando algo solidárias com a equipa de trabalho do PMIIL ao longo do processo, pelas meticulosidades formais e pelas exigências de prazos, mas não deixaram de referir que também elas próprias estariam sujeitas a várias avaliações e monitorizações por parte da União Europeia.

3.6. Elaboração do PMIIL, etapas e atividades desenvolvidas

3.6.1. Constituição do Grupo Restrito e do Grupo de Trabalho

A elaboração do PMIIL implicou, primeiro que tudo, a constituição de um grupo de trabalho e de um grupo de trabalho restrito. Seguiu-se uma fase de diagnóstico, fino e participado, através de um protocolo assinado com o Instituto de Geografia e

46 O ACIDI desenvolveu dois Planos de Integração de Imigrantes na primeira década do milénio

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22 Ordenamento do Território (IGOT). Recorreu-se ainda ao contributo do Conselho Municipal para a Interculturalidade, numa lógica participativa. A fase de elaboração culminou em sessões territoriais com a participação de estrangeiros nacionais de países terceiros. De modo a compreender cada uma das fases de elaboração do PMIIL, segue-se uma descrição dos momentos que acompanhei e em que participei.

Para a realização do Plano Municipal foram criados um Grupo de Trabalho e um Grupo Restrito. O Grupo de Trabalho foi composto pela Dr.ª Susana Ramos (diretora do Departamento de Desenvolvimento Social e coordenadora do Plano Municipal), Dr.ª Cláudia Prazeres (chefe de divisão da Cidadania e Inovação Social), Dr.ª Teresa Craveiro (coordenadora da Equipa de Projeto do Programa Local de Habitação e Direitos Sociais

– EP-PLHDS), pelo Arq.º Miguel Graça (assessor do gabinete do Vereador João Afonso) e, finalmente, pelo Dr. André Costa Jorge (Serviço Jesuíta aos Refugiados). O último elemento do Grupo de Trabalho voluntariou-se em reunião do CMIC (24 de novembro de 2014) depois do convite lançado pelo Presidente do Conselho, o Vereador João Afonso.

Do Grupo Restrito constituíram parte os seguintes parceiros com os quais foi assinado protocolo: Fundação Aga Khan, Fundação Calouste Gulbenkian, Associação Renovar a Mouraria, Comunidade Islâmica de Lisboa, Associação dos Amigos da Mulher Angolana, Serviço Jesuíta aos Refugiados, CASA (Centro de Apoio aos Sem Abrigo), Associação Lusofonia, Cultura e Cidadania (ALCC), FAIASCA-P (Federação de Associações de Imigrantes e Amigos do Sector de Calequisse em Portugal), Federação das Organizações Cabo-verdianas, Centro Padre Alves Correia, Instituto de Segurança Social e Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.

Foi ainda assinado um protocolo com o Instituo de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT), tendo este parceiro um estatuto diferente, pois beneficiou de uma quantia de 5.000 € (do orçamento disponibilizado à CML pelo FEINPT) para a realização do diagnóstico sobre o contexto da população imigrante residente em Lisboa. O IGOT tinha já um trabalho prévio desenvolvido com a Câmara de Lisboa, nomeadamente, um inquérito às associações e organizações que compõem o CMIC48.

A primeira reunião a que assisti, no dia 29 de outubro de 2014, realizou-se com o grupo restrito e estiveram presentes os seguintes elementos: Fundação Aga Khan, Comunidade

48 «Inquéritos às Associações de Imigrantes, às Organizações com trabalho orientado para os imigrantes e

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23 Islâmica de Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, Associação dos Amigos da Mulher Angolana, Associação Renovar a Mouraria, Serviço Jesuíta aos Refugiados, CASA (Centro de Apoio aos Sem Abrigo), Associação Lusofonia, Cultura e Cidadania (ALCC), Instituto de Geografia e Ordenamento do Território, Equipa de Projeto do Programa Local de Habitação e Direitos Sociais (EP-PLHDS). Nesta reunião, foram apresentados os objetivos gerais do Plano Municipal, o orçamento disponibilizado, a calendarização e lista de parceiros do grupo restrito, tendo sido ainda relembradas as dezassete áreas de intervenção do último plano nacional49. Após a apresentação, ficou em aberto o espaço

para a discussão e sugestão de ideias. As áreas sugeridas de realce foram o empreendedorismo enquanto estratégia local de capacitação e empoderamento do imigrante, o diálogo inter-religioso como área merecedora de especial atenção, já que nos planos nacionais foi abordada de forma vaga, dispersando-se em conceitos como

“diversidade” e “interculturalidade”.

A partir desta reunião foi possível traçar as linhas estratégicas de atuação e as áreas de intervenção, resultando na definição de três eixos transversais a 10 áreas, que viria mais tarde a ser alterado50, tendo ficado primeiramente definido o seguinte:

1. Cidadania e Participação: Acolhimento, Habitação, Saúde, Educação;

2. Emprego, empreendedorismo, valorização e capacitação: Emprego e empreendedorismo, Qualificação, Associativismo

3. Diversidade: Diálogo inter-religioso e intercultural, Racismo e Discriminação, Exclusão Social

A propósito da definição dos eixos estratégicos, surgiram ainda outras questões como a distinção entre o que é responsabilidade e competência nacional e o que é da competência local. Exemplo disto foi a discussão sobre o Centro Local de Apoio à Integração de Imigrantes (CLAII) e se este teria recursos suficientes para oferecer apoio aos estrangeiros na área do acolhimento. Abordou-se como o PMIIL poderia colmatar esta

49 As 17 áreas de intervenção do último PII foram as seguintes: Acolhimento; Cultura e Língua; Emprego,

Formação e Dinâmicas Empresariais; Educação; Solidariedade Social; Saúde; Habitação; Justiça; Racismo e Discriminação; Acesso à Cidadania e Participação Política; Associativismo Imigrante; Descendentes de Imigrantes; Idosos Imigrantes; Relações com os Países de Origem; Promoção da Diversidade e Interculturalidade; Questões de Género; Tráfico de Seres Humanos.

50 Mais tarde e, segundo sugestão do IGOT, acrescentaram-se as áreas Participação Cívica e Política,

Referências

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