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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

ANDRÉ BRUTTIN

Contribuições da Psicologia Social do Trabalho e das

Organizações para a Gestão de Pessoas em Fábricas

Recuperadas: um estudo de caso na Metalcoop

Doutorado em Psicologia Social

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

ANDRÉ BRUTTIN

Contribuições da Psicologia Social do Trabalho e das

Organizações para a Gestão de Pessoas em Fábricas

Recuperadas: um estudo de caso na Metalcoop

Tese apresentada à banca

examinadora

da

Pontifícia

Universidade Católica de São

Paulo, como exigência parcial

para a obtenção do título de

Doutor em Psicologia Social, sob

orientação do Prof. Dr. Odair

Furtado.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

(3)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Banca examinadora:

______________________________

Prof. Dr. Odair Furtado

______________________________

Prof. Dr. Antonio da Costa Ciampa

______________________________

Prof. Dr. Bernardo Svartman

______________________________

Prof. Dr. Marcelo Afonso Ribeiro

(4)

Dedico este trabalho...

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Dedico este trabalho...

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Agradecimentos

Agradeço especialmente ao meu orientador Odair Furtado. É impressionante como a partir de econômicas e precisas orientações eu posso ver o seu dedo em cada parte deste trabalho. Levo comigo além de todo o aprendizado que um projeto como este permite, um modelo de orientação a seguir. Obrigado.

Agradeço também aos colegas da Metalcoop que me receberam de forma tão carinhosa e generosa. Sem a ajuda de vocês eu jamais teria conseguido concluir este projeto. Obrigado.

Agradeço também aos colegas no NUTAS por importantes contribuições durante nossas discussões durante todos estes anos, além de inenarráveis momentos em nossos encontros da ABRAPSO.

Aos Professores Antonio da Costa Ciampa e Marcelo Afonso Ribeiro que contribuíram muito para o resultado final deste trabalho a partir de seus comentários durante a banca de qualificação. Também vejo o dedo de vocês claramente ao ler este trabalho. Obrigado.

Aos colegas do Núcleo de trabalho da PUC-SP. Tenho muito orgulho de fazer parte deste grupo e certamente nossas discussões tem ligação direta com este doutorado.

Aos colegas da Reciprhocal, em especial o Eduardo, que souberam com a já tradicional elegância respeitar o meu tempo do doutorado assumindo papéis que estariam destinados a mim na empresa.

À Patchu por me dar tanto apoio, também assumindo papéis que estariam destinados a mim em casa. Pago esta dívida durante o seu doutorado.

Ao Leo e ao Diego por tanto me inspirarem a querer ser alguém melhor e pelos momentos de privação do pai. Comemorar o término dos meus finais de semana de estudos é sinal de que eu já estava fazendo falta.

Á Jessica pelas intermináveis revisões durante todo o trabalho. Ninguém leu este trabalho mais do que você. Obrigado.

Á Vanessa pela revisão da última versão, que me permitiu dormir em paz.

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Resumo

BRUTTIN, André.

Contribuições da Psicologia Social do Trabalho e das

Organizações para a Gestão de Pessoas em Fábricas Recuperadas. Um

Estudo de Caso na Metalcoop.

Tese de doutorado. PUC-SP, 2012.

Esta é uma tese de psicologia social, dentro do campo da psicologia organizacional e do trabalho, que teve como foco principal desenvolver um sistema de gestão de pessoas com foco em promoção de saúde do trabalhador em uma fábrica recuperada, a partir de uma atuação crítica do psicólogo inserido nas organizações. Para tanto utilizei como referencial teórico a psicologia social do trabalho e das organizações e a psicologia de perspectiva sócio-histórica e como referencial metodológico a proposta do campo-tema. A pesquisa foi realizada em uma fábrica recuperada localizada em Salto, São Paulo, e teve como principais resultados a implementação de um sistema de gestão de pessoas que inverte a polaridade tradicional da organização do trabalho, saindo do direcionador mais tradicional o capital e passando a ter no trabalhador o foco principal dos processos de trabalho. O programa com vistas a promoção de saúde implementado na Metalcoop, foi escorado em cinco eixos principais. a) colocar o trabalho a serviço do trabalhador, em que buscamos que as práticas e políticas de gestão tivessem o trabalhador como foco principal; b) fomentar o desenvolvimento humano através do trabalho, em que buscamos pensar ações de desenvolvimento a partir do trabalhador e não da organização; c) trabalhar políticas de identidade e identidades políticas, em que buscamos projetos que pudessem viabilizar um novo personagem, o sócio-trabalhador ao mesmo tempo em que fomentávamos os projetos pessoais de identidade dentro da organização; d) Fomentar a participação do trabalhador no processo decisório da organização, em que buscamos ampliar os espaços de participação democrática dentro da organização ao mesmo tempo em que buscávamos desenvolver a visão crítica do trabalhador, para que aproveitasse melhor os espaços democráticos existentes; e) saúde ocupacional, em que buscávamos fazer a gestão dos processos de trabalho evitando que fossem elementos geradores de adoecimento.

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Abstract

BRUTTIN, André.

Contributions of Social Psychology of Work and

Organizations for People Management in Recovered Factories. Case study

at Metalcoop.

Doctoral Thesis. PUC-SP, 2012.

This is a social psychology thesis, in the work and organizational psychology area, which has as a main focus to develop a people management system focusing the promotion of health of workers in a recovered factory, based on the critical role of a psychologist inserted in it. For that I have used as a theoretical reference the social psychology of work and organizations and the psychology of sociohistorical perspective and as a methodological reference I have used the proposal of the theme field. The research was done in a recovered factory in Salto, state of São Paulo, Brazil, and had as the main result the implementation of a people management system which inverts the traditional polarity of work organization, leaving the most traditional that focus the capital behind to have the worker as the main focus in the work process. The program focusing the promotion of health implemented at Metalcoop, was based on five main axis. a) putting work to serve the worker, as we search that the management policies have the worker as the focus; b) promoting the human development through work, as we seek for developing actions from the worker´s point of view and not the organization; c) working policies of identity and identity policies searching projects capable of creating a new character, the partner-worker at the same time that we were promoting the identity personal projects within the organization; d) promoting the

worker participation in the organization’s decision-making process, aiming to widen the democratic participation in the organization at the same time as we were searching for the development of its critical vision in order to better use the already existing democratic spaces; e) occupational health, managing the work process to avoid those as elements to cause illness.

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Sumário

1. Introdução ...01

1.1 .Trajetória até o presente momento ...03

1.2 A pesquisa de doutorado ...07

1.3 Objetivos de pesquisa ...08

2. Fábricas Recuperadas...12

2.1.Fábricas recuperadas, cooperativas e autogestão...13

2.2.A origem das fábricas recuperadas no Brasil...15

2.3.O processo de formação e desenvolvimento das fábricas

recuperadas ...19

2.4.O modelo de negócio das fábricas recuperadas...21

2.5. O modelo de gestão das fábricas recuperadas ...25

2.6. A lógica industrial ...30

2.7. A experiência das fábricas recuperadas na América Latina...32

2.8.

Desafios ...35

3. A Psicologia no Mundo do Trabalho ... 47

3.1.

A primeira fase da psicologia no mundo do trabalho ...48

3.2. A segunda fase da psicologia no mundo do trabalho...52

3.3. A terceira fase da psicologia no mundo do trabalho...55

3.4. Críticas a psicologia no mundo do trabalho...65

3.5. Uma quarta fase?...68

4. Psicologia Sócio-Histórica. ...72

4.1. Pressupostos epistemológicos ...73

4.2. Psicologia social crítica ...75

4.3. Historicidade ...78

4.4. Condição Humana ...80

4.5. Dialética ...82

4.6. Atividade ...87

4.7. Consciência ...89

4.8. Identidade ...92

4.9. Emancipação ...99

4.10. Saúde na perspectiva sócio-histórica...101

5. Método...104

5.1.

O problema de pesquisa ...105

5.2. O método de pesquisa ...108

5.3. Breve caracterização da Metalcoop...112

(10)

6. Diagnóstico organizacional ...119

6.1 O trabalho a serviço do trabalhador ...121

6.2 Desenvolvimento humano através do trabalho ...136

6.3 Participação do trabalhador no processo decisório...139

6.4 Identidades políticas e políticas de identidade ...150

6.5

Saúde ocupacional ...157

7. Plano de ação de gestão de pessoas com foco em promoção de

saúde ...161

7.1. O trabalho a serviço de trabalhador ...164

7.1.1 Gestão do clima organizacional ...165

7.1.2 Infraestrutura nos modelos da Adequação sociotécnica...169

7.1.3 Desenvolvimento Econômico ...169

7.1.4.Práticas e enriquecimento do cargo...172

7.2. Desenvolvimento Humano através do trabalho ...174

7.3. Identidades políticas e políticas de identidade ...179

7.3.1. Identidade do sócio-trabalhador...180

7.3.2. Projetos pessoais de identidade...183

7.4. Participação do trabalhador no processo decisório...186

7.5. Saúde ocupacional...188

7.5.1. Segurança no trabalho...189

7.5.2. PCMSO ...189

7.5.3. Qualidade de vida no trabalho ...190

8.Implementação do plano de gestão de pessoas com foco em promoção

de saúde ...192

8.1. O trabalho a serviço do trabalhador...194

8.2. Identidades políticas e Políticas de identidade...200

8.3. Participação do trabalhador nos processos decisórios...201

8.4. Desenvolvimento humano a partir do trabalho ...202

8.5. Saúde ocupacional...202

9. Considerações finais...206

9.1. Gestão de pessoas e promoção de saúde ...207

9.2. Um modelo para as fábricas recuperadas...212

9.3. Apontamentos sobre uma psicologia crítica nas organizações...213

(11)
(12)

1. Introdução

O presente trabalho surgiu a partir das reflexões que venho alimentando nos últimos quinze anos, desde que me formei como psicólogo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, e que encontraram o foro adequado para estimulá-las ainda mais, agora com método, no NUTAS (Núcleo de Trabalho e Ação Social), núcleo do programa de pós-graduação em psicologia social da PUC-SP.

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1.1 . Trajetória até o presente trabalho

Em um momento de consolidação de estudos e práticas como é o doutorado, pareceu-me importante resgatar um pouco de minha trajetória profissional, que certamente acaba por influenciar este trabalho.

Formei-me em 1996 na faculdade de psicologia da PUC-SP e, neste mesmo ano, comecei a atuar na área de recursos humanos em uma empresa metalúrgica de grande porte, na região do ABC. Lá, tive as minhas primeiras experiências com a vida prática do psicólogo que atua nas organizações e, hoje, vejo que tive sorte em minha primeira experiência, pois encontrei uma equipe que realmente queria um psicólogo que pudesse contribuir para as melhorias nas condições de trabalho, sem descuidar, é verdade, das necessidades da organização ou da gestão. Durante esta época, tive experiências de trabalho que ajudaram a marcar a maneira como eu vejo que o psicólogo pode contribuir com o trabalhador dentro das organizações.

Diversas questões ali vivenciadas acabaram por influenciar a minha atuação e a forma de enxergar a atuação do psicólogo nas organizações. Aprendi que o psicólogo que realmente quer contribuir de forma assertiva deve investir em diagnósticos ao invés de trilhar o fácil caminho das prescrições da moda. Aprendi que, estando dentro da organização em funções com poder, o psicólogo pode influenciar positivamente a agenda de práticas e políticas de gestão, contribuindo para que elas contemplem a saúde do trabalhador em seus objetivos. Pude vivenciar projetos que realmente faziam a diferença no desenvolvimento do trabalhador e também, já naquela época, aprendi que o psicólogo atuando nas organizações deveria estabelecer parcerias com colegas da psicologia do trabalho ou da saúde do trabalhador em busca de referenciais ou experiências, ganhando assim mais repertório para contribuir com o trabalhador. Também pude experimentar a dificuldade de trabalhar dentro de uma empresa que tem objetivos outros que não a promoção de saúde do trabalhador, o que torna o trabalho do psicólogo muito mais difícil, tendo de enfrentar diferentes obstáculos para se manter dentro de suas convicções.

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momento, além de mediar as conversas entre a comissão e a empresa, consistia justamente em prover os recursos necessários aos trabalhadores para que eles pudessem desempenhar tal papel a contento, como por exemplo ajudá-los a entender a sua função como representantes que deveriam trabalhar com as opiniões do conjunto de colegas e não com as suas visões pessoais. Ou ainda o auxílio com relação a treinamentos específicos sobre o funcionamento da empresa, etc.

Lembro-me ainda de outros projetos desenvolvidos naquele primeiro contato com a atuação do psicólogo nas organizações. Com a intenção de aumentar a qualificação do quadro de funcionários sem ter que provocar substituições, estruturamos dentro da empresa um programa de formação para o ensino médio e fundamental que era oferecido para aqueles trabalhadores que se voluntariassem para o programa. Novamente a percepção de desenvolvimento que pude aferir junto aos participantes do programa era notória, não somente no que diz respeito a novos conhecimentos técnicos, mas principalmente em relação à estima e à forma de se enxergar. Lembro-me até hoje da frase de um destes participantes: “André, antes quando tocava a música do Jornal Nacional em casa, eu saía da sala porque ficava com vergonha do meu filho me fazer perguntas que eu não saberia responder, agora quando toca a música, eu sou o primeiro a chamar todo mundo para a sala para assistirmos juntos. Eu quero mais é que ele pergunte. Eu mesmo faço perguntas.

Neste momento, atuando como psicólogo no RH de uma empresa, tive meus primeiros contatos com a chamada psicologia do trabalho, quando fui incumbido de fazer um diagnóstico que buscasse explicar os nossos níveis de acidente do trabalho, com vista a diminuí-los. Lembro-me naquele momento de ir até a minha antiga faculdade, PUC-SP, atrás de material que pudesse me auxiliar no assunto. Encontrei-me com o Fabio Oliveira, hoje Encontrei-meu colega no núcleo de trabalho da faculdade, e ele me falou um pouco a respeito do trabalho que desenvolveu em sua dissertação de mestrado (1997), A construção social dos discursos sobre o acidente de trabalho1

. O estudo mostrava o discurso de culpabilização do trabalhador sobre os acidentes do trabalho, processo este que acaba por impedir que as ações mais profundas ligadas às condições inseguras que demandariam maiores investimentos da empresa fossem feitas e consequentemente que os acidentes diminuíssem. Recordo-me do trabalho que fizemos lá na empresa a partir deste material, fazendo diretoria e trabalhadores enxergar as armadilhas presentes neste discurso até que conseguimos agir sobre, entre outras coisas, condições inseguras que nos levaram a derrubar alguns daqueles índices. Neste projeto tive o meu primeiro exemplo de como uma atuação integrada

1

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entre diferentes campos da psicologia no mundo do trabalho pode ser contributiva para o trabalhador.

Lembro-me também de histórias de dificuldades e frustração quando via projetos que iriam beneficiar a todos sendo impedidos por falta de investimento ou outras prioridades. É claro que nem tudo naquela época foi fácil, mas a verdade é que alguns destes projetos me marcaram no início da carreira e me fizeram acreditar que de fato o psicólogo, apesar das dificuldades, poderia contribuir para o trabalhador atuando dentro das empresas. Bem sei que tal atuação não representaria uma ação revolucionária, mas certamente poderia trazer benefícios aos trabalhadores se adotada de forma crítica, principalmente se articulada com outros campos de atuação do psicólogo no mundo do trabalho.

Ainda nesta época, comecei a sentir a necessidade de ir buscar mais conceitos que pudessem me ajudar com os trabalhos que estava desenvolvendo na empresa, e como o papel que esperavam de mim lá era muito mais analítico do que prescritivo, após procurar por alguns cursos ligados a RH não encontrei nada que atendesse as minhas expectativas, uma vez que a maioria trazia prescrições prontas e propunham uma atuação mais voltada ao administrador do que ao psicólogo. Parti então para o mestrado com o objetivo de ali aprofundar a minha habilidade para pesquisar e ir mais a fundo no entendimento dos problemas que vivia no trabalho. Entrei no mestrado em psicologia social da PUC-SP e tive como orientador Peter Spink. Este período foi muito rico em minha formação, uma vez que pude conviver durante quatro anos (naquele tempo os prazos eram outros) com psicólogos que traziam conceitos novos para mim, ligados não à psicologia organizacional, mas ao que chamavam de psicologia do trabalho. Eram colegas que em sua maioria, diferentemente de mim, estavam atuando fora das organizações, em sindicatos, órgãos de assistência ao trabalhador, cooperativas, ONGs, mas eu via que muito do que era ali discutido enriquecia a minha atuação nas empresas. Ali eu comecei a pensar que o psicólogo no mundo do trabalho pode ter diferentes formas de atuação, mas que elas podem ser complementares se pensarmos nos benefícios para o trabalhador. Não eram todos que pensavam assim, mas, para mim, ficou marcada esta posição.

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busca a aproximação entre as diferentes áreas da psicologia no mundo do trabalho se mostrava como a mais adequada.

Simultaneamente à minha carreira como consultor, iniciei em 2004 a carreira como docente lecionando na faculdade de psicologia da PUC-SP e também no Mackenzie. Em minhas aulas buscava levar um pouco da experiência prática que fui adquirindo ao longo dos anos, tentando mostrar como o psicólogo poderia contribuir para a saúde do trabalhador nas organizações. Encontrei novamente terreno fértil para discutir os limites e possibilidades de atuação crítica do psicólogo nas organizações a partir das discussões com meus colegas que compõem o núcleo de trabalho2, da faculdade de psicologia da PUC-SP.

Ali tive a oportunidade de trocar experiências com colegas de diferentes perspectivas como a saúde do trabalhador ou a psicologia social do trabalho, e que atuavam em campos distintos, como o sindicato, órgãos de assistência ao trabalhador, entidades de fiscalização social, ONGs e cooperativas, além do convívio com outros colegas que atuam em empresas. Durantes esses anos de convívio, o grupo tem discutido, dentre outros temas, sobre os limites e possibilidades de uma atuação integrada entre estes diferentes campos. Tais discussões me levaram a querer organizá-las melhor em forma de pesquisa, o que me levou ao programa de doutorado em psicologia social da PUC-SP.

Ali pude então consolidar a minha visão que a atuação do psicólogo no mundo do trabalho, pode ser articulada a partir de diferentes frentes, cada qual com seu papel tendo o trabalhador como objetivo final. Tive a oportunidade de organizar melhor as ideias que vinha tentando amadurecer de fazer uma psicologia organizacional crítica e que se integrasse com outras áreas da psicologia do trabalho com vistas a buscar uma atuação sinérgica entre todos os profissionais da área com a finalidade de contribuir para a promoção de saúde do trabalhador. Depois de muitas discussões com os colegas, ocasiões em que tencionávamos sobre as possibilidades ou não de atuação crítica do psicólogo nas organizações, conheci o C., então presidente da Metalcoop. Naquela ocasião ele foi ministrar uma palestra aos alunos do Núcleo falando de sua experiência com as chamadas fábricas recuperadas, especificamente a experiência da Metalcoop. Em seu relato ele contava do projeto e das enormes conquistas que tiveram até então, mas também sinalizava para os grandes desafios que ainda tinham principalmente no que dizia respeito à gestão de pessoas. Estava ali a oportunidade para conciliar os temas de interesse recente e propor uma atuação que fosse mais

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integrada e crítica, para quem sabe depois conseguir extrapolar este modelo para outros setores também. Estabeleci contato com o C. e rapidamente já estava fazendo as visitas iniciais à Metalcoop que perduram até hoje, totalizando já cerca de 18 meses de convívio.

1.2. A pesquisa do doutorado

Assim cheguei a presente pesquisa que busca dar a sua contribuição para a psicologia social, dentro do campo da psicologia organizacional e do trabalho, mais especificamente para aqueles que buscam formas de gerir pessoas em fábricas recuperadas, e tem como referencial teórico a psicologia sócio-histórica.

Recentemente (a partir da década de 90) temos visto no Brasil, e America latina, o crescimento de uma nova forma de articulação dos trabalhadores que pode resultar em um avanço no que diz respeito a possibilidades concretas de novas formas de organização do trabalho em que o trabalhador esteja em primeiro plano e não o capital, resultando assim em um progresso no que diz respeito à busca pela emancipação. Tal forma de organização tem sido referida na literatura acadêmica como fábricas recuperadas e tem como principal característica o fato de os trabalhadores (sócio-trabalhadores) assumirem a gestão e o controle dos processos de produção de empreendimentos industriais que estavam em fase pré-falimentar.

Tal movimento tem sido apontado como uma alternativa ao sistema capitalista de produção, ainda hegemônico, uma vez que tem nos ideais da autogestão os seus principais alicerces estruturais. No entanto, as recentes pesquisas sobre o tema de Santos, (2007) Azevedo, (2003) Juvenal, (2006) Gitahy e Azevedo, (2007) Costa, Tittoni, Barbieri e Maraschin, (2008) Novaes, (2007) têm demonstrado que ainda existem enormes desafios a serem equacionados, apesar das inegáveis conquistas que a nova forma de organização traz aos trabalhadores. O argumento é o de que o modelo de gestão das fábricas recuperadas até o momento apresentou-se como um modelo que permitiu aos empreendimentos se organizarem enquanto negócio, mas que ainda não trouxe tantos ganhos para o trabalhador. Apesar dos avanços apresentados em relação a práticas de gestão eles ainda são tímidos se pensarmos nas possibilidades que o modelo permite. A principal explicação, Juvenal, (2006) Novaes, (2007) Azevedo, (2007) para tal realidade reside no fato das iniciativas de fábricas recuperadas terem tido motivações mais pragmáticas (defesa dos postos de trabalho) do que ideológicas (construção de modelo de gestão que subverta a lógica capitalista).

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emancipatório) e ao que Juvenal (2006) chamou de desenvolvimento humano através do trabalho parece ser um dos grandes desafios que teremos nas fábricas recuperadas. Meu argumento é o de que a psicologia social do trabalho e das organizações pode dar importante contribuição para equacionar tal desafio, ajudando a construir um modelo de gestão nas fábricas recuperadas que contribua para a promoção de saúde do trabalhador, a partir de uma atuação crítica.

Para tanto o campo da psicologia organizacional e do trabalho tem que resolver seus próprios dilemas e desafios. Diferentes autores, como Ribeiro (2009); Furtado; (2005); (2009); Heloani; (2005) Spink; (1996) Veronese; (2003) Sampaio, (1998) têm apontado para a necessidade de repensarmos a atuação do psicólogo no mundo do trabalho, mais especificamente nas organizações. Recentemente uma nova vertente de atuação vem sendo proposta por alguns autores, que buscam uma nova forma de pensar e agir no mundo do trabalho, seria a proposta de uma psicologia social do trabalho e das organizações. A tese defendida neste trabalho é a de que a proposta trazida por esta vertente, que busca na psicologia social subsídios para a atuação do psicólogo no mundo do trabalho, pode contribuir para avançar em relação a alguns dos dilemas por estes vivenciados abrindo caminho para construir uma proposta para que o sistema de gestão de pessoas nas fábricas recuperadas coloque o trabalhador em primeiro plano e não o capital.

Tal visão permitiria à psicologia desconstruir a falsa distinção, conforme aponta Spink, (1996) entre a psicologia teórica e a psicologia aplicada, integrando-as, permitindo que as ações do psicólogo no mundo do trabalho fossem mais articuladas em prol da saúde do trabalhador, sem, no entanto, abandonar as especificidades inerentes a diferentes campos de atuação como as organizações, sindicatos, políticas públicas, órgãos de assistência ao trabalhador entre outros. A psicologia social do trabalho e das organizações permitiria a construção de um arcabouço teórico metodológico a partir da psicologia social que propiciasse tal atuação do psicólogo em diferentes contextos.

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1.3. Objetivos do trabalho

Vemos em diversas situações o trabalho como agente de adoecimento, causado por uma forma de organização do trabalho que privilegia o capital em detrimento do trabalhador, impondo rotinas desumanas em busca do lucro. No entanto, também entendemos o trabalho como importante agente promotor de saúde, capaz de dar acentuada contribuição para o desenvolvimento humano. Muitas das causas do trabalho gerador de adoecimento estão associadas à lógica capitalista de produção de mais valia a partir da exploração do trabalhador. Buscamos a partir da experiência de uma fábrica recuperada, portanto, não capitalista, apesar de inserida em mercado capitalista, avançar em relação a experiências de gestão que coloquem o trabalho a serviço da emancipação e da saúde do trabalhador, viabilizando o que temos chamado de desenvolvimento humano através do trabalho.

Objetivamos, ainda, contribuir com o movimento das fábricas recuperados, a partir de uma estratégia de fortalecer o movimento de dentro para fora, sabendo que já existem muitos colegas debatendo e pesquisando o caminho inverso. Para fazer frente ao capital e se consolidar como alternativa concreta, o movimento das fábricas recuperadas precisa crescer e se mostrar ao trabalhador como uma alternativa possível e melhor do que a que ele encontra na iniciativa privada (ainda mais em um momento econômico de taxas baixíssimas de desemprego no país). Como veremos no decorrer deste trabalho tem sido comum nas fábricas recuperadas a utilização de técnicas e tecnologias emprestadas do modelo capitalista de produção e, portanto, inadequadas para os ideais do movimento, sendo este um dos principais problemas enfrentados nestes empreendimentos. É nosso objetivo, portanto, produzir tecnologia adequada para a realidade das fábricas recuperadas construindo um sistema de gestão que coloque a saúde do trabalhador em primeiro plano, contribuindo para que os projetos do grupo e também os projetos pessoais possam ser convergentes, contribuindo para tornar as fábricas recuperadas não apenas viáveis em termos de negócios, mas também mais atraentes ao trabalhador no que diz respeito à organização do trabalho.

Entendo ainda que a psicologia pode dar especial contribuição para este objetivo na medida em que tem o repertório teórico metodológico para analisar e atuar sobre as relações psicossociais que estão presentes neste cenário. No entanto, para conseguir o objetivo de promover saúde por meio do trabalho, são necessários, além do repertório técnico, visão crítica e poder de influência sobre as práticas e políticas da organização.

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a) Desenvolver um sistema de gestão de pessoas na Metalcoop capaz de colocar o trabalho a serviço do trabalhador, contribuindo para a sua promoção de saúde3 e buscando a sua emancipação4 através do trabalho. b) Como objetivo específico buscamos ainda desenvolver um modelo de

gestão pensado para a realidade das fábricas recuperadas e que eventualmente possa ser utilizado por outras organizações com tais características contribuindo assim com o fortalecimento do movimento.

c) Temos ainda a intenção, a partir do caso da Metalcoop, de estabelecer alguns parâmetros para ajudar no direcionamento de uma psicologia crítica dentro das organizações.

Por fim é preciso ainda dizer que, durante estes quatro anos de pesquisa, tenho buscado fazer o que o legado de Silvia Lane nos ensinou, uma psicologia social marcada pela Praxis, onde teoria e prática se fundem em busca de uma sociedade melhor.

Para fazer tal discussão a linha de raciocínio proposta neste trabalho é a seguinte.

No primeiro capítulo, Fábricas Recuperadas, após traçar um panorama do

“movimento” no Brasil, argumento que o modelo de gestão das fábricas recuperadas até o momento apresentou-se como um modelo que permitiu aos empreendimentos se organizarem enquanto negócio, mas que ainda não trouxe tantos ganhos para o trabalhador, principalmente se pensarmos em relação às possibilidades que um modelo como este oferece. O grande desafio seria então construir um sistema de gestão que colocasse a saúde do trabalhador em primeiro plano, buscando o desenvolvimento humano através do trabalho. Argumento que a psicologia social do trabalho e das organizações pode ter importante contribuição neste desafio.

A seguir, no capítulo intitulado A psicologia no mundo do trabalho, apresento uma reconstituição histórica da evolução do campo da psicologia organizacional e do trabalho, desde a sua origem como psicologia aplicada, passando pela fase em que incorpora as teorias das relações humanas até a fase mais atual. Para fazer tal revisão apoio-me principalmente nos trabalhos de Zanelli (2003), Sampaio (1998), Malvezzi

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O conceito de saúde será mais amplamente discutido nos capítulos 03 e 04 deste trabalho. No entanto, podemos adiantar que estaremos trabalhando com o conceito de saúde conforme trabalhado na perspectiva da psicologia sócio-histórica que entende saúde como um processo e não algo estanque. E buscar a promoção da saúde envolveria criar condições para o sujeito adotar postura ativa de fazer face às dificuldades do meio físico, psíquico e social, de atender sua existência e, portanto, lutar contra elas.

4

(21)

(2000), Ribeiro (2009), Veronese (2003). Faço então a discussão em relação aos principais desafios e críticas à área a partir desta revisão histórica, para então fazer uma proposta de caminho a ser seguido que parece se não equacionar todos os dilemas, avançar em relação a alguns deles. Tal proposta se apoia nas ideias da psicologia social do trabalho e das organizações que busca na psicologia social subsídios para a atuação do psicólogo no mundo do trabalho. Argumento que a Psicologia Sócio-Histórica tem elementos teóricos e metodológicos para ajudar a construir tal modelo.

No terceiro capítulo, A psicologia de perspectiva sócio-histórica, a discussão que faço é a de que a psicologia de perspectiva sócio-histórica tem elementos teóricos e metodológicos que podem ajudar a psicologia organizacional e do trabalho a avançar em relação a um modelo de atuação que consiga contribuir para a promoção de saúde do trabalhador. Faço esta discussão a partir da revisão de alguns dos principais conceitos presentes nesta perspectiva à luz da realidade das fábricas recuperadas. O tema identidade ganha especial destaque nas discussões deste capítulo à medida que é a partir deste conceito, conforme proposto por Antonio da Costa Ciampa, que trabalho também a proposta de emancipação.

Na sequência apresento a discussão sobre o método utilizado na pesquisa, o campo-tema (Spink 2003). Aqui faço também a discussão mais aprofundada sobre o conceito de saúde que vou utilizar no trabalho na Metalcoop. Como dito anteriormente o presente trabalho foi todo realizado na Metalcoop, indústria do setor de forjaria localizada na região de Salto e que desde 2002 funciona como uma cooperativa, nos moldes do que a literatura acadêmica vem tratando como fábrica recuperada. Foram cerca de 18 meses de encontros semanais na Metalcoop.

Posteriormente apresento o capítulo referente à análise dos dados em que busco analisar, a luz do conceito de promoção de saúde nas organizações apresentado no capítulo anterior, como estava posicionado o sistema de gestão de pessoas na Metalcoop no momento inicial do meu projeto. A partir deste Diagnóstico são identificados pontos que podem ser melhorados para que o objetivo de promoção de saúde do trabalhador seja atingido.

No capítulo seguinte é apresentado o plano de ação de gestão de pessoas com foco em promoção de saúde elaborado a partir das necessidades identificadas no diagnóstico, apresentado anteriormente.

O próximo capítulo descreve o processo de implantação do programa destacando os principais resultados obtidos até então.

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Capítulo II

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2. Fábricas recuperadas, cooperativas e autogestão

No início dos anos 90 surge no Brasil uma nova forma de organização do trabalho, que coloca o trabalhador como figura central na gestão do processo produtivo e dos bens de produção, trata-se de experiências em empreendimentos em fase pré-falimentar que veem os seus antigos trabalhadores se organizarem para continuar a operá-lo, garantindo assim a permanência de postos de trabalho, além da possibilidade de colocarem o trabalhador como polo central da produção. Na literatura acadêmica, tais experiências têm sido denominadas de fábricas recuperadas 5, mas

também em muitos casos o conceito de fábricas recuperadas e cooperativas tem sido trabalhado por diversos autores de maneira muito próxima, em muitos momentos ficando difícil a diferenciação entre ambos. Juvenal, (2006) aponta para esta questão.

“Dimensionar o segmento de empresas recuperadas no Brasil é uma tarefa bastante difícil. Essas empresas não contam com arcabouço jurídico específico, como as sociedades laborais espanholas, e são constituídas, normalmente, sob a forma de cooperativas ou associações de trabalhadores. As diferenças existentes nas cooperativas e associações tradicionais que as tornam empresas recuperadas em regime de autogestão somente podem ser identificadas através do exame da estrutura organizacional de cada empresa.” (Juvenal, 2006, p.120)

Santos (2007) também retoma o tema, ao justificar o uso mais recente do termo “fábricas recuperadas” em detrimento de “cooperativas” para identificar empreendimentos industriais geridos pelos trabalhadores no formato de autogestão.

“A utilização desta expressão – fábrica recuperada – é muito recente no Brasil (até pouco tempo falava-se apenas em “empresas autogestionárias”). A expressão era mais comum no movimento argentino e começou a ser utilizada com frequência no Brasil por denotar com mais clareza o tipo de empreendimento a que se refere.

(Santos, 2007, p.78)

Neste trabalho, optamos por utilizar a nomenclatura de fábricas recuperadas, para podermos diferenciá-las de cooperativas de pequeno porte que não atuem no setor industrial, uma vez que o interesse neste tema reside justamente no modelo de gestão adotado por trabalhadores que assumem fábricas de médio e grande portes.

5Alguns autores utilizam o termo empresas recuperadas, com o mesmo sentido de fábricas

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O fenômeno das fábricas recuperadas pode ser entendido como parte de um movimento ainda mais amplo, a economia solidária6 que por sua vez pode ser entendida como um conjunto de iniciativas que busca uma forma alternativa de organização do trabalho baseada nos preceitos de autogestão 7 como um ideal de

sociedade igualitária. Seria uma busca por formas alternativas ao capitalismo de organização social, procurando estabelecer parâmetros humanistas, democráticos e socialistas da distribuição de renda.

Dentro desta perspectiva, as fábricas recuperadas recolocam a autogestão como pressuposto de uma estratégia alternativa de luta ao buscarem colocar o trabalhador no centro do processo decisório produtivo e priorizando-o em relação ao capital na distribuição dos excedentes econômicos gerados pelo seu trabalho. Parece-nos claro que as iniciativas adotadas nas fábricas recuperadas encontram muita uniformidade com outras práticas da economia Solidária, como a democracia na forma de gestão, a busca pela diminuição da desigualdade na distribuição de renda, a priorização do trabalhador em detrimento do capital na forma de remuneração e a detenção do controle sobre os meios de produção.

“Majoritariamente, as experiências de empresas recuperadas em autogestão se reconhecem no conjunto mais amplo de iniciativas coletivas de trabalhadores na esfera econômica, constituindo um campo heterogêneo que abriga diferentes práticas referenciadas no termo economia solidária.” (Faria, M e Cunha, G, pág. 02, 2011)

No entanto, apesar de podermos inserir o movimento das fábricas recuperadas como parte da economia solidária é importante lembrarmos que tais empreendimentos guardam particularidades que devem ser estudadas e trabalhadas de forma isolada. Apesar de serem cooperativas, como entidade jurídica, as fábricas recuperadas

6“Apesar da diversidade de conceitos, pode-se caracterizar a Economia Solidária como o conjunto de empreendimentos produtivos de iniciativa coletiva, com certo grau de democracia interna e que remuneram o trabalho de forma privilegiada em relação ao capital, seja no campo

ou na cidade.” (Nascimento, 2003, p.1). Para mais informações a respeito do tema, ver

“Autogestão e economia solidária: O desafio das fábricas recuperadas no Brasil”. Faria, M, e Cunha, G, 2011.

7 Claudio nascimento, 2003, recupera a definição de autogestão trabalhada durante a

conferência nacional pelo socialismo autogestionário, realizada em Lisboa, 1978, surgida como fruto das experiências das comissões de trabalhadores durante a experiência da revolução dos cravos (1974) para nos lembrar de que as fábricas recuperadas fazem parte do ponto de vista

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diferem da imensa maioria das cooperativas que fazem parte do movimento da economia Solidária pela quantidade de cooperados que agregam, pelo faturamento gerado 8, segmento de negócio e estrutura organizacional.

“Assim, ao mesmo tempo em que tem construído sua identidade enquanto parte integrante da economia Solidária, as empresas recuperadas em sistemas de autogestão também vêm se afirmando como segmento diferenciado, com características e demandas muito próprias.” (Faria,M e Cunha,G, 2011, p.08)

É preciso ainda frisar que as fábricas recuperadas são um movimento relativamente novo na luta dos trabalhadores por melhores condições de trabalho, que vem a se somar às estratégias utilizadas anteriormente como sindicatos, comissão de fábrica e partidos políticos e como tal ainda tem muita oportunidade de desenvolvimento. O presente trabalho busca dar a sua contribuição para o movimento das fábricas recuperadas lançando um olhar para dentro delas, buscando contribuir para que as estratégias de gestão adotadas por estes empreendimentos realmente consigam materializar os ideais que buscam devolver ao trabalhador parte das condições que o capital expropriou.

2.1. As origens das fábricas recuperadas no Brasil

O período, década de 90, que marca os primeiros exemplos no Brasil de fábricas recuperadas funcionando em regime autogestionário foi caracterizado por uma série de fatores macro econômicos tais como; abertura do mercado, adoção de políticas econômicas com viés neoliberal, reestruturação produtiva, fechamento de fábricas, valorização cambial, aumento da taxa de juros, barateamento dos produtos importados, que resultaram em um grande aumento do número de trabalhadores desempregados e a fragilização das relações de trabalho. Mais precisamente no setor industrial, onde se inserem as fábricas recuperadas autogeridas, estes índices ficaram alarmantes.

Segundo Juvenal, 2006, “A análise da evolução do número de ocupados na indústria através da pesquisa de emprego e desemprego na região metropolitana de são Paulo indica que a participação da indústria de transformação passou de 33% em 1989 –, portanto, anteriormente à abertura comercial – para 19,6% em 1999, oscilando nesse patamar a partir de então.” (Juvenal, 2006, p.117)

8 As fábricas recuperadas apesar de representarem apenas 10% do total de

(26)

É neste cenário que surgem as primeiras experiências de empresas autogeridas no Brasil. Diversos autores, Santos (2007) Azevedo, (2003) Juvenal, (2006) Gitahy e Azevedo, (2007) Novaes, (2007) Costa, Tittoni, Barbieri e Maraschin (2008) entendem que as primeiras experiências neste sentido tiveram uma motivação muito mais pragmática, a defesa do emprego, do que ideológica. Tais autores enxergam na crise do emprego vivida na época o principal impulsionador para que os trabalhadores buscassem novas formas de manter o seu trabalho. Neste caso, o caráter ideológico de se posicionar como alternativa ao sistema capitalista de produção ficava em segundo plano. “A organização autogestionária para recuperação de empresas é menos marcada pela ideologia do que pelo pragmatismo” (Juvenal, 2006, p.127). No início dos anos 90 os trabalhadores brasileiros viam seus postos de trabalho diminuir e as alternativas encontradas pelo sindicato ou governo eram insuficientes para mitigar os problemas decorrentes desta crise no emprego. Assumir a gestão de fábricas para evitar o seu fechamento e consequente extinção de postos de trabalho foi à alternativa encontrada naquele contexto por grupos de trabalhadores. A defesa dos empregos era um imperativo naquele momento.

“As cooperativas industriais autogestionárias emergem nesse cenário como um conjunto de iniciativas dos trabalhadores de fábricas em processo de falência, cujo objetivo foi tentar se reinserir no mercado através de formas associativas de produção. Esses empreendimentos resultam do esforço dos trabalhadores de reconquistar seus empregos, seja pela recolocação em funcionamento das empresas em que trabalhavam, seja pela criação de novas empresas.” (Gitahy, Azevedo, 2007, p.4)

No entanto, mesmo aqueles autores que concordam que as motivações iniciais do movimento foram pragmáticas no sentido de defesa do emprego, também apontam para os avanços da proposta do ponto de vista ideológico.

“Mesmo sabendo que o objetivo primordial das fábricas recuperadas seja a defesa dos postos de trabalho, elas não são uma resposta automática às condições macroeconômicas dos anos 1990, mas também resultado de um novo contexto, de um novo clima social e de uma crise estrutural do capital. Mais precisamente, trata-se de um novo fenômeno social ou num novo método desenvolvido pela classe trabalhadora brasileira num contexto onde a luta sindical tradicional por carteira assinada não encontrava mais resultados.” (Novaes, 2007b, p.4)

(27)

de organização do trabalho, que permita colocar o trabalhador em primeiro plano, em detrimento do lucro a qualquer preço. Sobre isto a autora diz.

“Para que a vida humana deixe de ser degradada pela lógica capitalista e seus modelos de gestão do processo de trabalho, é necessário romper com os mesmos, colocando a produção em favor da emancipação do trabalhador e buscando construir uma sociedade com outros valores, capazes de contrapor a reprodução do capital e das relações sociais estabelecidas” Mais adiante a autora ainda diz. “Essas fábricas recuperadas implicam outra proposta de organização e gestão do processo de trabalho, diferente daquela estabelecida pelo sistema capitalista. Trata-se da autogestão baseada nos valores e princípios do cooperativismo que aponta para condições de democracia, equidade, igualdade e solidariedade.” (Santos, 2007, p.83)

Com mais ou menos apelo ideológico, o fato é que o grande estopim para as primeiras iniciativas de união dos trabalhadores para assumir a gestão das fábricas foi mesmo a crescente ameaça de desemprego que naquele início de anos 90 não parava de crescer e que as medidas adotadas até então por governo, iniciativa privada e sindicatos não conseguiam estancar. A partir do insucesso de algumas políticas públicas para diminuir a situação de desemprego no país que já estavam em andamento ou que foram introduzidas na gestão Fernando Henrique Cardoso, como programas para recompor a capacidade competitiva do nosso parque industrial; Programa de tecnologia industrial básica, Programa Brasileiro de Design, Programa Brasileiro de Qualidade, ou de programas para a requalificação dos trabalhadores, como o Planfor, Programa Nacional de Qualificação do trabalho, os trabalhadores passam a ter de enfrentar o problema do desemprego por outras vias e os trabalhadores industriais, tradicionalmente um segmento mais organizado, começam então a buscar as suas próprias alternativas.

“Diferentemente da população historicamente excluída e marginalizada, que buscava conquistar seus direitos de cidadania, os trabalhadores industriais, desempregados e sem perspectivas concretas de reabsorção pelo sistema produtivo formal, constituíam uma classe organizada e instruída.” (Juvenal, 2006, p.116)

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disseminou-se no meio sindical, que encontrou ali uma alternativa para estancar e combater o desemprego crescente.

Azevedo e Gitahy (2003) resgatam a importância do movimento sindical para o processo de desenvolvimento das fábricas recuperadas e observam que uma das primeiras iniciativas do movimento sindical cutista a discutir o tema da autogestão foi o seminário “autogestão: a realização de um sonho” ocorrido em dezembro de 1994, no Rio grande do Sul. As autoras mencionam ainda que, em 1995, o terceiro congresso da confederação nacional dos metalúrgicos inclui em sua pauta o tema da autogestão e, no ano seguinte, promovem seminário nacional sobre o tema. Oda (2001) também nos ajuda a entender a importância que o sindicato teve no processo de constituição das fábricas recuperadas ao relatar que, em 1996, o sindicato dos metalúrgicos do ABC decide que sócios-trabalhadores de cooperativas metalúrgicas passariam a ser admitidos como sócios do sindicato, o que fez com que definitivamente o tema ganhasse espaço no sindicato. Ainda segundo as autoras, também em 1996, outro fato marca a relação entre sindicato e empresas autogeridas que é a criação, pela CUT, do programa Integrar, que visa a “desenvolver e planejar a formação profissional e resgatar as relações entre sindicato e trabalhadores desempregados”, tendo como um dos focos a reinserção dos trabalhadores a partir da experiência com empresas autogeridas.

Em 2000 a CUT cria, através de resolução, a União e solidariedade das Cooperativas do Estado de São Paulo (UNISOL cooperativas) e em 2002 A CUT decide pela criação da UNISOL Brasil (central de cooperativas e empreendimentos autogestionários do Brasil) que representaria as cooperativas de produção e serviços. Outra entidade que tem tido especial relevância no cenário de apoio e desenvolvimento do movimento de empresas autogestionárias no Brasil, é a ANTEAG. (Associação Nacional de Trabalhadores e Empresas de Autogestão) Segundo Marques (2006, 52) a criação da ANTEAG, em 1994, foi um marco no apoio e articulação das primeiras experiências de empresas recuperadas surgidas na década de noventa, dando visibilidade ao problema e buscando soluções para as empresas em processo de falência.

(29)

2.2. O processo de formação e desenvolvimento das fábricas recuperadas

Apesar das particularidades de cada empreendimento ocasionadas por diferenças no segmento de atuação, estilo de gestão dos antigos proprietários, localização, entre outras, a literatura tem mostrado que existem muitas características em comum entre as fábricas recuperadas, principalmente no que diz respeito ao seu ciclo de formação e desenvolvimento. Em trabalho de 2006, A diferença da igualdade: a dinâmica da economia solidária em quatro cidades do MERCOSUL, Cruz, caracteriza o ciclo econômico e sociopolítico pelo qual passam de maneira geral as empresas recuperadas. São 12 fases de um ciclo que o autor explica da seguinte maneira.

1) Atraso dos compromissos financeiros – O que caracteriza esta etapa do ciclo comum a diversas fábricas recuperadas é o atraso ou simplesmente o não cumprimento de compromissos financeiros tais como contribuições sociais trabalhistas, fisco, salários, bancos e fornecedores. Tais atrasos repetidos são, geralmente, o sintoma que desencadeia o processo de organização dos trabalhadores.

2) Organizações dos trabalhadores – Diferentes tipos de iniciativas de organização dos trabalhadores em prol de seus direitos serão empreendidas variando de acordo com a relação com o sindicato, do mercado de trabalho e do próprio histórico de mobilização dos trabalhadores.

3) Manobras legais e contábeis – Neste momento é comum, segundo o autor, as empresas buscarem manobras jurídicas tais como transferência de capital, descapitalização, etc. para tentar preservar o patrimônio dos proprietários.

4) Mobilização para ocupação da empresa – Ao longo deste processo os trabalhadores percebendo os seus direitos ameaçados e a iminente perda de seus postos de trabalho, busca a mobilização para ocupar a empresa e tomar para si a administração da mesma ao mesmo tempo em que buscam a articulação com a sociedade através de sindicatos, órgãos públicos e imprensa.

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6) Configuração jurídica – A configuração jurídica que irá resultar na posse por parte dos trabalhadores do maquinário, edifícios, estoques, etc. irá variar de acordo com a legislação vigente no país.

7) Perdas de trabalhadores – Durante o processo muitos trabalhadores abandonam a organização coletiva e por diversas razões como conflitos internos, desalento, obtenção de emprego, interesse na indenização, etc. buscam os seus próprios interesses particulares, desmobilizando em parte o movimento.

8) Recolocar a fábrica em funcionamento – Resolvida a questão jurídica os trabalhadores tem de correr atrás de contatos com fornecedores e clientes, organizar a gestão, obter crédito para remontar estoques e manutenção do maquinário, substituição de trabalhadores que deixaram o movimento, para então colocar novamente a fábrica em operação.

9) Conflitos internos – Geralmente neste início, e em muitos casos, durante um longo período de tempo estabelecem-se uma série de conflitos internos em decorrência de discussões sobre a escolha de quem administrará a empresa, processo de tomada de decisão, nível de autonomia, código de conduta entre outros aspectos de gestão.

10) Reconquista do mercado – É também neste início de operação que as empresas devem passar pela dura missão de reconquistar o mercado que perdeu a confiança na capacidade de entrega da empresa durante o período de crise que culminou com a ocupação dos trabalhadores, além de também ter de lutar contra a desconfiança de serem administrados pelos próprios trabalhadores.

11) Auxílio técnico – O autor lembra ainda que os trabalhadores costumam neste momento se socorrer de auxílio técnico em universidades, sindicatos, organizações sem fins lucrativos, consultores conhecidos ou indicados para resolver questões de gestão que até então não haviam sido sanadas.

(31)

suficientes para permitir uma rotina produtiva caracterizada pelo controle coletivo das ações administrativas e pela existência de espaços baseados na apropriação coletiva e efetiva da empresa pelo conjunto dos trabalhadores (Cruz, 2006, p. 193-195)

2.3. O modelo de negócio das fábricas recuperadas

Como vimos até aqui algumas características têm sido identificadas como comuns na estrutura das fábricas recuperadas, e de uma forma geral podemos também perceber que o seu modelo de negócio guarda alguns elementos comuns. O histórico de dificuldades financeiras e de relacionamento com o mercado que antecedeu a ocupação das empresas traz uma série de consequências para o negócio destas empresas que acabam por influir na sua maneira de operar.

“O fato das empresas oriundas de massa falida já estarem inseridas no mercado e esse conhecer a qualidade do produto oferecido por elas, muitas vezes pode se apresentar como um gargalo devido ao atraso do pagamento no caso dos fornecedores, ou o não cumprimento de prazos no caso dos clientes. O volume da produção também é outro problema, pois normalmente as empresas autogeridas, devido às dívidas assumidas e à falta de crédito, não conseguem bons prazos com os fornecedores, e a redução do quadro de trabalhadores contribui para a queda na escala de produção.”

(Azevedo, 2003, p. 5)

(32)

“Existem algumas variáveis que as (fábricas recuperadas) diferenciam como a transparência na gestão, maior participação e comprometimento do trabalhador, desenvolvimento de competências em proveito da empresa, o aperfeiçoamento da qualidade, o estímulo á criatividade dos cooperados na inovação de produtos e processos e a busca da eficiência através da cooperação.” (Gitahy e Azevedo, 2007, p.20)

A capacidade de seus trabalhadores de se adaptar a necessidade do cliente, a partir de processos flexíveis de trabalho parece ser uma marca importante deste tipo de empreendimento que é forjado em meio a uma série de imprevistos e enormes adversidades, transformando então estas adversidades em uma de suas forças no mercado.

“A competitividade de um empreendimento autogestionário parece ser conferida pela capacidade de seus trabalhadores de ajustarem-se às necessidades do mercado. A produção de uma empresa recuperada, até mesmo por sua limitação de acesso ao capital, caracteriza-se basicamente, pelo baixo custo e pela flexibilidade.” (Juvenal, 2006, p.122)

Outra vantagem competitiva que tais empreendimentos utilizam como forma de ganhar mercado e abrir espaço entre a concorrência é a sua capacidade de conseguir o comprometimento e o engajamento dos trabalhadores em relação aos objetivos organizacionais, que também são os seus objetivos, uma vez que todos participam como donos das empresas. Engajamento e comprometimento que ganham importância em ambientes organizacionais em que a flexibilidade e customização são os grandes direcionadores estratégicos.

Tais empreendimentos encontram potencialmente no trabalho coletivo e na motivação dos trabalhadores que os compõe, uma importante fonte de competitividade reconhecida no capitalismo contemporâneo. Enquanto no fordismo a competitividade é obtida através de economias de escala e de uma crescente divisão e alienação do trabalho associadas a linhas produtivas rígidas automatizadas ou não – na nova base técnica que está se configurando, uma importante fonte de eficiência é a flexibilização.” (Tauile e Debaco, 2002 p. 2)

A alta demanda por flexibilidade de um mercado com necessidades de

customização encontra na ágil forma de organização e “desorganização” dos

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seu mercado consumidor no sentido de tentar fazer com que o mercado se adapte à realidade da empresa, pelo contrário, o que vemos é uma enorme capacidade de reinvenção contínua que têm estes empreendimentos, sendo capazes de alterar todo o seu ciclo de produção para entregar o que o mercado quer, ou em outras palavras, para entregar o que eles conseguiram vender.

Quanto aos antigos mecanismos que controlavam a locomoção, também foram eles modificados. Hoje o espaço continua a definir a função, porém o trabalhador não está confinado a um só espaço. Os trabalhadores possuem flexibilidade em sua movimentação pelo espaço-função, permanecendo em constante realocação não pré-planejada, mas sim, agenciada segundo as demandas contingenciais.” (Costa, Luis, Tittoni, Jaqueline, 2008, p. 451)

Outro ponto forte que as empresas autogeridas têm conseguido, e que se reverte em redução de custos ou ganhos de produtividade, diz respeito aos ganhos de processo, uma vez que grande parte dos conhecimentos tácitos presentes na equipe remanescente se refere à esfera da produção. As pesquisas recentes tem mostrado que quanto mais os trabalhadores das fábricas recuperadas participam do processo de decisão sobre os processos de trabalho, mais ganhos conseguem.

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A tabela abaixo, 2.3.1. abaixo ilustra as principais estratégias de negócio destas organizações.

Fordismo Pós - fordismo

- Competição por preços - Competições por inovações

- Trabalho como custo - Trabalho como recurso

-Fragmentação das habilidades do

trabalhador

- Trabalhador com múltiplas habilidades

-Separação do trabalho no ambiente intrafirma

- Integração do trabalho no ambiente intrafirma

-Economias de escola - Economias de escopo

Autogestão

- Competição por preços - Trabalho como recurso

- Trabalhador com múltiplas habilidades - Integração do trabalho no ambiente intrafirma

Fonte. Juvenal, 2006.

Ao que nos parece, as fábricas recuperadas têm encontrado um modelo de negócio que se baseia na flexibilidade (flexibilidade para atender as necessidades do cliente em termos de prazos e produtos e também para modificar seus processos internos para atender tais demandas) como sua principal estratégia competitiva, modelo este que nasceu de forma emergente, e que aos poucos vai se aperfeiçoando. Assim, o modelo de autogestão que traz os trabalhadores para a arena principal no processo de tomada de decisão sobre os processos de produção se mostra bastante adequado do ponto de vista do negócio, que estimula tal flexibilidade também nos trabalhadores. É bem verdade que tal exigência de flexibilidade pode trazer efeitos negativos para o trabalhador, como nos apontam os autores abaixo mencionados:

(35)

A grande flexibilidade da empresa e sua capacidade de improviso, possibilitadas pelo engajamento dos profissionais, trazem ganhos para a empresa que se posiciona no mercado como fornecedor ágil e versátil, mas também pode trazer dificuldades para a saúde do trabalhador no que diz respeito ao excesso de improviso imposto a sua carga de trabalho. O que nos leva a crer que as fábricas recuperadas parecem estar encontrando um caminho para viabilizar o seu negócio, mas que ainda há espaço para repensar as relações de trabalho do ponto de vista da saúde do trabalhador. Talvez este seja ainda um reflexo de um movimento que traz a semente da possibilidade de colocar o trabalhador em primeiro plano, mas que ainda carrega raízes do sistema de produção de base capitalista, utilizando as técnicas e tecnologias desenvolvidas neste contexto sem a devida reformulação das mesmas para atender agora aos objetivos do trabalhador e não do capital. O presente trabalho se insere exatamente neste ponto, buscando lançar o olhar da psicologia social do trabalho e das organizações sobre o processo de gestão de pessoas nas fábricas recuperadas, buscando um formato pensado especificamente para o contexto das fábricas recuperadas que coloque o trabalho a serviço da saúde do trabalhador.

2.4. O modelo de gestão nas fábricas recuperadas

Vimos que o modelo de gestão das fábricas recuperadas que permite maior participação do trabalhador no processo decisório e consegue maior engajamento deste para com os objetivos organizacionais tem sido um importante alicerce de competitividade destas empresas. A ideia aqui é nos aprofundarmos um pouco mais nesta questão e entender se este modelo de gestão participativo trás ganhos para o trabalhador ou se o modelo é apenas uma vantagem competitiva da empresa enquanto estratégia de negócio.

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1960, que vão desde políticas de estímulo à participação do trabalhador nas decisões de assuntos marginais até a participação nos lucros e resultados, são, na verdade, uma ‘pseudoparticipação’, pois quem de fato participa e controla a produção nesta nova fase de acumulação é o capital financeiro.” (Novaes, 2007, p.37)

Neste sentido, Novaes argumenta que o modelo autogestionário das empresas recuperadas, significa avanço no que diz respeito ao nível decisório em que a participação se efetiva. Enquanto no primeiro modelo a participação dos trabalhadores só ocorra em relação aos níveis mais baixos em que as decisões de rotinas são tomadas, no segundo modelo o trabalhador tem a possibilidade de participar de decisões de alto nível, ou estratégicas, em que as decisões mais importantes da empresa e que vão impactá-la por um longo período são tomadas. Trata-se aqui de fazermos uma discussão sobre se o trabalhador tem a possibilidade de fazer o que

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Tabela 2.4.1.

Modelo flexível Empresa autogestionária

Grau de control e dos partici pantes

Os CCQ são praticamente elementos de consulta. Não tem poder de implantar soluções e nem participam das discussões sobre tomada de decisão a respeito da sugestão. Internamente ao funcionamento do círculo, procura-se um consenso. Porém deve ser ressaltado que a procura do consenso não invalida a estrutura informal do poder; a opinião dos líderes ou detentores do poder tende a prevalecer.

Vai além da simples consulta: os setores têm poder para implantar as sugestões (ou ao

menos, encaminhar as

sugestões para a decisão do coletivo) e não é cultivada a ideia de que prevaleça a opinião do coordenador da reunião.

Escop o de decisã o

É limitado, pois os círculos não decidem e se refere praticamente a melhorias no processo de trabalho. Prêmios, salários, cargos não são discutidos, e muito menos políticas de investimentos ou estratégia da empresa.

Os cooperados podem

influenciar tanto nas questões relativas ao trabalho e a

produção, quanto nas

questões mais estratégicas da cooperativa.

Forma de atuaçã o

O CCQ atua em nível de local de trabalho, num nível organizacional baixo. Não há nenhuma influência direta em nível de diretoria ou holding

Os cooperados podem

influenciar nas decisões do conselho de administração

Fonte: Tabela construída por Azevedo. A, 2003, a partir da experiência da Cooperfor (Oda 2001) e Salermo (1985).

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Se um grupo acredita que salvar postos de trabalho ou sobreviver no capitalismo não abala o sistema, outros afirmariam que – mesmo sem explicitar uma bandeira que indicaria a necessidade de uma transição socialista, e, portanto, estando inconscientes sobre o que estão fazendo – estes trabalhadores estão ajudando a construir o socialismo na America latina.”

Mais adiante ele diz:

“Mesmo que as iniciativas autogestionárias sejam oriundas das forças das circunstâncias e não de um movimento de resistência dos trabalhadores para com o modo de produção capitalista, há certa adesão dos trabalhadores com a nova proposta que implica outro comportamento e novas relações de trabalho.” (Novaes, 2007b, p.08)

No entanto, não é consenso dentro da literatura recente que o sistema de gestão das fábricas recuperadas tenha trazido avanços significativos no que diz respeito à saúde do trabalhador, talvez por ainda não conseguir aproveitar a oportunidade que a nova forma de gestão oferece por deficiências de formação como aponta o próprio Novaes (2007).

“Apesar de percebermos que há nas cooperativas maiores possibilidades de participação dos trabalhadores no processo decisório, por um lado, os trabalhadores não detém o conhecimento técnico necessário para sugerir mudanças nos rumos das cooperativas”. (Novaes, 2007b, p.15)

Ou mesmo pelo tema saúde do trabalhador não estar na pauta de prioridades do movimento, que ainda se preocupa muito mais com os aspectos relacionados ao negócio, ou seja, as decisões se baseiam mais no quanto irão beneficiar a produção do que o quanto irão beneficiar os trabalhadores.

“A participação dos sócios-trabalhadores na organização da produção e do trabalho deve ser dirigida para o alcance da melhoria no desempenho das cooperativas, mas as questões como segurança no trabalho, ritmo e intensidade do trabalho, qualificação profissional, dentre outras, que dizem respeito às condições de trabalho não foram abordadas por eles.” (Novaes, 2007b, p. 04)

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