Cimento, no sentido geral da palavra, pode ser descrito como um material com pro- priedades adesivas e coesivas que o fazem capaz de unir fragmentos minerais na forma de uma unidade compacta. Essa definição abrange uma grande variedade de materiais cimentícios.
Na área da construção, o significado do termo “cimento” é restrito a materiais aglomerantes utilizados com pedras, areia, tijolos, blocos para alvenaria, etc. Os prin- cipais constituintes desse tipo de cimento são compostos de calcário, de modo que, em engenharia civil e construções, o interesse é o cimento à base de calcário. Visto que rea- gem quimicamente com a água, os cimentos para a produção de concreto têm a proprie- dade de reagir e endurecer sob a água, sendo, então, denominados cimentos hidráulicos.
Os cimentos hidráulicos são constituídos principalmente de silicatos e alumina- tos de cálcio e podem ser classificados, de maneira geral, como cimentos naturais, ci- mentos Portland e cimentos aluminosos. Este capítulo aborda a fabricação do cimento Portland, sua estrutura e suas propriedades, tanto no estado anidro quanto no estado endurecido. Os diferentes tipos de cimento são tratados no Capítulo 2.
Histórico
A utilização de materiais cimentícios é bastante antiga. Os antigos Egípcios utilizavam gesso impuro. Os Gregos e os Romanos utilizavam calcário calcinado e, mais tarde, aprenderam a adicionar areia e pedra fragmentada ou fragmentos de tijolos ou telhas ao calcário e à água. Esse foi o primeiro concreto da história. A argamassa de cal não endurece sob a água e, para construções submersas, os Romanos moíam a cal em con- junto com cinza vulcânica ou telhas de barro cozido finamente moídas. A sílica e a alu- mina contidas na cinza e os fragmentos de telha reagiam com a cal e produziam o que se tornou conhecido como cimento pozolânico, devido ao nome da cidade de Pozzuoli, próxima ao monte Vesúvio, onde as cinzas foram inicialmente encontradas. O nome
“cimento pozolânico” é utilizado até hoje para descrever cimentos obtidos pela sim- ples moagem de materiais naturais em temperaturas ambientes. Algumas estruturas em que a alvenaria foi assentada com argamassa, como o Coliseu, em Roma, e a Pont du Gard, próxima a Nimes, e estruturas de concreto, como o Panteão, em Roma, resistem até os dias atuais, com o material cimentício ainda firme. Nas ruínas de Pompeia, a argamassa foi menos deteriorada pelo clima do que as rochas brandas.
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Cimento Portland
A Idade Média trouxe um declínio geral da qualidade e do uso do cimento, e so- mente no século XVIII ocorreram avanços no conhecimento sobre o material. John Smeaton, encarregado, em 1756, da reconstrução do Farol de Eddystone (situado ao largo da costa de Cornish), descobriu que a melhor argamassa era obtida quando a pozolana era misturada com calcário contendo elevado teor de material argiloso. Ao reconhecer o papel da argila, até então considerada como indesejável, Smeaton foi o primeiro a identificar as propriedades químicas da cal hidráulica, o material obtido pela calcinação de uma mistura de calcário e argila.
Outros cimentos hidráulicos foram desenvolvidos na sequência, como o “cimento Romano”, obtido por James Parker por meio da calcinação de nódulos de calcário argiloso, até culminar na patente para “cimento Portland”, obtida por Joseph Aspdin, pedreiro e construtor, em 1824. Esse cimento era preparado pelo aquecimento de uma mistura de argila finamente moída e calcário em um forno até a extinção do CO
2, que ocorre em temperatura bastante inferior à necessária para a clinquerização. O protótipo do cimento moderno foi produzido em 1845 por Isaac Johnson ao calcinar uma mistura de argila e giz até a clinquerização, de modo que ocorressem as reações necessárias à formação de compostos de alta capacidade cimentante.
O nome “cimento Portland”, atribuído originalmente devido à semelhança em cor e qualidade do cimento endurecido com a pedra de Portland (um calcário extraído em Dorset), é utilizado até hoje, em todo o mundo, para descrever o cimento obtido pela queima, à temperatura de clinquerização, de uma mistura íntima de materiais calcários e argilosos ou de outros materiais que contenham sílica, alumina e óxidos de ferro e pela posterior moagem do clínquer resultante. A definição de cimento Portland em várias nor- mas segue esse princípio, incluindo o sulfato de cálcio adicionado após a queima. Atual- mente, outros materiais também podem ser adicionados ou misturados (ver página 65).
Fabricação do cimento Portland
Pela definição de cimento Portland, dada anteriormente, deduz-se que ele é constituído principalmente de material calcário, como a rocha calcária ou o giz, e de alumina e sílica encontradas em argilas ou folhelhos. A marga, uma mistura de materiais argilosos e calcários, também é utilizada. As matérias-primas para a produção do cimento Portland são encontradas em praticamente todos os países, e existem fábricas em todo o mundo.
O processo de fabricação do cimento consiste essencialmente na moagem da matéria-prima, na sua mistura íntima em determinadas proporções e na queima (a temperaturas de até cerca de 1.450 °C) em grandes fornos rotativos, onde o material é sinterizado e parcialmente fundido, tomando a forma de esferas conhecidas como clín- queres. O clínquer é resfriado e recebe a adição de um pequeno teor de sulfato de cálcio, sendo então moído até se tornar um pó bastante fino. O material resultante é o cimento Portland, tão utilizado em todo o mundo.
Alguns detalhes da fabricação do cimento serão apresentados e podem ser mais bem acompanhados tomando como referência a representação esquemática mostrada na Figura 1.1.
A mistura e a moagem das matérias-primas podem ser feitas tanto em condição
úmida quanto seca, originando as denominações de processo “por via seca” e “por
via úmida”. Os métodos de fabricação dependem, na realidade, tanto da dureza das
matérias-primas como de seu teor de umidade.
Inicialmente, será apresentado o processo por via úmida. Quando se utiliza giz, ele é fragmentado em pequenos pedaços e disperso em água em um moinho de lava- gem. Esse equipamento consiste em um tanque de forma circular que contém em seu interior braços giratórios onde estão acoplados garfos que fraturam os fragmentos de matéria-prima. A argila também é fragmentada, normalmente em um moinho similar, e misturada com água. As duas misturas são bombeadas em proporções predeterminadas e, após passar por uma série de peneiras, a pasta resultante é armazenada em tanques.
No caso da utilização de calcário, ele inicialmente é extraído por detonação e bri- tado, em geral com o uso de dois britadores de dimensões decrescentes. Em seguida, é conduzido, juntamente com argila dispersa em água, a um moinho de bolas, onde se completa a cominuição do calcário (a uma finura de farinha). A pasta resultante é bom- beada para tanques de armazenamento. A partir deste ponto, o processo é o mesmo, apesar da natureza diferente da matéria-prima.
A pasta é um líquido de consistência cremosa com teor de água entre 35 e 50%, e somente uma pequena fração do material (cerca de 2%) maior do que a peneira 90 μ m. Normalmente, existem vários tanques de armazenamento onde a sedimentação dos sólidos é prevenida por agitação mecânica ou insuflação de ar comprimido. O teor de calcário da pasta, conforme já mencionado, é controlado pela dosagem original dos materiais calcário e argiloso. O ajuste final para atingir a composição química requerida pode ser obtido pela mistura de pastas de diferentes tanques, às vezes com um complexo sistema de tanques de mistura. Eventualmente, como na fábrica mais setentrional do mundo, situada na Noruega, a matéria-prima é uma rocha com uma composição que lhe permite ser triturada sem necessidade de mistura.
A pasta, com o teor de calcário requerido, finalmente passa pelo forno rotatório. Tra- ta-se de um grande cilindro de aço, revestido com material refratário, com diâmetro de até 8 m, chegando ao comprimento de 230 m. O forno gira lentamente em torno de seu eixo, que apresenta uma pequena inclinação horizontal. Ele é alimentado com pasta por sua extremidade superior enquanto carvão pulverizado é insuflado em sua extremidade infe- rior, com a temperatura chegando a 1.450 °C. O carvão, que não deve conter teor muito elevado de cinza, merece atenção especial, pois geralmente são necessários 220 kg de car- vão para a produção de uma tonelada de cimento, fato que deve ser lembrado quando se pesquisa o preço do cimento. Óleo (cerca de 125 litros por tonelada de cimento) ou gás na- tural também são utilizados, mas desde os anos de 1980 a maior parte das fábricas à base de óleo foi convertida para fábricas à base de carvão, que é de longe o combustível mais utilizado na maioria dos países. Deve ser ressaltado que, em função de ser queimado no forno, o carvão com elevado teor de enxofre pode ser utilizado sem emissões prejudiciais.
Conforme a pasta se movimenta no forno, encontra temperaturas progressivamen-
te mais elevadas. Inicialmente, a água é evaporada e o CO
2liberado. Em seguida, o ma-
terial seco passa por uma série de reações químicas até que, finalmente, na parte mais
quente do forno, ocorrem a fusão de 20 a 30% do material e as reações entre o calcário,
a sílica e a alumina. A massa se funde em esferas de 3 a 25 mm de diâmetro, denomina-
das clínqueres. O clínquer segue para resfriadores, que podem ser de vários tipos e fre-
quentemente possibilitam a troca de calor com o ar que será utilizado para a combustão
do carvão pulverizado. O forno deve funcionar ininterruptamente, garantindo um re-
gime contínuo e, com isso, a uniformidade do clínquer, além de reduzir a deterioração
do revestimento refratário. Deve ser destacado que a temperatura da chama chega a
a) Pr ocesso por via úmida
Ar gila Água Água Mistur a
Giz T anque de pasta F orno r ota ti v o
Filtr o eletr ostá tico R etorno de pó ao pr ocesso
Moinho de lavagemPasta calcária
Moinho de lavagem
F orno r ota tório Zona de queima Ar frio R esfriador de clínquer
Carv ão pulv erizado Sulfa to de cálcio Moinho de bolas
Silo de cimento Ensacamento
T remonhas T ransporte a gr anel
Calcário Britador
Ar gila Moinho de bolas R etorno de pó ao pr ocesso
Filtr os eletr ostá ticos Pr é-aquecedor de farinha crua Calor Queimador de leito fluidizado
Forno rotatório Silo de farinha crua