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Cimento Portland. Histórico

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Academic year: 2021

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Cimento, no sentido geral da palavra, pode ser descrito como um material com pro- priedades adesivas e coesivas que o fazem capaz de unir fragmentos minerais na forma de uma unidade compacta. Essa definição abrange uma grande variedade de materiais cimentícios.

Na área da construção, o significado do termo “cimento” é restrito a materiais aglomerantes utilizados com pedras, areia, tijolos, blocos para alvenaria, etc. Os prin- cipais constituintes desse tipo de cimento são compostos de calcário, de modo que, em engenharia civil e construções, o interesse é o cimento à base de calcário. Visto que rea- gem quimicamente com a água, os cimentos para a produção de concreto têm a proprie- dade de reagir e endurecer sob a água, sendo, então, denominados cimentos hidráulicos.

Os cimentos hidráulicos são constituídos principalmente de silicatos e alumina- tos de cálcio e podem ser classificados, de maneira geral, como cimentos naturais, ci- mentos Portland e cimentos aluminosos. Este capítulo aborda a fabricação do cimento Portland, sua estrutura e suas propriedades, tanto no estado anidro quanto no estado endurecido. Os diferentes tipos de cimento são tratados no Capítulo 2.

Histórico

A utilização de materiais cimentícios é bastante antiga. Os antigos Egípcios utilizavam gesso impuro. Os Gregos e os Romanos utilizavam calcário calcinado e, mais tarde, aprenderam a adicionar areia e pedra fragmentada ou fragmentos de tijolos ou telhas ao calcário e à água. Esse foi o primeiro concreto da história. A argamassa de cal não endurece sob a água e, para construções submersas, os Romanos moíam a cal em con- junto com cinza vulcânica ou telhas de barro cozido finamente moídas. A sílica e a alu- mina contidas na cinza e os fragmentos de telha reagiam com a cal e produziam o que se tornou conhecido como cimento pozolânico, devido ao nome da cidade de Pozzuoli, próxima ao monte Vesúvio, onde as cinzas foram inicialmente encontradas. O nome

“cimento pozolânico” é utilizado até hoje para descrever cimentos obtidos pela sim- ples moagem de materiais naturais em temperaturas ambientes. Algumas estruturas em que a alvenaria foi assentada com argamassa, como o Coliseu, em Roma, e a Pont du Gard, próxima a Nimes, e estruturas de concreto, como o Panteão, em Roma, resistem até os dias atuais, com o material cimentício ainda firme. Nas ruínas de Pompeia, a argamassa foi menos deteriorada pelo clima do que as rochas brandas.

1

Cimento Portland

(2)

A Idade Média trouxe um declínio geral da qualidade e do uso do cimento, e so- mente no século XVIII ocorreram avanços no conhecimento sobre o material. John Smeaton, encarregado, em 1756, da reconstrução do Farol de Eddystone (situado ao largo da costa de Cornish), descobriu que a melhor argamassa era obtida quando a pozolana era misturada com calcário contendo elevado teor de material argiloso. Ao reconhecer o papel da argila, até então considerada como indesejável, Smeaton foi o primeiro a identificar as propriedades químicas da cal hidráulica, o material obtido pela calcinação de uma mistura de calcário e argila.

Outros cimentos hidráulicos foram desenvolvidos na sequência, como o “cimento Romano”, obtido por James Parker por meio da calcinação de nódulos de calcário argiloso, até culminar na patente para “cimento Portland”, obtida por Joseph Aspdin, pedreiro e construtor, em 1824. Esse cimento era preparado pelo aquecimento de uma mistura de argila finamente moída e calcário em um forno até a extinção do CO

2

, que ocorre em temperatura bastante inferior à necessária para a clinquerização. O protótipo do cimento moderno foi produzido em 1845 por Isaac Johnson ao calcinar uma mistura de argila e giz até a clinquerização, de modo que ocorressem as reações necessárias à formação de compostos de alta capacidade cimentante.

O nome “cimento Portland”, atribuído originalmente devido à semelhança em cor e qualidade do cimento endurecido com a pedra de Portland (um calcário extraído em Dorset), é utilizado até hoje, em todo o mundo, para descrever o cimento obtido pela queima, à temperatura de clinquerização, de uma mistura íntima de materiais calcários e argilosos ou de outros materiais que contenham sílica, alumina e óxidos de ferro e pela posterior moagem do clínquer resultante. A definição de cimento Portland em várias nor- mas segue esse princípio, incluindo o sulfato de cálcio adicionado após a queima. Atual- mente, outros materiais também podem ser adicionados ou misturados (ver página 65).

Fabricação do cimento Portland

Pela definição de cimento Portland, dada anteriormente, deduz-se que ele é constituído principalmente de material calcário, como a rocha calcária ou o giz, e de alumina e sílica encontradas em argilas ou folhelhos. A marga, uma mistura de materiais argilosos e calcários, também é utilizada. As matérias-primas para a produção do cimento Portland são encontradas em praticamente todos os países, e existem fábricas em todo o mundo.

O processo de fabricação do cimento consiste essencialmente na moagem da matéria-prima, na sua mistura íntima em determinadas proporções e na queima (a temperaturas de até cerca de 1.450 °C) em grandes fornos rotativos, onde o material é sinterizado e parcialmente fundido, tomando a forma de esferas conhecidas como clín- queres. O clínquer é resfriado e recebe a adição de um pequeno teor de sulfato de cálcio, sendo então moído até se tornar um pó bastante fino. O material resultante é o cimento Portland, tão utilizado em todo o mundo.

Alguns detalhes da fabricação do cimento serão apresentados e podem ser mais bem acompanhados tomando como referência a representação esquemática mostrada na Figura 1.1.

A mistura e a moagem das matérias-primas podem ser feitas tanto em condição

úmida quanto seca, originando as denominações de processo “por via seca” e “por

via úmida”. Os métodos de fabricação dependem, na realidade, tanto da dureza das

matérias-primas como de seu teor de umidade.

(3)

Inicialmente, será apresentado o processo por via úmida. Quando se utiliza giz, ele é fragmentado em pequenos pedaços e disperso em água em um moinho de lava- gem. Esse equipamento consiste em um tanque de forma circular que contém em seu interior braços giratórios onde estão acoplados garfos que fraturam os fragmentos de matéria-prima. A argila também é fragmentada, normalmente em um moinho similar, e misturada com água. As duas misturas são bombeadas em proporções predeterminadas e, após passar por uma série de peneiras, a pasta resultante é armazenada em tanques.

No caso da utilização de calcário, ele inicialmente é extraído por detonação e bri- tado, em geral com o uso de dois britadores de dimensões decrescentes. Em seguida, é conduzido, juntamente com argila dispersa em água, a um moinho de bolas, onde se completa a cominuição do calcário (a uma finura de farinha). A pasta resultante é bom- beada para tanques de armazenamento. A partir deste ponto, o processo é o mesmo, apesar da natureza diferente da matéria-prima.

A pasta é um líquido de consistência cremosa com teor de água entre 35 e 50%, e somente uma pequena fração do material (cerca de 2%) maior do que a peneira 90 μ m. Normalmente, existem vários tanques de armazenamento onde a sedimentação dos sólidos é prevenida por agitação mecânica ou insuflação de ar comprimido. O teor de calcário da pasta, conforme já mencionado, é controlado pela dosagem original dos materiais calcário e argiloso. O ajuste final para atingir a composição química requerida pode ser obtido pela mistura de pastas de diferentes tanques, às vezes com um complexo sistema de tanques de mistura. Eventualmente, como na fábrica mais setentrional do mundo, situada na Noruega, a matéria-prima é uma rocha com uma composição que lhe permite ser triturada sem necessidade de mistura.

A pasta, com o teor de calcário requerido, finalmente passa pelo forno rotatório. Tra- ta-se de um grande cilindro de aço, revestido com material refratário, com diâmetro de até 8 m, chegando ao comprimento de 230 m. O forno gira lentamente em torno de seu eixo, que apresenta uma pequena inclinação horizontal. Ele é alimentado com pasta por sua extremidade superior enquanto carvão pulverizado é insuflado em sua extremidade infe- rior, com a temperatura chegando a 1.450 °C. O carvão, que não deve conter teor muito elevado de cinza, merece atenção especial, pois geralmente são necessários 220 kg de car- vão para a produção de uma tonelada de cimento, fato que deve ser lembrado quando se pesquisa o preço do cimento. Óleo (cerca de 125 litros por tonelada de cimento) ou gás na- tural também são utilizados, mas desde os anos de 1980 a maior parte das fábricas à base de óleo foi convertida para fábricas à base de carvão, que é de longe o combustível mais utilizado na maioria dos países. Deve ser ressaltado que, em função de ser queimado no forno, o carvão com elevado teor de enxofre pode ser utilizado sem emissões prejudiciais.

Conforme a pasta se movimenta no forno, encontra temperaturas progressivamen-

te mais elevadas. Inicialmente, a água é evaporada e o CO

2

liberado. Em seguida, o ma-

terial seco passa por uma série de reações químicas até que, finalmente, na parte mais

quente do forno, ocorrem a fusão de 20 a 30% do material e as reações entre o calcário,

a sílica e a alumina. A massa se funde em esferas de 3 a 25 mm de diâmetro, denomina-

das clínqueres. O clínquer segue para resfriadores, que podem ser de vários tipos e fre-

quentemente possibilitam a troca de calor com o ar que será utilizado para a combustão

do carvão pulverizado. O forno deve funcionar ininterruptamente, garantindo um re-

gime contínuo e, com isso, a uniformidade do clínquer, além de reduzir a deterioração

do revestimento refratário. Deve ser destacado que a temperatura da chama chega a

(4)

a) Pr ocesso por via úmida

Ar gila Água Água Mistur a

Giz T anque de pasta F orno r ota ti v o

Filtr o eletr ostá tico R etorno de pó ao pr ocesso

Moinho de lavagem

Pasta calcária

Moinho de lavagem

F orno r ota tório Zona de queima Ar frio R esfriador de clínquer

Carv ão pulv erizado Sulfa to de cálcio Moinho de bolas

Silo de cimento Ensacamento

T remonhas T ransporte a gr anel

(5)

Calcário Britador

Ar gila Moinho de bolas R etorno de pó ao pr ocesso

Filtr os eletr ostá ticos Pr é-aquecedor de farinha crua Calor Queimador de leito fluidizado

Forno rotatório Silo de farinha crua

Mistur a b) Pr ocesso por via seca

Flux o de pr odução Flux o de gases F orno r ota tório R esfriador de clínquer Ar frio

Zona de queima

Carv ão pulv erizado Sulfa to de cálcio Silo de cimento T remonhas Ensacamento T ransporte a gr anel

Moinho de bolas Figur a 1 .1 Repr esent ação esquemática de: a ) pr ocesso por via úmida e b ) pr ocesso por via seca da f abricação de cimento .

(6)

1.650 °C. No processo por via úmida, o maior forno existente produz 3.600 toneladas de clínquer por dia. Como a produção do cimento pelo processo por via úmida resulta em elevado consumo de energia, não são mais construídas fábricas com esse processo.

No processo por via seca ou semisseca, as matérias-primas são britadas e levadas nas proporções corretas a um moinho, onde são secas e reduzidas à dimensão de um pó fino. Esse pó, denominado farinha crua, é bombeado para um silo de mistura, onde é realizado o ajuste final da proporção dos materiais, necessário à fabricação do cimento.

Para obter uma mistura íntima e uniforme, a farinha crua normalmente é misturada com o uso de ar comprimido, o que produz um movimento ascendente do pó e reduz sua massa unitária. O ar é bombeado para um quadrante do silo de cada vez, fazendo os materiais de maior massa unitária dos quadrantes não atingidos pelo ar se desloca- rem lateralmente para o quadrante em aeração. Desse modo, o material aerado tende a se comportar praticamente como um fluido, e, pela aeração de cada um dos quadrantes, em um período aproximado de uma hora, obtém-se uma mistura uniforme. A mistura contínua é utilizada em algumas fábricas.

Nesse processo, a mistura é peneirada e levada a um disco denominado granulador, sendo adicionados, simultaneamente, cerca de 12% de água em relação à sua massa. O resultado desse processo são péletes duros com diâmetro de aproximadamente 15 mm.

Essa operação é necessária porque, se a farinha fria for levada diretamente ao forno, não possibilitará o fluxo de ar e a troca de calor necessária às reações químicas para a formação do clínquer.

Os péletes são aquecidos em uma grelha pré-aquecida pelos gases do forno, então, vão ao forno. As operações seguintes são as mesmas das do processo por via úmida.

Como o teor de umidade dos péletes no processo via semisseca gira em torno de meros 12%, se comparados aos 40% do processo por via úmida, o forno é consideravelmente menor. A quantidade de calor requerida também é muito menor, já que somente 12% de água precisam ser retirados, mas ainda é necessária uma quantidade adicional de calor para a retirada da umidade original das matérias-primas (normalmente entre 6 e 10%).

O processo é, portanto, econômico, desde que as matérias-primas estejam relativamente secas. Nesses casos, o consumo total de carvão pode ser da ordem de apenas 100 kg por tonelada de cimento.

No processo por via seca (ver Figura 1.1b), a farinha crua, que tem um teor de umi- dade na faixa de 0,2%, é passada por um pré-aquecedor, em geral do tipo suspensão, o que significa dizer que as partículas da farinha crua estão em suspensão nos gases ascendentes. A farinha crua é aquecida até cerca de 800 °C antes de ser levada ao forno.

Por não existir umidade a ser retirada da farinha crua e por seu prévio aquecimento, o forno pode ser menor do que no processo por via úmida. O pré-aquecimento utiliza os gases quentes que saem do forno e, como o gás contém um significativo teor de álcalis voláteis (ver página 9) e cloretos, parte dele deve ser purgada para garantir que o teor de álcalis do cimento não seja muito elevado.

A maior parte da farinha crua pode ser passada por um queimador de leito fluidi- zado (usando uma fonte de calor separada), existente entre o pré-aquecedor e o forno.

A temperatura no queimador fluidizado gira em torno de 820 °C e é estável, de modo que a calcinação é uniforme e a eficiência da troca de calor é elevada.

Uma parte da farinha crua é levada diretamente ao forno, mas o efeito principal do

queimador fluidizado é aumentar a descarbonatação (dissociação do CaCO

3

) da farinha

(7)

crua antes da entrada no forno, aumentando, assim, o rendimento deste. A fábrica que provavelmente é a maior do mundo no processo por via seca produz 10.000 toneladas de clínquer por dia, em um forno de 6,2 m de diâmetro e 105 m de comprimento. Nos Estados Unidos, mais de 80% da produção do cimento ocorre por meio do processo por via seca.

Deve ser destacado que o processo exige uma mistura íntima das matérias-primas, pois parte das reações no forno ocorre por difusão na matéria sólida, sendo essencial uma distribuição uniforme dos materiais para a garantia da qualidade do produto.

Na saída do forno, independentemente do tipo de processo, o clínquer é resfriado, e o calor é utilizado para o pré-aquecimento do ar de combustão. O clínquer resfriado, carac- teristicamente de cor preta, brilhante e duro, é moído em conjunto com sulfato de cálcio para evitar a pega instantânea do cimento. A moagem é realizada em um moinho de bolas que consiste em vários compartimentos com esferas de aço progressivamente menores. Em algumas situações, a farinha previamente passa por um moinho de rolos. Na maioria das fábricas, é utilizado um circuito fechado de moagem: o cimento descarregado do moinho passa por um separador, e as partículas finas são removidas para o silo de estocagem por fluxo de ar, enquanto as partículas maiores são novamente passadas pelo moinho. O cir- cuito fechado de moagem evita a produção de uma quantidade excessiva de material muito fino ou de uma pequena quantidade de material muito grosso, falhas frequentemente ob- servadas em circuitos abertos de moagem. Agentes de moagem como o etilenoglicol ou o propilenoglicol são utilizados em pequenas quantidades. Massazza & Testolin

1.90

fornecem informações sobre os agentes de moagem. O desempenho do moinho de bolas pode ser aumentado pela pré-moagem do clínquer em britadores de impacto horizontal.

Após o cimento ter sido adequadamente moído, ou seja, quando tiver cerca de 1,1 × 10

12

partículas por kg, ele estará pronto para ser transportado a granel. Menos comu- mente, o cimento é embalado em sacos ou tambores, mas alguns tipos de cimento, como o branco, o hidrófugo, o expansivo, o de pega controlada, o para poços de petróleo e o aluminoso, são sempre embalados em sacos ou tambores. Um saco padrão no Reino Unido contém 50 kg de cimento, enquanto nos Estados Unidos um saco pesa 42,6 kg.

Outros tamanhos de sacos são utilizados e sacos de 25 kg estão se tornando comuns.*

Hoje, exceto quando as matérias-primas requerem o uso do processo por via úmida, é utilizado o processo por via seca, a fim de diminuir o gasto de energia para a queima.

Normalmente, o processo de queima representa entre 40 e 60% do custo de produção, en- quanto a extração das matérias-primas representa somente 10% do custo total do cimento.

Por volta de 1990, nos Estados Unidos, o consumo médio de energia para a produ- ção de uma tonelada de cimento, por meio do processo por via seca, era de 1,6 MWh.

Nas fábricas modernas, esse valor é bem menor, estando abaixo de 0,8 MWh na Áustria, por exemplo.

1.96

O consumo de eletricidade, que fica entre 6 e 8% do total da energia uti- lizada, normalmente é da seguinte ordem: 10 kWh para a moagem das matérias-primas, 28 kWh na preparação da farinha crua, 24 kWh na queima e 41 kWh na moagem.

1.18

O custo de instalação de uma fábrica de cimento é bastante elevado, próximo a 200 dólares por tonelada de cimento produzido por ano.

Além dos processos principais, existem outros processos de produção de cimento que merecem destaque. Um que talvez mereça ser mencionado é o que utiliza sulfato de cálcio em vez de calcário. O sulfato de cálcio, a argila, o coque, a areia e o óxido de ferro

* N. de R.T.: As normas brasileiras estabelecem como padrão os sacos de 50 kg.

(8)

são queimados em um forno rotatório, e os produtos finais são o cimento Portland e dióxido de enxofre, posteriormente transformado em ácido sulfúrico.

Em regiões onde a demanda de cimento é pequena, ou em casos de limitação finan- ceira, pode ser utilizado um forno vertical do tipo Gottlieb. Nele, é feita a queima de uma mistura de nódulos de farinha crua e pó de carvão bem fino, produzindo um clínquer aglomerado que é triturado. Um forno simples de 10 m produz até 300 toneladas de ci- mento por dia. Na China, vários milhares desses fornos eram utilizados, mas hoje existe uma grande e moderna indústria cimenteira que produz 1 bilhão de toneladas por ano.*

Composição química do cimento Portland

Foi visto que as matérias-primas utilizadas na produção do cimento consistem, essen- cialmente, em calcário, sílica, alumina e óxido de ferro. Esses compostos interagem entre si no interior do forno e formam uma série de produtos mais complexos – exceto por um pequeno resíduo de óxido de cálcio não combinado devido ao pouco tempo para reagir, obtém-se um estado de equilíbrio químico. Essa condição, no entanto, não é mantida durante o resfriamento, e a velocidade de resfriamento afeta o grau de cristalização e o total de material amorfo presente no clínquer frio. As propriedades desse material amorfo, conhecido como fase vítrea, são bastante diferentes daquelas dos compostos cristalinos com composição química similar. Outra complicação vem da interação da parte líquida do clínquer com os compostos cristalinos já existentes.

Entretanto, o cimento pode ser considerado como em um estado de equilíbrio con- gelado, ou seja, considera-se que os produtos frios reproduzem o equilíbrio existente na temperatura de clinquerização. Essa suposição é adotada no cálculo dos percentuais dos compostos dos cimentos comerciais. A composição “potencial” é calculada a partir da quantidade medida de óxidos presentes no clínquer, considerando a ocorrência da cristalização total dos produtos em equilíbrio.

Quatro compostos normalmente são considerados como os principais constituin- tes do cimento. Esses compostos e suas abreviaturas estão listados na Tabela 1.1. A notação abreviada, utilizada na química de cimento, descreve cada óxido por uma letra,

* N. de R.T.: No Brasil, o Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (SNIC), em seu relatório anual de 2012, cita que foram produzidas aproximadamente 69 milhões de toneladas. A mesma fonte indica que a China, o maior produtor mundial, produziu cerca de 2 bilhões de toneladas em 2011. Em relação ao consumo de energia, o SNIC informa que, para produzir uma tonelada de cimento em 2008, era gasto cerca de 1,0 MWh.

Tabela 1.1 Principais compostos do cimento Portland

Nome do composto Composição em óxidos Abreviatura

Silicato tricálcico 3CaO.SiO

2

C

3

S

Silicato dicálcico 2CaO.SiO

2

C

2

S

Aluminato tricálcico 3CaO.Al

2

O

3

C

3

A

Ferroaluminato tetracálcico 4CaO.Al

2

O

3

.Fe

2

O

3

C

4

AF

(9)

respectivamente: CaO = C; SiO

2

= S; Al

2

O

3

= A; e Fe

2

O

3

= F. Da mesma forma, H

2

O no cimento hidratado é representado como H, e SO

3

, como .

Na realidade, os silicatos no cimento não são compostos puros, pois contêm óxidos secundários em solução sólida. Esses óxidos exercem efeitos significativos no arranjo atômico, na forma dos cristais e em propriedades hidráulicas dos silicatos.

O cálculo da composição potencial do cimento Portland é baseado no trabalho de R. H. Bogue e de outros autores, e é frequentemente denominado “composição de Bogue”. As equações de Bogue

1.2

para as porcentagens dos principais compostos do cimento são apresentadas a seguir. Os termos entre parênteses representam a porcenta- gem de determinado óxido na massa total de cimento.

Existem outros métodos para o cálculo da composição,

1.1

mas o tema foge ao es- copo deste livro. Em relação à composição de Bogue, deve ser ressaltado que ela su- bestima o teor de C

3

S e superestima o de C

2

S, porque outros óxidos substituem parte do CaO no C

3

S. Conforme já foi dito, não existem C

3

S e C

2

S quimicamente puros no clínquer de cimento Portland.

As fábricas modernas produzem clínqueres com resfriamento rápido que contam com a presença de íons substitutos em compostos teoricamente puros. Taylor

1.84

desen- volveu uma alteração na composição de Bogue que leva em conta esses íons.

Além dos principais compostos listados na Tabela 1.1, existem compostos secundá- rios, como MgO, TiO

2

, Mn

2

O

3

, K

2

O, e Na

2

O, que normalmente constituem um peque- no porcentual da massa de cimento. Dois deles são de especial interesse: os óxidos de sódio e de potássio (Na

2

O e K

2

O), conhecidos como os álcalis – embora haja de outros álcalis no cimento. Constatou-se que eles podem reagir com alguns agregados, produ- zindo uma reação que causa a desintegração do concreto. Verificou-se também que eles afetam a velocidade de ganho de resistência do cimento.

1.3

Portanto, deve ser destacado que a denominação “compostos secundários” se deve principalmente à sua quantidade, não à sua importância. A quantidade de álcalis e de Mn

2

O

3

pode ser rapidamente deter- minada com o uso de um espectrofotômetro.

O teor de compostos do cimento foi estabelecido principalmente com base nos es-

tudos do equilíbrio de fases dos sistemas ternários C–A–S e C–A–F e do sistema qua-

ternário C–C

2

S–C

5

A

3

–C

4

AF, entre outros. Por meio da observação dos cursos da fusão

e da cristalização, calcula-se a composição das fases líquida e sólida em qualquer tem-

peratura. Além dos métodos de análise química, a composição real do clínquer pode

ser determinada por meio de exame microscópico do pó, fazendo a identificação por

medida do índice de refração. Seções polidas e causticadas podem ser utilizadas tanto

com luz refletida quanto com luz transmitida. Outros métodos incluem a utilização de

difração de raio X, para identificar a fase cristalina e estudar a estrutura cristalina de

algumas fases, e a análise térmica diferencial. A análise quantitativa também é possível,

mas exige calibrações complexas.

1.68

Técnicas modernas incluem a análise das fases por

meio de microscopia eletrônica de varredura e a análise de imagem por um microscópio

ótico ou um microscópio eletrônico de varredura.

(10)

A estimativa da composição do cimento é melhorada por métodos mais rápidos para a determinação dos elementos, como fluorescência de raios X, espectrometria de raios X, absorção atômica, fotometria de chama e microssonda eletrônica (EPMA). A difração por raios X é útil na determinação do óxido de cal, ou seja, CaO, distinto do Ca(OH)

2

, sendo interessante para o controle do desempenho do forno.

1.67

O C

3

S, normalmente presente em maior quantidade, aparece na forma de pequenos grãos, incolores e equidimensionais. No resfriamento abaixo de 1.250 °C, ele se decom- põe lentamente, mas, caso o resfriamento não seja tão lento, ele permanece inalterado, e é relativamente estável em temperatura ambiente.

O C

2

S pode ter três ou mesmo quatro formas: o α -C

2

S, que existe em altas tempe- raturas e se transforma em β-C

2

S em temperaturas próximas a 1.450 °C; o β-C

2

S, que se transforma em γ -C

2

S em torno de 670 °C, mas em velocidades de resfriamento dos cimentos comerciais permanece no clínquer; e o β-C

2

S na forma de grãos arredondados, normalmente geminados.

O C

3

A forma cristais retangulares, mas em fases vítreas congeladas forma uma fase intersticial amorfa.

O C

4

AF é, na realidade, uma solução sólida que varia de C

2

F a C

6

A

2

F, sendo a descrição C

4

AF uma simplificação conveniente.

1.4

As proporções reais dos diversos compostos variam sensivelmente de um cimento para outro e, na verdade, diferentes tipos de cimentos são obtidos por meio da propor- cionalidade adequada das matérias-primas. Nos Estados Unidos, tentou-se controlar as propriedades necessárias a cimentos destinados a diferentes propósitos por meio da especificação dos limites dos quatro compostos principais, calculados pela análise de óxidos. Com esse procedimento, seria possível eliminar diversos ensaios físicos normal- mente realizados, mas infelizmente a composição calculada não é precisa o suficiente, tampouco leva em consideração todas as propriedades importantes do cimento, não sendo, portanto, útil para substituir ensaios diretos das propriedades desejadas.

Uma ideia geral da composição do cimento pode ser obtida da Tabela 1.2, que for- nece os limites da composição em óxidos dos cimentos Portland. A Tabela 1.3 mostra a composição em óxidos de um cimento típico dos anos de 1960

1.5

e o teor de compostos calculado por meio das equações de Bogue vistas na página 9.

Dois dos termos utilizados na Tabela 1.3 requerem explicações. O resíduo insolúvel, determinado pelo tratamento com ácido clorídrico, é uma medida da adulteração do

Tabela 1.2 Limites usuais da composição do cimento Portland

Óxido Teor (%)

CaO 60–67

SiO

2

17–25

Al

2

O

3

3–8

Fe

2

O

3

0,5–6,0

MgO 0,5–4,0

Álcalis (como Na

2

O) 0,3–1,2

SO

3

2,0–3,5

(11)

cimento, em grande parte decorrente de impurezas no sulfato de cálcio. A norma britâ- nica BS 12:1996 (cancelada) limita o resíduo insolúvel a 1,5% da massa de cimento. A norma europeia BS EN 197-1:2000, que admite um teor de 5% de fíler no cimento (ver página 91), limita o resíduo insolúvel a 5% da massa de cimento devido ao fíler.*

A perda ao fogo indica a extensão da carbonatação e da hidratação do óxido de cálcio e do magnésio livres devido à exposição ao ar. O teor máximo de perda ao fogo (a 1.000 °C) estabelecido pela BS EN 197-1:2000 é de 5%, enquanto o estabelecido pela ASTM C 150- 09 é de 3%, exceto para o cimento Tipo IV (2,5%). O valor de 4% é aceitável para cimento em regiões tropicais. Como o óxido de cálcio livre após a hidratação é inócuo (ver página 51) para um determinado teor de óxido de cálcio livre, uma maior perda ao fogo é vantajo- sa. Para cimentos que contêm fíler calcário, admite-se um teor maior de perda ao fogo: 5%

da massa de cimento, especificados pela BS EN 197-1:2000.**

É interessante ressaltar a grande importância da variação da composição em óxidos no teor de compostos do cimento. Dados obtidos por Czernin

1.5

são apresentados na Ta- bela 1.4. A coluna 1 mostra a composição de um cimento usual de alta resistência inicial.

A diminuição do teor de óxidos em 3%, com o correspondente aumento nos outros óxi-

* N. de R.T.: No Brasil, a determinação do resíduo insolúvel é feita com ácido clorídrico, confor- me a NBR NM 15:2012. Os valores-limite são variáveis conforme o tipo de cimento: CP I ≤ 1%;

CP I S ≤ 5%; CP II E ≤ 2,5%; CP II Z ≤ 16%; CP II F ≤ 2,5%; CP III ≤ 1,5%; CP V ≤ 1%; e cimento Portland branco estrutural ≤ 3,5%. Não existe exigência de resíduo insolúvel para o cimento CP IV.

** N. de R.T.: No Brasil, a determinação da perda ao fogo é estabelecida pela NBR NM 18:2012.

Os seguintes valores máximos para perda ao fogo são admitidos para os diversos tipos de cimento:

CP I ≤ 2%; CP I S ≤ 4,5%; CP II E, CP II Z e CP II F ≤ 6,5%; CP III ≤ 4,5%; CP IV ≤ 4,5%; CP V

≤ 4,5%; e cimento Portland branco estrutural ≤ 12%.

Tabela 1.3 Composição em óxidos e teor de compostos de um cimento Portland típico dos anos de 1960

1.5

Composição em óxidos típica (%)

Teor de compostos calculado por meio das fórmulas de Bogue, página 9 (%)

CaO 63 C

3

A 10,8

SiO

2

20 C

3

S 54,1

Al

2

O

3

6 C

2

S 16,6

Fe

2

O

3

3 C

4

AF 9,1

MgO 1 Compostos secundários —

SO

3

2

K

2

O Na

2

O 1

Outros 1

Perda ao fogo 2

Resíduo insolúvel

(12)

dos (coluna 2), resulta em mudança considerável na relação C

3

S/C

2

S. A coluna 3 mostra a mudança de 1,5% nos teores de alumina e de ferro quando comparados ao cimento da coluna 1. Os teores de óxido de cálcio e de sílica permanecem inalterados, mas a relação entre os dois silicatos, bem como os teores de C

3

A e C

4

AF, são bastante modificados. Fica

Tabela 1.4 Influência da variação da composição em óxidos no teor de compostos

1.5

Porcentagem no cimento n.

o

1 2 3

Óxido

CaO 66,0 63,0 66,0

SiO

2

20,0 22,0 20,0

Al

2

O

3

7,0 7,7 5,5

Fe

2

O

3

3,0 3,3 4,5

Outros 4,0 4,0 4,0

Composto

C

3

S 65 33 73

C

2

S 8 38 2

C

3

A 14 15 7

C

4

AF 9 10 14

Elementos constituintes

Compostos óxidos

Compostos do cimento

Cimentos Portland vários tipos Produtos de hidratação gel

Figura 1.2 Representação esquemática da formação e da hidratação do cimento Portland.

(13)

claro que a importância do controle da composição em óxidos não deve ser subestimada.

Dentro do campo dos cimentos Portland comuns e de alta resistência inicial, a soma dos teores dos dois silicatos varia em uma faixa estreita, de modo que a variação na composi- ção depende principalmente da relação entre CaO e SiO

2

nas matérias-primas.

Em alguns países da União Europeia, há um limite para o teor de cromo hexava- lente, normalmente igual a 2 ppm da massa de cimento seco, pois o contato excessivo com o cromo no concreto fresco pode causar dermatites.

Agora, pode ser interessante resumir o modelo de formação e hidratação do cimento, representado esquematicamente na Figura 1.2.

Hidratação do cimento

As reações pelas quais o cimento Portland se torna um material aglomerante acontecem na pasta, constituída por água e cimento. Em outras palavras, a presença de água e dos silicatos e dos aluminatos listados na Tabela 1.1 formam produtos hidratados que, com o tempo, resultam em uma massa firme e resistente, ou seja, a pasta de cimento hidratada.

Existem duas maneiras como os tipos de compostos existentes no cimento podem reagir com a água. Na primeira, acontece a adição direta de algumas moléculas de água, sendo esta a verdadeira reação de hidratação. O segundo tipo de reação com água é a hidrólise. No entanto, é conveniente aplicar a palavra “hidratação” a todas as reações do cimento com água, ou seja, à hidratação verdadeira e à hidrólise.

Le Chatelier foi o primeiro a observar, há cerca de 130 anos, que os produtos de hidratação do cimento são, em termos químicos, os mesmos produtos da hidratação de componentes isolados sob as mesmas condições. Isso foi confirmado posteriormente por Steinour

1.6

e por Bogue & Lerch

1.7

, com a ressalva de que os produtos da reação podem influenciar uns aos outros ou podem interagir com outros compostos do sis- tema. Os dois silicatos de cálcio são os principais compostos cimentícios existentes no cimento, e o comportamento físico do cimento durante a hidratação é similar ao desses compostos isoladamente.

1.8

A hidratação de cada composto será descrita com mais de- talhes nas seções seguintes.

Os produtos da hidratação do cimento têm solubilidade bastante baixa em água, como mostra a estabilidade da pasta de cimento em contato com a água. O cimen- to hidratado adere fortemente ao cimento não hidratado, mas a forma exata de como isso ocorre não é conhecida. É possível que os produtos recém-hidratados formem um envelope que cresce pela ação da água que penetrou no filme circundante de produ- tos hidratados. Alternativamente, os silicatos dissolvidos podem passar pelo envelope e precipitar como uma camada mais externa. Uma terceira possibilidade é a precipitação da solução coloidal através da massa após ser alcançada a saturação e a hidratação continuar a ocorrer no interior da estrutura.

Independentemente do modo de precipitação dos produtos de hidratação, sua ve-

locidade diminui de forma contínua, de modo que, mesmo após um longo período de

tempo, ainda existe uma quantidade razoável de cimento anidro. Por exemplo, após 28

dias em contato com a água, foram encontrados grãos de cimento hidratados em uma

profundidade de somente 4 μ m,

1.9

e de 8 μ m após um ano. Powers

1.10

estimou que a hi-

dratação completa do cimento, em condições normais, é possível apenas para partículas

de cimento menores que 50 μ m, mas obteve hidratação completa com a moagem do

cimento em água continuamente por cinco dias.

(14)

Exames microscópicos de cimento hidratado não mostram evidência de penetração de água nos grãos de cimento de modo a hidratar preferencialmente os compostos mais reativos (como o C

3

S) que podem se concentrar no centro do grão. Aparentemente, então, ocorre a hidratação por uma redução gradual da dimensão da partícula de ci- mento. De fato, após vários meses,

1.11

verificou-se a existência de C

3

S e C

2

S em grãos de cimento anidro de grandes dimensões, e é possível que os grãos menores de C

2

S se hidratem antes de a hidratação dos grãos maiores de C

3

S ter sido completada. Os vários compostos do cimento geralmente estão misturados em todos os grãos, e algumas pes- quisas indicam que o resíduo de um grão, após determinado período de hidratação, tem a mesma composição percentual que o grão original.

1.12

A composição desse resíduo, entretanto, muda durante a hidratação do cimento,

1.49

especialmente nas primeiras 24 horas, quando pode ocorrer uma hidratação seletiva.

Os principais compostos hidratados podem ser, de modo geral, classificados como silicatos de cálcio hidratados e aluminato tricálcico hidratado. Acredita-se que o C

4

AF se hidrate na forma de aluminato de cálcio hidratado e uma fase amorfa, possivelmente CaO.Fe

2

O

3

.aq. É possível também que uma pequena quantidade de Fe

2

O

3

esteja presen- te em solução sólida de aluminato tricálcico hidratado.

A evolução da hidratação do cimento pode ser determinada por diferentes meios, como uma medida de: (a) quantidade de Ca(OH)

2

na pasta; (b) calor de hidratação liberado; (c) massa específica da pasta; (d) quantidade de água quimicamente combi- nada; (e) total de cimento anidro (com a utilização de análise quantitativa de raios X);

e (f) indiretamente pela resistência da pasta hidratada. Técnicas termogravimétricas e difração por varredura contínua de raios X de pastas frescas em processo de hidrata- ção

1.50

podem ser utilizadas para estudos das reações iniciais. A microestrutura da pasta também pode ser analisada por meio da imagem de elétrons retroespalhados em um microscópio eletrônico de varredura.

Silicatos de cálcio hidratados

As velocidades de hidratação do C

3

S e do C

2

S em estado puro variam consideravel- mente, conforme mostra a Figura 1.3. Quando todos os compostos estão presentes ao

F ração hidr a tada

Tempo (escala logarítmica; dias) 1,0

0,8

0,6

0,4 0,2

0 1 10 100 180

Figura 1.3 Desenvolvimento típico de hidratação de compostos puros.

1.47

(15)

mesmo tempo no cimento, suas velocidades de hidratação são afetadas pela interação entre eles. Em cimentos comerciais, os silicatos de cálcio contêm pequenas impurezas de alguns óxidos presentes no clínquer. O C

3

S “impuro” é denominado alita, enquanto o C

2

S “impuro” é conhecido como belita. Essas impurezas exercem forte influência nas propriedades dos silicatos de cálcio hidratados (ver página 48).

Quando a hidratação ocorre com uma quantidade limitada de água, como é o caso da pasta de cimento, da argamassa ou do concreto, acredita-se que o C

3

S sofra uma hidrólise que produz um silicato de cálcio de menor basicidade, formando C

3

S

2

H, com liberação de cal na forma de Ca(OH)

2

. Contudo, existem incertezas quanto ao fato de o C

3

S e o C

2

S resultarem, no fim, no mesmo produto hidratado. Em função da análise do calor de hidratação

1.6

e da área superficial dos produtos de hidratação

1.13

, parecem ser o mesmo produto, mas observações físicas indicam que pode existir mais de um. Pos- sivelmente, existem vários silicatos de cálcio hidratados diferentes. A relação C:S seria afetada se parte da cal fosse absorvida ou retida em solução sólida, e existe forte evidên- cia de que o produto resultante da hidratação do C

2

S tem uma relação cal/sílica de 1,65.

Isso pode ocorrer devido ao fato de a hidratação do C

3

S ser controlada pela velocidade de difusão dos íons através do filme envoltório de produtos hidratados, enquanto a hidratação do C

2

S é controlada por sua própria baixa velocidade de reação.

1.14

Além disso, os produtos hidratados dos dois silicatos podem ser afetados pela temperatura, já que a permeabilidade do gel também é afetada por ela.

A relação C:S não é determinada de maneira inequívoca devido aos diferentes méto- dos utilizados resultarem em valores distintos.

1.74

A variação pode ser de até 1,5, quando realizada por extração química, e de até 2,0, por método termogravimétrico.

1.66

Medidas opticoeletrônicas também resultam em baixos valores para essa relação.

1.72

A relação tam- bém varia com o tempo e é influenciada pela presença de outros elementos ou compostos no cimento. Atualmente, os silicatos de cálcio hidratados são, em geral, descritos como C–S–H, e assume-se a relação C:S como, provavelmente, próxima a 2.

1.19

Como os cristais formados na hidratação são imperfeitos e extremamente pequenos, a relação molar entre a água e a sílica não é, necessariamente, um número inteiro. O C–S–H normalmente con- tém pequenas quantidades de Al, Fe, Mg e outros íons. O C–S–H já foi denominado gel de tobermorita devido à sua semelhança estrutural com um mineral de mesmo nome, mas isso pode não ser correto

1.60

e, hoje, essa denominação raramente é utilizada.

Fazendo a consideração aproximada de que o C

3

S

2

H

3

é o produto final da hidra- tação tanto do C

3

S como do C

2

S, as reações podem ser escritas (como referência, não como equações estequiométricas exatas) da seguinte forma:

C

3

S:

2C

3

S + 6H → C

3

S

2

H

3

+ 3Ca(OH)

2

. As massas envolvidas correspondentes são:

100 + 24 → 75 + 49.

C

2

S:

2C

2

S + 4H → C

3

S

2

H

3

+ Ca(OH)

2

. As massas envolvidas correspondentes são:

100 + 21 → 99 + 22.

(16)

Portanto, em termos de massa, ambos os silicatos requerem aproximadamente a mesma quantidade de água para a hidratação, mas o C

3

S produz mais do que o dobro da quantidade de Ca(OH)

2

formada na hidratação do C

2

S.

As propriedades físicas dos silicatos de cálcio hidratados são de interesse nos temas relacionados às propriedades de pega e ao endurecimento do cimento. Esses compostos hidratados são aparentemente amorfos, mas a microscopia eletrônica revela que eles têm caráter cristalino. É interessante destacar que um dos compostos hidratados que se acredita existir, citado por Taylor

1.15

como CSH(I), tem uma estrutura estratificada similar à de alguns minerais argilosos, como a montmorillonita e a haloisita. As ca- madas individuais nos planos dos eixos a e b são bem cristalizadas, mas as distâncias entre elas são menos rigidamente definidas. Essa rede poderia ser capaz de acomodar quantidades variáveis de óxido de cálcio sem alterações significativas, sendo este um aspecto relevante na variação das relações cal/sílica mencionadas anteriormente. De fato, diagramas de amostras de pó mostraram a retenção aleatória de uma molécula de óxido de cálcio a mais por molécula de sílica.

1.15

Steinour

1.16

descreveu esse fenômeno como uma situação-limite entre solução sólida e adsorção.

Os silicatos de cálcio não se hidratam no estado sólido. Possivelmente no início o silicato anidro sofra uma dissolução para, então, reagir, formando silicatos hidratados menos solúveis que se precipitam da solução supersaturada.

1.17

Esse é o mecanismo de hidratação sugerido por Le Chatelier em 1881.

Estudos de Diamond

1.60

indicam que os silicatos de cálcio hidratados existem em várias formas: partículas fibrosas, partículas lamelares, malha reticulada, grãos irre- gulares, todas bastante difíceis de definir. Entretanto, a forma predominante é a de partículas fibrosas, possivelmente sólidas, possivelmente ocas, algumas vezes lamelares, algumas vezes com ramificações nas extremidades. Normalmente, elas têm entre 0,5 μm e 2 μ m de comprimento e menos de 0,2 μ m de largura. Essa não é uma imagem precisa, mas a estrutura dos silicatos de cálcio hidratados é muito desordenada para ser deter- minada pelas técnicas existentes, incluindo a combinação de microscopia eletrônica de varredura e espectroscopia de raios X por dispersão de energia.

A hidratação do C

3

S em muito caracteriza o comportamento do cimento. A hidra- tação não ocorre a uma velocidade constante ou mesmo a uma velocidade com varia- ção constante. A rápida liberação inicial de hidróxido de cálcio na solução forma uma camada externa de silicato de cálcio hidratado de cerca de 10 nm de espessura.

1.61

Essa camada impede a hidratação subsequente, de modo que, por algum tempo, praticamen- te não ocorre hidratação.

Como a hidratação do cimento é uma reação exotérmica, a taxa de liberação de calor é um indicativo da velocidade de hidratação. Essa análise mostra que há três picos na velocidade de hidratação nos três primeiros dias ou perto disso, desde o momento em que o cimento seco entra em contato pela primeira vez com a água. A Figura 1.4 mostra a variação da taxa de liberação de calor com o tempo.

1.81

Pode ser visto que o primeiro pico, bastante elevado, corresponde à hidratação inicial da superfície dos grãos de cimento e envolve principalmente o C

3

A. A duração dessa hidratação elevada é bastante curta e é seguida por um período denominado período de dormência, tam- bém conhecido como período de indução, em que a velocidade é bastante baixa. Esse período dura entre uma e duas horas e, durante ele, a pasta de cimento é trabalhável.

Em determinado momento, a camada superficial é rompida, possivelmente pelo me-

canismo de osmose ou pelo crescimento dos cristais de hidróxido de cálcio. A velocidade

(17)

de hidratação e, portanto, a liberação de calor aumentam lentamente, e os produtos de hidratação dos grãos individuais entram em contato entre si, ocorrendo a pega. A taxa de liberação de calor alcança um segundo pico, normalmente em cerca de 10 horas, mas, algumas vezes, em somente quatro horas.

Após esse pico, a velocidade de hidratação diminui por um longo período, sendo a difusão através dos poros dos produtos hidratados o fator de controle.

1.62

Na maioria dos cimentos, ocorre uma retomada da velocidade de hidratação, resultando em um terceiro pico, menor do que os anteriores, entre 18 e 30 horas. Esse pico é associado à retomada da reação do C

3

A após o esgotamento do sulfato de cálcio.

O advento do segundo pico é acelerado pela presença de álcalis, pela maior finura dos grãos de cimento e pelo aumento da temperatura.

Devido à semelhança da evolução da hidratação de silicatos de cálcio puros e de cimentos Portland comerciais, o desenvolvimento de resistência é similar.

1.20

Uma re- sistência considerável é obtida antes de as reações de hidratação estarem completas e, assim, parece que uma pequena quantidade de compostos hidratados adere ao material anidro, o que resulta em posterior hidratação e em um acréscimo de resistência.

O Ca(OH)

2

liberado pela hidrólise do silicato de cálcio forma finas placas hexago- nais, frequentemente com dezenas de micrômetros de espessura, mas, em seguida, elas se unem em elementos maciços.

1.60

Aluminato tricálcico hidratado e a ação do sulfato de cálcio

A quantidade de C

3

A presente na maioria dos cimentos é relativamente pequena, mas seu comportamento e seu relacionamento estrutural com as outras fases no cimento o tornam importante. O aluminato tricálcico hidratado forma um material intersticial prismático escuro, possivelmente com outras substâncias em solução sólida. Frequente- mente, se apresenta na forma de placas circundadas pelos silicatos de cálcio hidratados.

A reação do C

3

A puro com a água é bastante violenta e resulta no enrijecimento instantâneo da pasta, conhecida como pega instantânea. Para impedir que isso ocorra, adiciona-se sulfato de cálcio (CaSO

4

.2H

2

O) ao clínquer. O sulfato de cálcio e o C

3

A rea- gem e formam um sulfoaluminato de cálcio insolúvel (3CaO.Al

2

O

3

.3CaSO

4

.32H

2

O), mas eventualmente pode ser formado aluminato tricálcico hidratado, embora isso seja prece-

T axa da liber ação de calor (J/s kg)

4

2

0 10 20 30 40 50

Idade (horas) I

II

III

Figura 1.4 Taxa da liberação de calor do cimento Portland com relação água/cimento igual

a 0,4. O primeiro pico, de 3.200 J/s kg, está fora do gráfico.

1.81

(18)

dido pelo 3CaO.Al

2

O

3

.CaSO

4

.12H

2

O metaestável, produzido a partir do sulfoaluminato de cálcio supersulfatado original.

1.6

Conforme o C

3

A se solubiliza, a composição se mo- difica, com diminuição contínua do teor de sulfato. A velocidade de reação do aluminato é elevada e, se esse rearranjo na composição não for rápido o suficiente, é provável que ocorra a hidratação direta do C

3

A. Em especial, o primeiro pico na taxa de liberação de calor, normalmente observado em até cinco minutos após a adição de água ao cimento, indica a formação direta de aluminato de cálcio nesse período e que as condições para o retardo pelo sulfato de cálcio ainda não estão estabelecidas.

Em substituição ao sulfato de cálcio di-hidratado, podem ser utilizadas outras for- mas de sulfato de cálcio na fabricação do cimento, como o hemi-hidrato (CaSO

4

.½H

2

O) ou a anidrita (CaSO

4

).

Existem algumas evidências de que a hidratação do C

3

A pode ser retardada pelo Ca(OH)

2

liberado pela hidrólise do C

3

S.

1.62

Isso ocorre devido ao fato de o Ca(OH)

2

reagir com o C

3

A e a água e produzir C

4

AH

19

, que forma um revestimento protetor na superfície dos grãos anidros de C

3

A. Também é possível que o Ca(OH)

2

diminua a concentração de íons aluminatos na solução, diminuindo, assim, a velocidade de hidratação do C

3

A.

1.62

Em última análise, a forma estável de aluminato de cálcio hidratado existente na pasta de cimento hidratada é, provavelmente, o cristal cúbico C

3

AH

6

, mas é possível que, a princípio, ocorra a cristalização do C

4

AH

12

hexagonal, que, posteriormente, transforma-se na forma cúbica. Dessa forma, a reação final pode ser escrita como:

C

3

A + 6H → C

3

AH

6

.

Novamente, essa fórmula é uma aproximação, e não uma equação estequiométrica.

Os pesos moleculares mostram que 100 partes de C

3

A reagem com 40 partes de água em massa, o que é uma proporção de água muito mais elevada do que a necessária para silicatos.

A presença de C

3

A no cimento é indesejável, já que ele contribui pouco ou nada para a resistência do cimento, exceto nas primeiras idades. Além disso, quando a pasta de ci- mento endurecida é atacada por sulfatos, a formação de sulfoaluminato de cálcio a partir do C

3

A causa expansão, o que pode gerar a desagregação da pasta endurecida. O C

3

A, en- tretanto, é útil na fabricação do cimento, já que funciona como fundente, reduzindo a tem- peratura de queima do clínquer e facilitando a combinação do óxido de cálcio com a sílica.

Pode ser notado que, se alguma quantidade de líquido não se formasse durante a queima, as reações no forno ocorreriam mais lentamente e, provavelmente, seriam incompletas. Por outro lado, um teor elevado de C

3

A aumenta a energia necessária à moagem do clínquer.

Um efeito positivo do C

3

A é sua capacidade de fixação de íons de cloreto (ver página 593).

O sulfato de cálcio não reage somente com o C

3

A. Com o C

4

AF, ele forma sulfo- ferrito de cálcio e sulfoaluminato de cálcio, e sua presença pode acelerar a hidratação dos silicatos.

A quantidade de sulfato de cálcio adicionada ao clínquer deve ser cuidadosamente

verificada, especialmente porque o excesso de sulfato de cálcio pode levar à expansão

e à consequente desagregação da pasta de cimento endurecida. O teor ótimo de sulfato

de cálcio é determinado pela observação da liberação de calor de hidratação. Como já

mencionado, o primeiro pico na taxa de liberação de calor é seguido por um segundo

pico, cerca de quatro a 10 horas após a adição de água ao cimento. Com a quantidade

(19)

correta de sulfato de cálcio, deve restar pouco C

3

A para reagir após a totalidade do sul- fato de cálcio ter se combinado, não devendo ocorrer mais qualquer pico de liberação de calor. Assim, um teor ótimo de sulfato de cálcio resulta em uma velocidade de reação inicial desejada e previne a concentração local elevada de produtos de hidratação (ver página 376). Como consequência, a dimensão dos poros da pasta de cimento hidratada é diminuída e a resistência, aumentada.

1.78

A quantidade de sulfato de cálcio necessária aumenta com o teor de C

3

A, bem como com o teor de álcalis no cimento. O aumento da finura do cimento eleva a quanti- dade de C

3

A disponível nas primeiras idades, aumentando, assim, a necessidade de sul- fato de cálcio. Um ensaio para determinar o teor ótimo de SO

3

no cimento Portland era estabelecido pela ASTM C 543-84 (cancelada). A otimização é baseada na resistência a um dia de idade, que normalmente também produz a menor retração.

A quantidade de sulfato de cálcio adicionada ao clínquer é expressa em relação à massa de SO

3

presente. A norma europeia BS EN 197-1:2000 limita esse valor a 3,5%, mas em alguns casos esse limite é maior. O SO

3

quimicamente importante é o sulfato so- lúvel advindo do sulfato de cálcio, e não dos combustíveis com elevado teor de enxofre, que se fixa ao clínquer. É por esse motivo que o atual limite de SO

3

total é maior do que no passado. Os valores máximos de SO

3

estabelecidos pela ASTM C 150-09 dependem do teor de C

3

A e são mais altos nos cimentos de alta resistência inicial.*

Pega

Pega é o termo utilizado para descrever o enrijecimento da pasta de cimento, embora a definição do enrijecimento da pasta que se considera como pega seja um tanto arbitrá- ria. Amplamente falando, a pega se refere à mudança de estado, de fluido para rígido.

Ainda que durante a pega a pasta ganhe alguma resistência, para efeitos práticos é im- portante distinguir pega de endurecimento, já que este se refere ao ganho de resistência da pasta de cimento após a pega.

Os termos “início de pega” e “fim de pega” são utilizados para descrever estágios arbitrariamente escolhidos da pega. O método de medida desses tempos está descrito na página 49.

Aparentemente, a pega é causada pela hidratação seletiva dos compostos do ci- mento. Os dois primeiros que reagem são o C

3

A e o C

3

S. As propriedades de pega ins- tantânea do primeiro foram citadas na seção anterior, mas a adição de sulfato de cálcio atrasa a formação de aluminato de cálcio hidratado, e essa é a razão pela qual o C

3

S entra em pega antes. O C

3

S puro misturado com água também apresenta um início de pega, mas o C

2

S enrijece de modo mais gradual.

Em um cimento com tempo de pega adequadamente controlado, a estrutura da pasta de cimento hidratada é estabelecida pelo silicato de cálcio hidratado, enquanto, caso o C

3

A reagisse antes, seria formado um silicato de cálcio hidratado mais poroso.

Os compostos restantes do cimento se hidratariam no interior dessa estrutura porosa e as propriedades de resistência da pasta de cimento seriam afetadas negativamente.

* N. de R.T.: As normas brasileiras relativas aos tipos de cimento especificam o valor de 4% em

relação à massa como o limite máximo de SO

3

para todos os cimentos, exceto para o cimento de

alta resistência inicial, em que o teor máximo é de 3,5 ou 4,5%, respectivamente, se o teor de C

3

A

do clínquer for menor ou igual a 8% ou maior do que 8%.

(20)

Além da velocidade de formação de produtos cristalinos, o desenvolvimento de filmes ao redor dos grãos de cimento e uma coagulação mútua dos componentes da pasta também têm sido sugeridos como fatores que afetam o desenvolvimento da pega.

No fim da pega, ocorre uma queda brusca da condutividade elétrica da pasta de cimento, tendo sido feitas tentativas de determinação da pega por meios elétricos.

O tempo de pega do cimento diminui com o aumento da temperatura, mas acima de 30 °C pode ser observado um efeito contrário.

1.1

Em temperaturas baixas, a pega é retardada.

Falsa pega

Falsa pega é a denominação dada ao enrijecimento prematuro anormal do cimento em poucos minutos após a adição de água. Ela difere da pega instantânea, já que não há liberação de calor importante, e, remisturando a pasta, sem adição de água, a plasti- cidade é restabelecida até entrar em pega de modo normal e sem perda de resistência.

Uma das causas da falsa pega pode ser associada à desidratação do sulfato de cálcio quando ele é moído com um clínquer muito quente, formando hemi-hidrato (CaSO

4

.½H

2

O) ou anidrita (CaSO

4

). Além disso, quando o cimento é misturado com água, ele se hidrata em cristais de sulfato de cálcio com forma de agulha. Dessa maneira, ocorre o que se deno- mina “pega do sulfato de cálcio”, com resultante enrijecimento da pasta.

Outra causa da falsa pega pode ser associada aos álcalis do cimento. Eles podem carbonatar durante o armazenamento, sendo que os carbonatos alcalinos reagem com o Ca(OH)

2

liberado na hidrólise do C

3

S, formando CaCO

3

. Esse composto se precipita e provoca o enrijecimento da pasta.

Também se sugere que a falsa pega possa ocorrer devido à ativação do C

3

S pela aeração em teores de umidade relativamente altos. A água é adsorvida nos grãos de ci- mento, e essas superfícies recentemente ativadas podem se combinar muito rapidamente com mais água durante a mistura. Essa hidratação acelerada resultaria na falsa pega.

1.21

Ensaios nas fábricas de cimento geralmente garantem que o cimento esteja livre da ocorrência da falsa pega. Caso ela ocorra, pode ser combatida pela remistura do concreto, sem adição de mais água. Embora isso não seja fácil, a trabalhabilidade será melhorada e o concreto poderá ser lançado normalmente.

Finura do cimento

Uma das últimas etapas da fabricação do cimento é a moagem do clínquer misturado com sulfato de cálcio. Como a hidratação começa na superfície dos grãos de cimento, é a área superficial total do cimento que representa o material disponível para hidratação.

A velocidade de hidratação depende, portanto, da finura dos grãos de cimento, e, para um rápido desenvolvimento de resistência, é necessária uma finura maior (ver Figura 1.5), sendo que a resistência em longo prazo não é afetada. É claro que um maior desen- volvimento da hidratação inicial significa maior liberação inicial de calor.

Por outro lado, o custo de moagem até uma maior finura é considerável, e, além

disso, quanto mais fino o cimento, mais rapidamente ele se deteriora quando exposto

ao ar. Cimentos mais finos resultam em reações mais violentas com agregados alcalirre-

ativos

1.44

e fazem com que a pasta de cimento, embora não necessariamente o concreto,

tenha maior retração e maior tendência à fissuração. O cimento mais fino, entretanto,

exsuda menos do que um cimento mais grosso.

(21)

Um aumento na finura implica aumento da quantidade de sulfato de cálcio necessá- ria ao retardo de pega, pois, no cimento mais fino, a quantidade de C

3

A disponível para hidratação inicial é maior. Quanto mais fino for o cimento, maior será a quantidade de água para a pasta de consistência normal, mas, inversamente, o aumento da finura melhora ligeiramente a trabalhabilidade de um concreto. Essa inconsistência pode ser devida parcialmente ao fato de que os ensaios de consistência da pasta de cimento e de trabalhabilidade medem propriedades diferentes da pasta fresca. Além disso, o ar incorporado acidentalmente afeta a trabalhabilidade da pasta de cimento, e cimentos de finuras diferentes podem conter diferentes teores de ar.

Pode ser percebido que a finura é uma propriedade vital do cimento e deve ser cui- dadosamente controlada. A fração de cimento retida na peneira de 45 μ m pode ser deter- minada pela norma ASTM C 430-08 (para dimensões de peneiras, ver Tabela 3.14). Esse ensaio garante que o cimento não contenha uma quantidade excessiva de grãos de gran- des dimensões que, devido à sua relativamente pequena superfície específica por massa, iriam contribuir pouco para o processo de hidratação e desenvolvimento da resistência.*

O método de peneiramento, entretanto, não fornece informações em relação aos grãos menores do que 45 μ m, e são essas partículas mais finas que atuam mais forte- mente na hidratação inicial.

Por essa razão, as normas modernas estabelecem um ensaio para a finura pela de- terminação da superfície específica do cimento, expressa como a área superficial total em

* N. de R.T.: A especificação da finura dos cimentos no Brasil é feita em função do resíduo na peneira de 75 μ m (n.

o

200), sendo a determinação realizada segundo a NBR 11579:2012, versão corrigida 2013. Foi publicada em 2014 a norma NBR 12826, que estabelece os parâmetros de de- terminação da finura do cimento Portland e de outros materiais em pó com o uso de peneirador aerodinâmico, servindo para a determinação do índice de finura em diversas peneiras.

R esistência à compr essão (MP a)

Superfície específica (Wagner; m

2

/kg) 1 ano

90 dias 28 dias

7 dias 50

40

30

20

150 200 250 300

Figura 1.5 Relação entre a resistência do concreto em diferentes idades e a finura do cimento.

1.43

(22)

metros quadrados por kg.* Uma abordagem direta é medir a distribuição das dimensões das partículas por sedimentação ou elutriação. Esses métodos estão baseados na relação entre a velocidade de queda de uma partícula e seu diâmetro. A lei de Stokes dá a veloci- dade terminal de queda, pela ação da gravidade, de uma partícula esférica em um meio fluido, embora os grãos de cimento não sejam esféricos. O meio deve ser, obviamente, inerte em relação ao cimento. Também é importante que seja possível a obtenção de uma dispersão satisfatória dos grãos de cimento, já que uma floculação parcial pode produzir uma diminuição da superfície específica aparente.

Uma evolução desses métodos é o turbidímetro de Wagner (ASTM C 115-10). Nesse ensaio, a concentração de partículas em suspensão em um dado nível, em querosene, é determinada com a utilização de um feixe de luz. A porcentagem de luz transmitida é me- dida por uma fotocélula. O turbidímetro, em geral, apresenta resultados consistentes, mas um erro é introduzido ao se considerar uma distribuição uniforme de partículas menores do que 7,5 μ m. São exatamente essas partículas mais finas que mais contribuem para a superfície específica do cimento, e o erro é especialmente significante com os cimentos mais finos utilizados hoje. Um aperfeiçoamento desse método é possível se a concentra- ção de partículas de até 5 μm for determinada e se for realizada uma modificação nos cálculos.

1.51

Uma curva típica da distribuição das dimensões das partículas é mostrada na Figura 1.6, que também apresenta a correspondente contribuição dessas partículas na área superficial total da amostra. Conforme citado na página 7, a distribuição das dimensões das partículas depende do método de moagem e varia de fábrica para fábrica.

* N. de R.T.: Nas normas brasileiras, são utilizadas as expressões “área específica” e “superfície específica”, ambas coerentes com a definição apresentada.

P or centa gem acum ulada passante Ár ea superficial acum ulada (W a gner ; m2)

Dimensão da partícula (μm) Área superficial

Distribuição das dimensões

100 0,18

0,16

0,14

0,12 80

60

40

20

0 10 20 30 40 50 60

Figura 1.6 Exemplo da distribuição das dimensões das partículas e contribuição de superfí-

cie acumulada até um determinado tamanho de partícula para 1 grama de cimento.

(23)

Contudo, deve-se admitir que não se sabe ao certo o que é uma “boa” granulome- tria do cimento. As partículas devem ser todas do mesmo tamanho ou devem ter uma distribuição tal que sejam capazes de se acomodar de forma compacta? Atualmente, acredita-se que, para determinada superfície específica de cimento, o desenvolvimento da resistência inicial é maior se pelo menos 50% das partículas tiverem entre 3 e 30 μm e, respectivamente, menos partículas muito finas e muito grossas. Tem-se que uma propor- ção de até 95% de partículas na faixa de 3 a 30 μm resulta em uma melhora da resistên- cia inicial, bem como da resistência final do concreto produzido com esse cimento. Para alcançar uma distribuição de dimensões de partículas com tal controle, é necessária a utilização de classificadores de alta eficiência em circuitos fechados de moagem de clínquer. Esses classificadores reduzem o montante de energia utilizado na moagem.

1.80

A razão para o efeito benéfico de partículas de dimensões intermediárias pode ser vista nos resultados obtidos por Aïtcin et al.

1.91

, que mostraram que a moagem do ci- mento resulta na segregação de uma determinada parte dos compostos. Especificamen- te, as partículas menores do que 4 μm são muito ricas em SO

3

e em álcalis. As partículas maiores do que 30 μ m contêm uma grande proporção de C

2

S, enquanto as partículas entre 4 e 30 μm são ricas em C

3

S.

Entretanto, deve ser destacado que não existe uma relação simples entre a resis- tência do cimento e a distribuição de dimensões das partículas. Por exemplo, o clínquer exposto ao ar e parcialmente hidratado, após a moagem, resulta em cimento com uma aparentemente elevada área superficial.

A área superficial do cimento também pode ser determinada pelo método de per- meabilidade ao ar, utilizando o equipamento desenvolvido por Lea & Nurse. O método se baseia na relação entre o fluxo de um fluido através de uma camada de cimento porosa e a área superficial das partículas nela contidas. A partir disso, a área superficial por unidade de massa pode ser relacionada à permeabilidade de uma camada de determinada porosi- dade, ou seja, que contém um volume fixo de poros no volume total da camada.

O equipamento para determinação da permeabilidade (permeabilímetro) é mostrado esquematicamente na Figura 1.7. Conhecendo-se a massa específica do cimento, a massa necessária para produzir uma camada de porosidade de 0,475 e de 10 mm de espessura pode ser determinada. Essa quantidade de cimento é colocada em um recipiente cilíndri- co, sendo insuflado um fluxo de ar seco, com velocidade constante, através da camada de cimento. A diminuição da pressão é medida por um manômetro conectado no topo e na base da camada. A velocidade do fluxo de ar é medida por um fluxômetro que consiste em um tubo capilar posicionado no circuito e um manômetro entre suas extremidades.

A equação desenvolvida por Carman dá a superfície específica em cm

2

/g, conforme segue:

onde:

ρ = massa específica do cimento (g/cm

3

)

ε = porosidade da camada de cimento (0,475 no método de ensaio inglês) A = área da seção transversal da camada (5,066 cm2)

L = altura da camada (1 cm)

Referências

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