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Direito de locomoção e os direitos e garantias fundamentais direito de ir e vir em meio à pandemia de covid-19

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DIREITO DE LOCOMOÇÃO E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS DIREITO DE IR E VIR EM MEIO À PANDEMIA DE COVID-19

ARARANGUÁ-SC 2020

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DIREITO DE LOCOMOÇÃO E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS DIREITO DE IR E VIR EM MEIO À PANDEMIA DE COVID-19

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Profª. Nádila da Silva Hassan, Esp.

Araranguá-SC 2020

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DIREITO DE LOCOMOÇÃO E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS DIREITO DE IR E VIR EM MEIO À PANDEMIA DE COVID-19

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Araranguá, 09 de dezembro de 2020.

______________________________________________________ Professora e orientadora Nádila da Silva Hassan, Especialista.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Professora Elisângela Dandolini, Especialista.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Professora Rejane da Silva Johansson, Especialista.

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Gostaria de agradecer a todos que me incentivaram e ajudaram para concluir esse curso e para fazer o presente trabalho da melhor forma possível. Em especial à minha família que sempre me apoiou e minha namorada, por sempre me apoiar e estar ao meu lado, me ajudando a seguir essa trajetória.

Gostaria de agradecer ao meu amigo que o Ministério Público me deu a honra de conhecer, Franklyn de Figueredo, por me ajudar na correção do presente trabalho. Também gostaria de agradecer à minha orientadora, que não poupou esforços para me ajudar, mesmo com a correria do dia-dia, sempre que possível esteve lá para me ajudar e sanar minhas dúvidas e também a todos os professores que tive aula, pois todos agregaram conhecimento fazendo com que eu conseguisse concluir o curso e me tornar um excelente profissional da área do direito.

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O presente trabalho foi elaborado por meio de pesquisas bibliográficas e documentais, com auxílio de internet. A pesquisa aborda sobre os direitos fundamentais e as privações da liberdade de ir e vir na atual pandemia da Covid-19. Com os estudos, foi possível chegar ao entendimento de como agir em situações que direitos fundamentais entram em conflito, trazendo uma visão interessante ao demonstrar o combate entre o direito de ir e vir e o direito à vida, na pandemia da Covid-19. Em determinadas situações, o direito de ir e vir pode ser ferido, em partes, mas visando a garantia do direito à vida, para tanto, é necessário usar da ponderação, a fim de analisar qual direito é o mais necessário para cada momento, e da proporção em que cada um deve ser reduzido, chegando em um consenso, para que, quando possível, sejam respeitados todos os direitos que se colidem nas suas devidas proporções dentro da razoabilidade. Do mesmo modo, também faz pensar que a ponderação pode ser usada em outras situações onde quaisquer direitos fundamentais se colidam.

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The present paper was elaborated through bibliographic and documentary researches, with the use of internet. The research talks about the fundamental rights and the deprivation of the freedom to come and go in the current Covid-19 pandemic. With the studies, it was possible to reach to an understanding of how to act in situations where fundamental rights conflict, bringing an interesting view when demonstrating the fight between the right to come and go and the right to live, in the Covid-19 pandemic. In certain situations, the right to come and go may be harm, in parts, but aiming at guaranteeing the right to live, therefore, it is necessary to use weighting, in order to analyze which right is the most necessary for each moment, and the proportion in which each one must be reduced, reaching a consensus, so that, when possible, all rights that collide in their due proportions within reasonableness are respected. Futhermore, it also makes one think that weighting can be used in other situations where any fundamental rights collide.

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1 INTRODUÇÃO...8

2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS...10

2.1 CONCEITO...10

2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA...11

2.3 DIMENSÕES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS...14

2.3.1 Primeira Dimensão...15 2.3.2 Segunda Dimensão...16 2.3.3 Terceira Dimensão...16 2.4 CARACTERÍSTICAS...17 2.4.1 Universalidade...18 2.4.2 Inalienabilidade...18 2.4.3 Aplicação Imediata...19 2.4.4 Irrenunciabilidade...19 2.4.5 Historicidade...20 2.4.6 Indivisibilidade...20 2.4.7 Concorrência...21 2.4.8 Imprescritibilidade...21 2.5 LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO...22

2.5.1 Limitações ao direito de ir e vir...26

2.5.2 Do direito de ir e vir e a cobrança de pedágio...30

3 O DIREITO DE IR E VIR EM TEMPOS DE PANDEMIA...33

3.1 COVID-19...36

3.2 DIREITO DE IR E VIR NA PANDEMIA DA COVID-19...38

3.3 DO DIREITO À VIDA, QUE CHOCA COM A LIBERDADE DE IR E VIR...43

3.4 DA PONDERAÇÃO...44

4 CONCLUSÃO...47

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1 INTRODUÇÃO

Este trabalho teve como objetivo entender o que deve ser feito em situações em que dois ou mais direitos fundamentais colidem entre si, mais especificamente, analisar a colisão entre o direito de locomoção e o direito à vida, com ênfase na quarentena, reflexo da Covid-19, aplicando a abordagem da ponderação entre direitos fundamentais.

É de conhecimento público que a pandemia da Covid-19 está “dominando” o planeta. No final do ano de 2019, esse vírus surgiu na China, mais especificamente, na cidade de Wuhan, e, atualmente, quase um ano após sua origem, ainda é um grande problema no Brasil e no mundo.

As pandemias acontecem quando um vírus se espalha por vários países, isso vem acontecendo cada vez com mais frequência, sendo que no caso da Covid-19 atingiu uma escala global.

Uma das últimas, antes do Corona vírus, foi a H1N1, popularmente conhecida como gripe suína, que surgiu há cerca de dez anos, tendo matado muitas pessoas em diversos países.

De acordo com especialistas no assunto, cada vez mais novos vírus vão ser descobertos e, por consequência, irão desencadear novas pandemias. Alguns estudiosos apontam que se trata de uma resposta da natureza em relação à degradação do planeta, visto ser um fator reflexo da globalização e da agressão do homem contra o meio ambiente.

Com a pandemia da Covid-19, devido à velocidade em que ela se propaga, uma das melhores medidas de prevenção, visto que ainda não foi descoberto um tratamento eficaz e nem uma vacina para imunização, é a quarentena ou isolamento social.

No Brasil, os estados federados tiveram liberdade para legislar sobre o funcionamento de comércios e indústria, muitas vezes, ordenando o fechamento de empresas e proibindo, até mesmo, cidadãos de transitarem em locais públicos onde poderia haver aglomeração de pessoas, essas medidas sempre tomadas com o devido motivo e justificativa.

Como consequência, muitos comércios foram afetados negativamente, pois tiveram que fechar as portas, não tiveram circulação de clientes e não

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receberam lucros para pagar suas dívidas, o que causou a falência de várias empresas dos mais diversos portes e segmentos de mercado.

Tendo isso em vista, nasceu um debate no qual empreendedores pediram pelo fim da quarentena, visto que os comércios estavam se esvaindo, tendo direta relação e impacto na economia nacional e local. Por conta disso, a economia brasileira despencou e os cidadãos estão sofrendo com altos níveis de inflação.

Por outro lado, muitas pessoas também defendem a quarentena. Pelo lado humanitário, a vida seria mais importante que dinheiro, todavia, do ponto de vista jurídico, há uma ponderação, sendo necessária a análise de até que ponto a vida é mais importante que dinheiro, justamente, por ser necessário deste para viver dignamente.

Nesse contexto, pode-se afirmar que existe um empasse entre direitos, o direito à vida colidindo com o direito de ir e vir, ambos defendidos pela constituição federal brasileira e de suma importância pelo seu caráter fundamental.

Quando se fala em direito à vida, é referente à defesa da quarentena, visando apenas a vida da coletividade, por sua vez, no que se refere ao direito de ir e vir, se fala apenas na liberdade de locomoção, fazendo o isolamento social apenas quem deseja.

O presente trabalho utilizou de pesquisas bibliográficas e documentais, com auxílio de internet, utilizando de vários autores para ter embasamento sobre o tema abordado.

Esse trabalho está dividido em 2 principais capítulos, o primeiro aborda os direitos e garantias fundamentais, demonstrando sua evolução histórica, as principais dimensões, além das características, e, por fim, abordando de forma mais completa a liberdade de locomoção.

O segundo capítulo, por sua vez, trata sobre o direito de ir e vir nos tempos de pandemia, dando um conceito geral de pandemia, além de falar da Covid-19, e da ponderação que deve ser utilizada na situação em que dois direitos fundamentais entram em contradição.

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2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Direitos e garantias fundamentais são uma parte do direito em si muito importante, tal como a dignidade da pessoa humana, que está diretamente ligada aos direitos humanos.

Desse modo, a fim de responder à questão deste trabalho, os direitos fundamentais serão amplamente estudados, começando pelos seus conceitos, dimensões, fases e outras características inerentes ao instituto jurídico.

2.1 CONCEITO

As chamadas garantias fundamentais são um conglomerado de direitos que visam proteger os interesses de cada cidadão e, por consequência, da coletividade, dando garantias para que o Estado cuide dignamente dos interesses de toda a sociedade.

Mafra (2005, p. 1) aponta que as garantias fundamentais, “são liberdades públicas de direitos humanos ou individuais que visam, num primeiro momento, a inibir o poder estatal no sentido de proteger os interesses do indivíduo, exonerando-o de seus deveres nesses campexonerando-os”.

Primordialmente, não se via necessidade desses direitos, mas, conforme foram ocorrendo evoluções e chegando à modernidade, se viu a necessidade da implementação de tais, visando garantir uma vida digna a todos.

Nas palavras de Silva (2005, p. 149):

O reconhecimento dos direitos fundamentais do homem, em enunciados explícitos das declarações de direitos, é coisa recente, e está longe de se esgotarem suas possibilidades, já que cada passo na etapa da evolução da Humanidade importa na conquista de novos direitos. Mais do que conquista, o reconhecimento desses direitos caracteriza-se como reconquista de algo que, em termos primitivos, se perdeu, quando a sociedade se dividira entre proprietários e não proprietários.

Um bom exemplo da evolução, que teve resultado em direitos fundamentais, foi a escravidão, mal que assolou os negros não só no Brasil, como no mundo. Naquele tempo, não existia o direito de ir e vir garantido a todos, direito de liberdade, dentre outros, que se coadunam à dignidade do ser humano.

Nesse período, os escravos eram considerados propriedades de seus soberanos e tratados como objetos e ferramentas para exercer alguma função, que,

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quando não desempenhassem tão bem, poderiam ser vendidos ou simplesmente “jogados fora”. Isso gerou grande revolta, mais tarde, chegando a Lei Áurea, ou Lei Imperial número 3.353, extinguindo a escravidão no Brasil.

Sobre a posse de pessoas (escravos), temos na obra de Bosi (1995, p. 206) que:

Um mercador da costa atlântica da África citava, em favor de seus direitos de livre cidadão britânico (free-born), a Magna Carta, a qual lhe conferia o poder inalienável de comerciar o que bem entendesse, dispondo com a igual franquia de todas as suas propriedades móveis, semoventes e imóveis.²¹ Esse direito, alegado por um negreiro em 1772, seria ainda base de sustentação jurídica dos parlamentares que, no Brasil de 1884, obstaram aos trâmites da proposta do conselheiro Dantas que visava a alforriar os escravos maiores de sessenta anos sem indenização aos senhores.

Atualmente, temos a dignidade humana, garantida na Constituição Federal de 1988, no seu Título II, “Direitos e Garantias Fundamentais”. Sobre a carta magna, Fachini (2020, p. 1) aponta que:

Um dos motivos que fazem da Constituição Cidadã um dos modelos constitucionais mais bem vistos no mundo com certeza é a sua ampla cobertura de direitos fundamentais, que caracterizam a sua preocupação com a cidadania e com a participação plena dos indivíduos na construção da sociedade.

No geral, os direitos e garantias fundamentais abordam o que, atualmente, um cidadão precisa para ter uma vida digna e, acima de tudo, livre.

Na sequência, será realizado um levantamento histórico das Constituições brasileiras, com o intuito de identificar quais tipos de direitos fundamentais foram previstos em cada uma.

2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

No século XVIII, ocorreu um forte movimento de constitucionalidade na Europa, que influenciou diretamente os direitos e garantias fundamentais, hoje previstos na Constituição Federal de 1988.

Groff (2008, p. 2) esclareceu que esse movimento, bem como a carta maior brasileira de 1824, sofreu forte influência de ideais liberais e constitucionalistas, presentes, à época, no continente Europeu.

Nesse raciocínio, pode-se afirmar que o primeiro momento, em que foram abordados os direitos fundamentais no Brasil, foi na Constituição de 1824, que tratava de direitos como liberdade de pensamento, propriedade, dentre outros.

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Groff (2008, p. 3), ao estudar a carta constitucional de 1824, concluiu que:

No art.179, constavam 35 incisos, contemplando direitos civis e políticos. Entre os direitos, encontravam-se: a legalidade, a irretroatividade da lei, a igualdade, a liberdade de pensamento, a inviolabilidade de domicílio, a propriedade, o sigilo de correspondência, a proibição dos açoites, da tortura, a marca de ferro quente e outras penas cruéis, entre outros direitos e garantias.

Em 1891, com o advento da nova Constituição, se teve uma piora no cenário dos direitos e garantias fundamentais brasileiros, pelo constituinte ter se baseado na constituição norte-americana, que era mais autoritária e não previu, de fato, os direitos previstos na antecessora.

Sobre a questão, Groff (2008, p. 4):

[...] surgiam novas instituições, baseadas na matriz constitucional norte-americana. Porém, essas instituições passaram a conviver com uma cultura política conservadora e autoritária. Nesse contexto a garantia dos direitos fundamentais, embora formalmente prevista na Constituição, ficava prejudicada na prática.

Na sequência, a Constituição de 1934 trouxe diversos avanços e direitos coletivos, como o direito de propriedade, dentre muitos outros, os quais foram de suma importância e necessidade para a sociedade da época. A respeito, tem-se que:

No rol dos novos direitos individuais, constam: a lei não prejudicará o direito adquirido... explicitou o princípio da igualdade... vedou a pena de caráter perpétuo... impediu a extradição de estrangeiros por crime político ou de opinião, e, em qualquer caso, a de brasileiros; criou a assistência judiciária para os necessitados... Inovou ainda a Constituição no que se refere ao direito de propriedade, afirmando que o direito de propriedade não poderia ser exercido contra o interesse social ou coletivo (GROFF, 2008, p. 9-10).

Ato contínuo, em 1937, Getúlio Vargas orquestrou um golpe de Estado, onde foi adotado um regime ditatorial, o qual tirava todo amparo da sociedade perante o Estado, quando se fala em direitos e garantias fundamentais.

O mesmo pensador, sobre o evento, pontua que:

Getúlio Vargas provocou um golpe de Estado, em 1937, apoiado pelos militares... O regime imposto tentou angariar alguma legitimidade, apresentando uma nova Constituição. Diante dessa conjuntura ditatorial, os direitos fundamentais ficam sem qualquer garantia (GROFF, 2008, p. 11).

Após a ditadura de Getúlio Vargas, em 1946, surgiu uma nova constituição muito semelhante à de 1934, quanto aos direitos e garantias fundamentais, mostrando estar mais focada em se livrar do, então, passado de ditadura, focando-se na redemocratização.

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Groff (2008, p.14) comenta que “a Constituição de 1946, que veio dentro do contexto da democratização do país, também restabeleceu os direitos fundamentais previstos na Constituição de 1934”.

Novamente, o Brasil sofre um golpe de Estado, dessa vez, tendo os militares como liderança, ficando, novamente, em 1964, o povo brasileiro à mercê da ditadura. A consequência desse regime foi a falta de direitos e garantias fundamentais, ainda mais rigorosa que em 1937.

Groff (2018, p. 17) comenta que “como em qualquer regime ditatorial, os direitos fundamentais foram duramente afetados desde as primeiras horas do golpe militar, em 31 de março de 1964. Os direitos fundamentais sofreram restrições com os Atos Institucionais”.

Em 1984, o povo foi para a rua pedindo pelas “diretas já”. Como sequência, o regime militar, que já estava enfraquecido, definhou definitivamente e, em 1988, surgiu a atual Constituição Federal, que permitiu eleições diretas e a redemocratização do Brasil pós-ditadura.

Concluindo, tem-se dos relatos de Groff (2008, p. 19) que:

Em 1984 surge o movimento pelas “Diretas Já”, que defendia a aprovação no Congresso Nacional da Emenda Constitucional prevendo as eleições diretas para Presidente da República. Esse movimento conseguiu mobilizar grandes manifestações de massa, e é um ponto marcante da democratização, embora não tenha conseguido a aprovação da Emenda nesse período. Foi apenas com a Constituição de 1988 que as eleições passaram a ser diretas em todos os níveis.

Nesse raciocínio, é possível afirmar que a Constituição Federal de 1988 trouxe novamente a democracia ao Brasil, bem como reestruturou e firmou os direitos e garantias fundamentais. No ponto, a Constituição Cidadã inovou ao trazer direitos de três dimensões, ao contrário das anteriores que trouxeram apenas direitos de primeira e segunda dimensão.

Para elucidar, os de primeira geração são os direitos e garantias individuais, civis e políticos, ao passo que os de segunda geração são os direitos econômicos, sociais e culturais. Por fim, a terceira geração diz respeito aos direitos de fraternidade e solidariedade. Sobre o tema:

A Constituição contempla as três gerações ou dimensões de direitos apontadas pela doutrina moderna: direitos de primeira, segunda e terceira geração. Essa classificação realizada pela doutrina baseia-se na ordem cronológica em que esses direitos foram recepcionados em nível constitucional, e são cumulativos. Os direitos fundamentais de primeira geração são os direitos e garantias individuais, civis e políticos, que

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surgiram no fim do século XVIII. Os direitos de segunda geração são os direitos econômicos, sociais e culturais, que surgiram na primeira metade do século XX. E os direitos de terceira geração são os direitos de solidariedade ou de fraternidade, que surgiram na segunda metade do século XX. As Constituições brasileiras de 1824 e 1891 apenas traziam direitos de primeira geração. As Constituições de 1934, 1937, 1946, 1967 e 1969 trouxeram direitos de primeira e segunda geração. Portanto, inova a Constituição de 1988 com os direitos de terceira geração (GROFF, 2008, p.21-22).

Em contínuo, Groff (2008, p. 22) completa que:

O Título II da Constituição (Dos Direitos e Garantias Fundamentais) está subdividido em cinco capítulos:

a) Capítulo I – Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos (art. 5o): corresponde aos direitos de primeira geração; são os direitos individuais que se subdividem em direitos civis e políticos; nesse capítulo estão basicamente os direitos civis; tratam das denominadas liberdades negativas, pelo fato de se dirigirem contra o Estado e exigirem a abstenção deste; b) Capítulo II – Dos Direitos Sociais (arts. 6o -11): corresponde aos direitos de segunda geração; são as denominadas liberdades positivas dos indivíduos, pelo fato de exigirem a intervenção do Estado, que deve assegurar certas prestações aos indivíduos;

c) Capítulo III – Da nacionalidade (arts. 12-13): está dentro dos direitos de primeira geração, são direitos políticos;

d) Capítulo IV – Dos Direitos Políticos (arts. 14-16): está dentro dos direitos de primeira geração;

e) Capítulo V – Dos Partidos Políticos (art. 17): está dentro dos direitos de primeira geração, são os direitos políticos.

Isso posto, tem-se que os Direitos e Garantias Fundamentais, presentes no Título II da Constituição de 1988, pregam, de forma geral, garantias para o cidadão, protegendo-o tanto do Estado, quanto de particulares, além de dar amparo e garantias necessárias para que todos possam ter uma vida digna e, acima de tudo, livre.

Finalizadas essas considerações iniciais, no item seguinte, serão amplamente estudadas as dimensões dos direitos fundamentais.

2.3 DIMENSÕES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Os Direitos Fundamentais são classificados em 3 principais dimensões pelos doutrinadores. De acordo com, Diógenes Júnior:

[...] os estudiosos costumam dividi-los em gerações ou dimensões, conforme sua ingerência nas constituições. Paulo Bonavides foi um dos principais constitucionalistas que leu os direitos fundamentais a partir de um perfil histórico, agrupando os mesmos em gerações de direitos. Afirma-se que esta divisão está amparada no surgimento histórico dos direitos fundamentais, sendo que parte doutrina tem evitado o termo “geração”, trocando-o por “dimensão”. Isso porque a idéia de “geração” está diretamente ligada à de sucessão, substituição, enquanto que os direitos

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fundamentais não se sobrepõem, não são suplantados uns pelos outros. (2012, p.1).

Então, podemos afirmar que a classificação em dimensões ocorre, pois, não surgiram todos os direitos na mesma época. À medida que apareciam as necessidades, eram adquiridos novos direitos, de modo que cada dimensão se remete a uma época e a um rol específico de direitos.

Outrossim, quando se fala no grau dos direitos fundamentais, existe um certo entendimento de cada autor quanto à nomenclatura. Alguns utilizam “gerações” e outros “dimensões” dos direitos fundamentais, no entanto, apesar da nomenclatura diferente, tratam da mesma matéria.

Quanto a essa nomenclatura, Diógenes Júnior (2012, p.1) explica que:

[...] o termo mais coerente com a evolução dos direitos fundamentais seria a expressão “dimensão”, e não “gerações”, conforme é utilizado por parte da doutrina. A exclusão do termo geração seria em virtude da impossibilidade de uma dimensão dos direitos “apagarem” a dimensão anterior, uma vez que os direitos se complementam jamais se excluem.

Sendo assim, vê-se que, atualmente, uma dimensão não anula a outra, por existirem em simultâneo, utilizando-se o termo dimensão, quando se trata das “fases” dos direitos fundamentais.

2.3.1 Primeira Dimensão

Os direitos de primeira dimensão seriam os mais conectados às liberdades e às necessidades da pessoa humana. De uma forma mais ampla, visam a proteção da coletividade perante o Estado, com garantias mais básicas, mas muito importantes para a manutenção da dignidade humana, mínimas para cada pessoa existir dignamente.

Sobre os direitos de primeira dimensão, nas palavras de Tavares (2012, p. 502):

Neste primeiro conjunto de direitos encontram-se, v. g., a proteção contra a privação arbitrária da liberdade, a inviolabilidade do domicílio, a liberdade e segredo de correspondência. Também pertencem à primeira dimensão liberdades de ordem econômica, como a liberdade de iniciativa, a liberdade de atividade econômica, a liberdade de eleição da profissão, a livre disposição sobre a propriedade etc. Já as liberdades políticas referem-se à participação do indivíduo no processo do poder político. As mais importantes são as liberdades de associação, de reunião, de formação de partidos, de opinar, o direito de votar, o direito de controlar os atos estatais e, por fim, o direito de acesso aos cargos públicos em igualdade de condições (2012, p. 502).

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Então, resumidamente, vê-se que na primeira dimensão são tratados, prioritariamente, sobre os direitos pessoais e individuais, impondo ao Estado normas que garantam a seguridade das pessoas.

2.3.2 Segunda Dimensão

Os direitos de segunda dimensão são direitos sociais e estão diretamente ligados aos direitos de primeira dimensão, de tal modo, que servem como uma espécie de “muleta”, que os alavanca e garante que sejam, de fato, cumpridos, além de oferecerem meios materiais para isso.

Nos ensinamentos de Tavares (2012, p. 503):

O que essa categoria de novos direitos tem em mira é, analisando-se mais detidamente, a realização do próprio princípio da igualdade. De nada vale assegurarem-se as clássicas liberdades se o indivíduo não dispõe das condições materiais necessárias a seu aproveitamento. Nesse sentido, e só nesse sentido, é que se afirma que tal categoria de direitos se presta como meio para propiciar o desfrute e o exercício pleno de todos os direitos e liberdades.

Sendo assim, a segunda dimensão complementa a primeira, pois na segunda é cobrado do Estado estruturas que disponibilizem à população o direito à saúde, à educação, à segurança e a outros direitos que se enquadram na primeira geração, tendo uma garantia maior que ambos estarão resguardados.

2.3.3 Terceira Dimensão

Na terceira dimensão, temos os direitos chamados de difusos e coletivos, que englobam um grupo de pessoas que necessitam de determinada benesse, tal como, moradores de uma cidade que merecem um devido cuidado especial ou quem tem uma doença que necessita de um remédio inexistente no país de origem.

Nas palavras de Cavalcante Filho (2020, p.13), temos uma exemplificação dos direitos de terceira dimensão:

Por exemplo: a poluição de um riacho numa pequena chácara em Brazlândia-DF atinge as pessoas que lá vivem. Mas não só a elas. Esse dano ambiental atinge também a todos os que vivem em Brasília, pois esse riacho deságua na barragem que abastece de água todo o Distrito Federal. E mais: atinge todas as pessoas do mundo, pois é interesse mundial manter o meio-ambiente ecologicamente equilibrado.

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Sendo assim, podemos concluir que estes garantem direitos não só uma pessoa específica, mas de um grupo de pessoas que precisam de algo específico, sendo esse o meio mais eficaz para tal.

Identificado o conceito, as dimensões e as fases dos direitos fundamentais, em contínuo, para melhor compreensão do tema, passar-se-á a identificar as particularidades dos direitos fundamentais.

2.4 CARACTERÍSTICAS

Para melhor compreensão, serão abordadas as seguintes características dos direitos fundamentais:

a) Universalidade: os direitos fundamentais são para todos os cidadãos sem distinção de credo, raça ou outras formas de discriminações;

b) Inalienabilidade: pode ser necessário a execução de mais de um direito fundamental ao mesmo tempo;

c) Aplicação imediata: tem caráter imediato, justificado pela urgência dos direitos, por serem muito importantes;

d) Irrenunciabilidade: não pode o direito fundamental ser renunciado, devido ao seu caráter coletivo;

e) Historicidade: muitos direitos foram conquistados de acordo com a necessidade de cada época, tendo todo seu contexto histórico por trás;

f) Indivisibilidade: não podem ser analisados separadamente, deve ser observado todo o contexto, pois, de certa forma, um depende de outro;

g) Concorrência: os direitos devem existir em harmonia, mas, caso ocorra algum conflito, deve-se chegar em um consenso, preservando ambos os direitos conflitantes;

h) Imprescritibilidade: não prescreverem, não se perdem com o tempo, sendo, assim, permanentes.

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2.4.1 Universalidade

No item 5 da Declaração de Viena de 1993, onde foi tratado sobre os direitos humanos, pontua-se que a universalidade é uma das características dos direitos fundamentais:

5. Todos os Direitos Humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e interrelacionados. A comunidade internacional deve considerar os Direitos Humanos, globalmente, de forma justa e eqüitativa, no mesmo pé e com igual ênfase. Embora se deva ter sempre presente o significado das especificidades nacionais e regionais e os diversos antecedentes históricos, culturais e religiosos, compete aos Estados, independentemente dos seus sistemas políticos, econômicos e culturais, promover e proteger todos os Direitos Humanos e liberdades fundamentais. (ONU, 1993).

Quando se fala em universalidade, refere-se à pluralidade do direito, ou seja, em todos que ele pode tocar, pois, o direito não é apenas para um, mas para todos, sendo um bem de toda a coletividade.

Repisa-se que, de forma ampla, a universalidade abrange toda a sociedade, chegando aos mais distintos grupos de pessoas.

Nas palavras de Alves (1994) apud Tavares (2012, p. 511):

Universalidade implica qualidade ou natureza. Ao dizer “universalidade dos direitos humanos”, procura-se declarar que todos são sujeitos desses direitos. Assim, universalidade refere-se à amplitude subjetiva. Todo Homem, pelo fato de o ser, possui tais direitos, que são, portanto, universais. Se há alguma divergência, tal reside na forma de aplicação dos direitos humanos.

Como podemos observar, a universalidade busca abranger toda a sociedade, para que todos tenham seus direitos em exercício.

2.4.2 Inalienabilidade

Na inalienabilidade, há a intransferência do direito, isto é, são direitos que estão além da vontade do possuidor, que amparam, até mesmo, quem não os quer, pois, têm uma característica muito pessoal com o necessitado do direito.

Nas palavras de Diógenes Júnior (2012, p.1):

Inalienabilidade: tais direitos, por não possuírem conteúdo econômico-patrimonial, são intransferíveis, inegociáveis e indisponíveis, estando fora do comércio, limitando o princípio da autonomia privada. Tal inalienabilidade resulta da dignidade da pessoa humana, sendo que o homem jamais poderá deixar de ser homem, tendo sempre os direitos fundamentais como alicerce para garantia de tal condição.

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Denota-se, que a inalienabilidade abrange direitos muito importantes, como, por exemplo, o direito à vida, podendo ser feito um adendo e relacionando isso com o aborto, que no Brasil é proibido, salvo quando justificado.

Para elucidar, tem-se a seguinte situação como exemplo: a mãe pode querer abortar, mas o direito à vida do filho está acima da vontade da genitora, não podendo ser transferido o direito do filho para a genitora.

2.4.3 Aplicação Imediata

Os preceitos definidores dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata, conforme temos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (BRASIL, CRFB, 2020):

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

Visto à urgência e à importância dos direitos e garantias fundamentais, para o ser humano e para a coletividade, no geral, se dá aplicação imediata a essas normas.

A necessidade da celeridade, se dá no tipo de direito que é atendido, por exemplo, o direito à vida, quando o necessitado está em situação de risco de vida, precisa de celeridade, pois cada minuto conta para obter êxito.

2.4.4 Irrenunciabilidade

Os direitos e garantias fundamentais, por serem essenciais, em regra, não estão sujeitos à abnegação, visto que são direitos da coletividade, não podendo o interessado abdicar de tal direito.

Nas palavras de Tavares (2012, p. 840):

Outra característica, própria dos direitos sociais do trabalho, comumente apontada pelos doutrinadores, é a denominada irrenunciabilidade. Os direitos sociais são, nesse sentido, considerados normas cogentes, vale dizer, de ordem pública, não anuláveis por força da vontade dos interessados ou, no caso das relações trabalhistas, pela vontade das partes contratantes. Neste caso, ao trabalhador, por se tratar de parte hipossuficiente, sempre em posição de desvantagem em relação ao

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empregador, não é dado abrir mão ou dispor dos direitos anotados pela Constituição (2012, p. 840).

Novamente, pode ser usado o exemplo da situação anterior, mas em outro sentido, no sentido de que a genitora mesmo tendo poder sobre seu corpo, não pode renunciar o direito à vida do embrião.

2.4.5 Historicidade

Os direitos e garantias fundamentais foram se aprimorando com a história, não se formaram todos de uma só vez, existindo todo um contexto histórico, de acordo com o que se passou em cada momento.

Nesse contexto, Diógenes Júnior (2012, p.1) ensina que “os direitos fundamentais não surgiram simultaneamente, mas aos poucos, em consonância com a demanda de cada época”.

Devido às necessidades apontadas em cada instante, foram surgindo cada vez mais novos direitos fundamentais, conforme aparecia uma necessidade, se entendia a sua dimensão e procurava-se um método eficaz para que fosse sanada, de forma eficaz, garantindo dignidade a todos.

Como consequência, se originaram a classificação em três principais dimensões de direitos e garantias fundamentais, conforme já estudamos nesta pesquisa, visto que foram em momentos diferentes que cada um surgiu.

2.4.6 Indivisibilidade

Os direitos fundamentais, de certa forma, têm o mesmo objetivo, que é garantir o mínimo para cada pessoa viver livremente e com dignidade, consequentemente, não podem ser analisados separadamente, visto o único objetivo.

Pestana (2018, p. 1) expõe que

[...] os direitos fundamentais não podem ser analisados de forma isolada, sendo eles um conjunto. Dessa forma, observa-se que a agressão a um deles pode representar agressão a todos. Não existiria um meio termo ao se falar em direitos fundamentais.

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Nesse contexto, vê-se que os direitos fundamentais fazem todos parte de uma coisa só, algo maior, de modo que devem ser analisados todos no contexto, pois, muitas vezes, um complementa o outro.

2.4.7 Concorrência

Normalmente, os direitos fundamentais devem coexistir em harmonia, mas podem ocorrer conflitos entre eles, como por exemplo a questão apontada nesta pesquisa.

Sendo assim, Cavalcante Filho (2020, p.11) discorre que:

Os direitos fundamentais podem entrar em conflito uns com os outros. Ex: direito à vida x liberdade de religião; direito à intimidade x liberdade de informação jornalística. Nesses casos de conflito, não se pode estabelecer abstratamente qual o direito que deve prevalecer: apenas analisando o caso concreto é que será possível, com base no critério da proporcionalidade (cedência recíproca), definir qual direito deve prevalecer. Mesmo assim, deve-se buscar uma solução “de consenso”, que, com base na ponderação, dê a máxima efetividade possível aos dois direitos em conflito (não se deve sacrificar totalmente nenhum dos direitos em conflito).

Em vista disso, deve-se chegar em um denominador comum, que preserve os direitos conflitantes. Essa ponderação depende muito de cada caso, de qual seria a máxima necessidade e de qual direito seria mais necessário em determinado momento, sendo ponderado e “colocado na balança”.

2.4.8 Imprescritibilidade

Os direitos fundamentais não têm prazo de validade, podendo ser aplicados independente do decurso de tempo.

Nas palavras de Carrió (1990) apud Tavares (2012, p. 498), isso ocorre porque “ao entender que os direitos subjetivos podem desaparecer, por meio da transferência ou da prescrição, os direitos humanos apresentam, ao contrário, a nota da imprescritibilidade e da inalienabilidade”.

Portanto, devido à grande importância dos direitos e garantias fundamentais, eles não prescrevem, por garantirem o mínimo necessário para a pessoa humana.

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Encerrado os estudos das características gerais dos direitos e garantias fundamentais, o presente estudo passará a estudar os conceitos e particularidades do direito da liberdade de locomoção e do direito à vida.

2.5 LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO

O chamado direito de ir e vir, como já falado anteriormente é um direito fundamental de segunda dimensão, estando amparado pelo art. 5º, XV da Constituição Federal de 1988, vejamos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens (BRASIL, CRFB, 2020)

Nesse contexto, pode-se concluir que qualquer pessoa, em tempos de paz, é livre para circular em todo o território nacional, tendo a liberdade de ir aonde bem entender. Essa é uma das garantias que mais mostra a força da democracia, que fala, de fato, da liberdade das pessoas na sociedade no quesito da locomoção.

Esse é um direito que o do homem carrega há muito tempo, diante da sua necessidade. Desde a idade média, há relatos sobre a liberdade de locomoção, notadamente, por ser um direito básico que todos precisam para ter o mínimo de dignidade e qualidade de vida.

Nas palavras de Cassales (2001, p. 34):

Não se trata de um direito novo, visto que era garantido aos cidadãos livres da Grécia e de Roma. Na Idade Média, após terem serenado os tumultos provocados pelas invasões bárbaras, ressurgiu a aspiração pela proteção à liberdade de locomoção. Tanto é assim, que essa liberdade foi assegurada pela Magna Carta outorgada, há 800 anos, pelo rei João da Inglaterra

Por sua vez, Tavares (2012, p. 652) completa esse raciocínio ao pontuar que “trata-se de norma de eficácia contida, podendo a lei regular sua aplicação e incidência, estabelecendo, inclusive, restrições, nunca, porém, arbitrárias, devendo sempre haver motivo fundante.”

Sendo assim, liberdade não significa poder fazer, literalmente, tudo. Podem haver algumas ressalvas reguladas por lei, visando o bem maior para a

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coletividade, todavia, importante frisar que sempre deve haver um motivo determinante para qualquer limitação, conforme expõe Tavares (2012, p. 652-653):

[...] os bens de uso comum do povo, como as ruas, os logradouros públicos, as praias, não admitem restrição quanto à circulação das pessoas. O Poder Público não pode impedir que as pessoas passem por determinada via pública. Admite-se, apenas, que a Administração, no interesse social, discipline o trânsito, para tanto limitando seu fluxo em determinado sentido, criando proibições de estacionamento ou impedindo a utilização de certos veículos (como caminhões, ou veículos com determinada placa) em razão de problemas ambientais, de saúde pública ou mesmo por força da contingência de disciplinar o próprio trânsito, podendo, ainda, interditar totalmente o tráfego em razão da realização de obras etc.

É sabido que nossa sociedade é gerida pelo Estado, que detém o poder para decidir o melhor para a coletividade, com base nisso é que o governo pode interferir no ponto que lhe compete, para garantir os direitos previstos na carta-magna.

Em momentos que a liberdade de locomoção é afetada, pode ser usado um remédio constitucional, o Habeas Corpus, visando a soltura do cidadão que teve seu direito fundamental de ir e vir ferido.

Sobre o ponto, Cardoso (2016, p.1) aponta que “quando esta liberdade é violada é cabível a utilização do Habeas Corpus (HC), instrumento jurídico utilizado para proteger o direito de ir e vir ou daqueles que sentem que este direito encontra-se ameaçado”.

Isto é, se, porventura, venha a ser ferida a liberdade de locomoção, o direito ferido pode ser reestabelecido por meio de habeas corpus, protegendo, assim, a liberdade da vítima. No que se refere à legitimidade ativa, o remédio pode ser impetrado por qualquer pessoa, seja em seu próprio nome ou de outrem.

Sobre o Habeas Corpus nas palavras de Moraes (2016, p. 116):

Assim, qualquer do povo, nacional ou estrangeiro, independentemente de capacidade civil, política, profissional, de idade, sexo, profissão, estado mental, pode fazer uso do habeas corpus, em benefício próprio ou alheio (habeas corpus de terceiro). Não há impedimento para que dele se utilize pessoa menor de idade, insana mental, mesmo sem estarem representados ou assistidos por outrem. O analfabeto, também, desde que alguém assine a petição a rogo, poderá ajuizar a ação de habeas corpus.

O direito de locomoção faz parte dos direitos fundamentais, sendo ele de suma importância. Para Cardoso (2016, p.1), mesmo que o direito de locomoção faça parte esteja previsto no rol de direitos e garantias fundamentais, isso não o faz absoluto, podendo, em alguns casos, ser restringido.

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Nesses casos, em que há necessidade de se limitar os efeitos dos preceitos fundamentais, deve ser observado um “sistema” de ponderações, o que será analisado mais adiante neste trabalho.

Sobre essas restrições, Cardoso (2016, p.1) explica que:

Ocorre que a Constituição, em sua própria garantia fundamental, restringe sua aplicação ao proclamar a livre locomoção “nos termos da lei”, deixando a cargo da legislação infraconstitucional a regulação da sua efetividade, ou seja, o direito de ir e vir pode ser restrito, mas não abolido (2016, p. 1).

Isto é, em casos específicos, o direito de liberdade de locomoção pode ser parcialmente restringido, desde que não cesse por completo. Exemplo disso é a situação de flagrante delito, amparado pelo Artigo 5º, inciso LXI, da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, CRFB, 2020):

Art. 5. [...]

LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei

Sendo, então, nas hipóteses de flagrante delito, por ordem de autoridade judiciária, crimes e transgressões militares, que o direito de locomoção pode ser limitado.

Nesse contexto, a liberdade de locomoção engloba quatro situações, sendo elas: (i) direito de acesso e ingresso no território nacional; (ii) direito de saída do território nacional; (iii) direito de permanência no território nacional; e (iv) direito de deslocamento dentro do território nacional (MORAES, 2016, p. 116).

Ainda, no mesmo pensamento, cumpre salientar que a livre locomoção abrange tanto brasileiros como estrangeiros, independente de residir ou não no Brasil (MORAES, 2016, p. 116).

Do mesmo modo, a questão da residência ou nacionalidade também não afasta o poder do legislador em fixar restrições quanto ao ingresso, à saída e à circulação interna de pessoas e patrimônios (MORAES, 2016, p. 116).

Em contínuo, a carta magna prevê um caso atípico que restringe o direito de locomoção, vejamos:

Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas: I - Obrigação de permanência em localidade determinada (BRASIL, CRFB, 2020).

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Como visto acima, no Artigo 139 da CRFB, o direito de locomoção é restringido e obriga a permanência em localidade determinada, na situação em que tenha sido decretado estado de sítio.

De acordo com Cassales (2001, p.38):

O direito de ir e vir, como todos os direitos, tem, inicialmente, como limite natural o direito do outro. Não pode alguém, com base no direito de ir e vir e permanecer, por exemplo, obstar à passagem de quem também esteja exercendo sua liberdade de circulação. Além desse limite natural, indispensável à convivência social pacífica, está esse direito limitado pela lei, consoante o que dispõe o dispositivo constitucional que o assegura.

Sendo assim, o beneficiário do direito de locomoção não pode se valer dele para ferir o direito do próximo, como, por exemplo, trancar uma calçada arbitrariamente, sem autorização ou permissão do Estado.

Essa atitude terá como consequência o ferimento do direito de locomoção do próximo, todavia o direito de um cidadão não é mais valioso que o de outro, visto que, ao viver em sociedade, se aceita no pacto social a convivência com outras pessoas, exigindo-se o bom senso para viver em harmonia.

Sobre o Pacto Social, de acordo com Rousseau (1983, p. 50):

O pacto social estabelece entre os cidadãos uma tal igualdade, que eles se comprometem todos nas mesmas condições e devem todos gozar dos mesmos direitos. Igualmente, devido a natureza do pacto, todo ato de soberania, isto é, todo ato autêntico da vontade geral, obriga ou favorece igualmente todos os cidadãos.

Como visto, para conviver em sociedade deve-se pensar no próximo, não se pode, assim, ferir o direito alheio pensando individualmente, tem que sempre levar em conta as pessoas ao seu redor, respeitando o princípio da isonomia.

Nesse sentido, tem-se na Constituição Federal:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (BRASIL, CRFB, 2020).

Assim, afirmando que todos são iguais, não sendo ninguém superior a outrem, para seu direito valer mais que de outro, todos devem ser tratados de maneira igualitária, bem como serem disponibilizados à coletividade os mesmos direitos e prerrogativas.

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2.5.1 Limitações ao direito de ir e vir

O direito de ir e vir só é pleno em tempos de paz, como menciona a Carta Superior:

Art. 5º. [...]

XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens (BRASIL, CRFB, 2020).

Sendo assim, pode haver restrições no direito de ir e vir, nos casos em que seja decretado Estado de Defesa e/ou Estado de Sítio, como em situação de guerra, mas com ponderação entre o que é melhor para a coletividade.

A Constituição Cidadã rege os casos e peculiaridades do estado de defesa:

Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

§ 1º O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes: I - restrições aos direitos de:

a) reunião, ainda que exercida no seio das associações; b) sigilo de correspondência;

c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica;

II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.

§ 2º O tempo de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação.

§ 3º Na vigência do estado de defesa:

I - a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial;

II - a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação;

III - a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário;

IV - é vedada a incomunicabilidade do preso.

§ 4º Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República, dentro de vinte e quatro horas, submeterá o ato com a respectiva justificação ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta. § 5º Se o Congresso Nacional estiver em recesso, será convocado, extraordinariamente, no prazo de cinco dias.

§ 6º O Congresso Nacional apreciará o decreto dentro de dez dias contados de seu recebimento, devendo continuar funcionando enquanto vigorar o estado de defesa.

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O estado de defesa é uma situação ímpar, em que existe necessidade de o Presidente da República suspender algumas garantias fundamentais, uma delas o direito de ir e vir, até que a excepcionalidade cesse.

Na sequência da carta superior, rege-se sobre as possibilidades de ser decretado estado de sítio:

Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:

I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa; II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.

Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta.

Ou seja, se devidamente motivado, deve o Presidente da República pedir ao Congresso Nacional permissão para que seja decretado estado de sítio, nos casos de grave comoção com repercussão nacional ou se for atestado ineficácia da medida que mantém estado de defesa.

Do mesmo modo, também deve ser decretado estado de sítio em casos de guerra ou envolvimento em conflitos armados com o estrangeiro.

Nesse diapasão, a Constituição Federal determina as medidas quando decretado estado de sítio:

Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas: I - obrigação de permanência em localidade determinada;

II - detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;

III - restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;

IV - suspensão da liberdade de reunião; V - busca e apreensão em domicílio;

VI - intervenção nas empresas de serviços públicos; VII - requisição de bens.

Parágrafo único. Não se inclui nas restrições do inciso III a difusão de pronunciamentos de parlamentares efetuados em suas Casas Legislativas, desde que liberada pela respectiva Mesa.

De modo geral, pode ser suspenso o direito de ir e vir, visto que poderá ser determinado que um certo grupo de pessoas deva permanecer em um local específico.

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Por sua vez, no que se refere à inviolabilidade do domicílio, o Estado, no estrito cumprimento do dever legal, pode fazer, arbitrariamente, buscas e apreensões nos domicílios.

Além disso, a liberdade de expressão também pode ser contida, isto é, uma espécie de “censura”, visto que existe intromissão nos empreendimentos de atividades públicas, de imprensa e em diversas mídias.

Uma das restrições do direito de ir e vir permitidas no Brasil é referente às crianças e aos adolescentes, que aborda, além do direito de ir e vir, as obrigações dos responsáveis por eles.

Nas palavras de Araújo (2019, p. 131):

A idade das crianças, a sua maturidade e desenvolvimento, porque não estereotipáveis, importam que cada criança seja um todo em desenvolvimento com necessidades não comparáveis com outrem da mesma idade, para além da “sua” concreta realidade e inserção social, cultural e concreta realidade familiar.

Isto é, quando se fala em direito de ir e vir para crianças e adolescentes, acaba sendo muito relativo, visto que cada criança tem seu tempo de desenvolvimento, assim, existindo diferentes níveis de maturidade.

No Artigo 227 da Constituição Federal de 1988, temos:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, CRFB, 2020).

A respeito, é dever da família dar amparo à criança e ao adolescente, ainda que, subsidiariamente, o dever recaia sobre a sociedade e o Estado, devido à necessidade de apoio que o ser humano necessita durante o seu desenvolvimento, precisando de uma estrutura para o seu crescimento sadio.

De acordo com Araújo (2019, p. 131):

Esta situação ganha particular acuidade atendendo à necessidade de protecção da criança e da infância pelo que as decisões que se tomam, por esta, em tenra idade, influenciam, directamente, o seu desenvolvimento, formação de personalidade e a própria identidade não podendo contar, razoavelmente, com todas as opiniões que ela exprima para a sua vida, atendendo à maturidade e à própria exposição à informação, o que nem sempre será fácil de discernir.

Sendo assim, nota-se que é de suma importância a proteção do menor, visando garantir uma estrutura saudável, visto que isso pode influenciar no seu

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caráter. Como as crianças são o futuro da nação, além da questão humanitária para garantir o futuro, deve-se resguardar os seus direitos, diante da sua vulnerabilidade.

Nas palavras de Silva (2008, p.1), é “dever dos pais de restringir a liberdade de locomoção dos filhos menores, como forma de resguardá-los e de lhes garantir um sadio desenvolvimento biopsicossocial.”

Ou seja, os pais, além de poder, devem restringir a liberdade de ir e vir dos seus filhos, visando o melhor para o desenvolvimento do infante, tal como, proibindo de ir em algum local perigoso ou festas onde possa haver eventual consumo de álcool ou outros entorpecentes, sendo essa a primeira obrigação moral dos pais.

No Estatuto da Criança e do Adolescente, temos que:

Art. 83. Nenhuma criança ou adolescente menor de 16 (dezesseis) anos poderá viajar para fora da comarca onde reside desacompanhado dos pais ou dos responsáveis sem expressa autorização judicial.

Isto é, em casos que exista falha na supervisão dos genitores ou, até mesmo, abandono, o Estado, de certa forma, intervém, restringindo o direito de ir e vir, proibindo que o menor de 16 (dezesseis) anos viaje desacompanhado, visando cuidar do menores de idade, quando os pais não o fazem.

Ainda, no mesmo diploma legal:

Art. 75. Toda criança ou adolescente terá acesso às diversões e espetáculos públicos classificados como adequados à sua faixa etária.

Como já falado anteriormente, em casos de falha na supervisão ou abandono dos pais o Estado tem o dever de intervir. Essa é outra situação que a intervenção poderá ocorrer, garantindo que o entretenimento cultural visto pela criança/adolescente seja compatível com a sua idade e formação, o que reforça o argumento de que aquilo que vimos na nossa infância é o que nos estrutura na vida adulta, tendo direta relação com o caráter.

Outra forma que o Estado priva a liberdade de locomoção é a prisão, que pode ser “um ‘castigo’ imposto pelo Estado ao condenado pela prática de infração penal, para que este possa se reabilitar visando restabelecer a ordem jurídica violada” (PRISÃO..., 2008, p.1).

Nesse interim, pode-se concluir que o Estado usa a restrição de liberdade como um meio para que o condenado por prática delituosa seja reabilitado e retorne à vida em sociedade.

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No Código Penal, temos os requisitos para que seja lavrado o Mandado de Prisão:

Art. 285. A autoridade que ordenar a prisão fará expedir o respectivo mandado.

Parágrafo único. O mandado de prisão:

a) será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade;

b) designará a pessoa, que tiver de ser presa, por seu nome, alcunha ou sinais característicos;

c) mencionará a infração penal que motivar a prisão;

d) declarará o valor da fiança arbitrada, quando afiançável a infração; e) será dirigido a quem tiver qualidade para dar-lhe execução.

Portanto, mesmo que a restrição de liberdade de um cidadão seja justificada, observa-se que existe um procedimento a ser seguido, pois, de certa forma, na ocasião de uma prisão, está sendo ferido o direito de ir e vir de alguém.

Assim, ao preencher as condições necessárias exigidas em lei, o ato praticado ficará livre de qualquer vício ou abuso de poder, bem como evitará a restrição de liberdade injustamente, privando eventual direito de ir e vir sem justa motivação.

2.5.2 Do direito de ir e vir e a cobrança de pedágio

Para Cassales (2001, p. 39), a criação de pedágios é um dos exemplos mais recentes que demonstram a limitação do direito de ir e vir, inclusive, já prevista no Código Civil:

Art. 103. O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem.

Conforme vemos nesse dispositivo legal, já existe uma certa disponibilidade quanto à cobrança de pedágio. Ao mencionar “gratuito ou retribuído”, o artigo deixa aberta a possibilidade de concessão de pedágios e cobranças para transitar em via pública.

Cassales (2001, p. 39-40) pontua que:

O pedágio, seja como forma de arrecadação de recursos para a construção e manutenção de estradas, seja como fonte de riquezas sem destinação específica, ou, ainda, como meio de reduzir ou impedir a circulação de pessoas, veículos e bens, provavelmente instituído pelos romanos, foi amplamente utilizado na Idade Média, tanto pelos reis como pelos senhores feudais.

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Como vemos, o pedágio é uma prática muito antiga, que muitas vezes visa à manutenção das próprias vias públicas, sendo uma maneira muito válida para que sejam feitas manutenções de forma hábil e, até mesmo, construções de mais faixas, evitando engarrafamentos nas estradas.

Sobre a concessão, Cassales (2001, p. 40) conclui que “o pedágio apresenta, como uma de suas características, a interferência no processo de distribuição de rendas. E isso porque transfere o ônus da conservação e melhoramento das estradas de toda a sociedade para os usuários das rodovias”.

Isto é, apesar de ser uma obrigação originária do Estado, é realizada uma concessão à empresa de natureza privada, que transfere o custeio dos serviços ao usuário final, qual seja, o cidadão, acarretando ainda mais gastos, visto que já são pagos tributos com a finalidade de ter esse tipo de estrutura garantida pela máquina estatal.

Nada obstante, ainda que acarrete a majoração de gastos, em vista da qualidade do serviço, ainda vale a pena, pensando na coletividade, pois a maioria precisa de um serviço de maior qualidade que o Estado, na prática, não tem condições de prestar.

Desse modo, é paga uma “taxa a maior” para que seja prestado um serviço de qualidade, podendo ser construídas novas faixas, evitando engarrafamentos e tendo uma via com manutenção em dia, menos buracos, além de serviços prestados pela empresa responsável pelo pedágio, como reboque caso ocorra algum problema no veículo do “consumidor”.

Sobre pedágio, temos na jurisprudência:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRETENSÃO OBJETIVANDO A GRATUIDADE DO PAGAMENTO DA COBRANÇA DO PEDÁGIO DE RODOVIA PRÓXIMA AO LOCAL EM QUE RESIDE. DECISÃO DO JUÍZO SINGULAR QUE DEFERIU O PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. INCONFORMISMO DA CONCESSIONÁRIA. - Inicialmente, declaro prejudicado o agravo interno interposto contra a decisão que indeferiu o efeito suspensivo postulado, em virtude do julgamento do recurso principal - A meu ver, não assiste razão à Agravante - Do exame dos autos originários extrai-se que a Agravada reside em localidade próxima à praça do pedágio, e está com a sua garantia constitucional de ir e vir comprometida pela necessidade do pagamento do pedágio para sair e voltar de sua residência - Com efeito, a própria Agravante em suas razões recursais admite que realizou um recadastramento das pessoas aptas a gozar do direito à isenção do pagamento do pedágio na praça de cobrança, que fica na altura do Km 192 da BR 101, para as pessoas que residam na localidade e tenham necessidade de se deslocar dentro da área do Município - Numa primeira análise, a controvérsia se concentra no fato da Agravada não ter

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comprovado que atendia aos requisitos estabelecidos pela Concessionária, para fazer jus ao benefício de isenção - A Agravada justifica não ter podido demostrar que satisfaz as condições de isenção, porque no dia agendado pela Agravante estava hospitalizada, o que a impediu de comparecer ao recadastramento - Nessa linha, entendo que os pressupostos para o deferimento da medida foram satisfeitos, tendo em vista que se mostra evidenciada a verossimilhança das alegações autorais, e o risco de lesão a direito de ir e vir da Agravada. - DECISÃO MANTIDA. - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (BRASIL, TJRJ, 2019).

Conforme visto na jurisprudência acima, existem casos que podem existir isenção, geralmente, quem tem esse direito são pessoas que residem na localidade do pedágio, que precisam passar pelo local para ir trabalhar e que não tem condições de arcar com esse custo diariamente.

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3 O DIREITO DE IR E VIR EM TEMPOS DE PANDEMIA

Primeiramente, vale falar da diferença entre pandemia e epidemia.

Resumidamente, epidemia é o termo usado quando se refere a uma doença que se espalha em uma pequena área específica, como por exemplo uma cidade.

Pandemia, por outro lado, é o termo que se usa quando uma doença se espalha para uma área maior, um ou mais países vizinhos ou, até mesmo, para uma escala mundial.

De acordo com Santos (2020, p. 1):

Quando falamos em epidemia, referimo-nos ao aumento de casos de uma doença em uma região que excede o número esperado para aquele período do ano. As epidemias podem atingir municípios, estados e até mesmo todo um país. No caso da pandemia, observa-se a distribuição da doença por diferentes países.

Cada vez mais cresce a mobilidade em escala mundial, sendo consequência da globalização. Atualmente, é muito mais fácil de se locomover para qualquer lugar do mundo do que era na antiguidade, graças ao advento de automóveis, de transportes coletivos, aviões etc., que são utilizados para turismo ou, simplesmente, para a locomoção, levando pessoas a diversos lugares do globo terrestre.

Como sempre, tudo tem seu lado negativo, em contra partida ao lado positivo, que deve ser mais positivo que negativo para valer a pena.

Isto é, com o aumento da mobilidade, principalmente em transportes públicos como aviões, navios e ônibus, vem a facilidade da proliferação de novas doenças, devido ao alto nível de exposição e contato com um grande número de pessoas.

Sobre a globalização e a proliferação da Covid-19, nas palavras de Echeverría (2020, p. 1):

O lugar de origem do vírus diz muito sobre a globalização: uma sociedade onde convivem a maior dinâmica econômica do planeta e práticas tradicionais das populações em seu relacionamento com os bosques e espécies silvestres; mercados onde essas espécies são vendidas, situados em cidades com milhões de habitantes e interconectadas com o planeta.

O local de origem do vírus tem alta movimentação de pessoas que vão para todos os locais do mundo, por consequência da globalização e da facilidade de

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mobilidade, uma das razões determinantes para a Covid-19 ter alcançado o nível mundial de forma tão sorrateira e repentina.

No ano de 2003, já se teve notícia de um surto do Corona vírus, também em escala mundial, como no caso da Covid-19.

Ocorre que, na mesma época, Silva (2003, p.1) já havia dito que “em 1894, teve início em Hong Kong a terceira pandemia de peste bubônica, foram necessários cinco anos para que chegasse ao Brasil. Desta vez, bastaram alguns dias para a chegada dos primeiros casos suspeitos.”

Acontece que muitas pessoas têm reações assintomáticas com novos vírus, pois, em muitos casos, os sintomas iniciais são semelhantes ao de uma gripe comum, o que faz com que a maioria das pessoas pensem que não seja nada grave e façam suas viagens, “tocando” suas vidas normalmente e tendo contato com várias pessoas.

Cotidianamente, com exceção às situações pandêmicas, as pessoas não têm cuidados severos de higienização, para evitar contágio de doenças, o que facilita o contágio desenfreado de novos vírus, o que vêm ocorrendo com mais frequência.

Com relação aos contaminados assintomáticos na covid-19:

[...] o que mais contribui para que a pandemia se agrave é a rapidez com que o vírus se espalha. O principal problema é que mesmo pacientes sem sintomas são capazes de transmitir o vírus. Um estudo realizado por norte-americanos e chineses publicado no periódico Science apontou que dois terços das infecções foram transmitidas por pacientes sem sintomas (POR QUE..., 2020, p. 1).

Isso reforça a ideia exposta anteriormente, isto é, aqueles que mais contribuem para a proliferação de alguma doença, geralmente, são os infectados assintomáticos (sem sintomas), porque não percebem a contaminação e levam suas vidas normalmente, além de disseminarem para diversos locais no começo de uma pandemia.

Notadamente, por conta disso, o vírus se mantém em circulação, caso não seja tomada nenhuma medida de contenção, como o isolamento social, adotado no Brasil e em diversos outros países na pandemia da Covid-19.

Conforme infectologistas, a “quarentena” ou o isolamento social é uma das medidas mais eficazes para a contenção de qualquer vírus, principalmente para

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