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Ocupação humana e a conservação do Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD), Alto Jurua-AC

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Número 35/2006

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

Pós-Graduação em Geografia

Área de Análise Ambiental e Dinâmica Territorial

MARCO AURÉLIO RODRIGUES

OCUPAÇÃO HUMANA E CONSERVAÇÃO NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DO DIVISOR (PNSD), ALTO JURUÁ - ACRE

Dissertação apresentada ao Instituto de Geociências como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Geografia, na Área de Análise Ambiental e Dinâmica Territorial.

Orientador: Prof. Dr. Daniel Joseph Hogan

CAMPINAS - SÃO PAULO

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AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente ao prof. Dr. Daniel Joseph Hogan pela paciência, carinho, companheirismo e orientação. A profa. Dra. Lúcia da Costa Ferreira e prof. Dr. Marcos César Ferreira pelas excelentes contribuições na qualificação e defesa, bem como pela cordialidade e respeito.

Ao WWF-Brasil pelo uso do laboratório de ecologia da paisagem. Aos colegas Gustavo Brana, Vevila Resende, Ekena Pinagé, Sidney Rodrigues e Talita Machado pelas discussões sobre ecologia da paisagem e a confecção dos mapas. Aos colegas Antônio Oviedo e Mariana Ramos pelas traduções. A TNC pelo apoio parcial através da bolsa de apoio a pesquisa em conservação. Ao Centro de Sensoriamento Remoto do IBAMA pelas imagens de satélite e dados de desmatamento do parque. A Fabiano Saraiva e Cláudia pela ajuda na interpretação das imagens de satélite.

Agradeço ao corpo de professores do atual programa, aos colegas de pós-graduação, pelo convívio e contribuições. Em especial a Valdirene e Edinalva da secretaria de pós-graduação do IG que me acolheram e me orientaram com amizade, cordialidade e respeito. Ao prof. Dr. Archimedes Perez Filho pelas discussões sobre geossistema e pela disponibilidade em contribuir. A Antônio Carlos Torrens, Geralda Colen, Jonas e Janina pela ajuda nos momentos mais difíceis, sem eles talvez essa dissertação não fosse possível.

Minha gratidão profunda ao meu pai, José Rodrigues Pereira e minha mãe, Célia Pedro Rodrigues pelo apoio incondicional a minha busca de realização dos sonhos. A minha irmã Fabiana Cristina Rodrigues pela cumplicidade de sentimentos e apoio nos vários momentos da vida. A minha companheira Carla Gracioto Panzeri pelo amor, aprendizado e tantas mudanças que vivenciamos juntos. As minhas filhas Rafaela e Cecília pela beleza da vida e por me ensinar a acreditar na superação das dificuldades.

Agradeço ao prof. Dr. Maurício Compiani pela amizade e pelo apoio a minha vinda para Campinas. Em especial agradeço aos moradores do parque pela forma com que me receberam em suas casas, como também pela possibilidade de compartilharmos sonhos, vivências e conhecimentos de uma região muito especial.

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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS v

EPÍGRAFE vii

SUMÁRIO ix

LISTA DE FIGURAS xiii

LISTA DE GRÁFICOS xiii

LISTA DE QUADROS xiii

LISTA DE TABELAS xv

RESUMO xvii

ABSTRACT xix

INTRODUÇÃO 01

1 HISTÓRICO DE OCUPAÇÃO DO ALTO JURUÁ 03

2 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO 11

3 PARQUE NACIONAL DA SERRA DO DIVISOR – CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA E SOCIOECONÔMICA

17

3.1 Geologia 20

3.2 Geomorfologia 23

3.3 Clima 25

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3.5 Solos 27 3.6 Vegetação 29 3.7 Biodiversidade 33 3.8 Estrutura Fundiária 35 3.9 Aspectos Socioeconômicos 35 3.10 Zoneamento do PNSD 66 4 REVISÃO DE LITERATURA 69

4.1 Parques Nacionais: Discussões e Recomendações Internacionais 69

4.2 Parques Nacionais no Brasil 75

4.3 Ocupação Humana em Parques Nacionais 82

4.4 Aspectos Jurídicos 92

4.5 Ecologia da Paisagem e Geossistema 95

5 MATERIAL E MÉTODOS 102

6 FATORES QUE INFLUENCIAM A RELAÇÃO OCUPAÇÃO HUMANA E A CONSERVAÇÃO DO PNSD

105

6.1 Desmatamento 105

6.2 A construção do plano de reassentamento das famílias (Termo de Compromisso)

113

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6.5 A criação da terra indígena Naua - sobreposição terra indígena e o PNSD 121 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS 123 8 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 127 ANEXOS 133

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LISTA DE FIGURAS

1.1 Localização da área de estudo 05

3.1 Meandro do Rio Juruá 27

3.2 Casa de farinha no PNSD 43

3.3 Paca morta em caça com cachorro na comunidade Jesumira 45

3.4 Tipos de moradias encontradas no PNSD 49

3.5 Canoa com rabeta utilizada no PNSD 51

3.6 Parque Nacional da Serra do Divisor e seu entorno 63 6.1 Carta imagem de satélite mostrando desmatamento no Peru em direção ao

PNSD

119

LISTA DE GRÁFICOS

2.1 Evolução populacional por região do Acre, entre 1970 - 2000 13

3.1 Estrutura fundiária 35

3.2 Ocupação dos moradores 39

3.3 Faixa etária dos moradores do PNSD, 1998 57

LISTA DE QUADROS

3.1 Importância Biológica do Polígono PNSD (Mapa de Áreas Prioritárias para a Região do Juruá/Purus/Acre)

19

3.2 Regiões Fitoecológicas do PNSD e as Formações Vegetais presentes em cada uma delas

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LISTA DE TABELAS

2.1 Evolução populacional por região do Estado do Acre entre 1970-2000 11 2.2 População rural, urbana e total, Juruá – 1991 – 2000 15 2.3 Taxa média anual de crescimento da população rural e urbana, 1970 –

1980, 1980 – 1991, 1991 – 2000

16

2.4 Indicadores de condições de vida da regional Juruá e Brasil, 2000 16 3.1 População humana da área norte, sul e total do PNSD 54 3.2 Tempo de residência das famílias da área norte e sul do PNSD 55

3.3 Criação de animais domésticos no PNSD, 1998 55

3.4 Intenção dos moradores em relação a permanecer ou sair do PNSD 57 3.5 População residente no PNSD por município, região e setor censitário,

1991

59

3.6 População residente no PNSD por município, região e setor censitário, 2000

60

3.7 População do PNSD por área e total dos anos 1991, 1998 e 2000 60

3.8 Categoria de ocupação do entorno 64

6.1 Desmatamento específico por unidade fitoecológica 110

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

CURSO DE GEOGRAFIA

OCUPAÇÃO HUMANA E A CONSERVAÇÃO DO PARQUE NACIONAL DA SERRA DO DIVISOR (PNSD), ALTO JURUÁ - ACRE

RESUMO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Marco Aurélio Rodrigues

O Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD) é uma Unidade de Conservação de Proteção Integral, localizado no Estado do Acre, fronteira com o Peru. Criado em 1989, possui área de 843.012 ha, equivalendo a 5,5% da área do Estado. Segundo o Plano de Manejo possuía em 1998 3.115 moradores agrupados em 522 famílias no seu interior e 5.967 moradores agrupados em 996 famílias no entorno, ambos utilizando os seus recursos. A sua importância é referendada por diversos estudos como Área Prioritária para Conservação na Amazônia Brasileira. Analisamos a relação entre ocupação humana e a conservação do parque, perguntando: a presença humana no PNSD é compatível com a conservação da cobertura vegetal original? As fontes de dados incluem imagens de satélite das décadas de 1980, 1990 e 2000, plano de manejo do parque (1998), censo demográfico do IBGE dos anos 1991 e 2000 por setor censitário e informações referentes à área de estudo. Para tanto analisamos o crescimento demográfico, a distribuição espacial e o desmatamento, sendo o mesmo utilizado como indicador do estado de conservação do parque. Foi analisado o desmatamento nas 10 unidades fitoecológicas que compõem o parque, obtendo-se a taxa de desmatamento no seu interior de 9.902,10 ha, equivalente a 1,19% da área interna do parque. No entorno o desmatamento é de 17.366,66 ha, equivalente a 4,46% do entorno. Com relação à demografia observamos uma diminuição do número de habitantes no PNSD. Avaliando a dinâmica de ocupação e o grau de conservação das unidades fitoecológicas que compõem o parque, consideramos compatível a ocupação humana e a conservação da cobertura vegetal original do parque.

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

CURSO DE GEOGRAFIA

HUMAN OCCUPATION AND CONSERVATION OF THE SERRA DO DIVISOR NATIONAL PARK, ALTO JURUÁ - ACRE

ABSTRACT Marco Aurélio Rodrigues

The Serra do Divisor National Park (PNSD) is a strict use protected area located in state of Acre, in the border with Peru. The National Park was created in 1989 with an area of 843.012 ha, the equivalent of 5,5% of total area of the state. According to the management plan, the National Park had, in 1998, 3.115 inhabitants, grouped in 522 families inside the Park, and 5.967 inhabitants grouped in 996 families on the buffer zone, both inhabitants groups are using natural resources of the National Park. The importance of the National Park is pointed by several studies as priority area for conservation in the Brazilian Amazon. We analyzed the relationship between the human occupation and the conservation by asking a simple question: Do the human presence in the PNSD is compatible with the biological diversity conservation? The data sources include satellite images from 1980, 1990 and 2000; the management plan (1998) done for the Park; demographic census from IBGE from 1991 and 2000; and information related to the studied area. Demographic growth, spatial distribution and deforestation were analyzed using the deforestation as an indicator for conservation status. The deforestation was analyzed in 10 phytoecological units that compose park´s landscape, where the deforestation is concentrated in the floodplains and holocenic terraces. The cumulated deforestation inside the Park is of 9.902,10 ha, or 1,19% of its total area. In the buffer zone, the cumulated deforestation is 17.336,66 ha, or 4,46%. Regarding the demography, we observed the increase of the number of inhabitants of the National Park. Evaluating the occupation dynamic and the conservation status of the phytoecological units that compose the park, we can conclude that the human occupation is compatible with the original vegetation conserved in the National Park.

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa de mestrado é resultado da experiência vivenciada no Estado do Acre, no período de novembro de 1998 a fevereiro de 2003, na função que exerci como secretário técnico da organização não governamental Associação S.O.S Amazônia, doravante S.O.S Amazônia, desenvolvendo entre outras atividades a coordenação técnica do projeto denominado Implementação do Plano de Manejo do Parque Nacional da Serra do Divisor, doravante PNSD.

O Plano de Manejo do PNSD foi elaborado pela Associação S.O.S. Amazônia em parceira com o IBAMA/MMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis/Ministério do Meio Ambiente), com recursos da TNC (The Nature Conservancy) e USAID (Agência Americana para o Desenvolvimento). A metodologia utilizada foi o Roteiro Metodológico desenvolvido em 1996 pelo IBAMA/Diretoria de Ecossistemas (DIREC), Departamento de Unidades de Conservação (DEUC) e a Deutsche Gesellschaft for Technische Zusammenarbert (GTZ).

Com a conclusão e aprovação do plano de manejo pelo IBAMA em 1998, se iniciou no mesmo ano a fase de implementação das atividades descritas no plano, sendo uma delas a discussão com as famílias residentes da elaboração de um plano de reassentamento das mesmas para outras áreas fora do parque.

A questão demográfica foi inserida no plano de manejo no capítulo atividades conflitantes, em função da legislação de parques nacionais, que não permite a presença humana em unidades de proteção integral. Criou-se assim, uma visão e um planejamento das atividades do plano de manejo onde a presença humana seria incompatível, iniciando assim a discussão de planos de reassentamento dos moradores para outras áreas fora do parque.

O processo de implantação das atividades do plano de manejo criou um espaço maior de convivência com os moradores do parque. Após quase cinco de anos de implementação do plano de manejo, a discussão em relação à presença das famílias no parque estava acontecendo de forma lenta, em função da complexidade do tema.

Havia certa dificuldade em desenvolver as atividades do plano de manejo, em função dos conflitos gerados com as famílias residentes e instituições do movimento social do Acre, com a posição do IBAMA e S.O.S. Amazônia, que buscava discutir o

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reassentamento e também, pelo fato do plano de manejo ter sido elaborado sem a participação dos seus moradores, criando-se assim um descontentamento por parte dos mesmos sobre o que aconteceria com eles.

Esses fatos trouxeram à tona a necessidade de reflexão e aprofundamento acerca da discussão sobre os possíveis impactos gerados ao ambiente, decorrentes do atual modelo de ocupação humana do PNSD. Sendo assim, em 2003 após ingresso no curso de mestrado em Geografia do Instituto de Geociências da UNICAMP, busquei pesquisar as relações entre ocupação humana e conservação de recursos florestais no PNSD.

O tema da pesquisa está descrito no Plano de Manejo do PNSD, sendo apresentado como objetivo do programa de conhecimento do parque, sub-programa de pesquisa, intitulado aspectos sócio-econômicos e uso da terra.

O objetivo da pesquisa foi analisar a relação entre a ocupação humana e a conservação do PNSD. Para tanto foram considerados os aspectos relacionados à dinâmica populacional, como crescimento demográfico e distribuição espacial, utilizando-se dados de população do plano de manejo do parque (1998) e os censos demográficos do IBGE dos anos 1991 e 2000 por setor censitário. Como indicador do estado de conservação do parque foram utilizados dados referentes ao desmatamento nas décadas de 1980, 1990 e dos anos de 2000 a 2006, obtidas através de imagens de satélite Landsat TM 7 e do PRODES – Programa de controle do desmatamento na Amazônia do INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais.

Diante do exposto acima, a seguinte pergunta foi colocada pela pesquisa: A presença humana na área do PNSD é compatível com a conservação da cobertura vegetal original?

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1. HISTÓRICO DA OCUPAÇÃO DO ALTO JURUÁ

A região do Alto Rio Juruá compreende as terras a montante da foz do rio Tarauacá, abaixo da atual cidade de Eirunepé (AM), incluindo o rio Ipixuna, bem como as terras banhadas pelo curso superior dos rios Liberdade, Gregório e Tarauacá, incluindo neste o rio Envira e seus afluentes. Majoritariamente o Alto Juruá está inserido na porção mais ocidental do Estado do Acre, englobando os atuais municípios de Feijó, Taraucá, Jordão, Marechal Thaumaturgo, Porto Walter, Rodrigues Alves, Cruzeiro do Sul e Mâncio Lima, (Zoneamento Ecológico Econômico do Acre, 2000) (Figura 1.1 – Localização da área).

Segundo Cunha e Almeida (2002:12) “o conhecimento da natureza no Alto Juruá, como alhures (noutro lugar, noutra parte), grifo meu, depende de pressupostos e de práticas, e essas dimensões do conhecimento não se separam, antes se informam e se enriquecem mutuamente”.

Até o início do século XIX essa região foi território dos grupos indígenas falantes do tronco Pano e Aruák, em menor número, representados atualmente pelos Ashaninka (Kampa). Registros arqueológicos datam em 300 a 1300 d.c. a ocupação dos Pacacocha, moradores do Ucayali, dos quais os Panos atuais descendem. Os Aruák, herdeiros da tradição Hupa-iy, são registrados em sítios com 200 a.C localizados no Alto Rio Juruá e rios Urubamba, Tambo, Ene e Perené (Coutinho, 2003).

Apesar da ausência de dados sobre a ocupação indígena no Alto Juruá anteriores a 1800, os registros da ocupação indígena no Ucayali são importantes para entender a presença dos Panos e Aruak no alto vale do Juruá.

No Alto Juruá existem populações que ali aportaram em sucessivos movimentos migratórios dos contrafortes andinos (os Ashaninka) e de lá trouxeram técnicas, cultivares e mitologias; e no outro extremo há os seringueiros, com os quais além de tradições do nordeste rural, vieram para o Alto Juruá muitos dos componentes da cultura cabocla disseminada por quase toda a Amazônia. Entre esses dois grupos há as populações autóctones do Vale do Alto Juruá (os índios Katukina e os Kaxinawá).

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Segundo a Comissão Pró-Índio do Acre (2001), em meados do século XIX, começou a invasão dos territórios dos povos indígenas pelos nordestinos, que vieram com o destino de extrair borracha das seringueiras nativas (Hevea brasiliense) da região e pelos caucheiros peruanos, que vinham para extrair o caucho. O motivo da chegada de grandes números de “nawa” (povo, branco) era porque as terras eram ricas em seringa e caucho (goma elástica, resina), também usado como nome popular da seringueira (Hevea

brasiliense). Árvores que davam leite para fazer borracha para as primeiras fábricas de

carros e botas nos Estados Unidos, Inglaterra e outros países.

Os caucheiros peruanos andavam pelas matas em busca de caucho e os nordestinos subiam os rios em busca de seringa. Com essas duas frentes de invasão, a situação das nações indígenas piorou bastante. Quando os índios tentavam fugir de uma invasão, davam de cara com outra. Os invasores vinham à procura de seus interesses: a riqueza do caucho e da borracha.

As primeiras informações sobre estas nações no Juruá só ocorrem após o assalto à região das frentes coloniais, compostas por exploradores e comerciantes itinerantes agenciados por ‘casas-aviadoras’ de Belém, Manaus e outros centros urbanos localizados ao longo do rio Solimões no Amazonas.

A navegação exploratória e comercial no curso do rio Juruá e seus afluentes, resultou em estratégias de ocupação e domínio territorial baseadas no uso das violentas correrias (agarramentos) e descimentos de índios, constituídas em ataques belicosos contra os povos indígenas, com mortes e captura de mulheres e crianças que eram posteriormente vendidas às famílias ricas dos centros urbanos. Junto a isso, os comerciantes utilizavam-se do expediente de trocar bens industrializados diversos (facões, terçados, panelas, óleo) por produtos extraídos da floresta, que possuíam intensa demanda no mercado regional, sendo eles: salsaparrilha, copaíba, pirarucu, carne de caça, pele de animais silvestres, ovos e gordura de tartaruga, castanha e baunilha (Aquino & Iglesias, 1994: 6).

Os “coletores de drogas” e os “agarradores” de índios adentravam os rios Purus e Juruá, principalmente no primeiro, desde meados do século XVIII (Castello Branco, 1958: 18) apud Barnes (2003). Porém, estes agentes coloniais só alcançaram o alto rio Juruá, nas regiões do atual Estado do Acre, no decorrer do século XIX. Até então, suas expedições

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restringiam-se à região dos atuais municípios de Envira, Eirunepé e Ipixuna, no Estado do Amazonas.

Mesmo de forma incipiente, o povoamento do Alto Juruá se iniciou durante as décadas de 1850 a 1870, momento que o preço da borracha no mercado internacional aqueceu o investimento na produção do látex da seringueira ou do caucho. Com a invenção do processo de vulcanização da borracha, esta matéria prima alçava a condição de recurso natural (Raffestin, 1993), teve seu primeiro período de ouro (também chamado ouro negro).

Afligidos pela seca de 1877 nordestinos migraram para a região, apoiados pela inauguração de linhas regulares de navegação a vapor ligando Belém e Manaus aos principais rios da região. Majoritariamente cearenses, rumaram para o serviço de abertura dos seringais, que envolvia a abertura das estradas de seringa, e colocações (de centro ou margem) nas regiões mais densamente povoadas pela seringueira para a extração e defumação de sua seiva e entrega ao patrão.

Por outro lado, no final do século XIX, vindos do alto Ucayali e Madre Dios, abrindo trilhas (varadouros) pelas cabeceiras do Juruá, surgiu a frente caucheira, composta por peruanos aviados por empresas localizadas em Iquitos, que estabeleciam tambos (entrepostos comerciais tipo o barracão) e passavam a comprar o caucho (Castilloa

ellastica). Foram também responsáveis por correrias e descimentos, disputando as terras do

alto Juruá com os Panos e Aruak. Diferente dos seringais, os caucheiros identificavam áreas com caucho para realizar sua derrubada e extração do látex.

Posteriormente eram retiradas as madeiras-de-lei e peles de animais caçados na floresta, com bom preço em Lima no Peru. As correrias contra índios, como já visto, também eram uma prática de conquista e colonização, envolvendo a expulsão violenta dos índios. Conquistava-se o espaço para extração dos recursos naturais comercializáveis. Os peruanos estabeleceram-se na foz do rio Môa, no rio Breu e em frente à foz do rio Amahuacas (atual Riozinho Cruzeiro do Vale), onde está localizada a sede do município de Porto Walter.

Ainda em 1904, o Congresso Nacional brasileiro, com o Decreto nº 1.181, de 25 de fevereiro de 1904, autoriza o presidente da república, Francisco de Paula Rodrigues Alves a administrar provisoriamente o território reconhecido brasileiro [o Acre], em virtude do tratado de 17 de novembro 1903, entre o Brasil e a Bolívia, e dá outras providências. Ato

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do poder executivo, o Decreto nº 5.188, de 07 de abril de 1904, determina a divisão do Território do Acre, para fins de administração, em três departamentos, intitulados: Alto Acre, Alto Purus e Alto Juruá. O Departamento do Alto Juruá englobou as terras drenadas pelo rio Tarauacá e seus afluentes, sendo as terras banhadas pelo Envira na porção mais a leste, bem como as terras do alto rio Juruá e seus tributários, a partir do Môa, ao norte, ao Breu, extremo sul (Castello Branco, 1930: 666) apud Barnes (2003).

Em 1909, Brasil e Peru firmam tratado demarcando fronteiras físicas, sendo o rio Breu importante divisor entre os dois países no rio Juruá. No dia 01 de junho de 1910, ocorre mais uma proclamação de autonomia para o Acre, na cidade de Cruzeiro do Sul, então capital do Departamento do Alto Juruá.

Em 1912, o Território do Acre, foi divido em municípios, sendo Cruzeiro do Sul a área correspondente ao Departamento do Alto Juruá (Castello Branco, 1930: 684) apud Barnes (2003).

A partir da década de 1940, a produção gomífera ganha novo impulso, em conseqüência das demandas surgidas com a Segunda Guerra Mundial. A borracha passa a ser matéria prima para a fabricação de pneus para os veículos militares. O governo federal, com o intuito de monopolizar e incrementar a produção do látex, cria o Banco de Crédito da Amazônia, também conhecido como Banco da Borracha, com vultosos recursos do governo dos Estados Unidos respaldados pelo Acordo de Washington, para garantir o financiamento das empresas seringueiras.

Novamente há uma onda migratória para a região, agora apoiada por um órgão governamental, o Serviço Especial de Trabalhadores da Amazônia (SEMTA), que passou a recrutar nordestinos para incorporar a mão-de-obra nos seringais. Esses ficam conhecidos pela alcunha soldados da borracha (Gonçalves, 1991: 29-30). apud Martinello (1985), que complementa que apesar de toda a euforia do momento, o novo ciclo da borracha teve vida curta.

Nos anos 50 e 60, o Acre continuava relativamente isolado, embora tenha sido alcançado pela rodovia Brasília-Acre, funcionando ainda de forma precária. Em 1962 o território foi transformado em Estado. A queda do preço da borracha no mercado internacional e as reformas econômicas em curso em 1964 provocaram a venda de muitos seringais para fazendeiros sulistas. Os seringueiros com isso ficaram a sua própria sorte.

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Com isso muitos “paulistas” como eram chamados os não acreanos aproveitando créditos e incentivos governamentais compraram terras e iniciaram a criação de gado, sem nenhuma preocupação ambiental. Nesse período começam a surgir os assentamentos agrícolas, acelerando o crescimento da capital Rio Branco, sustentado pelos gastos do setor público, por meio de transferências federais (Cedeplar, 1979).

Para Cunha e Almeida (2002) a região do Alto Juruá tem uma história e uma situação particulares, pois se trata de uma área do Acre ocidental em que hoje convivem, lado a lado, vários grupos indígenas e seringueiros, e em que a diversidade biológica se revelou muito elevada, ou seja, a ação humana não destruiu a diversidade. A região forma um mosaico de áreas protegidas de altíssima diversidade biológica e de grande diversidade cultural.

As diferentes áreas protegidas - terras indígenas, reserva extrativista e parque nacional, coexistem lado a lado e reforçam-se mutuamente, constituindo uma experiência de reconhecimento do direito à sociodiversidade e à biodiversidade. Os estudos da região indicam, segundo Cunha e Almeida (2002), alguns pontos importantes a serem analisados. Dentre eles que a região possui uma notável riqueza de sistemas naturais, e que a população de seringueiros e índios tem utilizado esses sistemas de modo a conservá-los em equilíbrio dinâmico, pois a riqueza e diversidade dos sistemas naturais se conservam mediante repetidas perturbações, que são acompanhadas de processos de regeneração, quer de origem natural, quer de origem humana e por último que esse ajustamento dinâmico entre população e natureza deve-se basicamente ao impacto mínimo representado pelo estilo de vida extrativista da população, traduzido em baixa densidade demográfica e um baixo impacto técnico sobre a natureza.

De acordo com Brown e Freitas (2002), a maioria das perturbações humanas tradicionais na região, produz no sistema os mesmos efeitos diversificadores que as perturbações naturais. Segundo eles os solos, as florestas e a fauna da região são ricos e capazes de se manter em equilíbrio dinâmico, por meio de sucessivas perturbações, de escala reduzida ou média.

Por outro lado o sistema de uso humano extrativo mostrou-se, ao longo de um século, dotado de resiliência, já que foi capaz de atravessar crises sucessivas de preços no âmbito de produtos de exportação ao longo do último século. Porém o sistema natural e

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humano, que de fato constituem uma unidade na área, está ou podem estar à beira de um desastre, provocado por políticas desenvolvimentistas inadequadas.

2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

A partir da rede hidrográfica, o governo do Acre organizou o estado em 5 regiões de desenvolvimento. A rede hidrográfica foi determinante face à geografia dos rios que correm no sentido sudoeste-nordeste, tornando extremamente difícil a comunicação entre os vales, acarretando diferenças ambientais, culturais e étnicas. Nesse sentido, contextualizar a região do Alto Juruá, onde está situado o PNSD, torna-se imprescindível para que possamos entender as principais características que influenciam na dinâmica da região do Alto Juruá, que são importantes para uma análise e contextualização do PNSD.

Nos estudos do Zoneamento Ecológico e Econômico do Estado do Acre (ZEE, Acre, 2000) os aspectos demográficos foram definidos como sendo a dinâmica populacional do Estado em suas dimensões mais relevantes para o zoneamento, as quais dizem respeito, principalmente ao crescimento e à distribuição espacial da população, com ênfase na análise das migrações e da mobilidade populacional. A fecundidade e a mortalidade, que são outros elementos da dinâmica demográfica, são consideradas na medida em que exercem influência sobre o crescimento e distribuição espacial da população por meio do crescimento vegetativo, ou seja, a diferença entre nascimentos e óbitos. Na pesquisa priorizamos a análise da ocupação do PNSD em relação aos aspectos do crescimento e distribuição espacial da sua população. A seguir são apresentados dados demográficos relativos às Regiões de Desenvolvimento do estado (tabela 2.1, Gráfico 2.1).

Tabela 2.1 – Evolução populacional por região do Estado do Acre entre 1970-2000

Região 1970 1980 1991 1996 2000 Baixo Acre 83.977 136.061 230.400 276.876 336.770 Alto Acre 25.638 29.961 35.546 38.844 45.275 Alto Juruá 43.584 57.583 76.820 87.556 100.409 Purus 22.470 29.499 29.524 30.483 39.832 Tarauacá/Envira 39.630 47.929 45.428 49.834 59.693 Total 215.299 301.303 417.718 483.593 581.979

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Gráfico 2.1 – Evolução populacional por região do Estado do Acre entre 1970-2000 Observa-se nas regiões do Alto Juruá, Baixo Acre e Alto Acre em termos de população um aumento considerável entre os anos de 1970 a 2000. A região do Baixo Acre onde está a capital, Rio Branco, o crescimento da população foi muito expressivo, passando de 83.977 habitantes em 1970 para 320.079 habitantes em 2000. Na região do Alto Juruá a população cresceu num ritmo constante e mais que dobrou comparando-se os dados de 1970 e 2000, passando de 43.584 habitantes em 1970 para 100.409 habitantes em 2000. A região do Alto Acre ocorreu o mesmo fenômeno, onde a população passou de 25.638 habitantes em 1970 para 41.772 em 2000. Nas regiões do Purus a população aumentou, porém em menor intensidade, passando de 22.470 em 1970 para 39.832 em 2000. E por fim a região de Tarauacá/Envira a população passou de 39.630 habitantes em 1970 para 59.693 em 2000. 0 50.000 100.000 150.000 200.000 250.000 300.000 350.000 1970 1980 1991 1996 2000 anos Baixo Acre Alto Acre Alto Juruá Purus Tarauacá/Envira população

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Tabela 2.2 – População rural, urbana e total, Alto Juruá – 1991 e 2000.

1991 2000

Regional/município Rural Urbana Total Rural Urbana Total

Alto Juruá 45.391 31.429 76.820 50.586 49.823 100.409 Cruzeiro do Sul 23.982 26.766 50.478 28.470 38.971 67.441 Mâncio Lima 6.642 3.575 10.217 5.301 5.794 11.095 M. Thaumaturgo 9.312 291 9.603 7.310 985 8.295 Porto Walter 5.455 797 6.252 4.044 1.441 5.485 Rodrigues Alves* 00 00 00 5.461 2.632 8.093

Fonte: IBGE, censos demográficos 1991 e 2000.

* O município de Rodrigues Alves em 1991 pertencia a Cruzeiro do Sul.

A análise da população rural e urbana nos municípios do Alto Juruá apresenta diferenças interessantes. O município de Cruzeiro do Sul teve um crescimento de 4.488 pessoas na área rural entre 1991 e 2000. Porém o crescimento na área urbana foi de aproximadamente 12.205 pessoas, número expressivo se comparado à população total do município (tabela 2.2).

Já no município de Mâncio Lima observou-se no período, uma diminuição da população rural, com aumento da população urbana, porém a população total se manteve próxima no período analisado. O mesmo fato ocorreu com o município de Marechal Thaumaturgo, onde a população rural diminuiu, ocasionando um aumento na população urbana, havendo uma inversão de ocupação no período, porém manteve-se um aumento pequeno na população total do município. Já no município de Porto Walter houve uma diminuição na população rural, com aumento da população urbana e na soma total houve uma diminuição da população no período.

Não foi possível analisar o município de Rodrigues Alves, pois o mesmo se desmembrou de Cruzeiro do Sul em 1996. No contexto da região do Juruá observa-se um aumento tanto da população rural quanto urbana e também da população total da região de 76.820 habitantes em 1991 para 100.409 habitantes em 2000, ou seja, um aumento de 23.589 habitantes no período analisado.

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Tabela 2.3 –Taxa média anual de crescimento da população rural e urbana, 1970-1980, 1980-1991, 1991-2000, Alto Juruá. Juruá 1970-1980 1980-1991 1991-2000 Rural 2,8 0,1 0,6 Urbana 3,2 8,3 5,4 Total 6,0 8,4 6,0

Fonte: IBGE, SEPLAN Acre, 2000.

Analisando-se a taxa média de crescimento da população rural e urbana nos períodos de 1970-1980-1991-2000 observa-se principalmente entre os anos 1980 e 1991 um crescimento significativo da população na área urbana. Nas décadas de 80 e 90 a taxa de crescimento urbano é bem superior à taxa de crescimento rural. Entre 1991 e 2000 apesar de a taxa média não ser tão elevada como na década de 80 a 90, observa-se também um crescimento significativo em relação à taxa de crescimento da população urbana, comparada com a rural (tabela 2.3). Os dados indicam em termos de crescimento médio anual que a população urbana aumentou nas três décadas. A busca por melhores condições de vida é o fator que vem fazendo com que a população urbana cresça em níveis bem expressivos no estado (tabela 2.4).

Tabela 2.4 - Indicadores de condições de vida da regional Juruá e Brasil, 2000.

Indicador Juruá Brasil

Esperança de vida ao nascer (anos) 63,99 63,29

Taxa de mortalidade infantil (por mil nascidos vivos) 51,52 49,49 Taxa de analfabetismo (%) da população de 15 anos e mais 45,70 19,40 Porcentagem de crianças de 7 a 14 anos que não freqüentam a escola (%) 44,20 22,70 Porcentagem de crianças de 10 a 14 anos que trabalham (%) 9,30 8,60 Renda familiar per capita média (salário mínimo de set/91) 0,48 1,31

Porcentagem de pessoas com renda insuficiente 76,21 45,46

Fonte: PNUD/IPEA/FJP/IBGE, 1998. e 2000

Os indicadores de condições de vida da região do Juruá que mais se diferenciam em comparação com o Brasil, é a alta porcentagem de crianças que não freqüentam a escola, sendo 44,20% no Juruá e 22,70% no Brasil e a porcentagem de pessoas com renda insuficiente e renda familiar per capita média, sendo que a renda familiar média per capita é de 0,48% do salário mínimo no Juruá e 1, 31% no Brasil. Em relação à porcentagem de

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pessoas com renda insuficiente o Juruá apresenta 76, 21% de pessoas e o Brasil 45,46%. Os indicadores mostram as dificuldades vivenciadas pelas pessoas na região do Juruá em relação à educação e geração de renda, isso em função da dinâmica de vida estar vinculada ao extrativismo e a agricultura basicamente de subsistência. Os dois indicadores refletem o motivo em que as pessoas vêm deixando as zonas rurais, migrando para as zonas urbanas, em busca principalmente de educação e emprego.

3. PARQUE NACIONAL DA SERRA DO DIVISOR – CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICA E SOCIOECONÔMICA

O PNSD é uma Unidade de Conservação de Proteção Integral, destinada à preservação dos ecossistemas e a fins científicos, culturais, educativos e recreativos, sendo administrada pelo Governo Federal através do IBAMA.

Localizado no extremo oeste do Estado do Acre, na bacia do Alto Juruá, o PNSD faz fronteira com o Peru (Norte: 07º07’00”S, 73º48’20”W; Sul: 09º24’40”S, 73º12’40”W; Leste: 09º08’40”S, 72º40’00”W; Oeste: 07º32’40”S, 73º59’20”W). Foi criado em 16 de junho de 1989, pelo Decreto Federal número 97.839, possui uma área de 843.012 ha e ocupa 5,5% da área total do Estado do Acre. Ocupa áreas dos municípios de Cruzeiro do Sul (25,7%), Mâncio Lima (57,2%), Rodrigues Alves (34,1%), Porto Walter (37,2%) e Marechal Thaumaturgo (5,1%). Esses municípios formam a microrregião de Cruzeiro do Sul, segunda em número de habitantes, equivalendo em 2000 a 18,35% da população total do Estado. Sua criação esteve associada ao conceito da Escola Superior de Guerra/ESG, de ocupar espaços vazios, instalando “fronteiras vivas”.

Segundo Barnes (2003) sua instituição, via decreto presidencial, caracterizando uma decisão “de cima para baixo”, impõe a constituição de uma nova realidade fundiária. Isto é, o Estado, com seus aparelhos burocráticos, neste momento o IBAMA, interfere radicalmente sobre as formas costumeiras de utilização dos recursos naturais dos distintos grupos sociais (índios, seringueiros e fazendeiros) que historicamente ocupam a área física do PNSD e adjacências. Desta forma, as estratégias de produção e reprodução sociocultural desses povos ou grupos sociais são impactadas por um conjunto de normas, saberes e ideologias inerentes a uma cosmologia de preservação e conservação, caracterizando a construção de uma nova realidade fundiária.

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A importância do PNSD vem sendo discutida e referendada em vários workshops e seminários. Em 1990 no “Workshop 90” realizado em Manaus/AM com a participação de mais de 100 especialistas da região amazônica, o PNSD foi considerada a quinta prioridade das 52 áreas identificadas como prioritárias para conservação na Amazônia brasileira. Em 1991 a CI (Conservation Internacional) considerou a região onde se encontra o PNSD dentro do mais alto nível de prioridade para conservação. A Avaliação Ecológica Rápida realizada em 1997 reafirmou a importância do PNSD para a conservação da biodiversidade, unidades de conservação e populações tradicionais.

É o sexto Parque Nacional do Brasil, em termos de extensão territorial, sendo que o fato de ser tão grande e estar localizado na borda oeste da Bacia Amazônica na zona de transição entre a cordilheira andina e as terras baixas de floresta tropical úmida, faz com que o PNSD proteja uma diversidade impressionante de habitats tornando-o de uma importância singular, pois é uma área de comprovado endemismo, considerando a biodiversidade e as culturas humanas.

Nesse mesmo contexto o “Seminário para avaliação e identificação de ações prioritárias para conservação, utilização sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade na Amazônia Brasileira” realizado no Amapá, em setembro de 1999, considerou o PNSD como área prioritária para a conservação da biodiversidade.

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Quadro 3.1 - Importância Biológica do Polígono PNSD (Mapa de Áreas Prioritárias para a Região do Juruá/Purus/Acre)

- Grau de Prioridade: A – Área de extrema importância biológica - Localização: UF: AC

- Município principal: Mâncio Lima - Número de municípios abrangidos: 6 - Fitofisionomias: Ab,Da,Db,Ds

Ab – Floresta ombrófila aberta de terras baixas Da – Floresta ombrófila densa aluvial

Db - Floresta ombrófila densa de terras baixas Ds - Floresta ombrófila densa submontana Observações:

Importância biológica excepcional já comprovada pela Avaliação Ecológica Rápida realizada. Plano de manejo sendo implementado.

Grande número de famílias no seu interior, 522 famílias. Precisa de regularização fundiária urgente.

Extrema importância para botânica, invertebrados, répteis e anfíbios e aves. Importância muito alta para mamíferos e biota aquática.

Importância biológica: Aves: A - Biota aquática: B - Botânica: A - Invertebrados: D - Mamíferos: B - Répteis e anfíbios: B.

A – extrema importância B – muito alta importância

D – insuficientemente conhecida, mas de provável importância. Grau de estabilidade: 3 - Baixa – igual ou inferior a 5

Grau de instabilidade: 6 – média – entre 7 e 5

Grau de prioridade para a intervenção: 5 – longo prazo – inferior ou igual a 5 Principal ação recomendada: Proteção

Outras ações recomendadas: Fiscalização e complementação de inventários biológicos.

Fonte: Seminário de consulta sobre a Biodiversidade, Macapá, 1999.

Também o WWF na definição de ecoregiões prioritárias para a conservação na Amazônia, elegeu a ecoregião do sudoeste da Amazônia, que contempla a região onde está

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instalado o Estado do Acre como área prioritária para sua atuação. Em 2001 a instituição consolidou a prioridade de ação na região instalando um escritório na cidade de Rio Branco.

O termo “área prioritária” refere-se a uma região geográfica delimitada com base em sua importância biológica, definida pela grande riqueza de espécies ou ocorrência de espécies ameaçadas ou endêmicas, e pelo tipo de pressão antrópica a qual está submetida. Com essa definição, espera-se que nesses locais as ações causadoras de impactos sejam controladas e que o uso da terra sofra um processo de ordenamento territorial com vistas à minimização de possíveis impactos advindos da ocupação humana. Um fator muito importante a ser considerado em relação à importância da região do PNSD e seu entorno para a conservação é que o mesmo faz parte do corredor ecológico da Amazônia Ocidental e segundo alguns pesquisadores pode ser inserido na definição de hotspot, ou seja, área de alta diversidade biológica e sob alta pressão antrópica.

3.1 Geologia

Segundo o plano de manejo na área do PNSD estão presentes duas províncias geológicas: bacia do Acre, representada por sedimentos cretáceos que constituem o complexo fisiográfico da Serra do Divisor (Grupo Acre), e depósitos cenozóicos representados pela Formação Ramon e Formação Solimões que perfazem a maior parte da área, além dos depósitos holocênicos (Anexo 1).

As unidades litoestratigráficas que ocorrem na região do PNSD têm idades que vão do Pré-Cambriano até o presente, bem distintas e separadas por discordância tanto angulares quanto paralelas. As rochas mais antigas da região representadas pelo Complexo Xingu - afloramento do escudo cristalino - são principalmente gnaisses, granulitos, anfibólitos e veios de pegmatito, que afloram numa área bastante restrita da Serra da Jaquirana.

Da usualmente espessa seção da era Paleozóica, que ocorre em outros locais da bacia amazônica, apenas a Formação Formosa do início desta era e intrusões ígneas de caráter alcalino representadas pelo Sienito República, afloram na região noroeste do PNSD. Afloram também em áreas muito restritas por estarem em grande parte erodidos em conseqüência das várias orogenias que ocorreram.

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Complexo Xingu

São as litologias consideradas mais antigas na região. São rochas gnáissicas, gnaisses dioríticos, granulitos, anfibólitos, veios de pegmatitos e eruptivas, que afloram na Serra da Jaquirana e que não possuem ligação física com as encontradas nas unidades basais dos crátons separados pela Sinéclise do Amazonas. Supõe-se que os afloramentos do Complexo Xingu estejam ligados a orogênese sub-andina, responsável pelo soerguimento da Serra do Divisor, bem como pelos falhamentos transversais a estas estruturas, provocando deslocamentos de blocos com grandes rejeitos.

Formação Formosa

A idade da Formação Formosa é Carbonífera baseada na datação de fósseis encontrados em seixos retrabalhados no leito do igarapé Capanauá de um brachiópodo (Productus cora) e impressões de um briozoário do gênero Fonestela. Esta formação é formada de quartzitos cinza-escuros duros, metasiltitos, arenitos quartizíticos, altamente metamorfizados, com camadas de chert (cinza claro a branco) e com espessura de até 1 m. Estes sedimentos teriam sido depositados em ambiente marinho raso no início do Paleozóico, quando um mar teria transgredido pela primeira vez sobre a área.

Sienito República

São rochas intrusivas alcalinas, sendo parte de um evento magmático que não afetou as rochas mais novas do Cretáceo. O contato inferior com os quartzitos da Formação Formosa é feito através de discordância angular. Têm exposições isoladas e restritas. Maior ocorrência é verificada no leito igarapé Capanauá onde apresenta 1,3 km de comprimento.

Formação Môa

Localiza-se no flanco leste da Serra do Môa e da Jaquirana, onde se limita com os sedimentos da Formação Solimões e Formação Rio Azul. Sua maior expressão é o rio Azul, apresentando grande continuidade para Norte ao longo do Igarapé Água Branca.

Esta formação foi subdividida em dois membros: Capanauá (inferior) e Água Branca (superior).

Formação Rio Azul

Apresenta folhelhos argilosos com níveis calcários e generalizada impregnação calcífera. Também presente uma seqüência de arenitos, siltitos e folhelhos e,

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ocasionalmente, calcários, provavelmente de idade cretácea, sobrepondo-se concordantemente a Formação Môa.

Esta formação foi dividida em dois membros: inferior - caracterizada por uma seqüência uniforme de arenitos e superior - caracterizada por grande freqüência de intercalações de folhelhos e siltitos. Esta formação está mapeada no flanco oeste da anticlinal do Môa, onde a topografia é a mais positiva com escarpas íngremes.

Formação Divisor

Aflora no alto curso do rio Môa, perto da Fazenda Pedernal. Ocorre também entre os igarapés Pedernal e Água Branca (Serra do Rio Branco), área que abrange os rios Juruá-Mirin, Branco e Ouro Preto. Está posicionada entre a Formação Rio Azul e a Formação Ramon.

Formação Ramon

Esta formação está posicionada sobre os arenitos da Formação Divisor através de uma discordância angular. Ocupa área restrita, ocorrendo apenas no lado oeste da Serra do Divisor, aflorando no rio Môa e no igarapé Ramon. No lado leste não aflora, pois se encontra sob o espesso pacote sedimentar da Formação Solimões. Sua espessura aumenta consideravelmente no sentido leste para oeste: inicia com 800 m (no igarapé Ramon e rio Môa) e alcança até 3.000 m (ao longo do rio cachiyacu entre o Ucayali e a Serra de Contamana), devido ao fato da bacia do Acre ocupar posição de borda da bacia de Pastaza (ou do oriente Andino), no Peru.

Formação Solimões

É uma discordância litológica sub-horizontal que recobre em discordância angular os sedimentos da Formação Ramon e do Grupo Acre. A ela sobrepõe, também em discordância angular, os depósitos aluviais holocênicos dos terraços e das planícies fluviais. Ë a unidade litoestratigráfica que recobre a maior parte do PNSD (mais de 30%).

A espessura determinada por sondagens, em Cruzeiro do Sul, foi de 1835 m, diminuindo na direção do rio Javari, que chega a 760 m. Esta formação é derivada de sedimentos depositados em ambiente continental, predominantemente fluviais e subordinamente lacustres.

Apresenta duas feições morfológicas distintas, perfeitamente delimitadas em imagens de radar. A primeira está localizada no Planalto Rebaixado da Amazônia, nas

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imediações de Porto Walter. E é de localização restrita no PNSD, sendo, no entanto, freqüente na sua Área de Influência. Apresenta relevo tabular, drenagens de fundo chato e planícies de inundação amplas. Nesta feição, os tipos litológicos são predominantemente arenosos.

A segunda feição, a que predomina no PNSD, localizada na Depressão rio Acre-Javari, é caracterizada por relevo bastante dissecado, topografia com colinas de vertentes, com forte declividade e vales mostrando planícies de inundação pequenas, onde os sedimentos predominantes são argilo-siltosos.

Aluviões Holocênicos

São os sedimentos das planícies fluviais (Qa) e aluviões indiferenciados (Qai), sobrepondo-se discordantemente à Formação Solimões.

Aluviões Qai - representam os depósitos aluviais mais antigos em terraços, os colúvios e os eflúvios do sopé da Serra do Divisor.

Qa - são encontrados nas planícies fluviais constituindo barrancos em ambas as margens dos rios com até 5 m de espessura.

3.2 Geomorfologia

Segundo o mapa geomorfológico elaborado para a área em que está incluso o PNSD existem três grupos de unidades morfoestruturais. Todos estão situados entre 200 e 650m de altitude. A Depressão Amazônica (rio Acre/Javari), representada no PNSD por extensas planícies de idade Terciária e pela cadeia de montanhas denominada de Complexo Fisiográfico da Serra do Divisor, o Planalto Rebaixado (da Amazônia Ocidental) representado no PNSD por uma pequena área de interflúvios tabulares, e a Planície Amazônica representado no PNSD pelas planícies aluviais margeando os rios da região e pelos níveis de terraços descontínuos, remanescentes de sedimentos desenvolvidos durante o Pleistoceno Superior (Anexo 2).

Depressão Amazônica

Esta unidade morfoestrutural se caracteriza por uma ativa e generalizada dissecação e pelo seu posicionamento intermediário logo acima da Planície Amazônica e abaixo dos relevos mais conservados da área. Divide-se numa área de relevo colinoso e numa mais montanhosa denominada de Complexo Fisiográfico da Serra do Divisor.

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Planalto Rebaixado da Amazônia Ocidental

Corresponde aos baixos platôs que margeiam a planície do rio Amazonas e, na região do PNSD, do rio Juruá, representados por interflúvios tabulares. Embora comum na região em que o Parque está inserido. É pouco representado dentro dos seus limites, ocorrendo apenas numa área restrita a oeste de Porto Walter.

Planície Amazônica

Abrange uma faixa nas duas margens dos grandes rios Juruá e parte do rio Môa, alargando-se na direção da foz. Comporta extensas áreas alagadas e de inundação onde ocorrem paranás, furos, igapós, depósitos lineares fluviais antigos e áreas de colmatagem recente, além de uma grande quantidade de lagos com gênese e forma diferenciadas.

Morfogênese

O desenvolvimento destas formas morfológicas atuais se processou principalmente através de uma dinâmica fluvial associada a movimentos tectônicos atuantes numa bacia de deposição de sedimentos geomorfologicamente tenros, formada em fins do Terciário e início do Quaternário.

A partir do Cretáceo Superior, as margens da bacia amazônica foram erguidas, enquanto que o seu interior continuou deprimido e sujeito à subsidência. As áreas erguidas se tornaram uma série complexa de superfícies niveladas.

O material detrítico produzido durante o período erosivo foi parte evacuado para o oeste formando a bacia do Acre e parte para leste formando a bacia do Marajó. A partir desse período, os eventos geomorfológicos são registrados pelas formas de uma deposição aluvial (planícies e terraços) e pelas formas desenvolvidas nos interflúvios (cristas, colinas e interflúvios tabulares).

Os terraços (5-12 m acima do nível do mar) são mantidos por lateritas que alcançam entre 6 a 12 m e são do Pleistoceno. Algumas das colinas que tem mais de 100 m de diferença em relação à paisagem circundante são do tipo pão de açúcar e representam remanescentes dos períodos de pediplanação.

Na região da bacia do Alto Rio Branco, o pediplano e os depósitos semi-áridos correlatos que alcançam até 30 metros são de idade Quaternária, indicando que o clima naquela época era diferente do de hoje. Apresenta também áreas com influência da

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morfogênese pleistocênica, aplainamento pleistocênico, relevos dobrado do Complexo Fisiográfico da Serra do Divisor e os terraços.

3.3 Clima

O Estado do Acre localiza-se no extremo ocidental da Amazônia Brasileira apresenta-se, com clima caracterizado por altas temperaturas e elevados índices pluviométricos. Uma de suas principais características é a diminuição progressiva da intensidade do período seco no sentido SE/NW, com três meses secos na parte SE e menos de um mês no NW (onde se localiza o PNSD). A constância pluviométrica é perturbada pela entrada da friagem.

Segundo a classificação de Koppen (apud RADAMBRASIL, 1977) o PNSD está inserido em uma área com clima dominante do tipo A (clima tropical chuvoso) do tipo Am (monção) assim definido: AM: chuvas do tipo monção, com uma estação seca de pequena duração, mas, devido aos totais elevados de precipitação, possui umidade suficiente para alimentar florestas de características tropicais.

Já segundo a classificação bioclimática de GAUSSEN que considera um maior número de fatores (variação periódica da temperatura, das precipitações e da umidade durante o ano), permite uma caracterização mais minuciosa, o PNSD está situado na região Termaxérica (ou Equatorial), representada pelo tipo Eutermaxérico, onde a temperatura média do mês mais frio é sempre superior a 20 C.

3.4 Hidrografia

A região em que está situado o PNSD é o divisor de águas das bacias hidrográficas do Médio Vale do Rio Ucayali (Peru) e do Alto Vale do Rio Juruá, é também onde estão as cabeceiras de vários afluentes pela margem esquerda deste último. Uma das características comuns aos rios da região são o paralelismo e as mudanças de direções dos seus cursos, resultantes de controle estrutural. Em geral, apresentam forma meândrica com pequenos trechos retilinizados (figura 3.1).

A rede hidrográfica delimita boa parte da área e facilita o acesso ao PNSD, através dos rios Juruá, Moa, Juruá-Mirim, Azul, Amônea e seus afluentes. Os rios são fundamentais na dinâmica de vida da população residente do PNSD, pois é a única forma de transporte, fornece alimentos e também é o local onde os moradores retiram água para beber, cozinhar e tomar banho.

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Pelo seu formato o rio Juruá-Mirim é o divisor das áreas ou setores do parque em norte e sul. Do rio Juruá-Mirim no sentido norte, ou seja, em direção ao estado do Amazonas está a área norte do parque e do mesmo rio em direção a terra indígena Ashaninka e Resex Alto Juruá está a região sul do parque. As duas regiões têm características físicas, dinâmica de ocupação humana e dinâmica de uso dos recursos bem diferentes. Segundo o plano de manejo é na região norte do parque onde se encontra a maior quantidade de espécies endêmicas em função do contato com os Andes.

Figura 3.1 – Meandro do Rio Juruá mostrando áreas abertas para produção de subsistência 3.5 Solos

A descrição dos tipos de solos presentes no PNSD é baseada no Levantamento Exploratório de Solos realizado pelo Projeto RADAMBRASIL (1977). O levantamento utilizou interpretação de imagens de radar, pontos de amostragem (perfis) e checagem de campo.

A classe de solo predominante são os Podzólicos Vermelho Amarelo Eutróficos (PVAE), ocorrendo em subordinação com Podzólicos Vermelho Amarelo Álicos (PVAE) e Brunizem Avermelhado, perfazendo 65,7% de toda a área do PNSD e ocupando toda a porção leste e central. São solos que foram desenvolvidos sobre os sedimentos plio-pleistocênicos da Formação Solimões e são em sua grande maioria cobertos pela Floresta Aberta de Palmeiras, pela Floresta Aberta de Bambu Dominante e pela Floresta Aberta de

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Apresenta também solos Gley Pouco Húmico Eutrófico, Brunizem Avermelhado, Vertissolos, Solos Aluviais Eutróficos e Distróficos, Latossolos Vermelho Amarelo Distróficos, Areias Quartzozas Distróficas e Solos Litólicos Eutróficos (Anexo 3).

O levantamento do RADAM indica que na grande maioria das áreas, ocorrem solos férteis como os PVAE com argila de atividade alta, textura argilosa e média, com teores de alumínio trocável baixo a nulo. No entanto o relevo e a susceptibilidade á erosão constituem fortes limitações de uso agrícola desta área, que varia normalmente de ondulado a forte ondulado.

3.6 Vegetação

No PNSD ocorrem duas grandes Regiões Fitoecológicas (ou Sistemas Ecológicos Regionais), o domínio da Floresta Ombrófila Aberta (FOA) e o domínio da Floresta Ombrófila Densa (FOD) de acordo com a classificação proposta pelo RADAMBRASIL (1977). Estas duas regiões fitoecológicas regionais estão associadas às grandes feições climáticas e morfoestruturais presentes na Bacia Amazônica, os Baixos Platôs da Amazônia, o Planalto Rebaixado da Amazônia Ocidental e Região Aluvial da Amazônia (Anexo 4).

Apesar do esforço do Projeto Radam-Brasil, até 1955, a região do Alto Juruá apresentava uma representatividade de coletas de apenas 1 em 100 km2 (Silveira et al., 1997). Em função da baixa densidade, de coletas, esta região é floristicamente pouco conhecida, muito embora esteja localizada próxima de áreas propostas como refúgios de pleistoceno, de alta prioridade para conservação, baseado em valores de diversidade e endemismo e como área de “gap” (lacunas) de informações sobre biodiversidade (Conservation International, 1991 e WWF, 1996).

Para Daly e Silveira (2002) a vegetação, a flora do Alto Juruá e do PNSD como um todo, apresenta um caráter especial no cenário Amazônico, principalmente na Amazônia Brasileira, em razão dos seus muitos contrastes, transições entre floras, raridades, e sempre surpresas. Esse fato no complexo Serra do Divisor se deu em conseqüência da proximidade dos Andes, pois a topografia de uma parte da bacia do Alto Juruá foi afetada pelo soerguimento dessa cadeia de montanhas, tornando-se mais acidentada, apresentando morros, rochas e cachoeiras de até 650 metros de altitude.

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O PNSD está situado na Zona de Vida da Floresta Tropical Úmida de acordo com a classificação proposta por Holdrige (1947). Estas grandes regiões fitoecológicas regionais estão geralmente associadas ás grandes feições climáticas e morfoestruturais presentes na Bacia Amazônica, i.e, os Baixos Platôs da Amazônia, o Planalto Rebaixado da Amazônia Ocidental e Região Aluvial da Amazônia.

O domínio da Floresta Ombrófila Densa encontra-se associado á faixa climática B3 e B4, onde ocorrem rochas sedimentares cretácicas e terciárias da sub-região dos Baixos Platôs da Amazônia dissecados tanto em interflúvios colinosos (Formação Ramon), quanto em cristas (Grupo Acre), como também em rochas sedimentares de idade plio-pleistocênica (Formação Solimões) da sub-região do Planalto Rebaixado da Amazônia Ocidental dissecados em interflúvios tabulares. O domínio da Floresta Ombrófila Aberta está associado às rochas sedimentares de idade plio-pleistocênica da sub-região dos Baixos Platôs da Amazônia dissecada na forma de interflúvios colinosos ou em relevo ondulado (Formação Solimões) e na sub-região Aluvial da Amazônia da Formação Solimões embora independente das faixas climáticas.

Quadro 3.2 - Regiões Fitoecológicas do PNSD e as Formações Vegetais presentes em cada uma delas.

1. Região de Domínio da Floresta Ombrófila Densa 1.1 Sub-região dos Baixos Platôs da Amazônia

1.1.1. Floresta Densa em Relevo Montanhoso 1.1.2 Floresta Densa em Interflúvios Colinosos

1.2 Sub Região do Planalto Rebaixado da Amazônia Ocidental 1.2.1 Floresta Densa em Interflúvios Tabulares

2. Região do Domínio da Floresta Ombrófila Aberta 2.1 Sub Região Aluvial da Amazônia

2.1.1 Floresta Aberta em Planícies Aluviais Periodicamente Inundáveis 2.1.2 Floresta Aberta em Terraços Altos Residuais

2.2 Sub Região dos Baixos Platôs da Amazônia

2.2.1 Floresta Aberta em Relevo Ondulado de Depósitos Coluviais 2.2.1.1 de Palmeiras

2.2.1.2 de Cipós

2.2.2 Floresta Aberta de Interflúvios Colinosos 2.2.2.1 de Palmeiras

2.2.2.2 de Bambu Dominante 2.2.2.3 de Bambu Dominado

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Estas feições fitoecológicas regionais, i.e, Floresta Ombrófila Aberta e Floresta Ombrófila Densa estão também condicionadas a fatores geológicos e pedológicos. Dentro destes dois grandes domínios, coexiste uma grande diversidade de formação vegetais, sendo que o principal fator nesta diferenciação é o edáfico. O domínio da Floresta Ombrófila Densa subdivide-se em três principais formações: densa com emergentes em relevo colinoso, densa submontana e densa com emergentes em interflúvios tabulares.

O Domínio da Floresta Ombrófila Aberta subdivide-se em sete formações com dominância de Palmeiras, cipós ou bambu (seja dominante ou dominado). A razão desta subdivisão em diferentes formações deve-se ao fato de as feições fitoecológicas regionais, sejam elas de florestas abertas ou de floresta densa, adquirem características peculiares de acordo com as formas de relevo nas quais são instaladas.

A diferenciação apresentada é principalmente em relação a aspectos fisionômicos e estruturais mais do que em aspectos florísticos. No entanto, como cada tipo de vegetação refere-se às formas de vida que são resultados de adaptações a variações no meio ambiente, mesmo sendo o princípio fisionômico e estrutural, a diferenciação ecológica está sempre presente criando vários nichos para diferentes espécies vegetais e animais. (Pires e Prance, 1995).

Estas principais formações vegetais que ocorrem no PNSD são formações vegetais de ampla distribuição, de biomassa e diversidade relativamente alta. No entanto também estão presentes dentro destas grandes tipologias, formações florestais de distribuição restrita como buritizais, tabocais, cipoais, jarinais e caranaízais, que se referem ao grupamento quase homogêneos de certos tipos de palmeiras e cipós.

As Tipologias de Florestas Ombrófilas densas caracterizam-se pela cobertura dominante de floresta densa com dossel emergente ou uniforme ou um sub-bosque ralo ou ausente. Encontram-se principalmente na borda ocidental no PNSD ao longo da fronteira do Peru, embora também ocorra numa área limitada na margem esquerda fronteira com o Peru, embora também ocorra numa área limitada na margem esquerda do Juruá a oeste da cidade de Porto Walter. No total, o ecossistema de floresta densa perfaz quase um quarto (22,5%) de área do PNSD correspondendo a uma superfície total de 1.895 Km2. Está subdividido em três tipos distintos baseados na unidade geológica e geomorfológica em que está instalada, ou seja:

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1. Um ecossistema sub-montano presente nas elevações do Complexo Fisiográfico da

Serra do Divisor do Grupo Acre.

2. Nos interflúvios e vertentes colinosos desenvolvidos sobre os argilitos da Formação Ramon Terciário.

3. Nos interflúvios tabulares à margem esquerda do Rio Juá, a oeste da cidade de Porto Walter.

Os ecossistemas de florestas Ombrófila aberta, que perfazem a maior parte do PNSD (77,2%), ocupam preferencialmente as seguintes unidades geomorfológicos:

1. Os terrenos sedimentares plio-plistocênicos da Formação Solimões, dissecados e aplainados em pequenas colinas e cristais com altitude variando de 200 a 250 m, apresentado três fisionomias florestais: a) aberta de palmeiras, b) aberta de bambu dominante e c) aberta de palmeira e bambu dominado;

2. Uma estreita faixa de relevo ondulado nas bordas orientais das serras sobre depósitos coluviais holocênicos apresentando as fisionomias florestais: a) aberta de palmeira e b) aberta de cipó.

3. Nas planícies aluviais cobertas por sedimentos recentes e atuais (Quartenário) apresentando a fisionomia aberta de palmeiras.

Neste sistema ecológico regional, as diferenciações entre estas diversas fisionomias referem-se á relativa dominância de certas espécies de palmeiras, bambu e cipó, com suas relativas densidades e distribuição espacial, e ou variabilidade no número de indivíduos e espécies (Brasil, 1977). A maioria das espécies é de ampla distribuição, ocorrendo também nos outros ecossistemas. Entre as espécies arbóreas mais freqüentes com índice de presença de mais de 25%, apenas três espécies ocorreram exclusivamente nestes ecossistemas: a

Terminalia amazonia (cuiarana), a Tabebuia serratifolia (Ipê amarelo ou pau d´arco) e a Schizolobium amazonicum Duke (Parapará). As Palmeiras mais freqüentes são a Iriartea, a Mauritia e a Phytelephenas, os cipós mais característicos são de gênero Strychnos e a

gramínea Guadua. Sp.(bambu). No plano de manejo no capítulo “vegetação” foram definidas 10 unidades fitoecológicas que compõem o parque. Os mesmos foram plotados no mapa de vegetação na escala 1:250.000 e foram utilizados para os cálculos de desmatamento por unidade fitoecológica.

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Segundo Daly e Silveira (2002) a conservação da região da bacia do Alto Juruá deve integrar a proteção de unidades de conservação com o uso “neotradicional”, isto é, subsidiado por pesquisas científicas, dos recursos ao redor das comunidades florestais. A grande quantidade de espécies vegetais e animais encontrados na bacia do Alto Juruá e as lacunas de informação ressaltam a importância de sua conservação. Tanto para conservar a biodiversidade na região como para assegurar o manejo sustentável dos recursos é necessário gerar informações básicas sobre a flora e a ecologia das espécies úteis. Assim será possível compreender as razões de tão grande diversidade e ao mesmo tempo garantir seu uso produtivo a longo prazo, associado à conservação da unidade.

3.7 Biodiversidade

O Parque abrange toda a Serra do Divisor, a qual é um importante divisor de águas da bacia dos rios Ucayali no Peru e Juruá no Brasil. As características geológicas e geomorfológicas atípicas em comparação com o restante do Acre e informações esparsas sobre a fauna e flora local indicam que o PNSD apresenta uma biodiversidade bastante diferenciada (ZEE, Acre, 2000).

A Avaliação Ecológica Rápida confirmou a ocorrência de uma alta biodiversidade no PNSD e uma grande diversidade de paisagens. Entre os resultados, destacam-se a presença de 8 tipos de vegetação, representando 47% dos tipos de vegetação protegidos em UCs na Amazônia; de pelo menos 70% do total de espécies de palmeiras que ocorrem na Amazônia Ocidental; de 121 a 188 espécies arbóreas com DAP > 10 cm; de 1223 espécies de animais, dos quais 90 foram considerados de valor especial para conservação (76 vertebrados e 14 invertebrados); de 53% das espécies de morcegos atualmente conhecidas para a Amazônia Brasileira; de 485 espécies de aves, das quais 40 são consideradas especiais para conservação: 4 são espécies ameaçadas de extinção, 15 são migrantes do hemisfério norte e 8 do hemisfério sul, seis são consideradas raras e pouco representadas em coleções e duas são espécies novas para a ciência; de 101 espécies de anfíbios (na RESEX Alto Juruá foi encontrado 84 espécies em 3 anos de pesquisa); de 229 espécies de aranhas, com 3 espécies ainda não descritas (com possibilidade de ocorrência de um novo gênero e espécies novas para a ciência); de 64 espécies de abelhas sem ferrão (Meliponinae); de 34 espécies de abelhas polinizadoras de orquídeas (Euglossini), destacando-se o gênero Aglae, extremamente raro.

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Segundo o plano de manejo das espécies de animais citadas na Lista de Espécies Ameaçadas do IBAMA, dezenove ocorrem no PNSD. Isso significa que no PNSD ocorrem 10,5% das espécies brasileiras atualmente consideradas ameaçadas de extinção. São elas:

Lagothrix lagotricha (barrigudo), Saguinus imperator (bigodeiro), Callimico goeldii (soim

preto), Ateles chamek (macaco preto), Cacajao calvus (uacari vermelho), Panthera onca (onça pintada), Puma concolor (onça vermelha), Leopardus pardalis (gato maracajá),

Leopardus wiedii (gato maracajá), Lontra longicaudis (lontra), Pteronura brasiliensis

(ariranha), Mustela africana (furão), Speothos venaticus (cachorro do mato vinagre), Inia

geoffrensis (boto vermelho), Vampyrum spectrum (morcego), Myrmecophaga tridactyla

(tamanduá bandeira), Priodonte maximus (tatu canastra), Melanosuchus niger (jacaré-açu),

Lachesis muta (surucucu) (S.O.S Amazônia apud ZEE, Acre, 2000).

Estudos recentes confirmaram a elevada biodiversidade no Estado, tanto do ponto de vista florístico como faunístico. O Parque Nacional da Serra do Divisor, por exemplo, mostrou índices de diversidade florístico e faunístico dos mais altos já registrados na Amazônia Brasileira, aproximando-se dos encontrados para o Parque Nacional de Manu no Peru, que é considerada uma das áreas mais biodiversas do planeta (ZEE, Acre, 2000).

Somado a essa biodiversidade o parque tem em seu interior e no seu entorno e zona de influência uma grande diversidade cultural e formas de manejo advindos da ocupação indígena e ribeirinha que com certeza tem contribuído para a conservação de toda essa biodiversidade.

Referências

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