AS AÇÕES AFIRMATIVAS DO ESTADO BRASILEIRO NO SISTEMA DE COTAS NO ENSINO SUPERIOR – INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DE
DIREITOS HUMANOS
Elenita Moura Meireles Abe1 Otoniel Araújo2
RESUMO:O presente trabalho tem por objeto analisar e discutir a finalidade das ações afirmativas nas universidades públicas. Visa examinar os fundamentos constitucionais do sistema de cotas para o ingresso do ensino superior por critérios étnico-raciais e verificar se as ações afirmativas têm sido instrumento hábil para garantir a efetivação de Direitos Humanos e Fundamentais, tais como dignidade da pessoa humana, igualdade e acesso à educação. Para tanto, foi realizada uma pesquisa documental e histórica da discriminação de raças nos setores de ensino superior no Brasil, além da evolução das ações afirmativas criadas pelo Estado que objetivam a afirmação do princípio da igualdade e o reforço na aplicabilidade dos Direitos Humanos preceituados na Declaração Universal dos Direitos Humanos. As políticas públicas diferenciam a igualdade formal da material, esta última aparece como principal anseio dos Estados democráticos, sobretudo do brasileiro, que dá o devido enfoque a esse tema na Constituição Federal. O método utilizado foi o dedutivo, aplicando a pesquisa bibliográfico-documental-qualitativa.
Palavras-chave: Ações afirmativas. Ensino Superior. Direitos Humanos.
Eixo 4. Educação em Direitos Humanos e Inclusão, na modalidade Banner/Pôster
INTRODUÇÃO
As ações afirmativas para a população negra surgem na tentativa de obediência à Constituição Federal de 1988, que traz uma ampla noção de cidadania. Os diversos danos causados à população negra na história do Direito no Brasil justificam a existência das ações afirmativas e tentam promover alguma igualdade, no tocante ao direito à educação como um direito social, previsto no artigo 6º da Constituição.
1 Especialista em fisioterapia aplicada a ortopedia UNIDERP/UEL, graduanda em Direito pela UFMS/CPTL
2 Graduando em Direito pela UFMS/CPTL
Anais do XIV Congresso Internacional de Direitos Humanos. Disponível em http://cidh.sites.ufms.br/mais-sobre-nos/anais/
Esta pesquisa vislumbrando esta realidade, busca analisar, pelo viés dos direitos humanos e da Constituição Federal, a necessidade das ações afirmativas para o ingresso de negros nas universidades brasileiras. Vale-se, por isso, do método dedutivo, aplicando a pesquisa bibliográfico-documental-qualitativa.
1 CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CIDADANIA E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Silva (2012) e Dallari (2010) compreendem que a constitucionalização de normas faz surgir na sociedade uma garantia de que existem direitos e deveres que formam determinado ente estatal. Limitar o poder do Estado, com um conteúdo decidido pelas pessoas que compõem aquela sociedade, é uma característica do constitucionalismo, de acordo com esses dois doutrinadores.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2012, p. 21) ressalta que a garantia de um Estado Democrático de Direito é a Constituição. Ela tem o objetivo de conter as arbitrariedades do governo e de preservar os direitos humanos. Por isso, ele diz que “o Estado de Direito é um Estado constitucional”.
Todas essas observações aplicam-se ao caso do Brasil, onde os direitos fundamentais trazidos pela Constituição de 1988 são preservados, como forma de limitar o poder do Estado. Como afirma Ferreira Filho (2012, p. 24), “definem esses direitos a fronteira entre o que é lícito e o que não o é para o Estado. E, limitando o poder, deixam fora de seu alcance um núcleo irredutível de liberdade”.
Para que chegasse a isso, o país passou por fases constitucionais ao longo da história. A primeira Constituição brasileira, a imperial, de 1824, foi a primeira a tentar implementar a ideia de constitucionalismo no país. Vinculada à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, ela teve que lidar com o paradoxo de estabelecer um poder unitário, monárquico, sem ser absolutista (SILVA, 2012, p. 76).
Em seu artigo 1º, a Constituição Federal de 1988 traz como fundamentos, dentre outros: o da cidadania (II) e o da dignidade da pessoa humana (III); esses fundamentos merecem destaque quanto às bases de construção da justiça social proposta pela Constituição de 1988.
2 OS PASSOS DA INCLUSÃO RACIAL NO BRASIL
Anais do XIV Congresso Internacional de Direitos Humanos. Disponível em http://cidh.sites.ufms.br/mais-sobre-nos/anais/
Atualmente, a luta contra o racismo continua forte na sociedade brasileira. No ano de 2010, foi sancionado o Estatuto da Igualdade Racial. O instrumento legal escancara a realidade de que, em pleno século XXI, as pessoas se mostram totalmente intolerantes em relação à cor ou à origem do outro.
Em meio às discussões para a votação do Estatuto, era falado por alguns que não havia necessidade, que o instrumento só ia salientar os valores tidos como fundamentais pela Magna Carta; outros mencionavam que seria uma forma de vitimização; alguns acharam desnecessário, por hoje lidarmos com uma população mais evoluída, supostamente mais flexível, a qual trata os desiguais na medida de suas desigualdades.
Depois da aprovação por unanimidade pelo Senado Federal, o Estatuto transformou-se em Lei (nº 12.288), no dia 20 de julho de 2010, com o único objetivo – como prescreve o art. 1º: “Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica”.
O argumento de que as cotas são uma discriminação contra o branco ou contra o próprio negro (ou que o negro se sente inferiorizado por entrar na universidade ou no serviço público mediante cota) é apenas uma forma de desviar a atenção para o problema histórico da discriminação e pressionar a sociedade – inclusive a população negra – a uma postura contra as cotas.
3 AÇÕES AFIRMATIVAS PARA O ENSINO SUPERIOR
As ações afirmativas em universidades têm o único e exclusivo objetivo de querer corrigir ou amenizar a desigualdade e o preconceito que determinado grupo sofreu e vem sofrendo, ou seja, tentam proporcionar uma equalização social.
A falta de conhecimento e de compreensão que conduz a uma interpretação errônea dessas ações acaba por polemizar a política pública, levando pessoas a fazer afirmações totalmente inadequadas sobre a efetivação e a aplicação das ações afirmativas.
Os negros são maioria na sociedade – 53% da população brasileira (SANTOS, 2014, p. 18), mas continuam sendo a minoria em termos de inserção em espaços que, historicamente, são ocupados por brancos.
Anais do XIV Congresso Internacional de Direitos Humanos. Disponível em http://cidh.sites.ufms.br/mais-sobre-nos/anais/
Diante disso, as cotas não têm um objetivo de serem eternas, mas sim de serem temporárias, até diminuir o preconceito. Aqueles que são contra cotas para negros, em geral, são racistas ou estão reproduzindo, sem o saber, uma visão de mundo racista, que pretende manter o curso da história nos mesmos trilhos de antes, tentando privar o negro de ter o direito de buscar condições melhores.
CONCLUSÃO
Depois de muita luta e muita resiliência, o negro vem lutando para ter o seu espaço. Ou seja, os direitos sociais, entre outras bases da Constituição vigente, não foram conquistados gratuitamente: pelo contrário, foram fruto de muita luta; por conta disso, são protegidos pela Constituição Federal e considerados fundamentais.
Diante do exposto, é visível que o sistema de cotas traz vários tipos de grupos de discussão, aqueles que são contra e que se utilizam de um argumento frágil, no qual tentam mostrar que as cotas demonstrariam que o negro não tem a capacidade intelectual; e os que são a favor e conseguem perceber que o real objetivo é buscar a inclusão de certos grupos considerados desprivilegiados e marginalizados. Restando claro que a responsabilidade do Estado é a de promover a igualdade.
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