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Psicologia Geral

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Academic year: 2021

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(1)227. PSICOLOGIA GERAL. AMÂNCIO DA COSTA PINTO ISBN: 978-972-674-605-8.

(2) Amâncio da Costa Pinto. PSICOLOGIA GERAL. Universidade Aberta 2001 © Universidade Aberta.

(3) Copyright. ©. UNIVERSIDADE ABERTA — 2001 Palácio Ceia • Rua da Escola Politécnica, 147 1269-001 Lisboa – Portugal www.univ-ab.pt e-mail: cvendas@univ-ab.pt. TEXTOS DE BASE; N.o 227 ISBN: 978-972-674-605-8. © Universidade Aberta.

(4) AMÂNCIO DA COSTA PINTO Doutorou-se em 1985 na especialidade de Psicologia Experimental e é desde 1993 professor catedrático na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto e regente da cadeira de “Aprendizagem e Memória”. É autor de vários artigos publicados em revistas científicas na área da “memória humana” e dos livros Metodologia da Investigação Psicológica, Psicologia Experimental: Temas e Experiências e Temas de Memória Humana.. © Universidade Aberta.

(5) Psicologia Geral 13. Prefácio 1. Psicologia: Introdução Geral. 19. Definição e âmbito da psicologia. 21. Marcos da história da psicologia. 25. Psicologia e ciências afins. 27. Métodos psicológicos. 27. Observação naturalista. 28. Estudo de casos. 29. Questionários. 29. Método correlacional. 31. Método dos testes. 32. Método diferencial. 34. Método experimental. 37. Perspectivas de investigação psicológica. 38. Perspectiva bio-psicológica. 39. Perspectiva evolucionista. 42. Perspectiva sócio-cultural. 44. Perspectiva cognitiva. 45. Áreas de especialização psicológica. 46. Psicologia clínica. 46. Psicologia educacional. 47. Psicologia organizacional. 47. Psicologia cognitiva e experimental. 47. Psicologia social. 48. Psicologia do desenvolvimento. 48. Organização e plano da obra. 49. Conceitos psicológicos referidos no capítulo. 49. Perguntas de auto-avaliação. 49. Sugestões de leitura. © Universidade Aberta. 5.

(6) 2. Aprendizagem 53. Âmbito, definição e tipos. 55. Habituação. 56. Condicionamento clássico. 56. Pavlov: procedimento experimental. 60. Generalização e discriminação. 61. Relação temporal entre EC e o EI. 62. Condicionamento de respostas emocionais. 66. Explicações do condicionamento de Pavlov. 67. Condicionamento operante. 68. Thorndike: procedimento experimental. 69. Características de aprendizagem. 70. Leis de aprendizagem. 71. Skinner: procedimento experimental. 72. O papel do reforço. 73. Tipos e programas de reforço. 74. 6. Comportamento supersticioso. 75. Reforço e punição. 76. Reforço ou punição?. 79. Condicionamento de fuga e evitação. 80. Extinção da resposta de evitação. 80. O desamparo aprendido. 81. Moldagem do comportamento. 82. Limitações biológicas do condicionamento. 86. Condicionamento clássico e operante. 88. Condicionamento e cognição. 93. Aprendizagem por observação. 95. Observação e imitação. 98. Aprendizagem verbal. 99. Materiais e parâmetros de avaliação. 100. Tarefas de aprendizagem verbal. 102. Tipos de aprendizagem verbal. 104. Aprendizagem e cognição. 105. Conceitos de aprendizagem. © Universidade Aberta.

(7) 105. Perguntas de auto-avaliação. 106. Sugestões de leitura. 3. Memória 109. Âmbito e perspectivas. 111. Referências históricas de memória. 116. Sistemas e processos de memória. 118. Distinções de memória. 119. Curva de posição serial. 121. Estados de amnésia. 122. Memória a curto prazo. 123. A capacidade da MCP. 125. A codificação na MCP. 126. Duração e esquecimento na MCP. 130. Memória operatória. 132. Memória a longo prazo. 132. Modelos de MLP. 135. Codificação na MLP. 137. Retenção na MLP. 138. Categorização e hierarquização. 140. Formação de imagens. 143. Recuperação da informação na MLP. 144. Provas de memória. 148. O problema do esquecimento. 149. Teoria do desuso. 151. Teoria da interferência. 154. Incongruência contextual. 156. Recalcamento. 158. Esquecer é recordar. 159. Recordação e reconstrução. 163. Conceitos de memória. 164. Perguntas de auto-avaliação. © Universidade Aberta. 7.

(8) 164. Sugestões de leitura. 4. Inteligência. 8. 167. Âmbito e definições. 170. Medidas de inteligência. 170. História breve dos testes de inteligência. 173. O significado do QI. 175. Inteligência geral: o factor g. 175. Características psicométricas de um teste. 176. Fidelidade e validade. 177. Estabilidade e previsão dos testes de inteligência. 179. O efeito Flynn. 180. Testes de inteligência: prós e contra. 180. Limitações dos testes. 181. Vantagens dos testes. 182. Teorias e modelos de inteligência. 182. Teorias psicométricas. 183. Spearman: o factor g. 183. Thurstone: habilidades mentais primárias. 184. Guilford: o cubo da inteligência. 185. Cattell e Horn: inteligência fluida e cristalizada. 185. Carroll: a teoria dos estratos de inteligência. 186. Jensen: o factor g de inteligência. 188. Estrutura de inteligência e análise factorial. 189. Teorias de processamento de informação. 190. Haier: inteligência e o metabolismo da glucose. 190. Nettelbeck: inteligência e tempo de inspecção. 191. Jensen: inteligência e tempos de reacção de escolha. 191. Hunt: inteligência e acesso lexical. 192. Simon: inteligência e resolução de problemas. 192. Sternberg: inteligência e analogias. 194. Teorias de desenvolvimento cognitivo. © Universidade Aberta.

(9) 195. Teoria de Piaget. 196. Teoria de Vygotsky. 196. Teorias contextuais. 197. Sternberg: teoria triárquica de inteligência. 198. Gardner: teoria das inteligências múltiplas. 200. A inteligência emocional. 201. O problema da hereditariedade-meio. 202. Factores genéticos. 204. Adopção de crianças. 204. Factores ambientais e sócio-culturais. 206. Interacção hereditariedade-meio. 208. Observações complementares. 209. Conclusão. 210. Conceitos de inteligência. 211. Perguntas de auto-avaliação. 211. Sugestões de leitura. 5. Motivação 215. Definição. 216. Conceitos motivacionais. 218. Teorias da motivação. 219. Teorias biológicas. 219. Teoria dos instintos. 220. Teoria sociobiológica. 221. Teoria de Freud. 222. Teorias comportamentais. 222. Teoria de redução de impulsos. 224. Teoria da excitação. 226. Teoria do incentivo. 227. Teoria humanista de Maslow. 229. Teorias cognitivas. 230. Teoria da dissonância cognitiva de Festinger. 232. Modelos de atribuição causal. © Universidade Aberta. 9.

(10) 233. Teorias da aprendizagem social. 234. Teoria da expectativa x valor. 234. Teoria de Nuttin. 235. Modelo de Bandura. 236. Motivação intrínseca e extrínseca. 238. Não há uma teoria …. 239. Conclusão. 240. Conceitos de motivação. 240. Perguntas de auto-avaliação. 240. Sugestões de leitura. 6. Emoção. 10. 243. Âmbito da emoção. 244. Funções da emoção. 245. Conceitos emocionais. 247. Emoções primárias e secundárias. 249. Teorias da emoção. 249. Teoria de James-Lange. 250. Teoria de Cannon-Bard. 251. Teoria de Schachter e Singer. 255. Teoria cognitiva de Lazarus. 257. Expressão e feedback facial da emoção. 259. Perspectiva neurológica. 259. Modelo de LeDoux. 260. Modelo de Damásio. 262. Emoção e cognição. 266. Emoção e terapia. 267. Cognição e congruência emocional. 269. Conclusão. 270. Conceitos de emoção. 270. Perguntas de auto-avaliação. 270. Sugestões de leitura. © Universidade Aberta.

(11) 7. Personalidade 274. Teorias da personalidade. 274. Teorias psicodinâmicas. 275. Freud. 276. Mecanismos de defesa. 277. Erik Erikson. 280. Teorias humanistas. 280. Carl Rogers. 282. Teoria dos tipos e dos traços. 282. Tipos de personalidade. 283. Traços de personalidade. 284. Modelo de Hans Eysenck. 286. Modelo de Cattell. 287. Modelo dos cinco grandes factores. 290. Teorias beavioristas. 291. Teorias situacionistas. 294. Teorias interaccionistas. 296. Teorias e conclusão. 297. Instrumentos de medida da personalidade. 297. Métodos projectivos. 298. Questionários e inventários. 301. Avaliação comportamental. 301. Origem das diferenças de personalidade. 304. Conclusão. 305. Conceitos de personalidade. 305. Perguntas de auto-avaliação. 306. Sugestões de leitura. 309. 8. Referências. © Universidade Aberta. 11.

(12) Página intencionalmente em branco. © Universidade Aberta.

(13) Prefácio. © Universidade Aberta.

(14) Página intencionalmente em branco. © Universidade Aberta.

(15) Os temas e as áreas de investigação psicológica são muito mais vastas do que pode sugerir uma leitura apressada do Índice deste livro de Psicologia Geral. Há já muitos anos que os conhecimentos psicológicos são de natureza enciclopédica, de modo que um livro desta dimensão terá de ser necessariamente uma selecção de temas que pela sua relevância e diversidade possam ser considerados fundamentais em psicologia. Os temas seleccionados estão incluídos nas principais publicações deste tipo e tentam representar um certo equilíbrio em termos da aprendizagem da psicologia entre as dimensões mais cognitivas do comportamento humano com três capítulos sobre Aprendizagem, Memória e Inteligência e os aspectos mais afectivos e emocionais com capítulos sobre Motivação, Emoção e Personalidade. A redacção deste livro foi para mim uma oportunidade e um desafio. Um desafio porque não sendo eu um especialista em algumas das áreas focadas neste livro (na verdade não há ninguém que o seja actualmente em qualquer parte do mundo em psicologia geral) tive necessidade de actualizar conhecimentos, ganhando assim a oportunidade de obter uma visão mais actualizada e abrangente da investigação psicológica que se pratica actualmente. Na realidade esta tarefa foi mais delicada do que inicialmente julgara, ao verificar a pouco e pouco que escrever uma obra generalista é mais complexo do que escrever uma obra específica sobre um tema da nossa especialidade. Um livro de autor, ao contrário de um livro organizado por um autor-editor, é um livro que permite desenvolver uma perspectiva. Este livro tem subjacente a perspectiva de que a psicologia é uma ciência empírica e o seu objecto não se reduz ao das ciências afins. A psicologia é uma ciência empírica; não é um enlatado de psicologia popular, senso comum, conselhos da avòzinha e especulação de gabinete sob a forma de sugestões, conselhos e horóscopos para revistas e jornais. A psicologia é uma ciência constituída por modelos e teorias, racionalmente desenvolvidas e empiricamente fundamentadas, cuja natureza condiciona a recolha de dados comportamentais que por sua vez vão apoiar ou desconfirmar os modelos e teorias subjacentes sobre o funcionamento da mente humana. É esta perspectiva que está subjacente às apreciações críticas dos vários modelos e explicações psicológicas descritas ao longo do livro. A psicologia é uma ciência autónoma face à biologia e medicina ou à sociologia e antropologia. Neste livro não há capítulos específicos sobre condicionalismos biológicos e sociais do comportamento humano, embora estas variáveis sejam consideradas e às vezes valorizadas em várias secções desta obra. Apesar dos condicionalismos a que o comportamento humano está sujeito, a psicologia é sobre a psique, a mente, as estruturas e processos mentais que ultimamente são os responsáveis pela tomada de decisões humanas no dia a dia. Os seres humanos têm um passado, uma história de desenvolvimento, uma estrutura © Universidade Aberta. 15.

(16) mental, valores, planos e projectos futuros. Não estão agrilhoados a cadeias biológicas ou sociais, mesmo quando em certos casos as pessoas parecem agir ou reagir em função das suas pulsões instintivas ou da sua honra familiar. É a mente humana em toda a sua organização e complexidade que avalia a informação que tem ao dispor para dirigir o comportamento. Sou fortemente crítico em relação às orientações psicológicas que desvalorizam os processos cognitivos em detrimento do papel concedido às influências sociais e biológicas. Se a realidade fosse aquilo que defendem certas orientações psicológicas, as cadeias estavam vazias, porque haveria sempre justificações biológicas e sociais atenuantes para os actos humanos. Do mesmo modo ninguém valorizaria o comportamento pacífico e ordeiro da maior parte das pessoas, assim como os prémios e as recompensas pelas realizações humanas brilhantes. Às vezes até parece que uma concepção humana deste tipo apenas é ensinada e discutida nos cursos de filosofia, direito e economia. Por complexos de saber em relação a outras ciências ou mesmo por ignorância, a redução da psicologia, da mente e do comportamento às influências biológicas e sócio-culturais tem tido uma divulgação exagerada e infeliz, mesmo por parte daqueles que deveriam defender mais de perto a especificidade do conhecimento psicológico. A redacção deste livro tem por objectivo dar a conhecer aos estudantes universitários no início da sua formação um conhecimento fundamentado e actual sobre alguns dos temas mais centrais da psicologia. O livro é o resultado de um convite feito pela Universidade Aberta, por intermédio do meu colega e amigo Félix Neto a quem agradeço especialmente, com restrições específicas no que se refere ao formato e extensão da obra. A ordem dos capítulos do livro não é arbitrária e há alguma vantagem na leitura sequencial para efeitos de aprendizagem escolar. Apesar de tudo, creio que o leitor ocasional interessado apenas num ou noutro capítulo específico não será especialmente afectado em termos de compreensão. Todo o esforço foi feito para expor os temas de forma clara e interessante. Se o consegui ou não, a última palavra pertence naturalmente ao leitor. Um agradecimento especial ao Dr. Nuno Gaspar pela leitura das provas tipográficas e pelas correcções sugeridas. Esta obra foi o resultado de cerca de um ano de trabalho intenso. Foi durante este período que faleceu o meu pai, Manuel Pinto. À memória do meu querido pai e à vida e saúde do meu amado filho João, que me causou tantas interrupções e chamadas de atenção com os seus ternos 5 anos, dedico este livro. Porto, 21 de Junho de 2000 amancio@psi.up.pt. 16. © Universidade Aberta.

(17) 1. Psicologia: Introdução Geral. © Universidade Aberta.

(18) Página intencionalmente em branco. © Universidade Aberta.

(19) De psicologia todos sabemos um pouco. Pelo tom da voz, pelo aspecto do rosto, pela posição corporal somos capazes de perceber se o nosso interlocutor está feliz ou triste, nos quer ajudar ou fazer mal. O que o comportamento dos outros revela parece ser uma indicação das intenções ou planos que têm para connosco e dessa percepção e interpretação organizamos os nossos comportamentos e respostas para melhor nos adaptarmos e interagimos com as pessoas e o meio. Em geral somos bem sucedidos nestas tarefas, mas às vezes cometemos erros graves. Escolhemos para amigos pessoas que se vêm a revelar falsas e enganadoras, confiamos o nosso voto a dirigentes corruptos, enamorámo-nos da pessoa errada e divorciámo-nos da pessoa que no fundo nos amava de verdade. Podemos desculparmo-nos destes ou de outros erros dizendo que o comportamento humano é em grande parte um mistério, mas rapidamente nos damos conta de que o nosso comportamento não deixa de ser menos misterioso. Assim porque é que esta manhã acordei tão bem disposto e agora à tarde estou tão irritadiço, porque é que ainda não cumpri as intenções do Ano Novo de fazer ginástica, deixar de fumar, estudar mais ou tentar um melhor relacionamento com a família? O conhecimento psicológico que possuímos sobre nós e os outros parece ser paradoxal. Por um lado, temos algum conhecimento de psicologia ao conseguirmos adaptarmo-nos às pessoas e ao meio apesar das adversidades, de contrário a espécie humana teria já sido extinta. Mas, por outro, damo-nos conta rapidamente de que o conhecimento que possuímos é tão escasso e limitado que é uma sorte termos chegado onde chegámos.. 1.1. Definição e âmbito da psicologia. A psicologia é o estudo científico do comportamento e da mente em termos de organização e diversidade. A função da psicologia é constituir um corpo coerente de enunciados, empiricamente fundamentados, de forma a explicar o comportamento e a organização mental das pessoas e proporcionar previsões correctas. A psicologia é uma ciência que tem por objectivo descobrir leis e regularidades entre fenómenos de modo semelhante às ciências físicas e biológicas. A psicologia é ainda uma ciência, porque formula modelos e teorias consistentes para compreender, explicar e prever os fenómenos humanos e depois avalia, modifica, retém ou abandona tais modelos explicativos se não forem capazes de resistir às provas empíricas, à replicação dos resultados e ao escrutínio dos especialistas, ao contrário da psicologia popular e do senso comum que apresentam um corpo de saberes praticamente imutável ao longo de gerações. © Universidade Aberta. 19.

(20) A psicologia científica e a psicologia popular podem ter alguns aspectos comuns em termos de conteúdo, mas são saberes de natureza diferente em termos de pesquisa de dados, organização do saber, previsão e controlo da acção. O saber não-científico de natureza popular, que se reclama de psicologia, é contraditório nas suas afirmações, não tem consistência interna, as fronteiras do saber são obscuras e indefinidas, as circunstâncias da sua aplicação são vagas e confusas, e falta-lhe precisão na capacidade preditiva. Nesta perspectiva, a psicologia científica tem uma especificidade própria e não precisa de se preocupar em servir de contraponto à psicologia popular e ao senso comum (e.g., Pinto, 1999). Qual é o âmbito da psicologia científica? Como antes foi dito, a psicologia é o estudo científico do comportamento, das funções da mente e da sua organização mental. O objecto da psicologia é analisado sob diferentes perspectivas com o objectivo de se vir a obter um dia uma perspectiva integradora. Estas perspectivas são a biológica, a comportamental, a cognitiva, a sócio-cultural, a psicanalítica e a fenomenológica. Como exemplo das diferentes perspectivas de investigação psicológica na análise do comportamento humano, considere-se a investigação sobre o comportamento de ira ou cólera. Na perspectiva biológica, a ira pode ser analisada a partir da activação de certos circuitos neuronais do cérebro, lesões cerebrais provocadas pelo parto, alterações cromossomáticas ou genéticas e da presença ou ausência de certo nível hormonal no organismo. Na perspectiva comportamental, a ira pode ser analisada a partir dos gestos e expressões faciais produzidos, do rubor da face e dos estímulos externos que precederam e acompanham a manifestação da ira. Na perspectiva cognitiva, a ira pode ser analisada a partir das experiências passadas vividas, do modo como um indivíduo as organiza, representa e manifesta, e ainda do modo como tais vivências afectam a maneira de pensar e raciocinar em situações específicas. Na perspectiva sócio-cultural, a ira pode ser analisada a partir da pertença a certos grupos sociais, meios residenciais ou ainda em contextos em que há ou não um público presente. Os acessos de ira são raros na ausência de público. Na perspectiva psicanalítica, a ira pode ser analisada a partir de conflitos parentais não resolvidos na infância, de traumatismos de natureza sexual que foram depois reprimidos pela pessoa para evitar a ansiedade daí resultante, podendo no entanto irromper de forma inesperada e abrupta. Na perspectiva fenomenológica, a ira tende a ser analisada a partir da história de vida de uma pessoa, tendo em conta os ultrajes e afrontas vividos e sofridos, da imagem que se tem de si próprio e do controlo que se julga ter sobre as situações. 20. © Universidade Aberta.

(21) A ira está associada a guerras, violência e agressões entre pessoas, grupos e nações. É um fenómeno que foi estudado desde a antiguidade clássica por filósofos como Aristóteles na “Ética a Nicómaco” e Séneca em “De Ira”. A ira é um fenómeno comportamental e social de enorme complexidade, cuja análise, compreensão e explicação científica constituiria um avanço considerável para o saber psicológico. Quer em relação a este, quer a outros fenómenos psicológicos, a psicologia fez já bastantes progressos, mas ainda há um longo caminho a percorrer em termos de formulação de teorias integradoras das diversas perspectivas de análise.. 1.2. Marcos da História da Psicologia. Nos dias de hoje a psicologia é um ramo do saber bastante popular e um dos cursos universitários mais escolhido pelos estudantes nos países desenvolvidos. É uma ciência que aparece no entanto para muitos estudantes como sendo um produto americano ou anglo-saxónico, tal é o número de referências bibliográficas atribuídas a investigadores destes países nos dias de hoje. No entanto a psicologia, cientificamente falando, é uma construção cultural europeia. Surgiu e desenvolveu-se na Europa, onde se verificaram nos finais do séc. XIX e na primeira metade do séc. XX algumas contribuições notáveis por parte de muitas figuras da história da psicologia, das quais destaco a seguir as mais importantes. Na Alemanha, Wundt (1832-1920) fundou em 1879 o primeiro laboratório de psicologia experimental, possibilitando a autonomização da psicologia como ciência; Ebbinghaus (1850-1909) realizou importantes estudos experimentais sobre memória e esquecimento. Na Áustria, Freud (1856-1939) atribuiu ao inconsciente um papel fundamental na origem das desordens do comportamento e propôs a psicanálise como método de tratamento. Na Rússia, Pavlov (1849-1936) fez importantes descobertas no domínio do condicionamento com aplicação ao estudo da aprendizagem. Na Inglaterra, Galton (1822-1911) investigou e desenvolveu o importante tema das diferenças individuais. Em França, Binet (1857-1911) elaborou uma escala de medida da actividade intelectual, cujos desenvolvimentos e ramificações posteriores, influenciaram a psicologia aplicada ao longo do século XX. Na Suíça, Piaget (1896-1980) fez descobertas notáveis no domínio do desenvolvimento intelectual da criança e do adolescente. Outros psicólogos e investigadores europeus notáveis poderiam ainda ser referidos, mas tal será feito ao longo dos capítulos do presente livro. Ebbinghaus afirmou que a psicologia tinha um longo passado, mas uma curta história. De facto, o passado da psicologia remonta a algumas questões já © Universidade Aberta. 21.

(22) reflectidas e pensadas pelos filósofos gregos na antiguidade como o problema da relação entre mente e o corpo, o problema da consciência, o livre arbítrio e a percepção da realidade. Por sua vez, a história da psicologia é mais recente e oficialmente remonta a 1879 com a criação do primeiro laboratório de psicologia experimental por Wundt na cidade de Leipzig na Alemanha. Wundt definiu a psicologia como a ciência da consciência e propôs a introspecção como método de estudo da experiência imediata. Muito do trabalho realizado no laboratório de Wundt foi sobre sensação, percepção e tempos de reacção. Num estudo sensorial, uma pessoa provava um alimento, por exemplo, e depois esta experiência imediata era analisada através da introspecção em elementos simples, como o sabor amargo, doce ou ácido presente na consciência. À maneira do químico, a psicologia partia depois para a síntese dos elementos em compostos e para o estabelecimento de leis e princípios que governavam estes compostos e estruturas psicológicas. Assim a psicologia de Wundt e do seu discípulo americano Titchener (1867-1927) ficou a ser conhecida por psicologia estruturalista. No início do séc. XX a introspecção foi fortemente contestada, enquanto método de observação dos próprios estados da consciência, devido em grande parte ao facto dos dados obtidos por introspecção divergirem bastante entre si, mesmo quando obtidos por observadores treinados. Por volta da segunda e terceira décadas do séc. XX, um grupo de psicólogos alemães, nomeadamente Wertheimer, Köhler e Koffka, questionaram a conclusão dos estruturalistas de que a experiência imediata era elementar e defenderam a posição de que os fenómenos perceptivos eram antes percebidos imediatamente no seu todo (em alemão gestalt) em vez de serem percebidos nos seus elementos constituintes. Este sistema de investigação ficou conhecido por psicologia da forma ou gestaltismo. Os gestaltistas propuseram ainda que o todo era mais do que a soma das suas partes. Este enunciado pode ser melhor entendido, se se olhar para uma série de pontos, onde é possível perceber às vezes linhas, círculos ou outras figuras geométricas, conforme o conhecimento e a atitude da pessoa, em vez de se perceber pontos meramente isolados entre si e carecidos de qualquer organização perceptiva. Paralelamente nos EUA no princípio do séc XX surgiu o beaviorismo, uma perspectiva radicalmente diferente das perspectivas psicológicas europeias da época, proposta por John Watson (1878-1958) num célebre artigo publicado em 1913 com o título “A psicologia vista por um beaviorista” (Watson, 1913). Para o aparecimento do beaviorismo muito contribuíram os estudos pioneiros do americano Thorndike (1874-1949) e do russo Pavlov sobre aprendizagem animal, ao introduzirem um tipo de investigação experimental que apresentava 22. © Universidade Aberta.

(23) maior rigor e objectividade na obtenção de dados e revelava grandes similaridades com os métodos usados nas ciências naturais da época. O beaviorismo de Watson rejeitava qualquer recurso à instrospecção e pretendia reduzir a psicologia a uma ciência natural que tinha por objecto apenas e somente o comportamento observável, excluindo do seu âmbito a consciência e os processos mentais que aí tinham lugar, como a atenção, a memória, a inteligência e a vontade. Segundo Watson (1913), a consciência era um fenómeno privado. Só o comportamento da pessoa era uma resposta pública que podia ser observada por outra qualquer pessoa. A ciência analisa dados e fenómenos públicos e observáveis como o comportamento de uma pessoa numa situação. A ciência não se interessa por fenómenos privados, estados de consciência, cujo acesso só é possível através da introspecção. Watson e os beavioristas posteriores como Skinner (1904-1990) concentraram-se apenas na investigação do comportamento observável, fixando-o numa cadeia que se iniciava com um estímulo (E) e terminava com a resposta (R) produzida, dando origem à expressão psicologia do E-R. A maior parte deste tipo de estudos foi realizado com animais, nomeadamente, ratos, pombos, cães e macacos. De acordo com os beavioristas mais radicais, entre o (E) e a (R) há como que um vazio, ou uma caixa-negra. Se há ou não há consciência, atenção e memória para atender, registar e recordar os estímulos, são temas que não interessam. O que interessa é apenas e somente a resposta do organismo a um estímulo ou situação. O beaviorismo e o uso que fez do modelo animal na investigação psicológica propagou-se rapidamente pelas escolas de psicologia americana, tendo dominado a maior parte da psicologia que se produziu nos EUA na primeira metade do séc. XX. Na Europa da primeira metade do séc. XX, o beaviorismo teve uma influência mínima e circunstancial. Havia a desconfiança no dizer de Marx e Hillix (1973) de que “a soma de informação gerada pelos quilómetros percorridos pelo rato [no labirinto ou gaiolas de investigação] durante os últimos 50 anos não era grande”. Embora esta desconfiança fosse exagerada, os estudos de psicologia realizados na Europa até à década de 60 raramente faziam uso do modelo animal, concentrando-se antes em problemas humanos. Em Inglaterra, os problemas de investigação psicológica relacionavam-se com a memória, a cognição e o papel dos factores humanos como a atenção na interacção homem-máquina (Bartlett e Broadbent), assim como o estudo psicológico das diferenças individuais, da inteligência e da personalidade (Spearman, Burt, Hans Eysenck). Na França, os problemas diziam respeito à relação entre cérebro e pensamento (Piéron) e na Bélgica à percepção da causalidade (Michotte) e motivação (Nuttin). Na Suíça, os temas foram a. © Universidade Aberta. 23.

(24) memória e as desordens de reconhecimento mnésico (Claparède) e o desenvolvimento intelectual da criança (Piaget). A psicologia da personalidade e o seu desenvolvimento na perspectiva de Freud e do movimento psicanalítico teve também uma aceitação bastante generalizada na Europa deste período. Neste período, em Portugal, a investigação psicológica foi praticamente inexistente, apesar dos esforços pioneiros de Alves dos Santos que em 1913 fundou o primeiro laboratório de psicologia experimental em Portugal na Universidade de Coimbra e de Sílvio Lima que em 1928 publicou uma tese notável de doutoramento no domínio da memória humana e do reconhecimento sob a direcção do suíço Claparède. Em meados do séc. XX, a explicação beaviorista do comportamento passou a ser objecto de contestação crescente e vigorosa. Algumas das críticas vieram do interior do sistema beaviorista, como as objecções feitas por Tolman (18861959) ao introduzir variáveis cognitivas, como expectativas e mapas cognitivos, na explicação da aprendizagem dos ratos em labirintos. Outras críticas foram feitas por jovens investigadores, como o psicolinguista Chomsky (1959) que tentou provar com grande eficácia que a maior parte dos dados sobre a linguagem não podia ser explicada e compreendida em termos de associação entre estímulo e resposta (E-R), como propunham os beavioristas. A visão simplista do ser humano, que o beaviorismo pressupõe, foi substancialmente refutada por George Miller et al. (1960) no influente livro Planos e Estrutura do Comportamento onde defenderam que o ser humano é um processador e um intérprete activo do seu meio ambiente, respondendo em função da própria experiência que tem do meio, em vez de reagir de forma mecânica e irreflectida. As pessoas, longe de serem meros figurantes passivos que reagem ao meio, são antes vistas como organismos activos que no comportamento do dia a dia usam planos, estratégias e regras de acção. Esta nova perspectiva veio a ser cunhada de psicologia cognitiva por Neisser (1967) no livro com o mesmo título, onde define a psicologia cognitiva como “o estudo dos processos pelos quais uma pessoa capta, retém, manipula e recupera a informação”. Os temas que organizam os capítulos deste livro de Neisser foram os temas ignorados pelos beavioristas, como a atenção, a percepção, a memória, a linguagem e o pensamento. A importância central dos processos cognitivos em relação ao comportamento foi-se desenvolvendo nos anos seguintes a ponto de Chomsky numa entrevista dada em 1986 afirmar que “a psicologia não é a ciência do comportamento, mas antes o estudo da mente, da organização mental e das estruturas mentais, servindo-se dos comportamentos enquanto dados de estudo” (Baars, 1986, p. 347). Os cognitivistas não são necessariamente anti-beavioristas, como às vezes se ouve ou lê, antes consideram o beaviorismo um sistema incompleto em termos de explicação do comportamento. O comportamento não pode ser explicado 24. © Universidade Aberta.

(25) apenas através das suas características métricas mais salientes, como a frequência, intensidade ou robustez da resposta. A explicação do comportamento tem de ter em conta as explicações ao nível dos processos e representações mentais da pessoa, crenças e intenções. Sem a perspectiva cognitiva em psicologia não seria possível caracterizar e explicar satisfatoriamente os processos mentais como o reconhecimento e a recordação, a atenção, a linguagem, o pensamento, o raciocínio e a tomada de decisões. Para melhor se perceber este aspecto, Chomsky propôs uma analogia com a ciência física. Se a física não é a leitura métrica dos fenómenos, mas antes a compreensão e explicação das forças da matéria, assim também a psicologia não é a leitura métrica do comportamento, mas antes a compreensão das estruturas e processos mentais que afectam o comportamento (in Baars, 1986, p. 347). Desde a década de 60 até ao presente, a psicologia cognitiva alargou progressivamente a sua influência a todos os ramos e actividades da psicologia, de modo que se pode dizer que poucos são hoje os investigadores que não se consideram cognitivistas, pelo menos em sentido lato. Em contraste, a influência do beaviorismo foi diminuindo progressivamente ao longo dos últimos 30 anos. Segundo Robins et al. (1999) o equilíbrio entre estes dois sistemas, em termos de publicações próprias e importância explicativa, terá sido atingido durante a década de 70, altura onde se terá verificado um cruzamento da função ascendente da perspectiva cognitiva com a função descendente da perspectiva beaviorista. Robins et al. (1999) analisaram ainda a influência da psicanálise e das neurociências na literatura psicológica e concluíram existir, no que se refere à psicanálise uma influência diminuta mas constante ao longo dos últimos 30 anos; no que se refere às neurociências, houve um aumento progressivo ascendente nas últimas duas décadas, mas bastante aquém do que se poderia pensar, tendo em conta a popularidade existente em certos círculos académicos.. 1.3. Psicologia e ciências afins. A psicologia não é a única ciência a estudar o comportamento humano e animal, nem o cérebro e a mente, o que torna confuso para muita gente perceber quais as áreas de investigação psicológica e as práticas de intervenção. A psicologia apresenta similaridades com outras ciências afins, nomeadamente a sociologia, antropologia e biologia, cujas relações são referidas a seguir. A sociologia estuda o comportamento de grupos de pessoas em larga escala, nomeadamente sociedades, culturas e sub-culturas. A antropologia estuda a espécie humana e o modo como esta forma comunidades, sociedades e nações, © Universidade Aberta. 25.

(26) e como evoluiu ao longo dos tempos em termos somáticos, raciais, étnicos e geográficos. A biologia estuda a origem, o desenvolvimento, as funções, as estruturas e a reprodução dos organismos vivos. A psicologia estuda o comportamento de animais e pessoas, individualmente ou em pequenos grupos. Estuda ainda a organização mental da pessoa, as suas estruturas e funções e o modo como estas afectam o comportamento. Em termos metodológicos, a sociologia usa mais frequentemente métodos observacionais e correlacionais; a antropologia cultural aplica métodos qualitativos e descritivos; a biologia e a psicologia utilizam além destes ainda o método experimental. Psiquiatria e psicologia, nomeadamente a psicologia clínica, são por vezes confundidas pelo público em termos de áreas de intervenção, na medida em que ambas as especialidades diagnosticam e tratam problemas comportamentais e desordens mentais. Mas estas profissões diferem em pontos importantes. A psiquiatria é uma especialidade médica, estuda o comportamento dito anormal, como as desordens comportamentais e mentais e os profissionais estão autorizados a receitar medicamentos para efeitos de tratamento. A psicologia clínica é uma especialidade obtida numa licenciatura e pós-graduação em psicologia, e em princípio estuda, diagnostica e orienta terapias psicológicas específicas em todos os tipos de problemas de comportamento, dito normal ou anormal. Em termos práticos, a diferença mais nítida entre psicologia e as outras especialidades afins é a obtenção de um grau superior a nível universitário e a pertença a uma sociedade científica que torne credível o grau académico obtido. Houve no entanto algumas excepções notáveis no passado. No estudo dos problemas psicológicos houve investigadores brilhantes que não possuíam qualquer grau académico ou pertenciam a qualquer sociedade psicológica. Os pais fundadores da psicologia nos finais do séc. XIX foram filósofos, fisiologistas e físicos, como William James, Wundt e Fechner, cujas contribuições constituiram um avanço notável para a ciência psicológica. No século XX houve ainda fisiologistas como Pavlov, prémio Nobel da medicina em 1904, que marcou profundamente a psicologia da aprendizagem; médicos como Freud que propôs um modelo de organização mental e um tipo de tratamento das desordens mentais que influenciou toda a prática de intervenção psicológica; biólogos e epistemólogos como Jean Piaget, que renovou radicalmente a psicologia do desenvolvimento; economistas como Herbert Simon (n. 1916), prémio Nobel da economia em 1978, que contribuiu de forma marcante para a psicologia cognitiva; grandes analistas e humanistas como Erik Erikson (1902-1994) que nem sequer tinha um grau universitário e no entanto repôs o desenvolvimento da personalidade numa nova perspectiva. Daqui se conclui que ao longo do séc XX, o conhecimento psicológico avançou imenso com a contribuição das investigações realizadas em ciências afins à 26. © Universidade Aberta.

(27) psicologia. Tudo leva a crer que no séc. XXI os temas, os problemas e os procedimentos de investigação psicológica continuem a ser arejados e renovados não só com o esforço e a criatividade dos estudantes de psicologia, mas também com as contribuições e o saber dos estudantes das ciências afins.. 1.4. Métodos psicológicos. Método refere-se a procedimentos ou técnicas específicas para recolha e análise de dados. A investigação científica não implica um único método ou abordagem de estudo, porque os métodos de investigação variam de problema para problema e de disciplina para disciplina. Para responder cabalmente a uma questão pode haver procedimentos científicos mais apropriados do que outros e a resposta dada está limitada pela natureza do método seguido. No entanto fazer investigação científica significa muitas vezes usar métodos quantitativos e estes métodos incluem de uma maneira geral a observação sistemática, um controlo experimental exigente, instrumentos de medida e recolha de dados fieis e precisos, a aleatoriedade das amostras de sujeitos e uma análise estatística rigorosa (e.g., Pinto, 1990). Os métodos psicológicos de recolha de dados mais usados são a observação naturalista, o estudo de casos, os questionários, o método correlacional, o método dos testes, o método diferencial e o método experimental. Uma descrição abreviada de cada um destes métodos será apresentada a seguir.. 1.4.1 Observação naturalista A observação naturalista é um dos métodos mais antigos e refere-se à recolha atenta e cuidada de dados de animais e pessoas no seu ambiente natural. A observação é realizada de modo flexível de forma a tirar partido, não só de todos os comportamentos sob observação, mas também de acontecimentos inesperados, que eventualmente possam ocorrer. Os comportamentos sob observação não estão limitados a quaisquer restrições humanas de movimento e acção e tanto podem ser o comportamento de nidificação e reprodução de uma ave rara, como o comportamento competitivo e agressivo dos rapazes no recreio da escola, ou o comportamento dos condutores de automóvel no meio de um engarrafamento matinal de trânsito. Margaret Mead (1901-1978) foi uma das primeiras investigadoras a aplicar o método da observação naturalista ao estudo do comportamento humano. Esta antropóloga viveu durante algum tempo no meio de uma tribo asiática, observando e registando várias informações sobre o comportamento do dia a © Universidade Aberta. 27.

(28) dia dos membros da tribo e tirando ilações sobre o sistema de organização social, distribuição do poder, divisão do trabalho, sistema de parentesco e valores culturais e religiosos. Os métodos naturalísticos têm sido também usados em psicologia para estudar o comportamento humano em diversas situações. Algumas das observações mais frequentemente efectuadas em psicologia foram o estudo do comportamento social das crianças na sala de aula ou no recreio, o comportamento dos condutores em cruzamentos, estradas e em situações de engarrafamento de trânsito, manifestações de violência em locais desportivos, o impacto psicológico e social causado nas populações por desastres naturais ou industriais, o comportamento de fumar em locais proibidos, entre outros.. 1.4.1.1 Estudo de casos O estudo de casos refere-se à descrição detalhada de um único indivíduo em termos de passado e história, usando às vezes a entrevista, efectuando avaliações ou aplicando testes e discutindo os resultados. É um método muito usado em psiquiatria, em psicologia clínica e em neuropsicologia. Freud foi talvez o investigador que inicialmente mais contribuiu para o uso e divulgação deste método. Um exemplo de estudo de casos foi a análise efectuada por Freud em 1909 de uma fobia num rapaz de 5 anos, de nome Hans (Freud, 1909/1955). Mais recentemente, o russo Luria e o inglês Oliver Sacks descreveram alguns casos famosos usando também o método dos casos. Luria (1968) descreveu o caso de S., um homem com uma memória excepcional e Sacks (1990) referiu o caso de um paciente com um problema neurológico grave que o levava a confundir a mulher por um chapéu. Em geral são relatos verídicos e fundamentados, normalmente muito expressivos e de leitura estimulante, sobre aspectos específicos do comportamento de uma pessoa. O estudo de casos tem sido considerado como o menos científico de todos os métodos empíricos usados pelos psicólogos. A justificação apresentada refere que este tipo de método envolve apenas o caso específico de uma pessoa que é única e não pode ser reproduzido; interpreta o comportamento sob uma certa perspectiva teórica; implica em muitos casos uma relação de tipo terapêutico, que pela sua natureza de ajuda dificilmente pode ser objectiva em termos de análise. Há estudo de casos em que a análise é meramente qualitativa sem qualquer tipo de medição ou análise estatística como no caso de Freud ou Sacks. Noutros estudos, como o de Luria, foram feitos registos e medições de natureza quantitativa para se saber até que medida a memória era ou não excepcional em relação a casos considerados normais e estabelecido algum controlo sobre certas variáveis. 28. © Universidade Aberta.

(29) 1.4.1.2 Questionários Os questionários são formados por um conjunto de perguntas planeadas sobre um certo tema para serem administradas a um grande número de pessoas a fim de se obter informação sobre atitudes, opiniões e comportamentos. Um exemplo destes é o questionário de metamemória de Zelinski et. al. (1980). Estes investigadores estudaram a frequência do esquecimento e a qualidade de recordação em várias situações do dia a dia, como a memória para nomes, faces, encontros, entrevistas, datas, tarefas, direcções e números de telefone, entre outros aspectos. Os questionários têm a vantagem de permitir recolher muita informação em pouco tempo de um grande número de pessoas, mas têm grandes limitações. O investigador parte do pressuposto de que os participantes respondem honestamente a todas as perguntas. Se é possível que a maioria das pessoas o faça, é preciso contar também com a eventualidade de um pequeno número não ser assim tão franco e honesto. Sondagens efectuadas à boca das urnas, depois da votação sobre a escolha política ter sido efectuada, revelaram discrepâncias significativas entre os resultados oficiais da eleição e os resultados da sondagem e cuja explicação pode ser em parte devida à ocultação da verdade por parte dos eleitores. Os questionários estão ainda sujeitos a limitações resultantes do contexto em que são administrados, do sexo do entrevistador e do modo como este obtém a cooperação do entrevistado e formula as perguntas. Mesmo que estes factores sejam devidamente controlados resta ainda a eventualidade do problema em estudo estar sujeito a variações cíclicas ou passageiras, como acontece provavelmente com o caso dos comportamentos sexuais ou de atitudes face ao aborto, pena de morte, imigração e racismo, restringindo assim temporalmente as conclusões obtidas. Os questionários estão ainda sujeitos a um problema que é comum a toda a investigação psicológica: Será que as avaliações feitas são fieis, isto é consistentes, e válidas, isto é precisas? No caso dos questionários de meta-memória, o grau de fidelidade é elevado, quando expresso pelo grau de correlação das avaliações do mesmo instrumento efectuadas entre dois momentos distanciados no tempo, mas apresentam um grau de validade reduzido, quando as avaliações são comparados com provas objectivas de memória a curto prazo (memória de números) ou a longo prazo (evocação de listas de palavras).. 1.4.2 Método correlacional Os estudos correlacionais ultrapassam a simples fase de contagem e descrição de dados e representam um nível superior de conhecimento face à observação © Universidade Aberta. 29.

(30) naturalista e ao estudo de casos. Quando um investigador observa que os pais com mais livros em casa têm filhos com melhor rendimento escolar, que as crianças que vêem mais horas de televisão são mais violentas e agressivas, ou que o grau de poluição industrial está relacionado com o declínio cognitivo, e for ainda capaz de efectuar medições quantitativas precisas de cada variável, então o investigador fica em condições de determinar qual o grau de relação e de direcção entre as variáveis observadas. Os estudos correlacionais têm por objectivo determinar uma relação entre duas ou mais variáveis e esta relação pode ser positiva, negativa ou inexistente. O tipo de relação é determinado a partir de uma análise estatística, o teste de correlação. Os valores de correlação variam entre -1 a +1. Quanto mais as variáveis estiverem relacionadas entre si, tanto mais o coeficiente de correlação se aproxima de +1 ou de -1. Se a relação for nula, o coeficiente de correlação aproxima-se do zero. O coeficiente de correlação descreve de forma precisa e quantitativa o grau de relação verificada entre duas variáveis. A direcção do relacionamento é dada pelo tipo de sinal positivo ou negativo que acompanha o coeficiente. Um sinal positivo significa que os valores da grandeza de uma variável estão positivamente relacionados de forma linear com os valores da outra variável e um sinal negativo significa que o relacionamento dos valores das duas variáveis é linearmente negativo. O coeficiente de correlação traduz a força da ligação linear entre duas variáveis. Quando a ligação entre variáveis não é linear mas curvilínea, o coeficiente de correlação pode estar próximo do zero, mas mesmo assim existir uma relação forte entre duas variáveis. O teste estatístico para medir tal relação é que terá de ser outro. O método correlacional é útil no domínio da psicometria, tendo sido possível determinar satisfatoriamente os traços comuns de um determinado estilo de personalidade (por ex., a introversão ou a extroversão) ou de uma habilidade cognitiva (por ex., o raciocínio espacial ou fluência verbal). O método correlacional é ainda usado com frequência em psicologia na determinação dos índices de fidelidade (isto é, a consistência entre várias aplicações do mesmo teste) e de validade (isto é, a medição adequada daquilo a que o teste se destina) dos questionários e testes de inteligência e de personalidade. O método de correlação tem todavia limitações, a maior das quais é a incapacidade de se estabelecer uma relação causal entre variáveis que apresentam um coeficiente de correlação elevado. Neste caso pode-se suspeitar da presença de alguns factores causais comuns, mas não é possível afirmar que uma variável é a causa de outra. Esta dificuldade pode ser ilustrada a partir de uma ocorrência grave verificada na década de 80 em Itália onde se registaram uma série de mortes sem haver uma explicação clara. No entanto as mortes estavam 30. © Universidade Aberta.

(31) significativamente relacionadas com o consumo de azeite, o que levou o governo a concluir que o azeite vendido era tóxico. No entanto estudos mais aprofundados indicaram que a causa das mortes tinha sido a ingestão de tomates contaminados com pesticidas e comidos em saladas temperadas com azeite. Numa outra situação verificou-se que o coeficiente de correlação entre o tempo de estudo e o desempenho escolar universitário era baixo e negativo (-0.10). Se o coeficiente fosse interpretado em termos causais, então a conclusão óbvia seria deixar de estudar para se obter um bom desempenho académico! Uma leviandade que nenhum estudante responsável seguirá. Então porque é que o coeficiente de correlação foi tão baixo e negativo? Possivelmente porque muitos alunos tentam compensar através de um maior tempo de estudo algumas das limitações que têm à partida em termos de preparação académica ou de recursos cognitivos. Outros estudantes, que se consideram melhor preparados à partida, usam métodos de estudo mais eficazes, ou fazem uma gestão mais económica do tempo de estudo. Estes dois exemplos, entre muitos outros, mostram que um coeficiente de correlação significativo não prova que uma variável é a causa de outra, antes indica que as variações no valor de uma variável prevêem até certo ponto variações noutra variável. A determinação da causa de um fenómeno só é possível a partir de uma investigação experimental.. 1.4.3. Método dos testes. Para ser valorizada ou denegrida, a psicologia é muitas vezes associada aos testes psicológicos. Os testes constituem a única indústria que a psicologia produziu até hoje e estão sujeitos a controvérsias cíclicas. Os testes são porém métodos objectivos de observação e medida de variáveis. Os testes são constituídos por tarefas uniformes administradas individualmente ou em grupo com o objectivo de medir uma ou mais variáveis ou construtos teóricos. Os testes são instrumentos que permitem obter facilmente um grande número de dados sobre as pessoas, sem lhes provocar transtornos de maior em termos de rotina diária ou exigir meios complexos de aplicação como acontece por vezes a nível laboratorial. Historicamente a expressão teste mental surgiu num artigo publicado pelo americano Cattell em 1890, que juntamente com o inglês Galton e o francês Binet são considerados os pioneiros da avaliação mental e psicológica. Em 1905, Binet e Simon publicaram uma escala de inteligência, um instrumento elaborado a pedido do Ministério da Instrução francês a fim de permitir detectar deficiências intelectuais em crianças de idade escolar. A função básica dos. © Universidade Aberta. 31.

(32) testes era medir diferenças entre indivíduos de forma a permitir uma classificação de natureza mental e comportamental. Em psicologia há centenas de testes, escalas e medidas que podem dividir-se em vários grupos: Testes de aptidão e inteligência; testes de realização; medidas de personalidade e escalas de valores e atitudes. Através de testes elaborados para o efeito podem ser analisadas variáveis de comportamento, como a ansiedade ou o autoritarismo; a inteligência geral ou aptidões específicas, como a fluência verbal ou o raciocínio espacial; realização escolar, como o nível da leitura ou de aritmética; atitudes, como as crenças e predisposições face à religião, grupos étnicos ou o aborto. Os testes são importantes instrumentos de medida em psicologia, principalmente após terem sido normalizados e aplicados a amostras representativas. A construção e normalização de um teste é uma tarefa muitas vezes longa e complexa em termos de preparação dos itens do teste, aplicação a amostras representativas, aferição e normalização, sendo a descrição das respectivas fases e procedimentos objecto de uma literatura bastante especializada. Desde o começo do século XX, os testes psicológicos são uma área importante da psicologia com aplicações ao nível da selecção e classificação escolar, militar, profissional e organizacional. Porém a importância dos testes não se limita apenas à psicologia aplicada, tendo ainda um papel importante ao nível da investigação. Assim os testes podem esclarecer, quer na medição das diferenças individuais ou nas diferenças de grupo, qual o nível de desenvolvimento intelectual de uma criança desde a infância até à adolescência, ou o eventual declínio cognitivo de uma pessoa durante a vida adulta. Os testes são ainda um meio indispensável para ajudar a esclarecer diferenças de grupo em função de variáveis como a instrução ou o meio sócio-cultural. Quando um investigador pretende saber se um programa de instrução aplicado a um grupo de alunos é melhor do que outro programa alternativo, precisa de estabelecer uma equivalência entre os participantes dos dois grupos em diversas variáveis cognitivas, nomeadamente ao nível da inteligência. Ora o grau de inteligência determina-se com a aplicação de um teste.. 1.4.4 Método diferencial O método diferencial tem por objectivo investigar o desempenho de dois ou mais grupos que se distinguem na base de uma variável pre-existente, seja o género, a idade, os anos de escolaridade ou um traço de personalidade como a ansiedade. 32. © Universidade Aberta.

(33) Um exemplo de estudo diferencial é a análise dos resultados de uma prova de memória entre dois grupos, um do género masculino e outro do género feminino. O género é a variável independente, isto é, a variável responsável pela definição dos grupos. O desempenho de memória registado é a variável dependente. Um problema com o método diferencial é a dificuldade de controlo das variáveis que concorrem com a variável independente. No exemplo anterior, os grupos podem diferir na base de outras variáveis para além do género, a variável independente medida. Se os grupos diferem à partida numa determinada variável, como o género, é muito provável que também se diferenciem noutras variáveis que possam afectar os resultados, como a idade, o número de anos de escolaridade, o raciocínio, o estilo cognitivo, entre outras. Nesta situação a obtenção de diferenças de memória entre o género masculino e feminino seria um resultado artificioso. Na investigação diferencial, as diferenças entre os grupos pré-existem ao início da investigação propriamente dita. Assim a variável independente não é manipulada pelo investigador como na investigação experimental, mas apenas medida. Sendo a variável independente apenas medida e não manipulada não é possível ir além do grau e direcção de relacionamento das variáveis estudadas, isto é, do grau de correlação registado. Este método torna a investigação diferencial muitas vezes mais difícil de interpretar do que a investigação experimental, pois não é possível usar os controlos típicos da investigação experimental. Na investigação experimental, a distribuição aleatória dos sujeitos pelos diferentes grupos proporciona uma equivalência inicial dos grupos em todas as variáveis (teoricamente falando) que concorrem com a variável independente. Neste sentido a investigação diferencial é, em termos de explicação, conceptualmente semelhante à investigação correlacional. A investigação diferencial substitui por vezes a investigação experimental, como acontece na área da educação. Em educação não é viável distribuir aleatoriamente os estudantes de uma escola, metade pelo método X e a outra metade pelo método Y para se verificar se um método é melhor ou pior do que outro. Se se quiser comparar os efeitos de dois métodos de instrução é habitual comparar duas escolas que adoptaram tais métodos de ensino, e depois esperar que os estudantes que as frequentam sejam equiparáveis nas variáveis mais relevantes, exercendo-se todo o controlo possível ao nível da equivalência de tais variáveis. O método de ensino é a variável independente que diferenciava as escolas e é responsável pela definição dos grupos que existiam antes da experiência começar; os resultados escolares finais dos alunos de cada escola são a variável dependente.. © Universidade Aberta. 33.

(34) 1.4.5 Método experimental A investigação experimental tem um papel crucial na investigação científica. O método experimental é considerado o único método científico em que é possível estabelecer-se uma relação de causalidade entre duas ou mais variáveis ou fenómenos. A análise dos fenómenos por meio de uma experiência é a aspiração de muitos cientistas.. Caixa 1.1 Um Estudo Experimental Quer a partir da simples observação da relação mãe-bebé, quer a partir do modelo teórico de Freud sobre o desenvolvimento das crianças, é possível formular a hipótese de que a alimentação é o factor crucial no desenvolvimento da ligação afectiva entre a mãe e a criança. Mas será de facto o factor alimentação? Não será antes o contacto corporal que a mãe estabelece com a criança durante a amamentação? Harlow (1959) tentou investigar esta hipótese através de uma experiência científica realizada com oito macacos recémnascidos. Harlow produziu dois modelos de “mães substitutas”, um modelo em que o corpo do animal era formado por uma estrutura de arame, cabeça de madeira e rosto meio tosco e um outro modelo em que uma estrutura semelhante era revestida de tecido aveludado. Os oito macacos foram colocados em gaiolas individuais com acesso igual às “mães substitutas”, recebendo metade deles o leite da “mãe de arame” e a outra metade da “mãe de veludo”, em ambos os casos através do bico de um biberão, parcialmente escondido no corpo de cada modelo. Durante o período de observação, os macacos beberam uma quantidade de leite equivalente e obtiveram um peso semelhante, no entanto passaram a maior parte do tempo agarrados ao modelo de veludo, independentemente de terem sido ou não alimentados por este modelo. Este estudo desconfirmou a hipótese da importância da alimentação no desenvolvimento da ligação afectiva em favor da importância do contacto corporal. Na sequência deste projecto, Harlow verificou ainda que os macacos, quando se sentiam ameaçados pela aproximação de um urso mecânico, refugiavam-se todos no modelo de veludo. Noutra situação quando tinham a oportunidade de pressionar uma alavanca que permitia abrir uma janela para observarem ou um macaco real ou o modelo de veludo, os macacos pressionavam igualmente a alavanca de cada janela, mas não mostravam qualquer interesse 34. © Universidade Aberta.

(35) pelo modelo de arame. Estes resultados provaram que o modelo de veludo é capaz de reduzir a ansiedade dos jovens macacos e atrair a atenção de modo equivalente ao de um macaco real. O modelo de veludo mostrou-se no entanto inadequado em termos de desenvolvimento social. Os macacos, “criados” pelo modelo de veludo, mas mantidos isolados, tornaram-se socialmente inaptos ao crescerem. Todavia quando os macacos “criados” pelo modelo de veludo tiveram a oportunidade de brincar uma hora por dia com três outros macacos, o crescimento e desenvolvimento deles tornou-se indiferenciável dos macacos criados pelas mães naturais, provando ainda que um factor importante no desenvolvimento saudável dos macacos era o contacto social.. Em termos gerais, uma experiência é um arranjo de condições, procedimentos e equipamento com o objectivo de se avaliar uma hipótese e mantendo sob controlo todos os restantes factores. Em termos específicos, uma experiência é uma observação objectiva de um fenómeno que é forçado a ocorrer numa situação rigorosamente controlada, e em que um ou mais factores são manipulados enquanto os restantes são controlados (Zimney, 1961). As variáveis manipuladas designam-se por variáveis experimentais, independentes ou de tratamento e os resultados da experiência designam-se por variável dependente. É crucial em qualquer experiência estabelecer-se condições de controlo das variáveis concorrentes face à variável independente e ainda uma distribuição aleatória dos diferentes factores. Um exemplo de estudo científico de acordo com o método experimental está descrito na Caixa 1.1, onde se referem vários factores que tiveram de ser controlados para se conseguir descobrir uma relação de causa e efeito sem ambiguidade entre os factores estudados. Estes controlos são necessários para se obter uma conclusão definitiva sobre o tipo de antecedentes que causam e originam um evento subsequente. Além do controlo das variáveis, o experimentador manipulou sistematicamente variáveis no ambiente em que decorria a experiência de forma a observar o efeito desta manipulação em certos tipos de comportamento. A manipulação sistemática dos valores da variável independente tem por objectivo demonstrar um efeito causal directo na variável dependente. Os pontos fortes da investigação experimental são o controlo das variáveis, a precisão das medições obtidas e a possibilidade de se estabelecer uma relação causal entre variáveis. Uma experiência tem validade interna, quando os resultados obtidos resultam única e exclusivamente da manipulação da variável. © Universidade Aberta. 35.

(36) independente, conseguindo-se controlar toda a influência de outras variáveis concorrentes. Frequentemente este grau de controlo é apenas conseguido através de recursos laboratoriais com a apresentação das condições da variável independente, controlo das variáveis concorrentes e registo preciso da variável dependente. Mas as circunstâncias que tornam forte a aplicação do método experimental têm a contrapartida de o fragilizar em termos de aplicação dos resultados a outros sujeitos, situações e contextos. Assim quando o método experimental é forte em termos de validade interna costuma ser fraco em termos de validade externa ou validade ecológica. Por exemplo, Ebbinghaus (1885) obteve alguns princípios ou efeitos de memória importantes, como a curva de esquecimento, usando sílabas sem significado. No entanto, Bartlett (1932) sublinhou a falta de validade externa deste tipo de estudos ao usar-se material verbal sem significado. Em contraste, Bartlett usou figuras e contos populares, um tipo de material verbal mais próximo da aprendizagem e memória que ocorre no dia a dia das pessoas. O estudo de Ebbinghaus era forte em termos de validade interna, mas fraco em termos de validade externa; por sua vez, os estudos de Bartlett foram acusados do contrário. A discussão sobre a importância da validade externa da investigação experimental é por vezes mais um problema para certos especialistas de metodologia do que para os investigadores que fazem investigação laboratorial a sério no dia a dia. No caso da investigação efectuada por Harlow (1959), os modelos “mãe de arame” e “mãe de veludo” não têm qualquer representatividade em termos de aplicação dos resultados ao meio ambiente da selva. Na selva não há “mães de arame” ou “mães de veludo”. São situações laboratoriais de uma artificialidade extrema. No entanto este estudo pôs irremediavelmente em causa o factor alimentação considerado até então como o factor essencial no estabelecimento da ligação afectiva entre a mãe e a criança. Noutro aspecto, por exemplo, é altamente improvável que as leis do condicionamento, descobertas por Pavlov e Skinner em situações laboratoriais extremamente artificiais de que falaremos no capítulo seguinte, fossem alguma vez estabelecidas, se estes investigadores se tivessem limitado a observar simplesmente o comportamento do cão do vizinho ou o do rato no sótão da casa de campo. Dito isto, não se pretende insinuar que a investigação experimental deva desinteressar-se da generalização dos resultados a situações reais do dia a dia. Os investigadores estudam propositadamente os comportamentos das pessoas em ambientes simplificados de forma a obter um maior controlo das variáveis e conseguirem testar os princípios gerais que explicam os comportamentos animais e humanos. Os investigadores esforçam-se tenazmente por evitar a 36. © Universidade Aberta.

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