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A quantas anda a classe média assalariada no Brasil?

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Academic year: 2021

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Rinaldo Aparecido Galete*

Resumo

Assiste-se, atualmente, no Brasil, a um debate não muito alardeado pela mídia; logo, nem sempre percebido pela população em geral em torno da situação atual e das perspectivas da chamada classe média. O escopo perseguido no presente estudo será investigar, a partir dos anos 90, em especial no período Pós-plano Real, a quantas anda a proporção da classe média não-proprietária inserida no mercado formal de trabalho. Adicionalmente, pretende-se verificar qual a tendência apontada pelos dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), principalmente em função das mudanças estruturais observadas na década de 1990. Entre outras questões, indaga-se se é possível afirmar que, conforme destacado na mídia, nos últimos tempos a classe média no Brasil caminha para a extinção!

Palavras-chave: Brasil. Classe média assalariada. Mercado formal de trabalho.

* Mestre em Economia Social e do Trabalho

pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/Unicamp); fessor da PUC/PR Campus Maringá; pro-fessor das Faculdades Maringá e da Facul-dade Alvorada de Tecnologia e Educação de Maringá; Rua Ivai, 802, ap. 202-B, Cond. Res. Amaylis, Jardim Novo Horizonte, Ma-ringá, PR; 87005-270; rgalete@uol.com.br

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1 INTRODUÇÃO

O escopo perseguido no presente estudo será in-vestigar, a partir dos anos 90, em especial no período Pós-plano Real, a quantas anda a proporção da classe média não-proprietária inserida no mercado formal de trabalho e qual a tendência apontada pelos dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais).

O período em análise foi escolhido em função das mudanças estruturais observadas na economia brasileira durante a década de 1990, cujos reflexos mais perversos só puderam ser sentidos, de manei-ra mais intensa, no início deste século. Entre outmanei-ras questões, indaga-se se é possível afirmar que, confor-me destacado na mídia, nos últimos tempos a classe média no Brasil caminha para a extinção!

O trabalho está dividido em sete seções. Na seção 2, considera-se a metodologia, a fim de definir o que é a classe média e quais indivíduos, ou famílias, podem ser considerados como pertencentes a esse segmento, consoante à literatura pertinente ao tema. Na seção 3, ainda que de maneira extremamente sumária, investi-ga-se a origem da classe média brasileira, bem como suas perspectivas atuais, segundo diferentes pontos de vista. Na seção 4, discute-se como é o padrão de con-sumo, o comportamento econômico e as características da classe média, em especial no caso brasileiro. Tendo em vista o caráter de formadora de opinião, próprio da classe média, na seção 5 aborda-se o comportamento político e as relações da classe média com a mídia. Na seção 6 discute-se o modo de vida da classe média e a maneira como esse modo de vida é tratado pela mídia. A seção 7 apresenta os resultados empíricos da pesqui-sa. Finalmente, a seção 8 sumariza as considerações finais e sugere pistas ao desenvolvimento de trabalhos futuros para estudiosos interessados nesse intrigante tema ainda pouco estudado no Brasil.

2 CONSIDERAÇÕES DE NATUREZA

METODOLÓGICA

Assiste-se, atualmente, no Brasil, a um debate, não muito alardeado pela mídia; logo, nem sempre

percebido pela população em geral em torno da situa-ção atual e das perspectivas daquela classe de pessoas que se convencionou chamar de classe média.

Do ponto de vista conceitual, a classe média é uma classe social presente no capitalismo moderno que se convencionou tratar como possuidora de um poder aquisitivo e de um padrão de vida e de consumo razoáveis, de forma a não apenas suprir suas necessi-dades como também permitir-se formas variadas de lazer e entretenimento, embora sem chegar aos pa-drões de comportamento eventualmente considerados exagerados das classes superiores.

Trata-se como classe média, no Brasil, os bra-sileiros que não têm dinheiro sobrando, mas não pas-sam necessidades. Não são donos de empresas, mas também não são trabalhadores braçais.

É difícil definir com precisão quem é classe mé-dia. Até mesmo os sociólogos divergem nos critérios. Mas é fácil entender que classe média é a faixa da população que fica entre os ricos e os pobres. Ela se identifica não somente pela renda, mas também pelo tipo de trabalho, que, em geral, exige certo grau de escolaridade. A classe média representa quase 1/3 da população brasileira.

Kanitz (2005) destaca que a classe média são aqueles que mostram o caminho, não pelas suas idéias, mas pelos seus exemplos. Exemplos de sucesso, dis-ciplina, persistência e determinação, como gerentes, supervisores, administradores, pequenos e médios empresários, juízes, médicos, funcionários públicos, profissionais liberais, professores universitários, etc.

Não há, porém, uma definição clara do que seja classe média: tal noção varia de sociedade para socie-dade, especialmente de acordo com o desenvolvimen-to econômico do país em questão. Por esse motivo, costuma-se tratar essa fração da população não como um único bloco, mas como muitas classes médias di-ferentes. Em nações centrais do capitalismo interna-cional, normalmente entende-se que as classes médias sejam a porção maior na constituição da sociedade.

Para a realização de pesquisas sobre essa classe social, a primeira barreira a ser rompida, em termos metodológicos, é definir quais indivíduos ou quais fa-mílias podem ser considerados como pertencentes a

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ela. Mais especificamente, quais critérios, parâmetros e informações devem ser considerados para identi-ficar, mapear e quantificar a dimensão desse estrato social em um determinado país.

Se fosse conceituada a classe média apenas pe-los níveis de renda, segundo a Ordem dos Economistas de São Paulo, seriam de classe média aquelas pessoas que ganham entre 6 e 33 salários mínimos, uma faixa ampla demais, na qual operários também podem se encaixar (QUADROS, 1996).

Buscando uma conceituação mais precisa e não tão abrangente, Quadros (1996) apresenta a seguin-te proposta metodológica: “Meu esforço de pesquisa tem sido integrar ao nível de renda as ocupações con-sideradas de classe média.” A sua opção metodológi-ca é inspirada em trabalhos de natureza sociológimetodológi-ca, desenvolvidos por Wright Mills (1969), sociólogo clássico que realizou estudo ocupacional nos Estados Unidos. Para Quadros (1996), em termos esquemá-ticos, existem o proprietário da empresa (burguesia) e os operários (a massa trabalhadora braçal). Seriam de classe média todas as demais ocupações de uma empresa, do office-boy ao diretor, igualmente assala-riadas. Essa seria definida como a classe média assa-lariada, ou seja, não-proprietária.

Usando o critério de renda total familiar, Quadros (1996) define cinco níveis de renda para essa população, a preços de janeiro de 2004, tendo como fonte dos dados a Pesquisa Nacional por amostra de Domicílios (Pnad) e o IBGE, quais sejam: a alta clas-se média com renda familiar acima de R$ 5.000,00 por mês; a média classe média, com renda familiar de R$ 2.500,00 a R$ 5.000,00 por mês; a baixa clas-se média, com renda familiar de R$ 1.000,00 a R$ 2.500,00 por mês. Para Quadros (2005), rigorosamen-te, esses níveis significam uma “Proxy” dos padrões de vida da classe média e complementa que, no que chama de camadas inferiores, estariam outras duas classes: a massa trabalhadora, com renda familiar de R$ 500,00 a R$ 1.000,00 por mês; os trabalhadores precários ou miseráveis, com renda familiar de menos de R$ 500,00.

No presente estudo, tendo em vista a natureza dos dados da base utilizada, serão consideradas as

seguintes divisões por camadas sociais e faixas de rendimento, definindo-se pelo critério de renda indi-vidual os trabalhadores inseridos no mercado formal de trabalho, aqui entendidos como aquele onde preva-lecem relações de trabalho assalariadas.

Usando-se cinco níveis de renda para esses indivíduos, são definidos como: alta classe média, aqueles indivíduos que ganham acima de 15,01 sa-lários mínimos; média classe média, aqueles indiví-duos que ganham entre 7,01 e 15 salários mínimos; baixa classe média, aqueles indivíduos que ganham entre 3,01 e 7 salários mínimos; massa trabalhadora, aqueles indivíduos que ganham entre 1,51 e 3 salários mínimos; trabalhadores precários, aqueles indivíduos que ganham menos de 1,5 salário mínimo.

3 ORIGEM DA CLASSE MÉDIA E

PERSPECTIVAS ATUAIS

Especificamente no que diz respeito à classe média paulistana, com certeza a mais numerosa no país, sua origem está relacionada à colonização ale-mã: Segundo Brinkmann (2004, p. 18):

A principal herança que [os alemães] deixaram, a meu ver, foi constituir o primeiro núcleo para uma classe média paulistana. Ou seja, devido ao comér-cio por eles praticado, criaram uma cer-ta infra estrutura que se mostrou impor-tantíssima a partir do momento em que chega a grande massa de imigrantes, com as ferrovias, com a chegada dos italianos.

Quadros (1996) destaca a importância da classe média no processo de ascensão social, o qual sempre dependeu do nível de crescimento e desenvolvimento da sociedade e destaca o importante papel desempe-nhado pela classe média nesse processo:

Havendo desenvolvimento econômico, crescimento, tem ascensão social. A as-censão social ela se materializa na clas-se média. O que clas-seria o ideal? Um país que só tivesse classe média, que não ti-vesse massa trabalhadora e pobres. Nós

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poderíamos ter uma sociedade com três camadas: alta, média e baixa classe mé-dia.

De 1930 ao início dos anos 80 foi o período no qual foi constituída e consolidada a chamada classe média urbana não-proprietária. Já havia um movimento muito pequeno, na sociedade agrária, mas era uma classe média geralmente proprietária. Especificamente no caso brasileiro, durante o proces-so de industrialização dos anos 30 a 80, a classe mé-dia brasileira foi formada por um grande número de pessoas que saiu do campo para trabalhar nas fábricas dos grandes centros. Milhões de trabalhadores entra-ram na modernidade sem qualquer estudo. Passa-se a ter, como fruto da socialização e urbanização, uma classe média vinculada basicamente à urbanização, não-proprietária (POCHMANN, 2006a).

Para Pochmann (2006b):

A classe média no Brasil foi um produto do projeto de industrialização nacional dos anos 1930-1980 em que tivemos uma expansão importante de empregos seja na grande indústria privada, seja no próprio setor público. E esses dois setores – in-dustrial e público, foram fortemente afe-tados com o que ocorreu a partir de 1990. Em primeiro lugar, a abertura comercial, produtiva, tecnológica e financeira, levou a um acirramento da competição no setor privado, cuja conseqüência principal foi a terceirização e a redução de empregos à classe média. No setor público, tivemos um esvaziamento do papel do Estado. E isso trouxe como conseqüência não ape-nas a redução do nível de renda do setor público de um modo geral, mas também a queda relativa na quantidade de pesso-as nele ocupadpesso-as. Por exemplo: Em 1980 tínhamos em torno de 12% do total da ocupação brasileira absorvidos pelo se-tor público; em 2003 o sese-tor público re-presenta não mais que 8%.

Segundo Merlino (2006), a classe média, que viveu seu apogeu no período da ditadura militar – em especial durante o chamado milagre econômico –, passou por um empobrecimento nas duas últimas décadas. Destaque para dois processos nesse período:

os baixos índices de crescimento econômico desde o início dos anos 80 e as reformas neoliberais realizadas durante os anos 1990 por meio da abertura comercial e produtiva no Brasil. Combinadas, essas políticas impuseram juros altos, forçaram a diminuição do Estado, reduziram a população assalariada e empo-breceram a classe média. Para Pochmann (2006a):

[...] o que estamos observando de 1980 para cá é uma redução significativa da classe média não proprietária. Para al-guns estudiosos, a polarização entre ri-cos e pobres tem impulsionado a violên-cia justamente pelo fato de que locali-dades em que há essa presença tão forte de ricos com pobres, a violência termina sendo resultado desta situação de maior polarização social.

De 1980 a 2000, sete milhões de pessoas perde-ram seus empregos. Sem conseguir voltar ao mercado de trabalho, deixaram de fazer parte da classe média. Nos anos 90, muitas empresas fecharam ou diminu-íram o número de funcionários. A reestruturação do mercado de trabalho aconteceu sobretudo em cargos ocupados pela classe média. Pessoas que foram de-mitidas ganhando de R$ 4 mil a R$ 5 mil por mês tiveram que aceitar empregos por salários de 1,5 mil. A precarização do trabalho chegou às classe médias. Houve uma piora na distribuição de renda no Brasil, nos últimos 20 anos. A classe média empobreceu, e o capital especulativo enriqueceu. Estima-se que, se essa proporção de queda for mantida, em 2006, a porcentagem de participação da classe média na eco-nomia brasileira será de 22,1%, bem menos que os 31,7% da década de 1980. (POCHMANN; PEREIRA; BARBOSA, 2006).

Segundo Quadros (1996), a classe média atin-giu seu tamanho máximo no começo dos anos 80. A partir disso, com a queda do ritmo de crescimento da economia, parou de crescer e até recuou um pouco. Segundo Quadros (1996 apud FUTEMA, 2004):

A classe média encolheu no período entre 1981 e 2002. Nesse período, a participação da classe média – com renda à partir de R$ 2.500,00 - na

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po-pulação passou de 13,5% para 11,7%. A queda foi mais forte para pessoas com renda entre R$ 2.500,00 e R$ 5.000,00, cuja participação na popula-ção decresceu de 9,13% em 1981 para 7,57% em 2002.

Para Quadros (1996 apud WU, 2004), a classe média brasileira está encolhendo cada vez mais e de forma acelerada. Esse fenômeno, por ter implicações profundas no tecido social, exigirá atuação rápida e eficiente por parte da sociedade:

Esse rebaixamento da classe média não deve ser encarado apenas como uma perda temporária do padrão de consu-mo. Esse empobrecimento do poder aquisitivo deve ser analisado de forma mais ampla para que se implementem políticas públicas capazes de aumentar a capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria da qualidade de vida, para que o fosso da desigualdade não aumente ainda mais e não seja gera-dor de instabilidade social.

Segundo Pochmann (2006c), as transformações por que passaram a sociedade brasileira nos últimos anos comprometeram as características dos estratos sociais:

Houve um desaburguesamento da classe média brasileira, em relação ao padrão de vida, financiamento, crédito e con-sumo durante o auge dos anos 1970 e 1980. Isto está diretamente associado à alterações na estrutura sócio-ocupa-cional da classe média. Com relação à classe operária, que depende fundamen-talmente de sua força de trabalho física e mental para financiar sua sobrevivência, há sinais de desproletarização. Perce-bemos, hoje, no Brasil, cerca de quatro milhões de famílias sem remuneração. A cidade de São Paulo, de acordo com o censo demográfico de 2000, tinha 350 mil famílias sem renda. Isso caracteriza um processo de desproletarização. São dois sinais que mostram uma crescente heterogeneidade no interior das classes, com impactos importantes na organiza-ção do trabalho e na representaorganiza-ção em sindicatos e partidos políticos.

Nas duas últimas décadas, não apenas a clas-se média encolheu, mas também ela vem enfrentan-do sérias dificuldades para se manter e reproduzir a ascensão social entre suas gerações, haja vista que o contexto favorável que existia no Brasil quando do seu surgimento e apogeu não existe mais. O capita-lismo brasileiro, pelo menos até o final dos anos 70 e início dos anos 80, tinha um charme que era chamado mobilidade social1. A mobilidade social permitiu, de

certa maneira, que, apesar do êxito do modelo eco-nômico, se convivesse com uma tragédia de conflito social (POCHMANN, 1999). Quadros (1996, p. 180) já afirmava que:

Nos anos 80 esta situação se altera dras-ticamente, encerrando-se a criação es-trutural e em massa de novas oportuni-dades. Passa a vigorar apenas a chamada “mobilidade circular”, em que para al-gum ingressar no circuito outro deve ser deslocado.2 (PASTORE; ARCHIBALD,

1993).

4 CLASSE MÉDIA: PADRÃO DE CONSUMO,

COMPORTAMENTO E CARACTERÍSTICAS

A classe média chama a atenção pelo seu padrão de consumo e pelo comportamento que ela provoca na economia e na sociedade. A classe média gosta de comprar e tem peso econômico. São consumidores que apreciam novidades, mas os sonhos de consumo têm limites:

Quando a classe média antevê um perí-odo positivo, ela antecipa as compras, utilizando principalmente o crédito. Mas, quando o vento muda e ela percebe o risco de que as coisas possam tumul-tuar-se, ela é a primeira a puxar o freio, por que ela é profundamente dependente do dia-a-dia. Os movimentos da classe média são acompanhados de perto pelos especialistas em mercado consumidor não só pelo poder de compra, mas tam-bém por uma qualidade peculiar: como é formada por profissionais que dominam áreas importantes da sociedade moder-na, como educação, saúde,

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comunica-ção, ela é uma classe influente. A classe média tem a propriedade de ser inspira-dora das classes mais baixas. A marca que ela usa, a loja que ela freqüenta, seus hábitos, suas atitudes acabam sen-do referência para as classes mais bai-xas. (RETRATO..., 2005, p. 13). Contudo, o poder de influência que a classe mé-dia exerce não se restringe apenas ao aspecto econô-mico e mercadológico. Talvez muito mais importante seja seu papel de “caixa de ressonância” da socieda-de, principalmente quando ela é usada, com (ou sem) consciência, pelas elites dirigentes, ao replicar, no dia-a-dia dos negócios, a propaganda, ventilada sob encomenda, nos meios de comunicação.

Essa influência foi percebida de maneira muito inteligente e brilhantemente destacada no trabalho ar-tístico/musical de Gonzaga (2006), ao cantar:

Sou classe média

Papagaio de todo telejornal Eu acredito

Na imparcialidade da revista semanal. A classe média também apresenta algumas ca-racterísticas básicas, quais sejam: o investimento em educação e o conforto do automóvel, mesmo que a defesa dessas características implique constantes apertos no orçamento doméstico e obrigue a classe média a ser um dos principais clientes da “banca” na-cional:

A classe média remediada dependen-te da agiotagem oficial, (empréstimos, cheque especial, cartão de crédito, etc.), aperta o cinto para manter os filhos nas escolas pagas – até por que indica status. Mesmo os mais recalcitrantes, embora dilacerados em suas incertezas, rendem-se às evidências e exigências da lógica concorrencial. (SILVA, 2003).

Ou então, conforme complementa Gonzaga (2006):

Sou classe média

compro roupa e gasolina no cartão Odeio “coletivos”3 e

vou de carro que comprei a prestação. Só pago impostos,

Estou sempre no limite do meu cheque especial

Eu viajo pouco, no máximo um Pacote CVC trianual.

Outro aspecto importante que tem afetado o pa-drão de consumo, o comportamento, a reação e as es-tratégias de sobrevivência da classe média, no Brasil, diz respeito aos impostos sobre a classe média:

O aumento de impostos, a carga de im-postos, é muito grande4 e o achatamento

dos salários faz com que a classe média venha pouco a pouco caindo, diminuin-do por que está realmente difícil se man-ter dentro do mesmo patamar que vinha sendo conquistado. [...] Além de impos-to de renda, a classe média paga muiimpos-to imposto indireto, embutido nos preços dos bens de consumo e nas tarifas de serviços públicos. De uma certa forma, a classe média é vítima de um estilo de vida que pressupõe o consumo de bens altamente taxados: automóvel, com-bustível, telefone. (OS IMPOSTOS..., 2005c).

Merlino (2006) destaca que o impacto do neoli-beralismo no bolso da classe média também acontece pela precarização da atuação do Estado na área social. Com a diminuição do Estado e o sucateamento dos serviços públicos, a classe média arca duas vezes com os mesmos serviços. Paga impostos, mas, como sabe que o serviço público é ruim, acaba gastando com serviços públicos. Apesar de ser a grande pagadora de impostos que alimentam a máquina do governo, a classe média quase não usufrui dos serviços prestados pelo Estado. Seus filhos estudam em escolas particula-res, cursos particulares de línguas, possuem planos de saúde e seguro particulares etc., se bem que, no caso da saúde, algumas famílias, diante da nova e nefasta realidade econômica, estão “revendo seus conceitos”.

Quase 4 milhões de brasileiros perde-ram a proteção de planos de saúde nos últimos quatro anos, segundo dados da PNAD. A onda de reestruturação de em-presas e enxugamento de quadros que

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varreu o país nos últimos anos expulsou os usuários desses planos, grande parte deles oriunda da classe média. [...] A re-dução do número de planos individuais é um sintoma de que a classe média pas-sou a cortar também esse tipo de gas-to. [...] Os preços cada vez mais altos das mensalidades dos planos de saúde, aliados à pauperização da classe média, também explicam a redução do número de usuários destes planos. (FOLHA DE SÃO PAULO, 2003, p. 18).

Outro fator importante para uma alteração no perfil do consumo da classe média, principalmente no período entre 1994 e 1996, diz respeito ao comporta-mento dos preços dos serviços. Segundo Pochmann (1999):

Quem perdeu foi a classe média porque os serviços tiveram seus preços sempre reajustados. E a classe média, basica-mente, consome serviços: empregada doméstica, manicure, oficina mecânica, escola privada, aluguel, etc. Isso tudo subiu bastante entre 94 e 96, depois até se estabilizou um pouco.

5 CLASSE MÉDIA: COMPORTAMENTO

POLÍTICO E RELAÇÕES COM A MÍDIA

O comportamento político, as posições ideo-lógicas e as (re)ações da classe média no Brasil são determinados, em parte, primeiramente, pela situa-ção conjuntural e pelas perspectivas estruturais pelas quais a classe média estiver passando. Segundo, pela eficiência ou não da mídia de orientar o comporta-mento da classe média para que ela vá ao encontro e “comungue” com os mesmos interesses de classe das chamadas classes dirigentes.

As opiniões de alguns analistas divergem bas-tante sobre esse tema, não apenas em relação ao po-sicionamento, mas também quanto às perspectivas de comportamento futuro da classe média no Brasil.

Só que no Brasil ninguém defende a classe média, muito menos seus valores e sua postura política. Os ricos,

natu-ralmente de direita, são conservadores, querem manter o status quo. A classe média não é de direita nem de esquerda. É de centro e liberal. São os profissio-nais liberais, por excelência, que acre-ditam na autonomia, na responsabilida-de pessoal e social, na poupança para a velhice, nos valores sobre herança. Mas o liberalismo é a ideologia mais atacada no Brasil, pela direita e pela esquerda. A direita vê na classe média uma ameaça, a esquerda vê nela a burguesia a ser des-truída. (KANITZ, 2005, p. 14).

Já Quadros (1996, p. 182-183) destaca que o conservadorismo da classe média é algo tradicional e bastante conhecido:

Contudo, o agravamento da elitização acabou afetando importantes segmen-tos da média e alta classe média que nos anos 70 perfilaram no campo progres-sista de resistência à ditadura e combate às injustiças sociais. Acreditamos que é este mesmo fenômeno que explica a parcela substantiva da base social dos setores progressistas-elitistas que, em aliança orgânica com as forças mais conservadoras da sociedade brasileira, viabilizaram eleitoralmente e deram operacionalidade à estratégia neolibe-ral de enfrentamento da crise nacional. Em última instância, é o elitismo que os une, em oposição a propostas mais sin-tonizadas com os interesses nacionais e populares.

Conforme destacado anteriormente, em um pri-meiro momento, é a situação material da classe média que vai orientar seu comportamento político. Merlino (2006) destaca que:

A pauperização da classe média, histo-ricamente conhecida como conserva-dora, poderia indicar uma aproximação com as classes trabalhadoras. Será? Poderíamos, sim, esperar que a classe média se politizasse, mas aconteceu o contrário, está mais conservadora. Os números explicam: em 1980, 64,6% da classe média era assalariada em re-lação à Popure-lação Economicamente Ativa (PEA). Esse percentual caiu pra 55,8% em 2000. No mesmo período,

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aumentou a participação da classe mé-dia proprietária sobre a PEA urbana, de 35,4% para 44,2%. Quando a classe média é assalariada, fica mais próxima dos trabalhadores, como era na década de 80. A partir do momento que se torna proprietária, fica mais individualista e conservadora.

Esse posicionamento é claro e foi captado bri-lhantemente por Gonzaga (2006), ao afirmar que:

Mas eu “tô nem aí”

Se o traficante é quem manda na favela Eu não “tô nem aqui”

Se morre gente ou tem enchente em Ita-quera

Eu quero é que se exploda a periferia toda

Mas fico indignado com o Estado Quando sou incomodado

Pelo pedinte esfomeado Que me estende a mão.

Apesar da gravidade da situação atual e do des-perdício de certas oportunidades, Pochmann (2006c, p. 114) ainda acredita na possibilidade da construção de alianças positivas da classe média com os demais segmentos da sociedade.

A resistência não é forjada simplesmen-te porque aqueles que estão submetidos à opressão tendem a se conscientizar, mas também pelas próprias contradi-ções geradas pelo desenvolvimento capitalista. Inclusive acredito que a forma de desestruturação da sociedade está constituindo uma oportunidade de resistência em melhores condições das que tivemos no passado recente. Com o desaburguesamento da classe média, temos pela primeira vez a possibilidade da união do que seriam a classe operá-ria e a classe média. A classe média no Brasil nunca constituiu uma aliança com os trabalhadores. A eleição do presiden-te Lula em 2002 foi uma oportunidade, porque parte importante da classe média direcionou seu voto para o PT em fun-ção da avassaladora crise que vive em termos de reprodução social. A oportu-nidade não foi aproveitada, mas isso não significa que novas alianças não possam ser construídas.

Conforme destacado anteriormente, o compor-tamento político, as posições ideológicas e as (re) ações da classe média no Brasil também irão depen-der da eficiência ou não da mídia de orientar o com-portamento da classe média. Isso reapareceu e pode ser observado durante a última campanha presiden-cial, conforme destacado por Nassif (apud CINTRA; LOBREGATTE, 2006, p. 25), ao destacar que a onda anti-Lula e anti-PT ficou cada vez mais forte na gran-de mídia, dado que:

No começo do ano passado, alguns co-lunistas não oriundos da imprensa pro-priamente dita – intelectuais e pessoas do showbiz, basicamente o (Arnaldo) Jabor e o Jô (Soares), começaram uma crítica pesada ao Lula e ao PT. Essa crí-tica, num determinado momento, resva-lou para uma posição de intolerância e teve eco na classe média. [...] Quando fi-cou claro que o Lula não ia cair começa-ram a falar. “Ah, mas o eleitor do Lula é nordestino, é analfabeto”. E quem ficou com eles (os jornais)? Uma classe média muito paulistana, preconceituosa e ana-crônica – porque quem é minimamente sofisticado não entra nesse jogo. A classe média, envolta de uma crise econômi-ca, crise de valores, desiludida politicamente e des-cendo em queda livre, está “desamparada” politica-mente.

IR, IPTU, IPVA, ISS, ICMS, o econo-mista Marcos Cintra diz que essa grande quantidade de impostos só é empurrada para a classe média porque ela não tem ninguém que a defenda. “Ela não tem força como os ricos para imporem uma política econômica ao governo e, ao mesmo tempo, não tem a força política para serem objeto de políticas públicas que lhe favoreçam. Ensanduichada nes-se meio fica a clasnes-se média. Destituída, empobrecida e sempre alvo de todas as tentativas de arrecadação tributária no Brasil. (OS IMPOSTOS..., 2005c, p. 14).

Esse estado das artes tem imposto pesados ônus à classe média, no sentido de desenvolver estratégias

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de sobrevivência (velhas e novas), as quais não estão mais produzindo os resultados esperados.

A socióloga Maria da Glória Bonelhi lembra que a classe média não tem au-mentado e chegou a encolher. Mas ela diz que isso não impede a ascensão social, só torna as coisas mais difíceis. “Hoje você tem um padrão de ascensão que pressupõe que alguém cai para você subir. E aí é que está gerando essas rea-ções de mais insegurança, na sensação de fraqueza de uma classe média, por-que pode ser por-que ela não garanta o lu-gar para o seu filho. Daí que a educação ganha uma relevância muito maior”. O ensino superior é a principal ferramenta da classe média subir socialmente ou, pelo menos, para não descer. Por isso houve uma explosão de faculdades no Brasil. Estima-se que o desemprego en-tre jovens atinja 40% da PEA na faixa de 15 a 24 anos de idade, sendo que parce-la significativa se refere aos formandos que não conseguem a primeira ocupa-ção. [...] a causa da crise social no Bra-sil não é tanto a concentração de renda, mas a desigualdade. Eu acho que mais até que a concentração e desigualdade, o que causa tudo isso é a falta de perspec-tiva. É uma crise continuada, que está aí há muito tempo e, quando o jovem olha para a frente, não vê saída. (QUA-DROS, 1996 apud SUGIMOTO, 2004; OS DESAFIOS..., 2005b, p. 19). Investimentos em educação são a condição ne-cessária, mas não suficiente para garantir a sobrevi-vência da classe média. Na busca por garantir duas características que a classe média valoriza – formação profissional e qualidade de vida –, os recursos da clas-se média empobrecida podem não clas-ser suficientes e, diante da falta de perspectivas vislumbradas por seus filhos, novos problemas começam a aflorar.

Uma pesquisa feita pela Fundação do Bem-estar do Menor (Febem) de São Paulo mostra que o número de jovens da classe média já representa um terço dos internos. Acusados de roubos a carro, assaltos, tráfico de drogas e homicídios, esses jovens fogem do perfil interno da instituição. Dos 6 mil internos, 28%,

quase 1500, vieram da classe média e 3% são procedentes de famílias ricas. Há uma crise de valores. Esses exem-plos mostram o tipo de individualismo que se desenvolveu no Brasil, no capi-talismo contemporâneo. Está ligado ao tipo de visão de mundo absolutamente materialista. Recente reportagem de uma das revistas mais lidas do país explorou em maiores detalhes o que a televisão já havia anunciado a não muito tempo. Nas grandes cidades, muitas meninas de classe média, que moram com os pais e tiveram uma vida abastada e boa instru-ção procuram a prostituiinstru-ção como meio de vida. [...] Motivo da decisão e da es-colha? Dinheiro e nada mais! (O GLO-BO, 2006, p. 29; VELHO, 2000, p. 34; BINGEMER, 2006).

6 CLASSE MÉDIA: MODO DE VIDA E

RELAÇÕES COM A MÍDIA

Os relatos tragicômicos supracitados refletem uma dificuldade maior ainda para esse segmento da sociedade denominado classe média: a dificuldade extrema de manter e reproduzir o seu modo de vida; que lhe é específico, caro e causador até de “dramas existenciais”. Ao discorrer sobre o modo de vida da classe média, Trompczynski (2005, p. 32) destaca:

Trabalham, diria Cony, como mouros. Nunca falam sobre dinheiro, não é de “bom tom”. Adquirem bens às custa de algo que chamam prestações, mas parece-me que nem parece-mesmo sob tortura confes-sariam tal vergonha: é preciso manter a imagem. Viajam nas férias, sempre. Tra-balham para viajar nas férias. Não viajar nas férias é uma espécie de humilhação social impossível de ser aceita. Quase comparável a não possuir carro ou não ter lido o último livro do Diogo Mainardi. Essa novela da vida privada da classe média foi muito bem descrita pela dramaturgia brasileira, du-rante a exibição de “Laços de Família”.

Enfim, o drama não é a leucemia. Mas a classe média precisa manter as

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aparên-cias, e não pode se rebaixar ao nível da “gentalha” no mundo neoliberal. Ganha pouco, é oprimida, mas protestar é ates-tado de pobreza, coisa feia, de “terceiro mundo”. Tornar públicas as dificuldades é sinônimo de fracasso. O caminho mos-trado é, então, o da prostituição. (CLAS-SE..., 2005, p. 45).

Tendo em vista a crise de reprodução pela qual passa a classe média, levando-se em consideração o seu papel de “formadora de opinião”, um fato preo-cupante é a maneira como essa classe média “bem-in-formada” é “orientada” pela mídia a respeito de como a classe média deve pensar. Conforme destacado por Florêncio (2004, grifo nosso):

A Veja é a fonte de informação e conhe-cimento dessa massa acéfala que é a nos-sa classe média, a TV a cabo, o refúgio dela, que não suporta a TV brasileira e se entretém com seriados da Sony, do-cumentários da BBC, noticiários da Fox News e da CNN International. A clas-se média, que tem fobia do Brasil, não acredita que isso vá pra frente. E que, enquanto assistem ao último episódio de Friends, escutam New York, New York em seus CDs players e assistem a mais um blockbuster norte-americano no ci-nema, sonham com o dia em que pode-rão picar a mula daqui, rumo à terra do Tio Sam (ou a qualquer outro país desen-volvido). E aí que o tal Diogo Mainardi acertou em cheio seu público. Com sua linguagem acessível e ar intelectual, ele vem ao encontro desse público, “ávido por conhecimento e cultura”, para dizer tudo o que eles já sabiam, “o Brasil não tem jeito”, “não há mais solução para o país a não ser se render à poderosa po-tência do Tio Sam”, “ nada que fazemos aqui dá certo”, “tudo o que fizemos e deu certo foi sorte”, entremeado por uma ou outra sugestão irônica de como o gover-no deveria conduzir as rédeas do país. E, assim, toda essa gente que não se identi-fica e não se sente responsável pelo pró-prio país, porque tem seus olhos virados para a América, a cada semana lê com ar de deboche as opiniões desse cara, que apenas avaliza esse sentimento de des-prezo com o Brasil. O Brasil é a maior

piada de mau gosto que eu já vi. Pri-meira oportunidade, eu pico a mula.

Em termos de comportamento, até mesmo por questão de sobrevivência5, segundo Fontenelle

(2006):

A classe média brasileira tem que parar de ter vergonha de assumir seus valores, seus objetivos e proclamar, orgulhosa, aos qua-tro ventos, seu direito de existir, passando a valorizar e a exercer os poderes que de fato tem. No limite entre ascensão e que-da, se não se mobilizar – agora – cami-nhará inexoravelmente para a extinção. O fato preocupante é que a crise que atinge a todos os segmentos sociais, em maior ou menor inten-sidade e profundidade, ao invés de começar a produ-zir uma reação social, está desencadeando, há tempo, comportamento e estratégias individuais, em detri-mento daquelas orientadas para o esforço coletivo.

Uma coisa é certa: não existem mais anjinhos inocentes no paraíso social. É cada um por si e a quem couber mais perspicácia e inteligência será dada a chance de concorrer a vitória. Ou a clas-se média sai do ostracismo ou desapa-recerá do mapa social brasileiro. (FON-TENELLE, 2006, p. 23).

E nessa luta, de nada adianta e não se pode espe-rar muita coisa da mídia em geral, que demonstrou, em várias ocasiões, com que segmento da pirâmide social ela está explicitamente envolvida, o que justifica, na grande maioria dos casos, seu comportamento extrema-mente preconceituoso. Segundo Costa (2006, p. 56):

Não se justifica, porém, o fato de a im-prensa continuar tratando a chamada base da pirâmide social como uma fatia apartada da sociedade, quase um peso a ser arrastado. [...] Quando olha para baixo, onde sobrevivem 123 milhões de cidadãos, vaza um distanciamento quase hostil. [...] A chamada grande imprensa do Rio, São Paulo e Rio Grande do Sul, para sermos mais precisos, conversa diretamente com a classe média e tenta manter com ela uma relação de cumpli-cidade, que pode estar na origem desse viés quase sutil que denuncia certo des-prezo pela maioria que se acotovela na base da pirâmide social.

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Ao que Pochmann (1999, p. 33) complementa: E lá estão, por exemplo, o Joelmir Bet-ting, a Lílian Wite Fibe e muitos outros. Só que essa gente não tem nada a ver com o trabalhador [ou com a classe média]. São pessoas que ganham algo como 50, 100 mil reais por mês e são mais identifi-cadas com os interesses dos dominantes do que com dos dominados.

7 CONCLUSÃO

Tendo em vista a opção metodológica adotada no presente estudo e o objetivo traçado, cabe agora indagar: a quantas anda a classe média assalariada

no Brasil? As mudanças ocorridas na economia e na sociedade brasileiras, a partir dos anos 90, afetaram de maneira diferenciada os três segmentos da classe média brasileira.

Conforme ilustrado na Tabela 1, no início dos anos 90, em especial de 1990 a 1992, independente de qual segmento se olhe, havia clara tendência de crescimento na participação relativa da classe média assalariada no mercado formal de trabalho brasileiro. Para todos os es-tratos da classe média, houve uma interrupção abrupta dessa tendência, especificamente no ano de 1993. Essa interrupção abrupta pode ter sido causada pelo fraco de-sempenho da economia no início da década de 1990, marcada por um período recessivo (90 e 92) e medíocre taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Tabela 1: Participação relativa da classe média assalariada no mercado formal de trabalho brasileiro (1990 a 2006)

Segmento 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Baixa classe média 27,1 31,4 33,8 25,3 28,7 27,6 28,2 29,6 28,6

Média classe média 8,1 9,5 10,8 7,8 10,6 7,8 8,0 7,8 7,5

Alta classe média 4,5 3,4 4,9 3,2 6,5 4,4 3,7 4,0 3,6

Total 100 100 100 100 100 100 100 100 100

Segmento 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Baixa classe média 27,0 26,3 21,9 21,2 21,1 20,8 19,2 20,1

Média classe média 7,2 6,8 6,2 6,2 5,7 5,7 4,9 6,90

Alta classe média 3,4 3,1 3,8 2,1 1,9 1,6 1,6 3,10

Total 100 100 100 100 100 100 100 100

Fonte: Relação Anual de Informações Sociais.

A partir de 1994, com a implantação do Plano Real, parece que é possível perceber um movimento nitidamente estrutural em relação à participação relati-va da classe média no mercado formal de trabalho nos seus três segmentos, qual seja: um movimento de que-da livre e desenfreaque-da. Conforme ilustrado na Tabela 1, exceto a classe média baixa, que “esboça uma rea-ção”, nos quatro primeiros anos do Plano Real, (1994 a 1997), a partir daí todos os segmentos da classe média apresentam diminuição na sua participação relativa no mercado de trabalho formal brasileiro. Isso vem a con-firmar o fato de que, conforme destacado anteriormen-te, as mudanças estruturais que marcaram os anos 90 atingiram em cheio os empregos da classe média.

No período de 1990 a 2006, a baixa classe mé-dia sofreu uma redução da sua participação relativa no mercado formal de trabalho da ordem de - 8,1 pontos percentuais. A média classe média - 7,9 pontos per-centuais. A alta classe média - 4,4 pontos perper-centuais. Especificamente no período Pós-plano Real, o segmen-to que mais perdeu, em termos de participação relativa no mercado formal de trabalho, foi o da baixa classe média, com redução de - 8,2 pontos percentuais.

Conforme ilustrado na Tabela 2, em termos de composição da classe média, ou seja, em termos da participação de cada um dos seus segmentos dentro da classe média, observa-se que a classe média alta, menos numerosa, teve uma redução na sua

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participa-ção relativa dentro da classe média da ordem de - 4,3

pontos percentuais. Em termos absolutos, durante o período analisado, isso significa que quase meio mi-lhão de pessoas (635.759) desceu um degrau social. Tabela 2: Participação relativa da classe média assalariada segundo o segmento (1990 a 2006)

Segmento 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Baixa classe média 55,8 57,8 55,7 59,2 54,2 57,5 59,1 59,9 60,4

Média classe média 29,4 26,8 28,2 26,0 28,3 27,00 26,5 25,9 25,9

Alta classe média 14,8 15,4 16,1 14,8 17,5 15,5 14,4 14,2 13,7

Segmento 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Baixa classe média 61,3 62,2 63,5 63,8 66,0 65,7 66,4 66,8

Média classe média 25,7 25,0 24,5 24,4 22,8 23,0 23,0 22,8

Alta classe média 13,0 12,8 12,0 11,8 11,2 11,4 10,6 10,4

Fonte: Relação Anual de Informações Sociais.

Para a média classe média, que representava quase 1/3 da classe média assalariada, o impacto foi bem maior, tanto em termos relativos quanto em ter-mos absolutos. A média classe média, em 2006, não chega a representar nem mais ¼ (22,8%) da classe média brasileira. Em termos relativos, esse segmento sofreu uma redução da ordem de - 6,6 pontos percen-tuais. Em termos absolutos, essa redução chegou a mais de um milhão de pessoas (1.028.308) que tam-bém desceu a escada social.

Possivelmente, boa parte passou a “engrossar” as fileiras da baixa classe média, que foi a única a aumentar sua participação relativa (11 pontos percen-tuais) dentro do segmento da classe média. Em 1990, a baixa classe média representava pouco mais da me-tade (55,8%) da classe média assalariada. Em 2006,

ela já representava, praticamente, 2/3 (66,3%) de toda classe média assalariada. Em termos absolutos, mais de 500 mil pessoas “ascenderam” à classe média bai-xa ou decaíram dos estratos superiores, provavelmen-te da média classe média.

Os dados indicam que, mesmo não estando “em vias de extinção”, percebe-se claramente uma mudança estrutural na sua composição, com aumento significati-vo da classe média baixa, possivelmente causado pela decadência dos segmentos de média e alta classe média e aumento da participação do segmento da baixa classe média, que podem estar recebendo esses trabalhadores com os “emergentes” da massa trabalhadora. Estudos posteriores poderiam aprofundar ainda mais a presente análise, de natureza exploratória, visando entender me-lhor a situação da classe média assalariada no Brasil. How is the employee Mead Class in Brazil?

Abstract

There ar, in present moment, in Brazil, a disput, no ostentatin by midia and, at once, have knowledge of general people, about the circunstance and perspectives of people group denominete Mean Class. The objective in this present article will be to investigate since years 90, in specialty, after of Plano Real, how are the proportion of employee Mean Class in formal labor market and the perspectives indicate by RAIS – Report Year of Social Information, principaly in decorrency of strutural changes observed in 90´ decade. Is posible to afirmate what the Mens Class, in last times, will go to extinction?

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Notas explicativas

1 “Essa mobilidade era, justamente, a possibilidade de que, a cada geração, os filhos se apresentassem em situação melhor que a

dos seus pais. O filho do pobre ficava menos pobre que o pai, o filho do rico ficava mais rico que o pai. Havia uma desigualdade muito grande, mas, de certa maneira, todos se moviam, em maior ou menor grau. Mais do que isso, o Brasil vivenciou uma experiência que não pode ser comparada a dos países desenvolvidos que se industrializaram. Na Europa, quando houve a indus-trialização, foi uma luta tirar as pessoas do campo para que fossem para a cidade servir de mão-de-obra à indústria. A situação de vida e as condições de trabalho no campo eram melhores do que as do trabalho industrial. O Brasil viveu uma situação inversa, porque acumulamos quase quatro séculos de experiência patriarcal, em que as condições de vida e de trabalho no campo eram e são muito ruins. Então, a possibilidade de ir para a cidade, sobretudo quando se desenvolve um projeto de industrialização nacional, lá pelos anos 30, foi uma mobilidade. A migração nordestina também fez parte dessa mobilidade, a partir dos anos 80; no entanto, começamos a viver uma situação de estagnação econômica. Já tivemos, uma primeira década perdida, que foi a de 1980, e estamos vivendo nos anos 90, um segundo quadro de estagnação econômica, porém com forte desemprego. O Brasil vem apresentando, nessas últimas décadas, sinais de decadência. Apesar de não termos ainda alcançado o ápice da maturação numa sociedade plenamente desenvolvida, já apresentamos sinais de decadência.” (POCHMANN, 1999, p. 25).

2 “A crise atual atinge em cheio a classe média. A classe média está formando seus filhos em universidades, está tendo gastos

adicionais para fazer cursos de inglês, está colocando o filho para fazer um estágio em outro país que, no retorno, enfrenta o problema da falta de emprego. Não temos, portanto, a mobilidade social ascensional que tínhamos até os anos 80; pára a música, há mais pessoas que cadeiras para sentar. Quando alguém consegue emprego, significa, quase que automaticamente, que outra perdeu o emprego. Resta à classe média juntar-se aos demais que já estão tradicionalmente perdendo e reagir diante dessa situ-ação. Caso contrário, vai ficar isolada, assistindo à sua degradação enquanto ascendência social.” (POCHMANN, 1999, p. 45).

3 “No ano passado, segundo reportagem na Folhateen – caderno semanal da Folha de São Paulo – a respeito de jovens da classe

média, entre 14 e 18 anos, que nunca usaram ônibus em São Paulo. O repórter acompanhou alguns deles nessa primeira aven-tura e colheu o depoimento a respeito das impressões do uso do transporte coletivo. Uma garota de 14 anos considerou o banco de passageiros nojento e quente; outra, com 18 anos, disse ficar enjoada com o balanço do veículo e com o cheiro de suor dos passageiros. Um jovem de 18 disse que nunca andara antes de ônibus porque “não precisa”. As diferenças sociais, econômicas e culturais, por exemplo, estão claramente colocadas nas falas desses jovens. E preconceito violento está posto para a classe média. O comentário da Marília – irônico ou não, não importa – revela o que nós da classe média temos ensinado aos mais novos a respeito da convivência social e da vida pública. O outro, o estranho, é sempre um risco, um perigo, uma ameaça. E esse outro é sempre aquele que não se veste como nós, que não é igual, portanto. O preconceito tem sido por nós ensinado em nome da segurança e da proteção. Uma professora me contou uma conversa pra lá de interessante com um aluno de quase 10 anos. Ele, que reside no Morumbi, acredita que mora em uma região nobre da cidade. Da sacada de seu apartamento, ele avista uma favela. Ele acredita que quem lá reside mora na periferia. Qual o conceito de cidadania que temos transmitido aos nossos filhos, afinal?” (SAYÃO, 2006, p. 6).

4 O Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário fez as contas: O imposto de renda leva 20% dos ganhos da classe média. A

mordida sobre o patrimônio, principalmente IPTU e IPVA é de 5% da renda. Outros 24% estão embutidos em produtos que ela consome. Os impostos devoram quase a metade da renda da classe média. Fruto da tributação que escolheu a classe média como principal contribuinte de tributos sobre a renda, de tributos sobre o patrimônio e de tributos sobre o consumo, avalia Gilberto Luiz do Amaral, presidente do IBPT. (OS IMPOSTOS..., 2005c, p. 12).

5 “Assistindo, paralisada de horror, à sua transformação de profissional liberal ou servidor público, intelectualizado, em força

de trabalho especializada, desprovida de recursos que lhe possibilitem acesso aos meios de aprimorar seu grau de instrução, trabalhando apenas para ter casa e comida, a classe média ainda não conseguiu sair do estado de letargia, embora comece a dar os primeiros sinais de conscientização em relação ao seu status de refém do pensamento socialista de esquerda e de vítima da ditadura do politicamente correto. Sufocada pelo achincalhamento permanente de seus valores, sobrecarregada de impostos e abandonada pelo Estado, graças aos computadores domésticos e à Internet, a classe média vem formando guetos de resistência e começa a perceber que, apesar de ter respeitado a riqueza e ter se solidarizado com a pobreza, não obteve o mesmo, em con-trapartida, agora que se vê necessitada. Está só. Sua única chance de sobreviver está nas condições que ainda dispõe de buscar a verdade dos fatos e de encontrar uma maneira de se despir dos pudores que sente em se assumir como classe especificamente caracterizada, sem status de intermediária.” (FONTENELLE, 2006).

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Recebido em 12 de setembro de 2008 Aceito em 12 de fevereiro de 2009

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Tabela 1: Participação relativa da classe média assalariada no mercado formal de trabalho brasileiro (1990 a 2006)
Tabela 2: Participação relativa da classe média assalariada segundo o segmento (1990 a 2006)

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