• Nenhum resultado encontrado

DA PERCEPÇÃO À AÇÃO: ATIVISMO DA RURALIDADE METROPOLITANA FRENTE A PROCESSOS CONFLITUOSOS

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "DA PERCEPÇÃO À AÇÃO: ATIVISMO DA RURALIDADE METROPOLITANA FRENTE A PROCESSOS CONFLITUOSOS"

Copied!
150
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE ENGENHARIA AGRÍCOLA

DA PERCEPÇÃO À AÇÃO: ATIVISMO DA RURALIDADE

METROPOLITANA FRENTE A PROCESSOS

CONFLITUOSOS

ARIANE DA SILVA FAVARETO

CAMPINAS FEVEREIRO DE 2010

(2)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE ENGENHARIA AGRÍCOLA

DA PERCEPÇÃO À AÇÃO: ATIVISMO DA RURALIDADE

METROPOLITANA FRENTE A PROCESSOS

CONFLITUOSOS

Dissertação de Mestrado submetida à banca examinadora para obtenção do título de Mestre em Engenharia Agrícola, na área de concentração Planejamento e Desenvolvimento Rural Sustentável.

ARIANE DA SILVA FAVARETO

Orientador: Prof. Dr. Nilson Antonio Modesto Arraes

CAMPINAS FEVEREIRO DE 2010

(3)

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA

BIBLIOTECA DA ÁREA DE ENGENHARIA E ARQUITETURA - BAE - UNICAMP

F277p

Favareto, Ariane da Silva

Da percepção à ação: ativismo da ruralidade

metropolitana frente a processos conflituosos / Ariane da Silva Favareto. --Campinas, SP: [s.n.], 2010.

Orientador: Nilson Antonio Modesto Arraes.

Dissertação de Mestrado - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia Agrícola.

1. Participação social. 2. Estrutura social. 3.

Campinas, Região Metropolitana (SP). I. Arraes, Nilson Antonio Modesto. II. Universidade Estadual de

Campinas. Faculdade de Engenharia Agrícola. III. Título.

Título em Inglês: From the perception to the action: the actvism of metropolitan rurality in the face of conflicts

Palavras-chave em Inglês: Social participation, Social organization, the Metropolitan Region of Campinas

Área de concentração: Planejamento e Desenvolvimento Rural Sustentável Titulação: Mestre em Engenharia Agrícola

Banca examinadora: Mônica Muniz Pinto de Carvalho de Souza, Fernando Antonio Lourenço

Data da defesa: 25/02/2010

(4)
(5)

Aos meus pais, D. Rose e Seo Ariovaldo, pelas oportunidades e ensinamentos.

Para D. Aurora, minha avó, pelo exemplo de mulher guerreira e doce que demonstrou ser enquanto por aqui esteve.

(6)

Agradecimentos

Agradeço, inicialmente, ao Prof. Nilson Antonio Modesto Arraes pela acolhida na Faculdade de Engenharia Agrícola, pela troca de experiências e pela oportunidade de desenvolvimento desta pesquisa e a CAPES pelo financiamento.

Ao Prof. Fernando Antonio Lourenço pelo apoio e contribuições na banca de qualificação e defesa. Ao Prof. Mauro José Andrade Tereso também pelas contribuições durante o processo de qualificação e à Mônica Muniz Pinto de Carvalho de Souza pelas valiosas contribuições na banca de defesa desta dissertação.

Aos Profs. Bruno Reis e Rogério Arantes e aos colegas do GT Controles Democráticos e Instituições Políticas da Anpocs de 2008 pelos debates e trocas de experiência.

Aos amigos e parceiros nesta caminhada, Malimíria Otani e Marco Aurélio de Lima e Myrrha pela companhia, desabafos e paciência e a Bia Mariotto e Herta Avalos Viegas pelo apoio no início desta trajetória.

Agradeço a Carlos Reys Vukomanovic por abrir sua sala na Casa de Agricultura e nos ajudar a desvendar o rural campineiro e a Eros de Marconsini e Vizel pelos esclarecimentos junto a Prefeitura Municipal de Campinas.

Ao Eduardo, Mariane, Sérgio, Marcos, Lúcia, Noemia, Salvador e Sonia, dos bairros rurais Friburgo e Pedra Branca, por abrir a porta de suas casas e concederem as longas entrevistas que compõem este trabalho.

Aos queridos amigos Gapianos que sempre me ampararam e motivaram em todas as escolhas que fiz, em especial, Maira Eduarda Zanin e Gláucia Monteiro de Castro pelas críticas e leituras do texto final.

Às minhas mascotinhas, Tuca e Maju, pelas brincadeiras, sempre motivadoras, entre um capítulo e outro da dissertação.

Agradeço à minha “consciência” Isabel e seu irmão Luca, sobrinhos queridos, que me fazem lembrar a todo o momento as alegrias da infância.

(7)

Ao meu companheiro de vida, Eduardo Turati, sem o qual não realizaria este trabalho e tantas outras coisas nas quais sempre está ao meu lado.

Por fim, agradeço aos colegas do Cebrap, em especial, ao Arilson Favareto, pelas orientações quanto ao procedimento de análise e pelas contribuições teóricas, além destas, por todas as trocas que estabelecemos, de familiar a intelectual, que me enriquecem cotidianamente.

(8)

Sumário Lista de Figuras ... ix Lista de Tabelas... x Lista de Abreviaturas ... xi Resumo... xiii Abstract ... xiv Introdução ...- 15 -

1 – Explicações teóricas sobre a participação social: breve análise...- 24 -

1.1 – Racionalidade e cooperação: visões da democracia deliberativa sobre a participação social e regulação de conflitos ...- 25 -

1.2 – “Depende do desenho...”: visões do institucionalismo sobre a participação social e regulação de conflitos ...- 29 -

1.3 – “Tem que empoderar...”: o empowerment e a análise sobre participação social e regulação de conflitos...- 32 -

1.4 – Análise dos estilos de ativismo através das estruturas sociais ...- 34 -

1.5 – Ruralidade metropolitana e os conflitos de uso do solo: um quadro de análise...- 36 -

Síntese...- 38 -

2 – Do “caminho de Goiases” à metrópole: referências do rural na cidade de Campinas ...- 39 -

2.1 – Origens da metrópole: do agrário ao industrial...- 40 -

2.2 – A expansão urbana sobre as áreas rurais...- 42 -

2.3 – A formação do bairro Friburgo e a tradição alemã ...- 48 -

2.3.1 – Ampliação de Viracopos ...- 50 -

2.4 – A formação do bairro Pedra Branca: forte tradição na produção de frutas...- 52 -

(9)

2.5 – Conflitos rural-urbano e as propriedades empreendidas na ação coletiva: recolocando o

problema de pesquisa...- 55 -

Síntese...- 57 -

3 – Planejamento municipal, espaços participativos e as estratégias adotadas pelos grupos sociais na regulação dos conflitos...- 59 -

3.1 – Diretrizes de desenvolvimento municipal para as áreas rurais: o Plano Diretor...- 60 -

3.2 – Planos Locais de Gestão ...- 63 -

3.2.1 – Plano Local de Gestão para a região do bairro Pedra Branca ...- 64 -

3.2.2 – Plano Local de Gestão para a região do bairro Friburgo ...- 66 -

3.3 – Os espaços para o encaminhamento de demandas nas esferas executiva e legislativa ....- 68 -

3.4 – O Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável ...- 70 -

3.5 – Qual o lugar da mediação de conflitos? Espaços efetivamente ocupados pelos agentes sociais dos bairros Pedra Branca e Friburgo...- 72 -

Síntese...- 75 -

4 – Estilo de ativismo dos grupos sociais locais ...- 77 -

4.1 – Trajetória das lideranças, redes sociais e o papel do Estado...- 78 -

4.2 – Análise das trajetórias e suas propriedades à ação coletiva ...- 83 -

4.3 – Análise das redes e recursos mobilizados pelos grupos sociais...- 94 -

Associações do bairro Friburgo...- 95 -

A associação dos proprietários rurais e moradores do bairro Pedra Branca...- 99 -

4.4 – O papel do Estado na regulação de conflitos ...- 102 -

4.5 – O lugar da participação social e os estilos de ativismo...- 107 -

Síntese...- 111 -

Conclusão...- 113 -

Referências Bibliográficas ...- 120 -

(10)

Lista de Figuras

Figura 1 – Estrutura interacional e estilos de ativismo ...- 79 -

Figura 2 – Representação gráfica da trajetória das lideranças, redes e papel do Estado...- 82 -

Figura 3 – Trajetória das lideranças ...- 84 -

Figura 4 – Estrutura e dinâmica das redes...- 102 -

Figura 5 – Papel do Estado na regulação de conflitos...- 105 -

(11)

Lista de Tabelas

Tabela 1 – População de Campinas por Situação de Domicílio (1934 a 1960) ...- 44 -

Tabela 2 – Estrutura Fundiária no Município de Campinas (de 1940 a 1960)...- 44 -

Tabela 3 – Área Urbana de Campinas (de 1900 a 1954)...- 45 -

Tabela 4 – Grau de Urbanização em Campinas (de 1980 a 2007) ...- 46 -

Tabela 5 – Comparativo de diretrizes de desenvolvimento constante nos Planos Diretores de 1996 e 2006...- 61 -

Tabela 6 – Variáveis e formas de capital ...- 108 -

Tabela 7 – Estoque de capital das lideranças ...- 109 -

(12)

Lista de Abreviaturas

AIA = Área de Influência Aeroportuária AP = Área de Planejamento

APA = Área de Proteção Ambiental AVA = Área de Vocação Agrícola

Cebrap = Centro Brasileiro de Análise e Planejamento CEBs = Comunidades Eclesiais de Base

CMDR = Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural

CMDRS = Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável Codeter = Colegiado de Desenvolvimento Territorial

COHAB = Companhia de Habitação Popular de Campinas Condema = Conselho Municipal de Meio Ambiente de Campinas Condepacc = Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas Conseg = Conselho Comunitário de Segurança

FAO = Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação GDR = Grupo de Desenvolvimento Rural

IBGE = Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDH = Índice de Desenvolvimento Humano

Incra = Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária Infraero = Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária LUPA = Levantamento de Unidades de Produção Agropecuária MDB = Movimento Democrático Brasileiro

(13)

OAB = Ordem dos Advogados do Brasil OP = Orçamento Participativo

PD = Plano Diretor

PIB = Produto Interno Bruto PLG = Plano Local de Gestão

PMDR = Plano Municipal de Desenvolvimento Rural PMU = Pesquisa Municipal Unificada

PNAD = Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio PPS = Partido Popular Socialista

PRONAF = Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar PSDB = Partido da Social Democracia Brasileira

PTDRS = Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável RMC = Região Metropolitana de Campinas

SEADE = Sistema Estadual de Análise de Dados SEBF = Sociedade Escolar do Bairro Friburgo SENAR = Serviço Nacional de Aprendizagem Rural

SMCIST = Secretaria Municipal de Comércio, Indústria, Serviços e Turismo UTB = Unidade Territorial Básica

(14)

Resumo

A Região Metropolitana de Campinas é reconhecida como um importante centro econômico e industrial nos cenários estadual e nacional. O crescimento desordenado das cidades que a compõem, em especial o município sede, leva a ocupação de áreas rurais em detrimento de sua riqueza social, cultural, econômica e ambiental, fazendo com que suas populações se mobilizem no intuito de construir alternativas para mitigar os efeitos da alteração de uso e ocupação do solo em suas comunidades. Este estudo é dedicado a este tema, onde procuramos identificar os fatores que levam os agentes sociais presentes em dois bairros – Friburgo e Pedra Branca – a empreender determinada ação coletiva frente à regulação dos conflitos circunscritos nesta problemática. Do ponto de vista teórico, a análise recai sobre as explicações acerca da democracia e participação social. De acordo com a literatura, o sucesso dos espaços participativos enquanto mediadores de conflitos estaria no desenho das instituições e no empoderamento dos agentes que deles participam. Ocorre que a maneira distinta como estas instituições são acessadas trazem um novo questionamento: por que alguns grupos sociais se apoiam em espaços participativos para encaminhamento dos conflitos e outros não? A hipótese que orientou esta pesquisa consiste na afirmação de que a ação coletiva e, portanto, o uso de instituições participativas, é tributária de três componentes: a trajetória das lideranças, que permite compreender as formas de percepção, classificação e encaminhamento dos conflitos; as redes, que permitem compreender os recursos e alianças mobilizadas; e o Estado, que leva à compreensão da abertura institucional a que os conflitos sejam encaminhados via estes espaços participativos. Empiricamente, isto significa dizer que a utilização de institucionalidades que se dediquem à regulação de conflitos e processos de desenvolvimento, como os conselhos gestores, por exemplo, deverão, antes, se preocupar em lidar afirmativamente com as desigualdades, em vez de pressupor uma homogeneidade nos impulsos e estímulos ao uso destes espaços para o encaminhamento dos conflitos. Por aí seria possível elevar a eficiência das instituições na regulação destes conflitos e, em última análise, do próprio processo democrático.

(15)

Abstract

The Metropolitan Region of Campinas is recognized as an important economic and industrial center in the state and national scenarios. The uncontrolled growth of cities within it, especially the county seat, takes the occupation of rural areas to the detriment of their social wealth, cultural, economic and environmental issues, making their populations are mobilized in order to create alternatives to mitigate the effects the change of use and land use in their communities. This study is dedicated to this theme, where we tried to identify the factors that lead social actors present in two neighborhoods - Friburgo and Pedra Branca - determined to undertake collective action against the regulation of conflicts confined in this. From the theoretical point of view, the analysis rests on the explanations about democracy and social participation. According to the literature, the success of participatory spaces as mediators of conflict would be the design of institutions and the empowerment of staff who participate. It turns out that a different way as these institutions are accessed brings a new question: why some social groups rely on participatory spaces for addressing disputes and not others? The hypothesis in this research is the claim that collective action and thus the use of participatory institutions, is dependent on three components: the path of leadership, to understand the ways of perception, classification and referral of disputes, the networks, which allow to understand the resources mobilized and alliances, and the state, which leads to understanding of the institutional openness that conflicts are routed via these participatory spaces. Empirically, this means that the use of institutions that engaged in settling conflicts and development processes, such as management councils, for example, should rather worry about dealing positively with inequalities instead of assuming a homogeneity in impulses and stimuli to use these spaces for addressing disputes. So could increase the efficiency of institutions in the regulation of these conflicts and, ultimately, the democratic process itself.

(16)

Introdução

O adensamento populacional das cidades de médio e grande porte no Brasil teve seu auge durante a década de 1970. Marcadamente, dois processos contribuíram de forma significativa para este fenômeno. O primeiro deles, iniciado cerca de vinte anos antes, está presente na crescente industrialização e comporta um modelo de desenvolvimento urbano, baseado no crescimento econômico, que privilegia a concentração de investimentos em determinadas áreas das cidades. Um segundo processo, decorrente do primeiro, está alicerçado no crescente uso de maquinário, sementes especiais e defensivos agrícolas. Esta mudança no modo de produção agrícola, que diminui o uso de mão de obra, acelera a migração da população de áreas rurais para centros urbanos que se tornam atraentes do ponto de vista econômico e de oferta de serviços. Estes dois processos dão a tônica de um crescimento desordenado das cidades.

A falta de planejamento urbano e a opção por um modelo de desenvolvimento que centraliza os serviços públicos levaram para a periferia das grandes cidades as populações pobres, aumentando o perímetro urbano sobre as áreas rurais, que passam a ser consideradas como espaços de dilatação das cidades, a despeito da produção agropecuária e do patrimônio histórico, cultural e ambiental (MIRANDA, 2002).

Esta visão de desenvolvimento com foco no crescimento econômico começa a dar lugar, em fins do século XX, a uma noção de desenvolvimento que destaca a dimensão social e, posteriormente, a dimensão ambiental1. Utilizando as palavras de Sachs (2001), a agricultura familiar passa a desempenhar a função de guardiã da paisagem e conservadores da biodiversidade rumo à transição para uma economia sustentável. Além desta característica, a ruralidade traduz-se, como assinala Wanderley (2001), em um modo de vida próprio, baseado numa sociabilidade local que é assegurada pela valorização cultural,

1

No Brasil, as discussões empreendidas no âmbito da ECO 92 trazem algumas preocupações acerca da escassez de recursos naturais. Para uma leitura sobre a evolução das teorias de desenvolvimento, ver: FAVARETO, Arilson (2007).

(17)

carregada de simbologias com o local de origem2. Neste sentido, a manutenção das tradições locais e mesmo a possível preservação dos ambientes naturais pelas populações rurais ficam ameaçadas diante da expansão urbana. A alteração de uso do solo com a intensificação dos processos de urbanização gera, portanto, conflitos sociais que demandam um posicionamento das populações envolvidas no sentido de encaminhar demandas e buscar soluções para mitigar o efeito trazido por este processo. O interlocutor, neste caso, são os gestores públicos, por representarem os interventores das ações de desenvolvimento e de ocupação do solo.

Entre a vasta literatura sobre o tema da regulação de conflitos, algumas vertentes apontam para a participação social como um caminho para a existência de uma concertação capaz de colocar lado a lado opiniões divergentes em busca de uma solução de interesse comum. Isto seria possível por meio da participação dos pólos em conflito em torno de formas de governança que têm lugar em espaços institucionais como conselhos gestores, orçamento participativo, audiências públicas, entre outros3. Todo este processo poderia, então, ser traduzido na organização local rumo ao desenvolvimento em bases sustentáveis.

Assim, a pergunta a que esta pesquisa pretende responder consiste em saber que fatores levam a que, em comunidades rurais da Região Metropolitana de Campinas – RMC, a possibilidade da participação social na regulação de conflitos locais causados pela expansão urbana seja usada de maneira distinta em duas situações determinadas.

As possibilidades voltadas à participação social são abertas legalmente no texto da Constituição de 1988. A partir de um processo de mobilização de movimentos populares que reivindicavam maior participação nos processos decisórios, como também a própria abertura do Brasil à redemocratização, a Lei traz alguns parâmetros para a participação em processos decisórios de políticas públicas. A partir da descentralização de políticas é estabelecida a constituição de conselhos gestores como um dos espaços para que a população possa debater as agendas públicas em âmbito municipal.

2

Embora Wanderley teça suas análises para a ruralidade de pequenos municípios, estes valores estão também presentes na ruralidade metropolitana, onde o peso na valorização dos recursos naturais é ainda maior devido à pressão imobiliária.

3

Explicitações sobre o termo governança e seu uso em análises institucionais, consultar: Ortega (1998), Tápia (2005), Winchester & Rodriguez (1998) e Mackinnon (2002).

(18)

Na prática, a instituição de conselhos deliberativos e experiências como o orçamento participativo foram fundamentais para que cientistas se inclinassem ao estudo de experiências voltadas à participação social, gerando visões dos espaços institucionais enquanto promotores do desenvolvimento. Estas visões podem ser agrupadas em duas concepções: de um lado, uma visão um pouco mais pura do processo de participação, baseada na ideia de que a existência de canais institucionais com este fim é suficiente para elevar o potencial democrático; por outro lado, numa visão mais realista do processo democrático e da participação social, autores como Mackinnon (2002) anunciam a possibilidade de um controle por parte dos gestores públicos destes espaços e a captura de lideranças pelas estruturas democráticas, fato que pode provocar uma desestruturação do tecido social envolvido e colocar em dúvida a capacidade de construção de habilidades sociais capazes de qualificar a participação política (ABRAMOVAY et al., 2006).

De todo modo, mesmo cercado de precariedades, os conselhos criaram possibilidades de atuação da população que até então não existiam, indicando um importante avanço ao considerarmos a trajetória política brasileira de separação entre a gestão pública e a população beneficiária das políticas4. Mas seriam eles suficientes ou um caminho propício ao aprimoramento das instituições democráticas? Sob que condições isso poderia se dar? Que condições se interpõem a esse ideal normativo?

As teorias sobre democracia e participação social, que têm entre suas principais correntes as perspectivas da democracia deliberativa, do institucionalismo e do empowerment, trazem parâmetros que permitem entender os processos que envolvem a efetivação da participação social e seu papel e, ainda, condicionantes na regulação de conflitos. O estudo destas três vertentes ajuda a formatação de um quadro que nos permite uma análise sobre a participação social e as condições de sua efetivação.

Os seguidores da democracia deliberativa, que tem como principal expoente teórico Jurgen Habermas, creditam à racionalidade e ao espírito cooperativo as chaves para a efetivação da participação social, o que tornaria possível a busca de consensos e a regulação de conflitos. Para alguns autores, a fragilidade desta teoria está em acreditar em

4

(19)

uma opinião pública livre, culta, responsável, informada e disposta a participar, o que denota fortes componentes utópicos e idealistas (UGARTE, 2004). A resposta da democracia deliberativa a este questionamento estaria, em parte, no poder da ação comunicativa, ou seja, indivíduos com capacidade discursiva participariam dos processos políticos e a legitimidade à participação se daria via representatividade galvanizada em formas institucionais definidoras do regime democrático.

Para a vertente institucionalista, que tem como um de seus estudiosos Archon Fung, o problema relativo à assimetria de recursos comunicativos, materiais ou técnicos, é algo que poderia ser sanado através do desenho institucional destes espaços. Ou seja, o tema, o modo de discussão, a recorrência e o monitoramento representariam regras e estímulos à participação eficiente a que os indivíduos chegam por força de sua própria interação.

Em conjugação à vertente institucionalista, alguns especialistas creditam ao empoderamento individual ou comunitário o vetor capaz de alterar a balança de forças naturalmente desigual e, por aí, favorecer a participação. Isto é, seria necessário que as pessoas fossem dotadas de maior poder para que pudessem intervir efetivamente na própria moldagem das instituições que, por sua vez, determinam os rumos e resultados dos processos participativos (FERREIRA et al., 2007).

Ocorre, todavia, que maior empoderamento também pode significar maior intransigência dos movimentos e grupos sociais, e não um favorecimento ao diálogo e a busca de soluções concertadas para conflitos e problemas envolvendo uma determinada comunidade.

O que o rápido balanço das três vertentes citadas acima indica, e que será retomado no primeiro capítulo, é que o sucesso das instituições participativas não pode ser explicado isoladamente por nenhuma das três vertentes consagradas na literatura sobre o tema. Para compreender efetivamente se a participação social pode contribuir – e em que condições pode fazê-lo – para o processo de regulação de conflitos e de desenvolvimento localizado, por exemplo, parece ser necessário buscar uma abordagem situada na confluência entre as instituições e as motivações e estratégias de grupos e movimentos

(20)

sociais convidados a participar ou disputando espaços participativos, como apontam os trabalhos de Coelho et al. (2008) e Galvanese (2009).

Apesar de não tratar diretamente da problemática envolvendo as instituições e as motivações e estratégias de grupos e movimentos sociais diante da possibilidade da participação social, Charles Tilly (1998) cunha a noção de estilos de ativismo justamente para tentar explicitar as distintas maneiras pelas quais esses movimentos e grupos sociais podem se comportar em um tal contexto. Para ele, os movimentos sociais podem ser agrupados em três categorias. Na primeira delas predomina a ação competitiva e envolveria os grupos que disputam os mesmos recursos. O desafio de atores externos levaria à ação reativa os grupos que tentam manter ou reconquistar reivindicações já estabelecidas, determinando a segunda categoria. No caso de grupos que demandam reivindicações inéditas, o autor classifica como ação proativa a terceira categoria de estilo de ativismo de movimentos ou grupos sociais. Estas categorias, para o autor, são resultado da interação do papel das redes sociais, das identidades criadas nos conflitos coletivos, das estruturas dadas pela acumulação de compreensões compartilhadas e nas estruturas de oportunidades políticas.

As análises apresentadas por Tilly permitem elucidar o comportamento de grupos e movimentos sociais diante de um mesmo quadro institucional, porém resta ainda uma lacuna no tocante às razões pelas quais estas diferenciações ocorrem. Procurando preencher este espaço, autores como Coelho et al. (2008) e Galvanese (2009) utilizam as teorias de Bourdieu sobre campo, habitus e formas de capital, como também as análises sobre redes sociais de Granovetter para compor uma análise focada nas estruturas sociais que responderiam ao direcionamento da percepção dos agentes sociais, orientando suas ações e respostas aos estímulos institucionais, conformando determinado estilo de ativismo. As redes sociais estabelecidas pelos grupos sociais, através da identificação dos recursos mobilizados em conjunto com o papel desempenhado pelo Estado como estímulo ou retenção à participação, completam a análise empreendida pelos autores5.

5

(21)

Delimitando o campo de análise

A RMC experimentou um processo de desenvolvimento característico das grandes cidades6, tendo sua urbanização acelerada na década de 1970, quando a população praticamente dobra, sendo formada principalmente por migrantes atraídos pela dinâmica econômica da região. A partir da década de 1990, a RMC, e em especial a cidade de Campinas, vem se tornando pólo de indústrias de alta tecnologia, concentrando o primeiro condomínio industrial do país, abarcando cerca de um terço da produção industrial do estado (CANO & BRANDÃO, 2002). Apesar da economia do município crescer acima da média estadual, os problemas advindos com a expansão econômica e populacional também são de grande porte, materializados em questões ambientais, crescente favelização, altos índices de violência e ocupação urbana em áreas rurais.

Especificamente sobre a ocupação urbana em áreas rurais, dois casos recentes mobilizaram a população local de dois bairros rurais – Friburgo e Pedra Branca – para o enfrentamento de conflitos com origem nas formas de uso e ocupação do solo. Trata-se de duas experiências baseadas na expansão urbana que denota o processo de desenvolvimento experimentado pelo município de Campinas nas últimas décadas. A ampliação do aeroporto internacional de Viracopos, pensada desde a década de 1970 pelos gestores públicos, começa a tomar forma em sua fase de desapropriação de áreas. O traçado planejado anteriormente fora ocupado por famílias de baixa renda e a opção do poder público local foi de transferir o projeto para uma área que não apresentasse adensamento populacional, característica esta intrínseca a espaços rurais. A nova região escolhida abriga uma população de imigrantes alemães e suíços que fundaram o bairro Friburgo em 1870, possui produção agrícola e uma riqueza cultural que estes moradores implementaram no bairro. Do ponto de vista territorial, a região foco da ampliação concentra nascentes e remanescentes de mata nativa, incluindo o município de Indaiatuba, que abriga uma espécie de continuidade do bairro Friburgo, denominado Helvétia, também formado por descendentes suíços.

6

A RMC representou, em 2004, 9,4% do PIB estadual, segundo estudo sobre a região realizado em 2007 pela Secretaria de Economia e Planejamento do governo do Estado de São Paulo, somando 5,2 milhões de reais.

(22)

De menor porte, mas carregando a mesma gama de conflitos, imigrantes japoneses e italianos que formaram o bairro Pedra Branca na década de 1950 se depararam com a construção de um condomínio habitacional de caráter urbano no interior do bairro que possui uma significativa produção agrícola, principalmente frutas com certificação internacional. Abriga, ainda, programas de cunho ambiental e de desenvolvimento rural como o Microbacias do governo do estado de São Paulo7.

A hipótese que se pretende demonstrar, em consonância com a proposição de Tilly e os estudos realizados por Coelho et al. e Galvanese, é que a maneira como se portam os grupos sociais frente a estes conflitos está diretamente relacionada com a posição ocupada pelos agentes nas estruturas sociais, ou para usar os termos de Pierre Bourdieu, no campo de posições e oposições em que se situam. Estas estruturas, que podem ser percebidas pela trajetória e relações sociais estabelecidas durante a vida irão conformar as disposições que cada ator social empreende na ação coletiva. Por sua vez, esta construção social das disposições é constituída sempre a partir das relações de força e desigualdade que se expressam na distribuição das diferentes formas de capital – social, político, econômico e cultural – disponíveis a estes agentes e necessárias para empreender a ação coletiva. Isto é, o acúmulo e a diversidade dos capitais é o que determina a localização destes agentes na estrutura e, em consequência, influencia decisivamente na conformação de parâmetros e condições que envolvem suas formas de interpretação e classificação do mundo social e que irão, por aí, responder pelas principais características do estilo de ativismo de cada grupo social. Isso inclui a aposta e o sentido da aposta dos grupos sociais em adotar estratégias visando o aproveitamento dos espaços coletivos dedicados à participação. Além disso, a hipótese é complementada por duas instâncias fundamentais: a capacidade dos grupos sociais em estabelecer redes baseadas em laços fracos, possibilitando a efetivação de trocas e, ainda, pelas oportunidades abertas pelo Estado para a participação social. É, portanto, na análise desta tríade composta pela trajetória das lideranças, estrutura e dinâmica das redes e pelo papel do Estado que encontramos os componentes que respondem às estratégias e motivações dos grupos sociais.

7

O Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas, desenvolvido pela Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, tinha por objetivo em seu desenho inicial, apoiar o manejo adequado de recursos naturais. Devido a precariedade de acesso à infraestrutura e serviços, o Programa teve seu foco voltado, como aponta Navarro (2007) para o desenvolvimento rural dos municípios paulistas.

(23)

O presente trabalho está estruturado em duas partes. A primeira é dedicada a recompor o debate conceitual que envolve o problema das esferas participativas, e assim recolocar o problema de pesquisa e a hipótese, já brevemente anunciados nesta introdução. A segunda procura descrever os espaços dedicados à participação social no rural campineiro e os que são efetivamente ocupados por esta população, o que será feito por meio da análise das trajetórias sociais, das redes e das instituições dedicadas para que esta participação ocorra. Estas duas partes reúnem, ao todo, em cinco capítulos, como segue.

No primeiro capítulo promovemos uma breve sistematização das teorias consagradas presentes na literatura sobre democracia e participação social. Nele buscamos elementos que traduzem motivações e estratégias de grupos sociais quanto à participação social para a regulação de conflitos.

O segundo capítulo é dedicado à explicitação do problema de pesquisa. Para isso, realizamos um resgate da trajetória histórica da RMC, em especial do município de Campinas, abordando a expansão urbana sobre as áreas rurais, a formação dos bairros rurais Friburgo e Pedra Branca, até culminar nos dois fatos geradores do conflito aqui estudados: a ampliação do aeroporto de Viracopos e a construção do condomínio Topázio.

Os espaços disponíveis para participação e deliberação dedicados para a população rural campineira são objetos do terceiro capítulo. Nele são descritas as audiências realizadas para construção e apresentação de propostas de desenvolvimento para os dois bairros no âmbito das diretrizes do Plano Diretor municipal. Isto nos permitiu traçar um retrato de como se formam as propensões à participação dos grupos sociais.

As propriedades sociais efetivamente empreendidas na ação coletiva são o objeto de análise do quarto capítulo. Nele são apresentados os procedimentos metodológicos utilizados nas entrevistas e os resultados obtidos e que estão organizados de maneira a identificar o volume e a distribuição das diversas formas de capital de que são portadores os agentes sociais. O que se faz por meio da reconstituição da trajetória de lideranças exemplares, da formação de redes sociais e do papel do Estado em sua maneira de absorver e transformar em regras e em instituições o tratamento dos conflitos envolvidos na alteração do uso do solo no rural campineiro.

(24)

Por fim, o último capítulo promove um balanço das hipóteses apresentadas e procura evidenciar a correlação entre as estruturas e o posicionamento dos grupos quanto à regulação de conflitos e participação social. O que se pretende é deixar clara a necessidade de iluminar o comportamento dos agentes sociais para que se possa fazer mais efetiva a participação e o aprimoramento das instituições democráticas.

(25)

1 – Explicações teóricas sobre a participação social: breve análise

“A democracia surgiu quando, devido ao fato de que todos são iguais em certo sentido, acreditou-se que todos fossem absolutamente iguais entre si”. Aristóteles

Após vinte anos de ditadura no Brasil, a Constituição de 1988 e suas complementações estabelecem alguns parâmetros para a participação social, efetivada por meio da mobilização e reivindicação de grupos sociais, como também da própria natureza de reabertura à democratização. Este processo e a descentralização de políticas públicas trazem para a esfera municipal a possibilidade de que os rumos de desenvolvimento e a aplicação de recursos possam ser debatidos pela população, seja via instituições formais, como os conselhos gestores, ou por meio de processos participativos de consulta, como as audiências públicas.

Amplamente debatida no meio acadêmico, a participação social tem sido objeto de inúmeras pesquisas e poucos consensos. Todavia, podemos agrupar estas visões em duas abrangentes concepções8. Uma primeira delas comporta pesquisadores que vêem na existência de espaços de participação e deliberação a possibilidade efetiva de envolvimento da população nos debates que envolvem a gestão pública. Esta visão pura da democracia como resultado direto da participação não leva em conta assimetria de informações, disputas político-partidárias e desiguais possibilidades de acesso aos espaços e às decisões.

Uma segunda concepção enfatiza a captura de lideranças pelos gestores públicos nestes processos de participação, fato que dificultaria aos movimentos sociais se estabelecerem enquanto grupo crítico e verdadeiramente influente nos espaços participativos devido à dificuldade de formação de novas lideranças, capazes de combinar novos e diferentes recursos (MACKINNON, 2002; ABRAMOVAY et al., 2006). Os espaços de discussão seriam, então, fortemente constrangidos pelos gestores públicos,

8

Sobre um balanço das análises sobre participação social, ver, por exemplo: Coelho e Nobre (2004) e Dagnino e Tatagiba (2007).

(26)

diminuindo a aposta na participação popular como caminho para o aperfeiçoamento das instituições.

Em meio a este debate, o que se pode dizer é que é difícil não reconhecer que os conselhos e espaços dedicados à participação social representam avanços na esfera política brasileira e favorecem a possibilidade de discussão nas diversas arenas políticas. Mas pode-se dizer também, que somente sua existência não basta para confirmar a efetividade da participação do público envolvido como um critério de melhoria das instituições democráticas, seja em decisões sobre a aplicação de recursos públicos, em investimentos voltados ao desenvolvimento ou, mesmo, na regulação de conflitos. Em outros termos, os espaços de participação social podem ser utilizados como espaços de cooptação, como possibilidades de dar maior publicidade aos conflitos ou como locus de negociação, entre outras. O que o balanço da literatura sobre o tema aponta é que, em última instância, o sucesso da participação social em aperfeiçoar instituições democráticas depende das estratégias adotadas pelos grupos sociais envolvidos.

Este capítulo tem por objetivo analisar as vertentes teóricas voltadas a explicar os processos de participação social. As três primeiras seções do capítulo são dedicadas a cada uma das principais vertentes deste debate teórico. A quarta seção, por sua vez, é dedicada à apresentação das perspectivas explicativas que permitem compreender as razões da diferenciação de comportamentos da ação coletiva frente a um quadro institucional favorável à participação. O objetivo final deste capítulo é moldar um quadro analítico que possa ser aplicado ao caso dos bairros Pedra Branca e Friburgo.

1.1 – Racionalidade e cooperação: visões da democracia deliberativa sobre a participação social e regulação de conflitos

De uma maneira geral, podemos afirmar que a democracia é um regime onde o poder político vem da base e, este poder encontra-se amplamente distribuído entre a comunidade. É mediante a participação dos interessados na aplicação das políticas de

(27)

determinado governo que encontramos o cerne da própria democracia. Assim, a participação seria termo essencial para o funcionamento democrático.

Para Ugarte (2004) apoiado em Habermas, a democracia é vista como um autogoverno, entendida como a faculdade dos indivíduos de participarem da tomada de decisão a que são submetidos. Neste regime, a imposição heterônoma dissolve-se mediante a participação dos destinatários. Neste sentido, a democracia e a participação são conceitos entrelaçados e essa participação será efetivada de acordo com a teoria democrática que é adotada. O autor salienta, ainda, que há várias definições sobre o conceito de democracia deliberativa, mas suas bases fundamentais são compartilhadas e aponta para um elemento democrático da teoria baseado na participação de todos os potenciais destinatários nas tomadas de decisões coletivas e, um outro elemento propriamente deliberativo, onde a tomada de decisão deve ser o resultado de um intercâmbio de argumentos entre os participantes que, durante as decisões, devem respeitar os critérios de imparcialidade e de racionalidade.

Essa descrição apresenta uma vulnerabilidade teórica que, segundo Dryzek (2004), está alicerçada na ausência de participação da maioria dos afetados pelas políticas. Para ele, seria mais plausível que o problema fosse colocado em termos de direito, capacidade ou oportunidade para deliberar, assinalando que há um problema de aplicação da deliberação em larga escala. Reis (2004) coloca como maior obstáculo para aplicação da deliberação os custos de organização e participação que ela envolve.

Diante dos problemas de aplicação da deliberação, Dryzek (2004) aponta algumas soluções, esclarecendo que elas podem ser utilizadas de forma combinada. Na primeira delas restringe-se a um número reduzido os casos em que a deliberação popular possa ocorrer. Uma segunda solução está focada em diminuir o número de participantes, certificando-se que os indivíduos envolvidos na deliberação sejam de fato representativos dos que não o fazem. Um terceiro método que poderá ser utilizado está baseado na própria legitimidade da participação, ou seja, a indicação feita pelo autor, apoiado em Robert Goodin, é que os indivíduos que participam tragam à mente os interesses daqueles que não participam. A quarta e última solução apontada pelo autor está baseada em Habermas, traduzida na concepção de duas vias de deliberação na esfera pública e na legislatura. “A

(28)

legitimidade é assegurada pela aceitação púbica dos procedimentos pelos quais a legiferação adquire responsividade à opinião pública formada de uma esfera pública alargada. A opinião pública é convertida em poder comunicativo como resultado do processo eleitoral, e então em poder administrativo via eleição. O problema da economia deliberativa é resolvido porque apenas um pequeno número de legisladores precisa deliberar sobre o conteúdo da lei”. (DRYZEK, 2004:47).

Há nesta citação alguns elementos-chave que nos auxiliam a compreender o conceito de democracia deliberativa dentro do pensamento habermasiano, quais sejam, o poder comunicativo, a legitimidade e, em profunda ligação com estes, a autonomia política.

Nas sociedades contemporâneas, o voto do cidadão é o meio pelo qual se elegem os representantes da população, em especial nos países como o Brasil onde esse ato é obrigatório. De acordo com Bento (2003:221), “(...) o conceito de representação não se esgota na democracia parlamentar, que é uma de suas formas, historicamente a mais importante, mas que existe onde quer que decisões coletivas sejam tomadas, não pela coletividade inteira e sim por membros eleitos para essa finalidade. A ideia de representação traduz uma exigência democrática fundamental, qual seja, a necessidade de discussão e deliberação mediante persuasão por argumentos racionais”. Porém, o próprio autor ressalta que, em países com pouca tradição democrática, há uma fragilidade no processo eleitoral.

Nesse sentido, o voto é o instrumento mais importante da população e se traduziria, em última análise, numa opinião coletiva. Entretanto, Bourdieu (2005:74) afirma que o voto é o “(...) produto não de uma verdadeira ação coletiva (...) mas de uma agregação estatística pura de opiniões individuais individualmente produzidas e expressas.” Ainda segundo o autor, o voto somente se tornaria o sufrágio universal se fossem universalizadas as condições de acesso ao universal.

Para Nobre (2004), o voto representa um registro jurídico-burocrático hipertrofiado, onde a atribuição do Estado na implementação de políticas torna o cidadão

(29)

como um cliente9, substituindo a participação pela decisão técnica da burocracia estatal, sendo o controle político da burocracia delegado aos partidos políticos. É nesse contexto que O’Donnell (1991) propõe a substituição do conceito de democracia representativa por democracia delegativa. O perigo de estabelecer a ação coletiva baseada na delegação é, para Bourdieu (2005), sempre acompanhada pela ameaça da apropriação usurpadora.

Para os teóricos habermasianos, o procedimento pelo qual se alcança a representatividade é o mais significativo, sendo que é através do discurso ou, em outras palavras, da ação comunicativa que a escolha pessoal torna-se legítima e autônoma. Assim essa legitimidade discursiva é alcançada, para Dryzek10 “(...) quando uma decisão coletiva for consistente com a constelação de discursos presentes na esfera pública, na medida em que esta constelação seja submetida ao controle refletido de atores competentes”. O autor adverte que essa ação demandaria que existisse o consenso dos discursos concorrentes e isso poderia ser pautado por “acordos exequíveis” que variariam através “do grau de ressonância com a constelação de discursos prevalecente”. (DRYZEK, 2004:52). Seria, então, através de uma “comunicação competente” que o processo deliberativo efetivar-se-ia. Porém, para que tal intento fosse alcançado, Reis adverte sobre a necessidade de garantia, através de normas e sanções, para a efetivação da autonomia de todos no processo de comunicação. Dessa forma, a ação comunicativa, baseada numa argumentação livre entre iguais, representa o meio pelo qual a participação social ocorre e para sua realização deve haver regras formais e procedimentos burocráticos.

Segundo Nobre (2004), é nesse aspecto que a democracia deliberativa possui um caráter normativo, pois, em seu cerne está o respeito ao requisito essencial da legitimidade dos processos burocráticos, corroborado por Ugarte (2004), que afirma que a debilidade dessa teoria está em apostar em uma opinião pública que seja livre, culta, responsável, informada e disposta a participar, que, segundo o autor, tem fortes componentes utópicos.

9

Segundo o autor, o estabelecimento de direito adicionado da criação de uma cultura política democrática representaram as bases que deram origem ao estado de bem estar, concretizado por uma gama de direitos sociais sob a responsabilidade de execução do Estado.

10

(30)

1.2 – “Depende do desenho...”: visões do institucionalismo sobre a participação social e regulação de conflitos

A vertente institucionalista dos estudos sobre democracia sustenta que a partir do estabelecimento de regras expressas nas instituições é possível garantir aos agentes da sociedade civil sua participação mais eficiente. Grosso modo, as instituições representariam uma mediação entre a sociedade civil e as esferas públicas. Para Théret (2001), atualmente o debate em torno do institucionalismo organiza-se em três visões diferenciadas analiticamente através do enfoque na relação entre os indivíduos e as instituições e, também, no processo de formação e transformação das instituições. Em sua gênese está a regulação de conflitos ou a solução de problemas de coordenação.

Basicamente, esses entendimentos estão reportados a um enfoque de cálculo e numa perspectiva cultural. Uma primeira visão, baseada no enfoque de cálculo11, está presente no institucionalismo da escolha racional. As instituições teriam algo de resultado intencional, quase contratual, podendo ter alterada sua natureza após desempenhar o seu papel. Representariam a solução de problemas de coordenação com soluções adaptadas para problemas de oportunidade, informações imperfeitas ou assimétricas e custos de controle. Para Wampler e Avritzer (2004), a teoria da escolha racional visa instituições políticas formais e possui uma visão estreita do cidadão como eleitor, revelando-se, portanto, incapaz, em termos teóricos e empíricos, de conectar a sociedade civil e a sociedade política, que fica aqui reduzida ao âmbito do eleitorado, restringe-se um amplo conjunto de estratégias e ações políticas, como por exemplo, recursos judiciais, manifestações públicas e pressões por grupos de interesse. Uma segunda visão, apontada por Théret (2001), está baseada no enfoque cultural e traduzida na teoria das organizações. As instituições corresponderiam aos planos morais e cognitivos sobre os quais estão baseadas a interpretação e a ação. Assim, as instituições resistiriam às mudanças porque se estruturariam em escolhas individuais. Da mesma forma que na teoria da escolha racional, as instituições são vistas como solução aos problemas de coordenação, com o diferencial que essa coordenação é considerada por meio de dispositivos cognitivos, ao passo que

11

O enfoque de cálculo, para Therét, enfatiza o caráter instrumental e estratégico do comportamento, apresentada por uma concepção estratégica.

(31)

conflitos de interesse e luta política são vistos como periféricos. E, finalmente, a terceira e última visão apresentada pelo autor é o institucionalismo histórico. Este se diferiria dos anteriores por ser eclético, misturando os dois enfoques – cálculo e cultural –, os agentes sociais calculariam a sua base de interesse e ao mesmo tempo possuiriam diferentes visões de mundo, correspondentes às suas posições e a contextos sociais. Dessa forma, os interesses não seriam dados, mas politicamente construídos12.

De uma maneira geral, podemos afirmar que para a vertente institucionalista as regras representam soluções racionais a que chegam os indivíduos por força de sua própria interação, apostando, portanto, na cooperação e na convenção para a mediação de conflitos. Mas como devem ser esses espaços onde possa haver a concertação necessária à melhoria do relacionamento entre a sociedade civil e a esfera pública?

Segundo Fung (2004), embora haja defensores de medidas em larga escala, há também ativistas, fundações e acadêmicos pensando em projetos mais modestos, ao que o autor denomina de minipúblicos13. Para ele, os minipúblicos reúnem cidadãos em deliberações públicas organizadas de maneira autoconsciente em exercícios de reparação reformista. Representariam, portanto, uma classe intermediária das instituições democráticas. O autor enumera três principais razões para que os minipúblicos sejam objetos de atenção, principalmente por parte dos interessados em aperfeiçoar a esfera pública: “Embora pequenos, eles estão entre os atuais esforços construtivos mais promissores para o engajamento cívico e a deliberação pública na política contemporânea. Em segundo lugar, dada a fragmentação pública na política contemporânea, reformas efetivas de larga escala na esfera pública devem consistir em grande medida na proliferação de melhores minipúblicos, ao invés de um melhoramento de um único grande público. Por último, mesmo aqueles que subscrevem concepções de aperfeiçoamento tectônico, macroscópico, precisarão saber algo sobre os detalhes do desenho institucional para a deliberação pública efetiva.” (FUNG, 2004:174). Para ele, o mais importante é o desenho

12

Essas três visões estão cunhadas no âmbito da ciência política, o autor trabalha, nesse mesmo artigo, com as concepções equivalentes ao institucionalismo na economia. O institucionalismo da escolha racional corresponde a nova economia institucional, a teoria das organizações assume a forma de uma economia das convenções e o institucionalismo histórico apresenta-se como teoria da regulação.

13

O conceito de minipúblico está baseado na concepção de que “(...) a democracia local ajuda a perceber como a emergência de uma forte dimensão pública pode ajudar a afastar os abusos de poder que pertencem às sociedades com fortes estratificações hierárquicas”.(Dahl apud WAMPLER e AVRITZER, 2004).

(32)

ou a construção institucional dos espaços resguardados à participação social e à deliberação e é isso que determinará uma resistência a generalizações, indo além da legitimidade para incluir accountability pública, justiça social, governança efetiva e mobilização popular.

Um dos desenhos citados pelo autor são, justamente, os conselhos consultivos participativos. Em suas considerações, esses instrumentos institucionais podem aperfeiçoar a qualidade da opinião na procura de alinhar políticas públicas e preferências imediatas. Além disso, desenvolvem ligações com os tomadores de decisão, econômicos ou estatais, para transmitir preferências após elas terem sido articuladas e combinadas por uma escolha social.

Num estudo sobre foros participativos no Vale do Ribeira (SP), no intuito de testar hipóteses sobre a relação entre participação, inclusão e desenvolvimento, Coelho e Favareto (2007) afirmam que uma das características destes espaços é a possibilidade de ascensão político-partidária e com isso delineia-se uma reprodução da esfera política. Os autores propõem que, além das regras do jogo, presente na explicação da teoria institucionalista, é preciso observar o “jogo das regras”, caracterizado pelo próprio jogo social existente na dinâmica interna desses espaços que, antes de qualquer coisa, representam um universo de disputa e conflitos.

Os autores Wampler e Avritzer (2004) também apostam num modelo que tenha seu foco na esfera local, isso se dá a partir da conclusão de que os teóricos institucionalistas não aprofundaram a investigação de novas formas de articulação da sociedade civil influenciando a mudança e renovação institucional. Para preencher essa lacuna, promovem uma análise do que chamam de públicos participativos. Esses espaços teriam, na visão dos autores, três estágios de desenvolvimento14. Como exemplo, os autores analisam o Orçamento Participativo – OP de Porto Alegre (RS), de Recife (PE) e de Belo Horizonte

14

Num primeiro estágio de desenvolvimento estariam presentes as associações voluntárias, movimentos sociais e associações comunitárias que, durante os anos 1970, foram responsáveis pelo levantamento de temas importantes que foram levados à esfera pública. No segundo estágio, as associações voluntárias foram responsáveis, nos anos 1980, pela disseminação de reivindicações acerca de direitos civis, políticos e sociais. No terceiro e último estágio são implementadas instituições de deliberação popular. Cf.: Wampler e Avritzer (2004). Nesse mesmo período o município de Campinas também vivia momentos de reivindicação, dado o grande aumento de moradores na cidade, o maior problema enfrentado durante o final da década de 1970, era o de moradia. Moradores de favelas organizaram-se e em conjunto com as Comunidades Eclesiais de Base – CEBs, implementaram em 1979 as Assembleias Populares. Suas reuniões eram realizadas no Paço Municipal, na pauta, constavam cerca de setenta itens. Cf.: Lopes, 1997.

(33)

(MG). Uma das conclusões a que chegam no tocante ao sucesso de participação e deliberação do OP está na afirmativa que “A tradição associativa de um município condiciona a implementação do OP, assim como suas taxas iniciais de participação”. (WAMPLER & AVRITZER, 2004:227).

Em síntese, para os teóricos da vertente institucionalista, o desenho institucional dos espaços de deliberação é o que irá determinar o grau de participação e a qualidade das deliberações ali debatidas. Esse desenho depende de uma série de fatores, entre eles, o tema a ser abordado, o modo como ele é discutido, a recorrência e o monitoramento. É, em vista disso, apostando num certo grau de racionalidade intrínseca aos participantes que a ação coletiva deveria elevar-se. Mas o que explica o fato de que agentes sociais vêem de maneira distinta a possibilidade da participação, mesmo quando submetidos aos mesmos estímulos? Por que, sob uma mesma estrutura de incentivos à participação, esta oportunidade é aproveitada de maneira distinta por diferentes agentes ou grupos sociais?

1.3 – “Tem que empoderar...”: o empowerment e a análise sobre participação social e regulação de conflitos

O conceito de empowerment tem sido utilizado desde os anos de 1990 nos Estados Unidos com o significado de método na gestão de empresas e nas instituições públicas daquele país. Segundo Ferreira et al. (2007), as origens da noção de empowerment fixam-se na Inglaterra do século XVII, quando empower passou a significar “investir em autoridade”. Nos anos de 1970, nos Estados Unidos e no Canadá, a palavra empowerment surgiu com o sentido de processo, abordagem, método, além de guardar a ideia de resultado a atingir. Segundo os autores, representa uma noção polissêmica que serve a propósitos distintos. De uma forma generalizada, “(...) é o conceito que denomina concepções sobre os mecanismos de acesso ao poder de indivíduos, grupos, categoria sociais ou coletividades para intervir em instituições, programas ou contextos sociais que dizem respeito às suas vidas e à sua história.” (FERREIRA et al. 2007:127).

(34)

Coêlho (2005:4) afirma que o empoderamento é um “(...) processo de fortalecimento dos recursos e capacidade das comunidades pobres e excluídas, de forma a dotá-los de condições de participar da implementação de políticas públicas e ativamente do processo deliberativo, e de responsabilizar as instituições e atores envolvidos em tais deliberações, tornando-as mais transparentes e efetivas”. Para o autor, as estratégias que levariam ao empoderamento das comunidades estariam compreendidas em cinco passos: i) instituir consultas aos grupos pobres e excluídos; ii) criar mecanismos inclusivos de tomada de decisão coletiva/deliberação; iii) aumentar a capacidade de monitoramento e fiscalização; iv) promover o controle com responsabilização e, v) gestão direta dos programas.

Procurando aprofundar o conceito de empoderamento, Ferreira et al. (2007) explicam que há duas formas em que a noção de empoderamento é utilizada. A primeira delas é denominada pela literatura pertinente ao tema de individual ou psicológica. Ela tem o sentido de “dar poder” às comunidades locais para que elas enfrentem seus próprios problemas e, assim, legitima as ações governamentais e libera o poder público de parte de suas atribuições. Sem distribuir poder efetivo, é uma forma de descentralização da administração pública e é usada enquanto método ou estratégia. A segunda noção a que os autores se debruçam foi trilhada nos movimentos sociais e possui duas conotações, uma referente à capacidade dos destituídos de poder organizar-se, e a outra baseada num conjunto de métodos e estratégias de intervenção, visando a incitação de uma reflexão sobre subalternidade e alienação, aliada a serviços de formação15. Essa noção vem sendo utilizada também como empowerment comunitário.

Para essa abordagem, o foco “(...) é a mudança social colocada na escala da vida cotidiana, como resultado da criação de relações sociais de simetria (grupos, associações, redes) por meio das quais se abre a possibilidade de ganhar poder, de estabelecer relações de poder para criar alternativas”. (Ferreira et al, 2007:130). Ou seja, para essa noção de empowerment, o essencial é favorecer a simetria intragrupal, através de técnicas, estratégias

15

Essa noção de empowerment é inspirada em movimentos de ação não violenta, nos escritos e práticas de Ghandi e da Teologia da Libertação. Suas perspectivas são baseadas no marxismo e na reflexão-ação contínua. Cf.: Ferreira et al. (2007).

(35)

ou da constituição de espaços de relações simétricas, atribuindo poder de transformação ao coletivo.

Ao analisar o desenho de minipúblicos enquanto espaços institucionais, Fung (2004) admite que eles só serão empoderados se os resultados que forem deliberados em tais espaços influenciarem as decisões públicas. Acrescenta ainda que “muitos minipúblicos não deveriam ser empoderados ou fortes. Se aos participantes falta uma reivindicação legítima para exercer voz em uma decisão, o empoderamento pode levar à captura privada ou a uma delegação ilegítima do poder estatal”, mas pondera que “(...) há boas razões para se empoderar alguns minipúblicos. Quando o déficit democrático se manifesta como falta de accountabillity do Estado ou quando um minipúblico é um componente de um esquema de governança ou de resolução de problemas, então o empoderamento se segue como consequência do propósito da deliberação pública.” (FUNG, 2004:182).

Dessa forma, o empoderamento pode ser colocado como um processo retro alimentado, em que a participação apoia a deliberação que, transformada em ato público, reflete nos espaços de decisão coletiva, podendo atrair maior participação num fluxo contíguo de ação coletiva. O problema aqui é explicar quais são os trunfos que levam ao maior empowerment e em como este empoderamento é, ou não, canalizado para espaços participativos.

1.4 – Análise dos estilos de ativismo através das estruturas sociais

As vertentes teóricas apresentadas acima, que investigam os processos de participação e deliberação na estrutura democrática, trazem alguns elementos que nos ajudam na elaboração de um quadro de análise sobre a participação social na regulação de conflitos.

Resumidamente, para os teóricos da democracia deliberativa a participação social é efetivada pela ação comunicativa quando esta habilidade se torna representativa dos indivíduos que não participam diretamente das deliberações como, por exemplo, nos

(36)

processos eleitorais. Aposta-se numa argumentação livre entre iguais de difícil percepção nas sociedades contemporâneas. Já para os autores que se apoiam na visão institucionalista, o desenho embutido nas instituições, amparado na importância dos temas a serem discutidos, a recorrência dos debates e o monitoramento realizado, seria o ponto chave para a existência de uma coordenação efetiva capaz de atuar na regulação de conflitos. Nestes espaços seria possível o empoderamento dos agentes de forma a propiciar uma transformação dos indivíduos que participam dos processos deliberativos.

A análise das vertentes teóricas sobre democracia e participação social demonstra ser de difícil compreensão o sucesso de instituições participativas, enquanto um espaço de negociação coletiva, a partir de uma leitura isolada de cada uma delas. Ao se basear em procedimentos idealistas, a democracia deliberativa acaba por apresentar uma visão utópica que não permite extrair elementos que colaborem para uma análise sobre o sucesso das instituições participativas. E a perspectiva do empowerment, igualmente traz limitações para responder às perguntas colocadas por este estudo. Parece, portanto, necessário promover uma análise conjunta combinando elementos de ambas. A isto seria preciso ainda, agregar a análise de elementos que permitam entender as motivações e estratégias que levam os grupos sociais a utilizarem as instituições como meio para a regulação de conflitos.

Neste sentido, o foco recai sobre os estilos de ativismo destes grupos. Charles Tilly (1998), apesar de não construir suas análises a partir das motivações e estratégias de grupos e movimentos sociais diante da possibilidade de participação social, colabora para esta compreensão através do estudo sobre a mobilização e por meio de sua tipologia da ação coletiva. Salientando a noção de estilo de ativismo, onde procura delinear as distintas maneiras pelas quais tais grupos podem se comportar diante de um determinado contexto, o autor classifica a ação coletiva dos movimentos sociais em três categorias: competitiva, reativa e proativa. Haveria uma ação competitiva onde estão envolvidos grupos em disputa pelos mesmos recursos. Predominaria a ação reativa onde grupos tentam manter ou reconquistar reivindicações já estabelecidas quando um ator externo os desafia. E, por fim, há o predomínio da ação proativa quando esta envolve grupos que reclamam reivindicações inéditas.

(37)

O autor sugere ainda que há uma convergência na leitura sobre a apreensão da estrutura e dinâmica dos movimentos ou grupos sociais ao se analisar como se compõem os seguintes elementos: as redes sociais, as identidades desdobradas em conflitos coletivos, as estruturas dadas pela acumulação de compreensões partilhadas e as estruturas de oportunidades políticas.

A proposição de Tilly permite entender como diante de um mesmo quadro institucional, grupos e movimentos sociais vão se comportar de maneira diferente. Baseando-se nesta proposição, outros trabalhos, como é o caso de Coelho et al. (2008) e Galvanese (2009), agregam aportes da teoria bourdieusiana dos campos, habitus e formas de capital e da abordagem das redes, de Mark Granovetter. Para eles, a motivação à ação coletiva pode ser moldada através de uma leitura sobre as estruturas sociais de que os indivíduos são portadores. Estas estruturas seriam responsáveis por direcionar as formas de percepção da realidade dos agentes sociais, orientando suas ações e, consequentemente as possibilidades de resposta aos estímulos institucionais e à participação social. A localização dos agentes nesta estrutura é determinada, segundo Bourdieu (2007), pela distribuição desigual dos diferentes tipos e volumes de capital disponíveis aos agentes, havendo, portanto, uma correspondência entre o volume e o tipo de capital acumulado historicamente e a posição dos agentes nesta estrutura. Uma abordagem compatível aos preceitos da sociologia comportamental de Norbert Elias, para quem a estrutura e a configuração do controle comportamental de um indivíduo dependem diretamente da estrutura de relações entre os indivíduos.

1.5 – Ruralidade metropolitana e os conflitos de uso do solo: um quadro de análise

Pelo exposto até aqui é possível a construção de um quadro de análise que nos leva a compreender de forma teórica e analítica a problemática aqui proposta. O crescimento das cidades de forma dispersa dilatou o perímetro urbano sobre as áreas rurais que compreendem, contemporaneamente, uma população que se configura em aspectos econômicos, por meio da produção agrícola, mas também com fortes elementos culturais,

Referências

Documentos relacionados

Se, no processo de separação dos pais, o espaço já não for o mesmo, a criança pode não ser capaz de entender o processo do divórcio de seus pais, além de não conseguir mais se

Para poder configurar o delito de desobediência é preciso que inexista uma sanção de natureza administrativa, pois tendo a penalização administrativa não há o que

Há que proceder de acordo com o que pode de nir, parafraseando Santos (2018), uma sociologia do direito de acesso à justiça das ausências: tornar os sujeitos ausentes,

“O aluno de Mestrado ou de Doutorado pode solicitar aproveitamento de créditos referentes a disciplinas cursadas como aluno especial, nos últimos 36 meses antes da

da flambagem distorcional pode ser dispensada.. NOTA 2 Para valores intermediários interpolar linearmente. Para as barras com a mesa tracionada conectada a um painel e a

O conceito de colonialidade, a obra de Frantz Fanon (1952;1961) e os princípios metodológicos da psicanálise concreta nos permitiram uma base que orientou

Nesse sentido, um trabalho integrado da Divisão de Vigilância Sanitária de Serviços e da Divisão de Atenção ao Idoso culminou na elaboração da Nota Orientativa n°

Sendo o planejamento de eventos compartimentado em quatro fases que, segundo Matias (2004), consiste em concepção, pré-evento, per ou transevento e pós-evento, partiu-se para