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Responsabilidade tributária de grupos econômicos

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Academic year: 2023

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Bruno Barbosa Stamm

Responsabilidade Tributária de Grupos Econômicos

Mestrado em Direito

São Paulo 2022

(2)

Bruno Barbosa Stamm

Responsabilidade Tributária de Grupos Econômicos

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito, sob a orientação da Profa. Dra. Regina Helena Costa.

São Paulo 2022

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Autorizo exclusivamente para fins acadêmicos e científicos a reprodução total ou parcial desta Dissertação de Mestrado por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.

Assinatura:___________________________________________________

Data:16/08/2022

E-mail: bruno.stamm@gmail.com

S729

Stamm, Bruno Barbosa

Responsabilidade tributária de grupos econômicos. – São Paulo: [s.n.], 2022.

161 p. ; 30 cm.

Dissertação (Mestrado em Direito) -- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Estudos Pós-graduados em Direito, 2022.

Orientadora: Profa. Dra. Regina Helena Costa.

1. Responsabilidade tributária. 2. Grupos econômicos. 3. Sujeição passiva. 4.

Lançamento. 5. Execução fiscal. I. Costa, Regina Helena. II. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Estudos Pós-graduados em Direito. III. Título.

CDD 340

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Bruno Barbosa Stamm

Responsabilidade Tributária de Grupos Econômicos

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito, sob a orientação da Profa. Dra. Regina Helena Costa.

Aprovado em: ____/____/____

Banca Examinadora

Professora Doutora Regina Helena (Orientadora)

Instituição: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

Julgamento: _________________________________________________________

Assinatura:__________________________________________________________

Professor Doutor Estevão Horvath

Instituição: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

Julgamento: _________________________________________________________

Assinatura:__________________________________________________________

Professora Doutora Juliana Furtado Costa Araújo Instituição: Fundação Getúlio Vargas (FGV)

Julgamento: __________________________________________________________

Assinatura:___________________________________________________________

São Paulo 2022

(5)

AGRADECIMENTOS

Agradeço, incialmente, à minha orientadora, Professora Regina Helena Costa, por toda a dedicação, paciência e cordialidade com que conduziu o presente trabalho.

À minha esposa, Mayara, por todo o apoio e incentivo durante o período de confecção do presente estudo.

Agradeço, outrossim, às Professoras Elizabeth Nazar Carrazza e Luiza Nagib, por todo o apoio e pelos ensinamentos passados ao longo do mestrado.

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Stamm, Bruno Barbosa. Responsabilidade tributária de grupos econômicos. 2022. 161 p. Dissertação (Mestrado em Direito). Programa de Estudos Pós-graduados em Direito.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, São Paulo, 2022.

RESUMO

O objetivo do presente trabalho é analisar se há fundamento normativo para que se impute responsabilidade tributária às pessoas jurídicas integrantes de um mesmo grupo econômico. Inicialmente, faz-se uma análise da responsabilidade tributária de forma geral, com ênfase nas limitações constitucionais impostas à eleição do sujeito passivo.

Posteriormente, analisa-se cada um dos dispositivos previstos no Código Tributário Nacional comumente invocados na tentativa de responsabilização de outras pessoas jurídicas integrantes de um grupo econômico, com a finalidade de identificar quais suas hipóteses de aplicação. Após, estabelece-se um conceito de grupo econômico que se vislumbra passível de aplicação no Direito Tributário, consistente em um grupo de pessoas jurídicas que conservam sua autonomia patrimonial com vistas à consecução de um objetivo comum, mediante direção unitária e submissão a uma mesma política empresarial. Fixado o conceito, verifica-se sua compatibilidade com as normas previstas no Código Tributário Nacional e se investiga se o artigo 50, do Código Civil, é passível de aplicação no Direito Tributário. Por fim, analisa-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema, realizando-se um cotejo entre o entendimento atualmente adotado pela Corte e as premissas e conclusões fixadas ao longo do presente estudo. Ao final, conclui-se pela possibilidade de aplicação do artigo 50, do Código Civil, ante a autorização do artigo 149, VII, do Código Tributário Nacional, no âmbito do lançamento tributário, ampliando, inclusive, as hipóteses de defesa das empresas responsabilizadas.

Palavras-chaves: Responsabilidade tributária. Grupos Econômicos. Sujeição Passiva.

Lançamento. Execução Fiscal.

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Stamm, Bruno Barbosa. Tax liability of economic groups. 2022. 161 p. Dissertation (Masters of Laws). Pós-Graduate Program in Law. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, São Paulo, 2022.

ABSTRACT

The objective of this study is to analyze whether there is legal foundation in imputing tax liability to legal entities which are constituted within a common economic group. Firstly, some general tax liability analysis is conducted, emphasizing its constitutional limitations imposed on the appointment of the taxable person. Subsequently, each provision contained within the Brazilian Tax Code (CTN) is analyzed, which are commonly invoked in the attempt of generating liability for other legal entities constituent of an economic group, intending to identify their application hypotheses. After that, the concept of an economic group is established in the light of its applicability in Tax Law, being a group of legal people that conserve their asset autonomy aiming the achievement of a common objective, through a single direction and submission to a unique corporate policy. Having set the concept, its compatibility is verified according to the rules present in the Brazilian Tax Code and it is explored whether article 50 of the Civil Code is applicable in Tax Law. Finally, the jurisprudence of the Superior Court of Justice is analyzed, by comparing the Court's current understanding of the theme with the premises and conclusions established throughout the present study. At last, it is concluded that it is possible to apply article 50 of the Civil Code, according to the authorization of article 149, VII, of the Brazilian Tax Code, regarding tax assessment, actually expanding the hypotheses for defense of liable companies.

Keywords: Tax Liability. Economic Groups. Passive Subjection. Assessment. Tax Enforcement.

(8)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 10

CAPÍTULO 1 - CONCEITOS FUNDAMENTAIS ... 13

1.1 A norma jurídica e suas espécies: regras e princípios... 14

1.2 A regra matriz de incidência tributária ... 19

1.3 A relação jurídico-tributária ... 23

1.3.1 A obrigação tributária principal ... 25

1.3.2 A obrigação tributária acessória ... 26

1.3.3 A relação sancionatória ... 28

1.4 A teoria dualista da obrigação tributária ... 31

CAPÍTULO 2 - A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA ... 36

2.1 Conceito ... 36

2.2 A Constituição Federal e as limitações impostas à eleição de responsáveis tributários ... 40

2.2.1 O princípio da legalidade tributária ... 41

2.2.2 A capacidade contributiva e seus efeitos na sujeição passiva ... 44

2.3 A finalidade da norma de responsabilidade tributária ... 47

2.3.1 Responsabilidade como forma de sanção pelo descumprimento de um determinado dever ... 47

2.3.2 Responsabilidade como uma decorrência da praticabilidade tributária ... 52

2.4 Espécies de responsabilidade tributária ... 57

2.4.1 Substituição ... 57

2.4.2 Responsabilidade em sentido estrito ... 59

CAPÍTULO 3 - A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL ... 62

3.1 O artigo 128 do Código Tributário Nacional e os limites estabelecidos ao legislador ordinário ... 62

3.2 A solidariedade tributária e o artigo 124, do Código Tributário Nacional ... 69

3.2.1. O interesse comum previsto no artigo 124, I, do Código Tributário Nacional ... 71

3.2.2 Limites à lei ordinária na fixação de responsabilidade solidária nos termos do artigo 124, II, do Código Tributário Nacional ... 73

(9)

3.3 O artigo 134, do Código Tributário Nacional ... 76

3.4 A responsabilidade tributária prevista no artigo 135, do Código Tributário Nacional ... 82

3.4.1 O significado da expressão “obrigações tributárias resultantes de atos praticados” ... 85

3.4.2 A responsabilidade “pessoal” prevista no caput do artigo 135, do Código Tributário Nacional ... 89

CAPÍTULO 4 - REGIME JURÍDICO TRIBUTÁRIO DOS GRUPOS ECONÔMICOS ... 91

4.1 A definição de grupos econômicos ... 91

4.1.1 As definições do direito societário e do direito concorrencial ... 93

4.1.2 Os grupos econômicos no direito do trabalho e do consumidor ... 96

4.1.3 Os grupos econômicos no direito tributário ... 99

4.2 Os grupos econômicos e a sua incompatibilidade com as hipóteses do artigo 134 e 135, do Código Tributário Nacional ... 102

4.3 O interesse comum exigido pelo artigo 124, I, do Código Tributário Nacional e a confusão patrimonial ... 108

4.4 O artigo 30, IX, da Lei 8.212/91 ... 111

4.5 A aplicabilidade do artigo 50, do Código Civil, ante a previsão do artigo 149, VII, do Código Tributário Nacional ... 116

4.6 Consequências processuais do entendimento adotado: A inviabilidade da discussão da desconsideração da personalidade jurídica no âmbito das execuções fiscais ... 122

CAPÍTULO 5 - A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DOS GRUPOS ECONÔMICOS NA VISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ... 127

5.1 Elementos caracterizadores de grupos econômicos na visão do Superior Tribunal de Justiça ... 127

5.2 O interesse comum exigido para a responsabilização de sociedades pertencentes ao mesmo grupo econômico ... 132

5. 3 O posicionamento divergente da 1ª e 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça acerca do cabimento do Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica .. 138

5.4 Considerações acerca da visão do STJ sobre a responsabilidade tributária de grupos econômicos ... 143

CONCLUSÕES ... 150

REFERÊNCIAS ... 153

(10)

INTRODUÇÃO

Questão que corriqueiramente aparece no dia a dia das lides tributárias diz respeito à responsabilidade tributária de grupos econômicos. Atualmente, tem-se verificado que as sociedades empresárias passaram a atuar em conjunto com outras, explorando a empresa de forma grupada. Sendo assim, comumente se depara com estruturas econômicas em que mais de uma pessoa jurídica atua de forma coordenada e sob um comando unitário com vistas à consecução de objetivos comuns, consistentes na maximização de seus lucros. Inclusive, a exploração de atividades econômicas de forma conjunta, mediante a constituição de grupos já foi estimulada pelo Governo Federal. A exposição de motivos da Lei das Sociedades Anônimas corrobora que a atividade empresarial grupada longe de ser algo desaconselhável é até mesmo desejada.

Ocorre que, não raras vezes, constituem-se pessoas jurídicas de “fachada” com o único intuito de, valendo-se de sua autonomia patrimonial, blindar o patrimônio de outra sociedade integrante do grupo o que, por consequência, lesa credores, dentre eles o fisco.

Nesse contexto, a Procuradoria da Fazenda Nacional, em inúmeros feitos envolvendo execuções fiscais, procura identificar a existência de um comando unitário que pode se revelar das mais diversas formas, com a finalidade de imputar a todas as empresas do conglomerado responsabilidade tributária solidária. Não raras vezes, toda a discussão centra-se unicamente no fato de existir um grupo econômico, como se esse fato, por si só, fosse apto a desencadear a solidariedade.

No âmbito jurisprudencial, vários são os dispositivos invocados. Ora invocam- se os artigos 134 e 135, do Código Tributário Nacional1, ora o artigo 124, I, do mesmo diploma legal2. Com relação ao artigo 124, I3, as autoridades fazendárias, por diversas vezes, visam a tentar elastecer o sentido da expressão “interesse comum” para permitir a solidariedade diante de hipóteses de constatação de fraude na constituição de grupos econômicos. Também se vislumbra que, não raras vezes, o fundamento de validade

1 BRASIL. Lei n. 5.172 de 25 de outubro de 1966. Institui o Código Tributário Nacional. Brasília, DF:

Presidência da República, [2022]. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm. Acesso em: 22 jan. 2022.

2 Ibid.

3 Ibid.

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invocado para a responsabilização passa a ser o artigo 50, do Código Civil4, o qual prevê a desconsideração da personalidade jurídica. Em âmbito doutrinário, por sua vez, há entendimentos tanto no sentido de inexistir possibilidade de responsabilização de grupos econômicos, com base no Código Tributário Nacional e tampouco com fundamento no Código Civil, como há aqueles que advogam a possibilidade de responsabilização dos grupos societários.

Sendo assim, optou-se por investigar o fenômeno dos grupos econômicos à luz dos dispositivos do Código Tributário Nacional, com a finalidade de identificar se há e qual deve ser o fundamento normativo adequado para fins de responsabilização de suas sociedades componentes.

Para tanto, o presente estudo dividir-se-á em 05 capítulos. No primeiro capítulo, procurou-se fixar algumas premissas fundamentais que irão nortear a análise do tema da responsabilidade tributária. Assim, analisa-se no capítulo 1 a norma jurídica tributária e seus critérios, a fim de conseguir explicar, no capítulo 2, de que se trata a responsabilidade tributária. Do mesmo modo, analisou-se os diferentes tipos de relações jurídico- tributárias, a fim de que, posteriormente, fosse possível identificar a natureza da relação instaurada pela norma de responsabilidade.

O segundo capítulo traz uma análise geral do fenômeno da responsabilidade tributária, buscando identificar os seus fundamentos e os limites impostos pela Constituição na eleição de responsáveis tributários. Por sua vez, no terceiro capítulo, faz- se uma análise minuciosa dos artigos referentes à solidariedade tributária e à responsabilidade tributária de terceiros, com a finalidade de estabelecer alguns pressupostos que irão orientar a sua aplicabilidade aos grupos econômicos.

No quarto capítulo, procurou-se identificar em que consistem os grupos econômicos e analisar o seu possível enquadramento nas hipóteses dos artigos 124, I, 134 e 135, do Código Tributário Nacional5. No decorrer dos tópicos, procurou-se trazer as diferentes visões doutrinárias acerca do tema, firmando, ao fim, uma posição acerca de qual entendimento se reputa mais adequado e o porquê. Mais adiante, ainda no capítulo

4BRASIL. Lei n. 10. 406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 22 jan. 2022.

5 BRASIL. Lei n. 5.172 de 25 de outubro de 1966. Institui o Código Tributário Nacional. Brasília, DF:

Presidência da República, [2022]. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm. Acesso em: 22 jan. 2022.

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IV, analisar-se-á a compatibilidade do artigo 50, do Código Civil6, com a matéria tributária a luz do que dispõe o artigo 149, VII7.

Por fim, no capítulo 5, analisa-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema, identificando quais os elementos que se analisa para a identificação de grupos econômicos e quais os artigos que têm sido aplicados a eles. Ao final, critica-se, conforme as premissas fixadas ao longo do trabalho, se o entendimento esposado pelo Superior Tribunal de Justiça reputa-se consentâneo com o ordenamento jurídico brasileiro.

6 BRASIL. Lei n. 10. 406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 22 jan. 2022.

7 BRASIL. Lei n. 5.172 de 25 de outubro de 1966. Institui o Código Tributário Nacional. Brasília, DF:

Presidência da República, [2022]. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm. Acesso em: 22 jan. 2022.

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CAPÍTULO 1 - CONCEITOS FUNDAMENTAIS

Em um estudo que se pretende analisar a temática da responsabilidade tributária de grupos econômicos, reputa-se imprescindível o ingresso em tema essencial à sua compreensão, consistente no estudo da sujeição passiva tributária. Por sua vez, a análise de quem pode vir a ser sujeito passivo de uma determinada relação jurídica, que tenha no polo ativo o Fisco, exige uma investigação acerca do critério pessoal do consequente da regra matriz de incidência tributária e sua correlação com os demais critérios do antecedente8. A fixação de determinadas premissas, portanto, tais como o que se entende por regra matriz de incidência e seus critérios, as espécies de relações jurídicas que possam vir a surgir no âmbito do direito tributário, bem como o papel da ciência do direito e a diferença entre sua linguagem e a do direito positivo, é fundamental para a correta compreensão do tema.

De plano, importa que se rememore que há uma diferença entre a ciência do direito e o direito positivo. Com efeito, o direito positivo pode ser conceituado como um conjunto de enunciados prescritivos9, sobre os quais o intérprete se debruça e extrai um sentido, o qual formula sob o modo de um juízo hipotético-condicional. À ciência do direito cabe a formulação de proposições que visam a elucidar o sentido dos textos de direito positivo10. É, por essa razão, considerada uma metalinguagem, porquanto diz respeito a uma linguagem que toma outra como seu objeto11. As funções da linguagem utilizada pela Ciência do Direito e pelo Direito Positivo, no entanto, são diversas.

A Ciência do Direito, como metalinguagem, toma por objeto a linguagem do direito positivo, a qual possui uma função prescritiva12. Os enunciados prescritivos veiculados pelo direito positivo visam a alterar a realidade e influenciar comportamentos.

Por sua vez, a ciência do direito visa a analisar os enunciados prescritivos postos pelo

8 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade Tributária e o Código Civil de 2002. 3. ed. São Paulo:

Noeses, 2013. p. 29

9 Paulo de Barros Carvalho conceitua o direito positivo como sendo “[...] o complexo de normas jurídicas válidas num dado país”. (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 31. ed. rev. e atual.

São Paulo: Noeses, 2021. p. 06.). No entanto, conforme será exposto adiante, entende-se que norma jurídica é fruto do trabalho do intérprete, sendo extraída dos textos de direito positivo. Por essa razão, é que se opta pode conceituar o direito positivo como o conjunto de enunciados prescritivos, porquanto faz referência ao fruto do trabalho do legislador.

10 Ibid., p. 06.

11 Ibid., p. 07.

12 Ibid., p. 08.

(14)

legislador e organizá-los, emitindo proposições acerca deles, com vistas a transmitir informações. Utiliza-se a linguagem em sua função informativa, além de ser eminentemente descritiva, porquanto visa a descrever seu objeto com a finalidade de permitir a compreensão do fenômeno jurídico13.

Vale lembrar que, segundo as lições de Tércio Sampaio Ferraz Júnior, a Ciência do Direito é um pensamento tecnológico, de modo que visa a fornecer critérios para que os determinados conflitos sociais sejam solucionados, isto é, tem por objetivo a resolução de uma perturbação social da forma mais satisfatória possível14. Desse modo, respeitando os limites semânticos dos enunciados prescritivos postos pelo Legislador, o jurista irá emanar constatações que visam a elucidar qual é a melhor solução frente ao sistema para determinados problemas sociais que venham a surgir15.

Com essas considerações, pretende-se esclarecer que o propósito do presente estudo é, de acordo com as prescrições postas pelo legislador, verificar de que forma se pode dar a responsabilidade tributária de grupos econômicos no ordenamento jurídico brasileiro. O ponto de partida, portanto, será as normas jurídicas passíveis de serem extraídas dos enunciados prescritivos postos pelo legislador. Reputa-se necessário, assim, que se elucide o que se compreende por norma jurídica, já que são sobre as diversas normas acerca da responsabilidade tributária que se debruçará ao longo do presente trabalho.

1.1 A norma jurídica e suas espécies: regras e princípios

Dentre os poucos consensos que se têm no âmbito da ciência jurídica, está o de que texto e norma não são realidades coincidentes. O texto normativo nada mais é do que um enunciado prescritivo. Portanto, é um conjunto de palavras que obedece a uma determinada estrutura gramatical, portador de sentido, que tem por finalidade influenciar o comportamento humano, alterando a realidade social. Trata-se do resultado do trabalho do legislador, consubstanciando-se no produto legislado. Por sua vez, a norma jurídica é um juízo que se forma na mente do intérprete, sob uma estrutura de uma hipótese a qual

13 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 31. ed. rev. e atual. São Paulo: Noeses, 2021. p. 08.

14 FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. A Ciência do Direito. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 67.

15 Ibid., p. 02.

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se liga a uma consequência, caso aconteça seu pressuposto fático16. Daí a razão pela qual comumente se afirma que se trata de um juízo hipotético-condicional. Fruto, dessarte, do trabalho do jurista após ter contato com o texto de direito positivo. Paulo de Barros Carvalho, leciona, por sua vez, que o texto diz respeito ao suporte físico, enquanto a norma pertence ao plano da significação, alcançada após o contato com o texto17.

Dificilmente se encontrará, de maneira expressa, uma proposição posta pelo legislador que ostente de forma evidente uma estrutura que ligue uma hipótese a uma consequência. Via de regra, chega-se à tal estrutura por força da interpretação. Com efeito, ao se analisar os textos jurídicos, observam-se vários dispositivos dispersos que necessitam de interpretação conjunta para que se possa extrair a norma jurídica. Como exemplo, pode-se citar, para que fique claro, os dispositivos do Código Penal. Lá, encontrar-se-á uma série de condutas descritas às quais se atrela uma pena. O crime de homicídio, por exemplo, é previsto pela descrição no artigo 12118 de uma conduta “matar alguém” associada a uma pena. O intérprete ao ler esse dispositivo retira a seguinte conclusão: se um indivíduo matar outro, deverá ser punido com uma pena de 06 a 20 anos. De igual maneira, sucede-se com o Direito Tributário. Haverá que se interpretar os diversos enunciados prescritivos dispostos na legislação a fim de que seja possível construir essa estrutura lógica19.

De todo modo, não se pode perder de vista que nem todas as normas jurídicas possuem uma estrutura normativa idêntica. Em verdade, todas ostentam a estrutura lógica de atrelarem a uma hipótese uma consequência. No entanto, o tipo de consequência prevista pode ser uma conduta específica a ser adotada ou a determinação de que se perquira um estado ideal de coisas a ser alcançado, sem que se consiga, de antemão,

16 Conforme as lições de José Roberto Vieira seria um “[...] juízo hipotético em que se vincula certa consequência à realização condicional de um acontecimento, sendo que a previsão hipotética do evento e a consequência estão conectadas pelo princípio do dever-ser [...]”. (VIEIRA, José Roberto. A Regra Matriz de Incidência do IPI: texto e contexto. Curitiba: Juruá, 1993. p. 57). Geraldo Ataliba, do mesmo modo se manifestava “[...] a estrutura de todas as normas do direito tributário é idêntica à das demais normas jurídicas, sendo passíveis de igual tratamento. Há um tipo de norma que forma o centro do direito tributário, em torno do qual todo ele se estrutura: é a que contém a descrição do fato a que se imputa o comando”.

(ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 11. ed. 6. tiragem. São Paulo: Malheiros, 2010.

p. 52).

17 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 31. ed. rev. e atual. São Paulo: Noeses, 2021. p. 11.

18 BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Institui o Código Penal. Brasília, DF:

Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm.

Acesso em: 12 fev. 2022.

19 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 296.

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identificar um específico comportamento a ser observado. Diferenciam-se, assim, as normas jurídicas em regras e princípios.

Há, na doutrina, várias propostas de diferenciação entre regras e princípios, que nada mais são do que espécies de normas jurídicas. Celso Antônio Bandeira de Mello, por exemplo, afirma que os princípios jurídicos são verdadeiros alicerces de um sistema, compreendendo as vigas mestras de todo o ordenamento jurídico. Roque Antonio Carrazza traz exemplo bastante didático, ao, metaforicamente, equiparar o sistema jurídico a um edifício20. Nele, haverá portas, janelas, luminárias, paredes, alicerces.

Contudo, não se pode olvidar que haverá estruturas que, uma vez abaladas, poderão ruir todo o edifício. Tais estruturas seriam os princípios jurídicos. Por essa forma de se explicar os princípios jurídicos, costuma-se diferenciá-los das regras em razão de possuírem elevado grau de generalidade e abstração.

Humberto Ávila, no entanto, aponta os perigos de se adotar a concepção de que os princípios são normas de elevado grau de generalidade e abstração, denominando essa forma de diferenciação de “distinção fraca entre princípios e regras”21. Afirma que se trata de uma forma fraca de diferenciá-los, pois, em verdade, todas as normas jurídicas são vazadas em linguagem, a qual, pode possuir um grau de vagueza maior ou menor a depender do vocábulo empregado22. Além disso, por essa definição, normas que tradicionalmente são chamadas de princípios, assim não poderiam ser consideradas. Cita- se, como exemplo, o princípio da legalidade, o qual estabelece que nenhum tributo poderá ser criado ou majorado senão mediante lei23. Como se percebe, não há, sob esse aspecto, elevado grau de generalidade e abstração, porquanto o dispositivo é bastante claro acerca da conduta que se veda ou se exige.

Há, ainda, outra forma de se diferenciar os princípios das regras, consistente em distingui-los com base no método de sua aplicação. Tal corrente, capitaneada por Ronald Dworkin e Robert Alexy, parte do pressuposto de que os princípios devem ser aplicados mediante a ponderação, porquanto comportariam dimensão de peso, ao passo que as regras devem ser aplicadas pela sistemática do tudo ou nada, por intermédio da subsunção24. Tal forma de diferenciação, foi denominada por Humberto Ávila de

20 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 33. ed. rev, ampl. e atual.

até a Emenda Constitucional n. 103/2021. São Paulo: Malheiros, 2021. p. 40-41.

21 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 20. ed. rev.

e atual. São Paulo: Malheiros, 2021. p. 111-113.

22 Ibid., p. 112.

23 Ibid., p. 111-113.

24 Ibid., p. 113-114.

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distinção “forte” entre princípios em regras. Contudo, ao aliar-se tal critério à distinção fraca de princípios e regras, chega-se a um problema. Em verdade, permite-se uma flexibilização, não raras vezes, de estruturas normativas que deveriam ser aplicadas por subsunção em razão de o intérprete, de forma arbitrária, considerar tal norma como um princípio, quando em verdade se estava diante de uma regra25. Situação como essa ocorreu recentemente, quando o Supremo Tribunal Federal julgou a questão da majoração das alíquotas do PIS e da COFINS incidentes sobre receitas financeiras26. Na ocasião, a Suprema Corte brasileira flexibilizou a legalidade vista sob a perspectiva de uma regra, unicamente em razão de ser tradicionalmente denominada de princípio da legalidade.

Como se percebe, tal forma de distinção procede a um enfraquecimento de normas bastante importantes do ordenamento jurídico. Ademais, não se pode olvidar, que mesmo as regras precisam ser ponderadas, quando passíveis de serem aplicadas. Afinal, uma regra que, caso aplicada, nitidamente colida com sua própria finalidade, será ponderada e, portanto, afastada. Nota-se, portanto, que, ao que parece, as diferenciações tradicionais entre regras e princípios tendem a trazer problemas grandes de ordem prática.

É por essa razão que, no presente estudo, considera-se pertinente e adequada a diferenciação entre regras e princípios estabelecidas por José Joaquim Gomes Canotilho.

Em sua visão, os princípios são mandamentos de otimização, os quais podem ser implementados de forma gradual, em razão da existência de limitações fáticas e jurídicas porventura existentes. Por sua vez, as regras seriam espécies de norma jurídica que estabelecem de forma imediata as condutas proibidas, permitidas ou impostas27. Tal concepção é bastante condizente com a proposta por Humberto Ávila, que assim define as regras e os princípios:

As regras são normas imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e abrangência, para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência, sempre centrada na finalidade que lhes dá suporte ou nos princípios que lhe são axiologicamente sobrejacentes, entre a construção conceitual da descrição normativa e a construção conceitual dos fatos.

Os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementariedade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação de correlação entre o estado de coisas

25 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 20. ed. rev.

e atual. São Paulo: Malheiros, 2021. p. 115-118.

26 SCHOUERI, Luís Eduardo; FERREIRA, Diogo Olm; LUZ, Victor Lyra Guimarães. Legalidade tributária e o Supremo Tribunal Federal: uma análise sob a ótica do RE n. 1.043.313 e da ADI n. 5.227.

São Paulo: IBDT, 2021.

27 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. São Paulo:

Almedina, 2003. p. 1161.

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a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção.28

Percebe-se, portanto, da definição acima exposta, que quando se está diante de uma regra, o legislador estabelece uma norma que já fornece os critérios para a tomada da decisão, indicando de forma precisa a conduta que se espera. Assim, sua derrotabilidade apenas ocorrerá quando circunstâncias excepcionalíssimas apontarem que sua aplicação, no caso concreto, colidirá com sua finalidade29. Já no caso dos princípios, haverá a imposição de um estado ideal de coisas, sem que se especifique qual a conduta que deve ser adotada para que venha a ser promovido. No entanto, isso não significa que princípios e regras não se relacionem. Em verdade, os princípios, inclusive, servem para orientar as finalidades das regras e conferir-lhe sentido. É sabido que de um determinado texto, mais de uma regra pode ser extraída. Nessas hipóteses, os princípios orientarão a tomada de decisão entre qual o sentido que deve ser atribuído, tendo em vista que deverá ser aquele que melhor promova o estado ideal de coisas por eles imposto30.

Importante, por fim, rememorar que, conforme inicialmente exposto, texto e norma não se confundem. Logo, é plenamente possível que se vislumbre de um mesmo dispositivo mais de uma norma jurídica, assim como também se é possível extrair uma única norma de um conjunto de enunciados prescritivos. Como exemplo, pode-se citar o artigo 150, I, da Constituição Federal. Tradicionalmente, a ele se atribui o fundamento para o princípio da legalidade. Todavia, aplicando as considerações acima expostas, pode- se vislumbrar tanto uma regra quanto um princípio passível de se extrair31. Como regra, tendo em vista que o dispositivo é bastante claro ao estabelece que caso um determinado ente federado resolva majorar ou criar um tributo deverá se valer de uma Lei. A conduta é imposta é bastante evidente no caso, consistente na necessidade de adoção de um determinado veículo normativo específico. Há, ainda, a possibilidade de se extrair um princípio desse dispositivo, consistente no que tradicionalmente se chama de tipicidade tributária, o qual impõe que todos os critérios da regra matriz de incidência sejam traçados com a maior determinação possível.

28 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 20. ed. rev.

e atual. Malheiros, São Paulo, 2021. p. 104 (ÁVILA, Humberto, 2021, op. cit., p. 104?).

29 Ibid., p. 143,149.

30 Ibid., p. 125.

31 ÁVILA, Humberto. Legalidade tributária multidimensional. In: FERRAZ, Roberto (Coord.). Princípios e limites da tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2021. p. 279-282.

(19)

No caso do presente estudo, importa que se rememorem que as normas de responsabilidade tributária, são postas no ordenamento jurídico sob a forma de regras, porquanto estabelecem de forma clara as condutas impostas e proibidas, bem como suas respectivas consequências. Delas, contudo, não se vislumbra efetivo princípio jurídico, em que pese estejam vocacionadas à tutela da liberdade e do patrimônio dos cidadãos.

Assim, sua interpretação deve se dar como forma de garantia do princípio da liberdade.

As normas jurídicas tributárias consistentes na imposição de determinados tributos também parecem seguir a mesma lógica.

Feitas tais considerações, passa-se à análise do que se convencionou chamar de regra-matriz de incidência tributária.

1.2 A regra matriz de incidência tributária

Geraldo Ataliba lecionava que a dinâmica da tributação ocorre sempre do mesmo modo, havendo dois momentos lógicos distintos. Inicialmente, o legislador identifica um fato e diz que tem a potencialidade de dar nascimento a uma obrigação e, posteriormente, ocorre o acontecimento previsto32. Pode-se perceber, portanto, que sempre será necessário que o legislador descreva uma hipótese de incidência, também chamada de suposto ou antecedente, que, uma vez ocorrida, dará ensejo à incidência da norma, fazendo irradiar seus efeitos, com a instauração da relação jurídica prevista no consequente dessa mesma norma.

Há várias formas de se enxergar a composição da norma jurídica tributária.

Geraldo Ataliba, por exemplo, entendia que no antecedente estariam os critérios material, espacial, temporal, pessoal e a base de cálculo do tributo, a qual denominava de base imponível33. Por sua vez, no mandamento, encontrar-se-ia apenas a alíquota. Por essa razão, Paulo de Barros Carvalho chegou a afirmar que tal forma de vislumbrar a compostura da norma jurídica pertencia à chamada escola de “glorificação do fato gerador”.

Contudo, opta-se, no presente estudo, pela sistematização realizada por Paulo de Barros Carvalho, em sua “Teoria da Norma Tributária”34. Crê-se que do ponto de vista

32 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. 11. tiragem. São Paulo: Malheiros, 2010.

p. 55.

33 Ibid., p. 78.

34 CARVALHO, Paulo de Barros. Teoria da norma tributária. 5. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009.

(20)

lógico faz mais sentido que na hipótese de incidência se encontrem os critérios material, espacial e temporal, ao passo que na consequência estarão os critérios pessoal e quantitativo. Pensa-se que se a hipótese traz o conceito35 de um fato que deverá ser identificado no mundo fenomênico, deve conter estritamente os elementos necessários à sua identificação. Por sua vez, tendo em vista que a consequência desenha a relação jurídica que irá se irradiar em razão da ocorrência do fato, nela devem estar os elementos que permitam que se identifique a relação que irá se estabelecer. Ao que parece, a posição que esvazia a consequência de critérios relevantes, nega-lhe a sua importância. No entanto, como bem pondera José Roberto Vieira, se houvesse motivo para se atribuir maior importância a um dos elementos da norma jurídica, deveria se atribuir justamente ao consequente, pois é por meio da relação jurídica que o Direito cumpre a sua finalidade de regular as condutas intersubjetivas36.

Na hipótese de incidência, portanto, haverá um núcleo, consistente no critério material, o qual será formado por um verbo de predicação incompleta. Não se admitem verbos impessoais, pois impediriam que se imputasse a prática do fato a alguém e com isso que se aferisse qualquer manifestação de riqueza37. Diz-se, ainda, que o critério material se refere ao núcleo da hipótese, justamente em razão de o Direito ser uma ordem coativa da conduta humana, de modo que regulamenta as relações intersubjetivas. No entanto, toda a conduta se dá em uma coordenada de espaço e de tempo, as quais são traduzidas pelos critérios especial e temporal. O primeiro indica os limites do território em que o fato deve ocorrer para dar ensejo à incidência da norma. Em uma federação, tal como a delineada pela Constituição Federal de 1988, esse critério possui grande relevância. Por sua vez, o critério temporal dirá respeito ao preciso instante no qual se considera ocorrido o fato descrito na hipótese, permitindo que se analise a legislação que deve ser aplicada para a regência das relações jurídicas instauradas. Na hipótese de incidência, portanto, estará “um conjunto de critérios que nos permitem identificar fatos do universo físico”38.

35 Por conceito, toma-se a forma de apropriação da realidade consistente em conotar propriedades necessárias e suficientes para que se possa aplicar o vocábulo a um dado acontecimento, conforme leciona Misabel Derzi em obra destinada a analisar a diferença entre tipos e conceitos e sua aplicabilidade do direito tributário (DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito Tributário, Direito Penal e Tipo. 3. ed. rev. atual e ampl. Fórum, Belo Horizonte, 2018).

36 VIEIRA, José Roberto. A Regra Matriz de Incidência do IPI: texto e contexto. Curitiba: Juruá, 1993.

p. 62.

37 BAPTISTA, Marcelo Caron. ISS do Texto à Norma. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 123.

38 CARVALHO, Paulo de Barros. Teoria da Norma Tributária. 5. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009.

p. 124.

(21)

Com relação aos três critérios acima apontados, não parece haver divergência na doutrina acerca de sua importância. No entanto, há entendimento doutrinário no sentido de ser também necessária a referência a um critério pessoal no antecedente. Tal critério não se confunde com o critério pessoal previsto também na hipótese de incidência de Geraldo Ataliba, o qual correspondia à previsão de quem figuraria nos polos ativos e passivo da relação jurídica. O critério pessoal do antecedente a que se faz referência diz respeito àquele referido por Sacha Calmon Navarro Coelho, consistente na indicação de quem é que será apto a praticar o verbo descrito no critério material da hipótese e, com isso, desencadear os efeitos do consequente39.

Em verdade, não há divergências quanto à possibilidade de se identificar um critério pessoal no antecedente da regra-matriz. O que há são discussões acerca de sua relevância didática. José Roberto Vieira, por exemplo, entende que a exigência de um verbo pessoal no critério material já supre essa necessidade40. Em sua visão, os tributos que exigem uma qualidade especial do sujeito passivo são raros, como é o caso do ICMS em que se exige uma qualidade específica daquele que promove a circulação de mercadoria. Sendo assim, compreende que a indicação de um critério pessoal na hipótese de incidência equivaleria a uma mera repetição de informações já contidas no critério material.

No presente estudo, entretanto, pensa-se que há relevância em se identificar um critério pessoal na hipótese de incidência, tendo em vista sua influência na explicação da temática da sujeição passiva. Com efeito, se a hipótese de incidência tributária traz a descrição de um fato de possível ocorrência que, por força do princípio da capacidade contributiva, necessariamente deverá ser uma conduta reveladora de riqueza, parece inegável que alguém estará, invariavelmente, praticando-a. Logo, é dessa pessoa que se está presumindo a capacidade contributiva e graduando-se a obrigação tributária. Até porque presume-se que aquele que pratica o fato jurídico detém condições de acessar a riqueza manifestada e, com isso, efetuar o pagamento do tributo, respeitando-se a capacidade contributiva41. Já se pode observar a relevância que tem aquele que pratica a

39 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria geral do tributo, da interpretação e da exoneração tributária. 4. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 106.

40 VIEIRA, José Roberto. A regra-matriz de incidência do IPI: texto e contexto. Curitiba: Juruá, 1993. p.

64-65.

41 Observe-se que Ruy Barbosa Nogueira, inclusive, ao justificar seu conceito de sujeito passivo, dizia que

“como objetivamente a situação fática é de conteúdo econômico, o titular ou beneficiário do fato deve ser em princípio o próprio contribuinte, mesmo porque é com o resultado da realização do fato tributado que ganha para pagar o tributo ou manifesta capacidade contributiva”. (NOGUEIRA, Ruy Barbosa.

Curso de Direito Tributário. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 144.)

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materialidade descrita na hipótese de incidência. Não é por outra razão que Sacha Calmon Navarro Coelho expressamente afirma que a indicação de quem está apto a realizar o fato é relevante para a percepção da capacidade contributiva, graduação da progressividade e reconhecimento das isenções e imunidades subjetivas42. Ademais, a partir do momento que temos em mente que a capacidade contributiva a qual está dando lastro à tributação é daquele que efetivamente pratica o fato, tem-se possibilidade de aferir de forma mais adequada a constitucionalidade das regras de responsabilidade tributária e substituição.

Além disso, a compreensão de que há um critério pessoal no suposto da norma permite que também se entenda com maior clareza o fenômeno da responsabilidade e substituição tributárias43. Conforme ficará mais claro ao longo do presente estudo, pode-se concluir que, em verdade, quando se analisa a compatibilidade das regras que fixam a chamada sujeição passiva indireta, conforme denominada por Rubens Gomes de Sousa, está-se sempre analisando uma compatibilidade e relação entre os critérios pessoais do consequente e do antecedente.

Assim, para fins do presente estudo, compreende que na hipótese de incidência haverá a indicação de quatro critérios: material, pessoal, temporal e espacial.

Por sua vez, tão logo ocorra o acontecimento descrito no antecedente da regra- matriz de incidência tributária, instaurar-se-á o efeito do consequente, que consiste na instauração de uma relação jurídica44. Sendo assim, por questões lógicas, deve o consequente fornecer critérios que permitam a sua identificação. Considerando-se a relação jurídica como um vínculo jurídico que une duas ou mais pessoas em torno de uma prestação45, reputa-se imprescindível que no Consequente da regra-matriz estejam alocados critérios que permitam a identificação de quem ocupará os polos ativo e passivo da relação jurídica46. Ou seja, quem será o titular de um direito subjetivo de exigir daquele posto no polo passivo uma determinada conduta. Esse conjunto de elementos que identificará o sujeito ativo e passivo corresponde ao critério pessoal do consequente, diverso, portanto daquele previsto no antecedente. Por fim, há que se ter elementos que permitam identificar a conduta a ser imposta ao sujeito passivo. No caso do direito

42 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 364.

43 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria geral do tributo, da interpretação e da exoneração tributária. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 106.

44 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 559.

45 CARVALHO, Paulo de Barros. Teoria da Norma Tributária. 5. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009.

p. 91.

46 Ibid., p. 162-163.

(23)

tributário, quando se está diante de normas que imponham obrigações principais consistentes em levar dinheiro a título de tributo, haverá que se ter um critério quantitativo, composto pela base de cálculo e alíquota.

Estabelecida a compostura da regra-matriz de incidência tributária, passa-se agora à análise das relações jurídicas que podem vir a ser instauradas em razão da incidência de normas tributárias.

1.3 A relação jurídico-tributária

Alfredo Augusto Becker, em sua Teoria Geral do Direito Tributário, lecionava que entre duas pessoas inicialmente existe apenas uma separação. No entanto, pode ser que se estabeleça entre elas uma união e, assim, uma relação47. Há diversas formas de relações que podem ser identificadas no corpo social. Relações de amizade, parentesco e assim, por diante. Por vezes, o Direito identifica essas relações previamente instauradas no seio social e confere-lhes uma disciplina jurídica, estabelecendo direitos e obrigações entre as pessoas envolvidas. Há, contudo, situações em que o legislador identifica a necessidade de constituir uma nova relação, sem que haja coincidência com alguma relação social preexistente, de modo que se falará em relações puramente jurídicas. É o caso das relações instauradas no âmbito do direito tributário48.

A relação jurídica será, portanto, uma união entre duas ou mais pessoas, regulamentada pelo Direito. É uma decorrência da incidência de uma norma jurídica49. Tendo em vista que o Direito visa a imprimir uma direção à conduta dos cidadãos, observa-se que a relação jurídica se apresenta como o instrumento necessário para tanto50. Por meio das regras jurídicas, conferem-se direitos a alguém com o correlativo dever a outrem. Lourival Villanova afirmava que o traço característico da ordem jurídica que a difere das demais ordens sociais, é o fato de que o Direito é dotado de coercibilidade, permitindo àquele que é titular de um direito subjetivo exigir o cumprimento forçado de uma conduta imposta a outrem. Consegue-se vislumbrar, assim, que no seio de uma relação jurídica haverá sempre dois ou mais sujeitos de modo que um está obrigado a adotar uma determinada conduta em face de outrem, que pode exigi-la coativamente.

47 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 5. ed. São Paulo: Noeses, 2010. p. 359.

48 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27. ed. 7. tiragem. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 215.

49 BECKER, Alfredo Augusto, 2010, op. cit., p. 361.

50 Ibid., p. 359.

(24)

No âmbito do Direito Público, do qual faz parte o Direito Tributário, percebe-se que também relações jurídicas que se estabelecem. Afinal, em um estado democrático de direito, apenas a Lei pode ser o instrumento hábil a impor obrigações a quem quer que seja. E, para que seja possível que se obrigue alguém a contribuir para os gastos públicos, deve o Estado se valer também da instituição de relações jurídicas, em que passará a ostentar a posição de sujeito ativo frente a seus cidadãos. Alcides Jorge Costa noticia que durante um determinado período de tempo, chegou-se a cogitar da inexistência de relação jurídica no âmbito da tributação51. Entendia-se que o tributo era decorrência de uma relação de poder fundamentada na soberania do Estado. Todavia, hodiernamente, abandona-se tal concepção, tendo em vista que há como se separar o Estado legislador do Estado Administrador52. O primeiro poderá, dentro dos limites que forem outorgados pela Constituição Federal, impor obrigações e, com isso relações jurídicas. O segundo, por sua vez, terá que atuar nos estritos termos em que a lei disciplinou as relações que venham a surgir em decorrência da prática de fatos ensejadores de relações jurídicas tributárias. Ao menos no âmbito do direito brasileiro, parece não haver dúvidas de que as relações travadas entre Estado e Administrado são jurídicas53.

No âmbito do direito tributário, contudo, diversas relações podem ocorrer, tais como a obrigação de pagar tributo, manter escrituração contábil regular, não opor empecilhos à atividade fiscalizatória e assim por diante.54 Todas essas relações visam, de certa forma, a permitir que a arrecadação de uma quantia devida a título de tributo. Daí o porquê se opta por chamá-las de relações jurídico-tributárias55. Pode-se dizer, ainda, conforme leciona Regina Helena Costa que no âmbito do direito tributário, ao menos três relações jurídicas podem surgir56: a obrigação tributária principal, obrigação tributária acessória e a relação jurídica sancionatória, as quais se passa a analisar individualmente.

51 COSTA, Alcides Jorge. Contribuição ao estudo da obrigação tributária. São Paulo: IBDT, 2003. p.

10.

52Ibid., p. 09.

53 Ibid.

54 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 509.

55 Utiliza-se aqui, novamente, as lições de Alcides Jorge Costa que, ao definir o que se compreende por relação jurídica tributária, afirmou: “Uma vez que se fala em relação jurídica tributária, seria necessário definir o que entendemos por “relação jurídica” e por “tributária”. Do conceito de relação jurídica trataremos em seguida. Por seu turno, tributário é o que se refere a tributo”. (COSTA, Alcides Jorge, 2003, op. cit., p. 11, em nota de rodapé).

56 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: constituição e código tributário nacional. 11. ed.

São Paulo: Saraivajur, 2021. p. 208-213.

(25)

1.3.1 A obrigação tributária principal

A primeira espécie de relação jurídico-tributária existente no ordenamento jurídico brasileiro é a obrigação principal, conceituada no artigo 113, §1º, do Código Tributário Nacional como sendo aquela que “surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente”57. Regina Helena Costa afirma que assim é denominada em razão de ser a espécie de relação jurídica mais relevante no direito tributário58.

Como se percebe da redação do dispositivo, o traço distintivo da obrigação principal é que a prestação consistirá em uma obrigação de dar uma determinada quantia em dinheiro, que, segundo o legislador do Código Tributário Nacional, poderá ser a título de tributo ou penalidade. Paulo de Barros Carvalho, crítico à terminologia utilizada pelo Código Tributário Nacional, que inclui o pagamento de uma penalidade como uma obrigação tributária, insurge-se e afirma que a definição trazida pelo artigo 113, §1º briga com o próprio conceito de tributo estabelecido no artigo 3º, do Código Tributário Nacional59.

De fato, o Código Tributário Nacional define tributo como sendo toda “prestação pecuniária compulsória, moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito”60, o que aparentemente poderia gerar perplexidade ante a definição trazida pelo artigo 113, §1º, de obrigação principal. Ocorre que parecem pertinentes as colocações de Luís Eduardo Schoueri acerca do tema. Para ele, as críticas tecidas ao artigo 113, §1º são injustas. A intenção do legislador teria sido unicamente a de deixar claro que mesmo as obrigações impostas a título de penalidade em decorrência do descumprimento de obrigações tributárias consistentes no recolhimento de tributos ou de obrigações acessórias, as quais falaremos abaixo, submetem-se aos mesmos rigores e procedimentos necessários para a cobrança dos tributos em geral61. Ademais, leciona que, em verdade, o adjetivo “tributária” não foi empregado com a intenção de qualificar o objeto da

57 BRASIL. Lei n. 5.172 de 25 de outubro de 1966. Institui o Código Tributário Nacional. Brasília, DF:

Presidência da República, [2022]. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm. Acesso em: 22 jan. 2022.

58 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: constituição e código tributário nacional. 11. ed.

São Paulo: Saraivajur, 2021. p. 209.

59 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 31. ed. rev. e atual. São Paulo: Noeses, 2021. p. 330.

60 BRASIL. Lei n. 5.172 de 25 de outubro de 1966, op. cit.

61 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 513.

(26)

prestação, mas sim com a finalidade de indicar a origem da relação que surge62. Afinal, a relação jurídica sancionatória que implica a imposição da penalidade só terá nascimento caso haja o descumprimento de uma obrigação que tenha o tributo como seu objeto ou alguma prestação tendente a assegurar-lhe o recolhimento63.

Pode-se concluir, dessarte, que o Código Tributário Nacional trabalha, em verdade, com uma dualidade de vínculos que considera obrigacionais. No entanto, sob o manto da obrigação principal, pode-se dizer que está tanto a relação jurídico-tributária, propriamente dita, consistente no dever de recolher uma quantia a título de tributo, quanto a relação sancionatória decorrente do descumprimento de obrigações principais ou acessórias impostas pelo ordenamento jurídico.

1.3.2 A obrigação tributária acessória

O Código Tributário Nacional denomina obrigação acessória as prestações positivas ou negativas previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. São verdadeiras obrigações de fazer ou não fazer impostas com a finalidade de permitir que a Administração Tributária possa fiscalizar o correto cumprimento e eventual inadimplemento das obrigações principais. Percebe-se que sua diferença em relação à obrigação principal está que não contém como objeto uma prestação consistente em levar dinheiro aos cofres públicos. São exemplos de obrigações acessórias escriturar, emitir notas fiscais, prestar declarações, tolerar fiscalização, exibir livros etc.64. Apesar de aparentemente simples, as obrigações acessórias despertam várias controvérsias.

A primeira celeuma em relação às obrigações acessórias diz respeito ao seu caráter obrigacional. Paulo de Barros, por exemplo, entende que não se pode denominar tais relações jurídicas de obrigacionais, justamente pelo fato de faltar-lhes o requisito da

62 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 513.

63 Renato Lopes Becho tem posição bastante semelhante àquela externada por Luís Eduardo Schoueri. Em sua visão: “Evidentemente que a lei poderia ter sido escrita de outra forma. Mas, para nós, basta deixarmos claro que o CTN trabalha com as multas decorrentes do descumprimento do dever fiscal de forma assemelhada ao tratado do tributo. Ambos geram o dever de levar dinheiro aos cofres públicos (obrigação tributária principal). Assim, por exemplo, será constituído como crédito tributário (Título III do Livro Segundo do CTN) tanto o tributo quanto a multa pelo descumprimento da legislação tributária. Ambos passarão a ser tratados como crédito tributário”. (BECHO, Renato Lopes. Lições de direito tributário. 3.

ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 495-496).

64 BALEEIRO, Aliomar; DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito Tributário Brasileiro: CTN comentado. 14. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2018. p. 1085.

(27)

patrimonialidade65. Para ele as obrigações acessórias não são passíveis de serem estimadas em termos econômicos. Não se quer dizer que não gerem custos, pois todos sabem que as obrigações dessa natureza trazem severos ônus a todos aqueles que se prestam a desenvolver uma atividade econômica. No entanto, no direito privado, costuma-se conferir caráter patrimonial àquelas prestações que, uma vez descumpridas, serão passíveis de serem indenizadas. No âmbito direito tributário, uma vez descumprida uma obrigação acessória, não será o fisco necessariamente indenizado, donde predomina o caráter punitivo das sanções impostas por seu descumprimento66. Vale lembrar, ademais, que a própria ausência de patrimonialidade não é aceita sem ressalvas no âmbito doutrinário. Com efeito, Alcides Jorge Costa, por exemplo, compreendia que todas as obrigações acessórias teriam, ainda que indiretamente, conteúdo patrimonial, na medida que só se justificavam caso instituídas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos67.

Crê-se, no entanto, que como leciona José Souto Maior Borges a categoria da obrigação não é um conceito lógico-jurídico, mas sim jurídico positivo68. Cabe, portanto, à legislação de cada país definir o que se entende como vínculo obrigacional ou não. Não é porque no direito privado as obrigações têm como requisito a patrimonialidade, que o direito tributário tenha que conferir o mesmo tratamento às relações jurídicas instituídas em seu campo de atuação69. Assim, não se reputa adequada a crítica formulada no sentido de não ser a obrigação acessória uma relação jurídica obrigacional. Em verdade, o Código Tributário Nacional disciplinou uma dualidade de vínculos obrigacionais: há tanto as obrigações principais quanto as acessórias.

A segunda crítica que se faz à terminologia utilizada pelo Código Tributário Nacional diz respeito ao adjetivo “acessória”. Tal terminologia poderia de remeter à ideia de acessoriedade do direito civil, de modo que só existiriam caso houvesse uma obrigação principal, o que não corresponde à realidade70. Afinal, nada impede que haja obrigações

65 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 31. ed. rev. e atual. São Paulo: Noeses, 2021. p. 325.

66 É nesse sentido a lição de Luís Eduardo Schoueri ao afirmar que “[...] a obrigação acessória’, não tem caráter patrimonial porque seu descumprimento não dá ao credor o direito de reparação indenização”.

(SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 512).

67 COSTA, Alcides Jorge. Obrigação Tributária. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de Direito Tributário. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 221-222.

68 BORGES, José Souto Maior. Obrigação tributária (uma introdução metodológica). 3. ed. rev. e ampl.

São Paulo: Malheiros, 2015. p. 135-137.

69 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: constituição e código tributário nacional. 11. ed.

São Paulo: Saraivajur, 2021. p. 211.

70 SCHOUERI, Luís Eduardo, 2019, op. cit. p. 513.

(28)

acessórias impostas a entes imunes ou isentos, bem como que alguém seja submetido à fiscalização sem que tenha qualquer tributo a ser pago. Em verdade, a acessoriedade a que faz referência o artigo 113, §2º, do Código Tributário Nacional, decorre do fato de que, nas precisas lições de Regina Helena Costa, o liame é estabelecido para “propiciar efetivas fiscalização e arrecadação do tributo”71. Inclusive, parece que a ideia de acessoriedade, nos moldes em que explicados por Regina Helena Costa, permite, que se compreenda com maior clareza os requisitos para que se reputem válidas as obrigações acessórias. Dentre eles, pode-se dizer que a obrigação deve ser instituída de forma que tenha a possibilidade de auxiliar em alguma medida a administração na tarefa de fiscalizar se há a possibilidade ou nascimento de uma obrigação principal72. Ademais, devem ser impostas de modo a observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não sendo impostas como meras comodidades da Administração, tendo em vista que oneram sobremaneira todos aqueles que se dedicam a atividades econômicas73.

1.3.3 A relação sancionatória

Afora as relações jurídicas acima elencadas, há uma terceira espécie de relação que pode surgir no âmbito do direito tributário. Com efeito, espera-se que os contribuintes paguem os tributos devidos, bem como que cumpram as prestações positivas ou negativas que lhes forem impostas pela legislação. No entanto, pode ocorrer de haver o descumprimento da obrigação principal ou acessória, o que acarretará a possibilidade de a Administração Pública aplicar-lhes uma sanção em decorrência da inobservância do comportamento inicialmente devido, inaugurando-se uma nova relação jurídica de índole sancionatória74.

O termo sanção não é unívoco, comportando múltiplos significados. Eurico Marcos Diniz de Santi, por exemplo, identifica três possíveis sentidos do termo75. O primeiro consiste em vislumbrar a sanção como uma relação jurídica de índole reparatória

71 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: constituição e código tributário nacional. 11. ed.

São Paulo: Saraivajur, 2021. p. 212.

72 TAKANO, Caio Augusto. Deveres instrumentais dos contribuintes: fundamentos e limites. São Paulo:

Quartier Latin, 2017. p. 217.

73 CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010, p.

215-217.

74 COSTA, Regina Helena, 2021, op. cit., p. 213

75 SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Lançamento tributário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 39.

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