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DOUTORADO EM PSICOLOGIA SOCIAL PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

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Academic year: 2018

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Os nexos que tecem as competências de futuros

enfermeiros

DOUTORADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

(2)

Os nexos que tecem as competências de futuros

enfermeiros

Tese apresentada à banca examinadora

da Pontifícia Universidade Católica de

São Paulo como exigência parcial para a

obtenção do título de Doutora em

Psicologia Social, sob a orientação da

Profª Drª Sílvia Tatiana Maurer Lane.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

SÃO PAULO

(3)

Os nexos que tecem as competências de futuros enfermeiros

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL

Área de concentração: Categorias fundamentais do psiquismo humano.

DATA DE APROVAÇÃO: .../.../...

BANCA EXAMINADORA:

Dra. Mary Jane Spink – Presidente – PUC-SP: ...

Dra. Cilene Aparecida Costardi Ide – USP: ...

Dra. Sonia Schébel Mercado Sparti – UNISO: ...

Dra. Maria do Carmo Guedes – PUC-SP: ...

Dra. Regina Giffoni Marsiglia - PUC-SP: ...

SUPLENTES:

Dr. Cássio Silveira – Santa Casa: ...

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Dedico

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AGRADECIMENTOS

Estou comemorando, neste momento, a concretização de dois sonhos: a tese de doutorado e o término da construção de minha casa própria.

Como é de praxe, deveria retratar nesta página os agradecimentos. Então comecei a relacionar os nomes das pessoas às quais deveria agradecer (a PUC-SP, os professores, os colegas de trabalho, os alunos, os colaboradores, os funcionários etc.) e, à medida que ia lembrando dos nomes, escrevia algumas palavras de carinho e gratidão pela sua contribuição para elaboração desta tese. Ao ler a enorme lista de nomes, verifiquei que ainda correria o risco de esquecer alguém assim como fetichizar as palavras como se estas pudessem abranger todo o significado que aquela pessoa, em especial, representou.

Quando olho para esta tese, vejo vários fragmentos que se entrelaçam e percebo que, neste trabalho, meu olhar se juntou a muitos outros e dialogou direta e indiretamente com pessoas. Construímos nossa história, interagimos criativamente mediante a ação em que os problemas se tornaram desafios comuns, transformamos e fomos transformados.

Uma história cuja feitura é a soma do que pensaram e pensamos de nós, daqueles que acreditaram, quando achamos difícil acreditar em nós mesmos, do quanto duvidaram, do quanto valemos e do que fizemos para confirmar ou mudar.

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SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS E QUADROS ... 8

RESUMO... 9

SUMMARY ... 10

1 INTRODUÇÃO ... 11

CAPÍTULO I ... 14

2 UMA APROXIMAÇÃO COM A PSICOLOGIA SOCIAL ... 14

2. 1 O problema ... 14

2.2 Objetivo ... 26

3 NAS SENDAS DE UM NOVO FAZER CIENTÍFICO ... 27

3.1 O estudo da esfera subjetiva ... 32

CAPÍTULO II ... 48

4 CURRÍCULO: os elos íntimos e complexos entre escola, conhecimento, ideologia, instituições, identidade e subjetividade. ... 48

4.1 A ESCOLA DE ENFERMAGEM CORAÇÃO DE MARIA: religiosidade X modelo importado... 52

4.2 RUPTURAS E POSSIBILIDADES ... 60

4.3 A Reforma Universitária e a Escola de Enfermagem Coração de Maria ... 70

4.4 Saúde & Educação - acertando o passo para caminharem juntas ... 78

4.5 Superando nova crise ... 81

4.6 Novo currículo mínimo para enfermagem. ... 84

CAPÍTULO III ... 88

5 OS NEXOS QUE TECEM AS COMPETÊNCIAS DE FUTUROS ENFERMEIROS ... 88

CAPITULO IV... 106

6 DIRETRIZES CURRICULARES PARA O ENSINO DE ENFERMAGEM PRIORIDADES IMPLICAÇÕES E DESAFIOS... 106

6.1 O perfil: indo além do aparente ... 109

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LISTA DE FIGURAS E QUADROS

Página Figura 1 – Representação esquemática do complexo “sistema

psicológico” do processo de construção de competência do enfermeiro

40

Quadro 1- Esquema explicativo – religiosidade X modelo importado 59 Quadro 2 – Esquema explicativo – rupturas e possibilidades 69 Quadro 3 – Esquema explicativo – A Reforma Universitária e a Escola

de Enfermagem Coração de Maria

77

Quadro 4 – Esquema explicativo – Saúde e Educação acertando o passo para caminharem juntas

87

Quadro 5 – Perfil do egresso/profissional do Curso de graduação em Enfermagem – PUC-SP – vigente desde 1994

109

Quadro 6 – Perfil do egresso/profissional , traçado pelas Diretoras de Enfermagem de Instituições de Saúde de Sorocaba – 2002

110

Quadro 7 – Perfil do egresso-profissional do Curso de Graduação em Enfermagem, sugerido pelas diretrizes Curriculares – resolução nº3/2001 – art. Nº3

111

Quadro 8 – Perfil do egresso/profissional, traçado pela comissão de reforma Curricular para o Novo Currículo do Curso de Enfermagem da PUC-SP.

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OS NEXOS QUE TECEM AS COMPETÊNCIAS DE FUTUROS ENFERMEIROS.

RESUMO

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THE CONNECTIONS THAT WEAVE THE FUTURE NURSE'S COMPETENCES.

SUMMARY

(11)

1 INTRODUÇÃO

No momento em que o Curso de Enfermagem da PUC-SP discute as Diretrizes Curriculares Nacionais, sentimos a necessidade de fazer uma leitura para além do texto da Resolução nº03 de 2001, instituída pelo Conselho Nacional de Educação. Visto que, as discussões sobre as mudanças curriculares, freqüentemente, se concentram em quais disciplinas devem ser ministradas, e na distribuição de carga horária e corpo docente.

Desejamos experimentar uma mudança de foco do instalado para o novo, da prescrição para crítica, enfim sensibilizar nosso olhar para outros tipos de expressão e possibilidade.

Nosso caminho foi como no filme de Akira Kurozawa “Corvos”, em que o cineasta mostra um homem admirando a obra de Vicent Van Gogh e, de repente, no filme, ele está percorrendo o interior das obras do pintor como se fossem cenas vivas, até chegar ao momento de criação do quadro Corvos.

O quadro que queremos estudar está no poema de Horta (1983), que retrata uma cena do cotidiano, que já vivenciamos quando fomos aluna de enfermagem e que hoje dela participamos no papel de professora.

PARA VOCÊ

Que recebeu

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a sentir, a conhecer, a compreender, a assistir.

Que sorrindo, agradeceu tudo que fiz, quem sabe, sem perceber,

minha insegurança,

mãos trêmulas, falta de habilidade.

Que me estimulou a estudar, pensar,

para melhor cuidar.

Que me mostrou com sua coragem, o que é,

em verdade, a enfermagem.

Wanda Aguiar Horta (1983)

Estudar esta realidade implica admirá-la na sua totalidade, vê-la por dentro decifrar toda a trama de enfrentamento com o instituído historicamente e, deste interior, separá-la em suas partes e voltar a admirá-la, ganhar assim uma visão crítica e profunda da situação.

A pesquisa ação nos possibilitou realizar esse movimento e dialogar com os atores1e autores deste cenário, e em alguns momentos, retomamos os conceitos, os pressupostos e os procedimentos e os relacionamos com a história e com aquelas condições que garantiram a materialidade dos currículos. Vimos que esse diálogo pode ter algum valor de proposta e de mudança e não só definir-se como decifrador e crítico dos fatos que assistimos, como se fôssemos apenas espectadores e testemunhas da história.

Por isso, embora estejamos aqui sozinhas conversando conosco, ao tentar entender este emaranhado de fatos que ocorrem ao tecer as competências de

1

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futuros enfermeiros, pedimos emprestado olhares e diálogos de outras pessoas (alunos, colegas de trabalho e estudiosos no assunto) que, apesar da distância e as lembranças do passado, com suas dúvidas e proposições, contribuíram para elaborar argumentos que possam diminuir a insatisfação desse cenário, que nos é apresentado.

Grandes desafios foram enfrentados, a pesquisa ação não é estática ela está em movimento diretamente dependente de seus participantes, a realidade se apresenta como totalidade é multidisciplinar. Desta forma a pesquisa e pesquisador são reféns das contingências históricas devido seu dinamismo, provisoriedade e transformação.

De um lado, estão as dificuldades de cumprir os prazos estabelecidos que cerceiam as possibilidades de acompanhamento e conclusão do trabalho. De outro, há as grandes questões éticas e científicas do pesquisador, especialmente, em nosso caso quando os papéis se confundem e se mesclam, pois ora somos objeto pesquisado, ora somos autores, ora somos executores da ação.

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CAPÍTULO I

2 UMA APROXIMAÇÃO COM A PSICOLOGIA SOCIAL

2. 1 O problema

Sobre a gênese da burrice: O símbolo da inteligência é a

antena do caracol ‘com a antena tateante’, graças à qual, a

acreditar em Mefistófeles, ele é capaz também de cheirar.

Diante de um obstáculo, a antena é imediatamente retirada

para o abrigo protetor do corpo, ela se identifica de novo com o

todo e só muito hesitantemente ousará sair de novo como um

órgão independente. Se o perigo ainda está presente, ela

desaparecerá de novo, e a distancia até a repetição da

tentativa aumentará. Em seus começos a vida intelectual é

infinitamente delicada. O sentido do caracol depende dos

músculos e os músculos ficam frouxos quando se prejudica o

seu funcionamento. O corpo é paralisado pelo ferimento físico,

o espírito pelo medo. Na origem as duas coisas são

inseparáveis. (ADORNO, p.239, 1985, grifo nosso).

(15)

Psicologia Social, revelando sua origem e sua história no delineamento do problema de pesquisa, cuja missão de pensar em possíveis explicações mostraremos nesta tese.

Inicialmente, o relato de reflexão desse movimento de mudança adaptativa de um pensamento a outro será autobiográfico, e revelo que, à medida que as teorias estudadas na Psicologia Social foram dando sentido, possibilitaram não só estruturar e sistematizar conceitualmente experiências vividas, em cenários sociais e culturais diferenciados, como também serviram como um alicerce motivacional da própria práxis.

Como estudante de pós-graduação no Programa de Psicologia Social, enfrentei o desafio do conhecimento de temas que não fizeram parte de minha formação de enfermeira, pois tinha uma grande dificuldade em debater sobre os temas e expor minhas dúvidas, ou melhor, tinha medo de revelar minha ignorância diante dos colegas.

Ocorreu comigo um processo criador, para superar a menoridade e encontrar motivos para continuar estudando para defesa da tese; esforçava-me reconstruindo meu mundo interno, dando um significado e uma relação entre minhas problematizações, descobertas e conhecimentos adquiridos às questões de meu passado, armazenado até o momento atual como professora do curso de graduação em enfermagem.

(16)

A expressão “em seus começos a vida intelectual é infinitamente delicada” usada por Adorno (1985) se refere, no meu entender, a dar um significado que motive o educando a seguir em frente e não se esconder “como o caracol”.

Freire (2000, p.15) aborda a questão motivação em seu diálogo com Shor2 de forma muito enriquecedora:

[...] Nunca consegui entender o processo de motivação fora da

prática, antes da prática. É como se, primeiro, se devesse estar

motivado para, depois, entrar em ação! Você percebe? Essa é uma

forma muito antidialética de entender motivação. A motivação faz

parte da ação. É um momento da própria ação. Isto é, você se motiva

à medida que está atuando, e não antes de atuar.

Se a motivação não vem antes da ação o que leva o indivíduo a começar a agir, especialmente diante de novas situações?

A afirmação de Freire representa um marco do problema que pretendemos explorar, visto que, como ocorre em outros âmbitos do pensamento e da ação, existe uma preocupação em explicar não só o que, mas como se movem os fenômenos vinculados à relação entre o indivíduo e a ação, já que a ação envolve configurações individuais e sociais: o corpo, a inteligência, os afetos, as relações com as outras pessoas, as instituições, etc.

Na educação, em enfermagem, particularmente, tem sido cada vez maior o distanciamento entre o pensamento e a ação, a teoria e a prática, a academia e o serviço, professor e o aluno. Estes têm causado conflitos entre o saber da enfermagem na teoria e a ação de professores/alunos na prática e o saber da enfermagem na prática e a ação de enfermeiros profissionais.

2

(17)

As pesquisas realizadas nesta área têm sido focadas através do estudo de representações resultantes desses conflitos ou ainda através de pesquisas positivistas, mostrando-nos o diagnóstico do problema e algumas apontam as possíveis soluções.

A primeira dúvida surgiu: o cenário do processo de ensino-aprendizagem, no qual tanto os fenômenos visíveis, dentre os muitos - imprevistos, fracassos, alternativas, superações, transformações, conquistas e celebrações - bem como as emoções - motivos, necessidades, interesses, desejos, prazer, engajamento, significado - integram e condicionam a formação do indivíduo? E logo em seguida surgiu uma segunda pergunta: o que move esse processo?

E o que configuram essas dúvidas?

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brincadeira, tirei a máscara, a professora entrou no quarto e me advertiu diante do paciente.

Naquele momento, fiquei muito envergonhada e, ao mesmo tempo, com raiva, pois não tive chance de me justificar (visto que considerei que não haveria nenhum risco de infecção porque o paciente estava com alta hospitalar) e me desculpar perante o paciente, que ficou assustado sem entender o que estava acontecendo. Em respeito à hierarquia, fui obrigada a sair do quarto sem dizer nada.

Fui repreendida por não ter seguido as regras e normas impostas, prevalecendo a palavra da professora, que avaliou apenas eficiência de “como” (deveria ser) realizei o procedimento, que neste aspecto (naquela época) era incorreto (tirar a máscara e sentar-se à mesa junto ao paciente para atividades recreativas).

Hoje, 30 anos após esse episódio, vivencio o papel inverso, o de professora de enfermagem na mesma escola em que me formei; contudo, devo dizer que algumas vezes me surpreendo reproduzindo, de modo explícito ou velado, a mesma atitude daquela professora. Avalio a aluna “como” (deveria ser) realiza determinada técnica e não ouço o porquê a fez diferente, desconsiderando as suas emoções, para depois fazer as necessárias correções. A este respeito Chauí (1984, p.69) escreve:

Quando examinamos a relação pedagógica na universidade, não

encontramos razões para regozijo. Não se trata aqui, do

autoritarismo próprio dos regulamentos universitários, pois já

sabemos o que são e para que são. Trata-se de uso do saber para

exercício de poder, reduzindo os estudantes à condição de coisas,

(19)

Assim, comecei a refletir sobre se este modelo – autoritário e centrado no professor – é capaz de formar profissionais técnica e emocionalmente competentes para enfrentarem os desafios impostos pelo mundo do trabalho. Sobre este aspecto, Freire escreveu:

Pensar certo – e saber que ensinar não é transferir conhecimento é

fundamentalmente pensar certo – é uma postura exigente, difícil, às

vezes penosa, que temos de assumir diante dos outros e com os

outros, em face do mundo dos fatos, ante nós mesmos. É difícil, não

porque pensar certo seja forma própria de pensar de santos e de

anjos e a que nós arrogantemente aspirássemos. É difícil, entre

outras coisas, pela vigilância constante que temos de exercer sobre

nós próprios para evitar os simplismos, as facilidades as incoerências

grosseiras. É difícil porque nem sempre temos o valor indispensável

para não permitir que a raiva que podemos ter de alguém vire

raivosidade que gera um pensar errado e falso. Por mais que me

desagrade uma pessoa não posso menosprezá-la com um discurso

em que cheio de mim mesmo, decreto a sua incompetência absoluta.

Discurso em que cheio de mim mesmo, trato-a com desdém, do alto

de minha falsa superioridade. A mim não me dá raiva mas pena

quando pessoas assim raivosas, arvoradas em figura de gênio, me

minimizam e destratam. (FREIRE ,1999, p.54)

Com essas palavras Freire nos ensina a ensinar e toca no ponto crucial: a ética pedagógica fundamentada em pensar certo com atitude firme e exigente porém com humildade, tolerância e generosidade. E condena a postura arrogante e de superioridade adotada pelo professor, uma vez que a posição que ocupa favorece essa atitude.

(20)

O fazer, presente, na enfermagem, as técnicas com a sua seqüência

e todos os riscos envolvidos, assim como a preocupação com o

uniforme, a apresentação pessoal e postura profissional, com o

controle do comprimento do cabelo, das unhas, da saia, do jaleco, do

modo de ser, do uso do tempo, controle do medo, demonstram que a

enfermagem é uma profissão em que as minúcias, os detalhes

constroem e fazem parte de seu cotidiano. (LUNARDI, 1994, p.160).

Lunardi (1994, p. 258) aponta códigos que podem estar presentes na enfermagem e na formação de enfermeiros “a busca de uma normalidade representada pelo calar, abafar, reprimir e controlar os medos, as ansiedades e até os pavores do que temem enfrentar e a busca também de uma aparente linearidade nas relações de poder”.

É surpreendente como esses códigos resistem ao tempo, e como professores/enfermeiros estamos reproduzindo-os sistematicamente, uma vez que configuram ainda hoje as ações do aluno. Para exemplificar esta afirmação apresento algumas respostas encontradas num questionário3 aplicado no início de cada ano, da disciplina de Enfermagem Pediátrica, que ministro. Uma das questões é “Cite duas situações vivenciadas durante o curso de enfermagem que afetaram você emocionalmente, e diga como você as enfrentou?”. Eis algumas respostas:

“Várias situações nos afetam diariamente, porque sempre

estamos lidando com a vida e a morte, mas o que mais

me afeta é o descaso de médicos e enfermeiros quanto

ao cuidado do (sic) paciente.” (Aluno A/05).

“O primeiro exame físico que realizei foi num paciente que

tinha uma patologia chamada Pênfigo eritrodérmico, sua

3 O questionário tem no início o seguinte esclarecimento: O objetivo deste questionário é coletar dados para a operacionalização do plano de

(21)

aparência era meio assustadora para mim. Eu realizei o

exame normalmente evitando expressar o sentimento que

estava passando (medo e pena), mas com o tempo

compreendi que a enfermagem deve encarar as coisas de

frente e tentar passar um pouco de energia positiva para

os doentes através de suas ações.” (Aluno B/05)

“Vi uma coleta de líquor num garotinho de 8 anos de

idade. Saí do quarto e desmaiei. Tenho muito medo de

realizar qualquer procedimento que vá causar dor ao

paciente. Fico nervosa, boba e passo mal.” (Aluno C /04)

“Passei por uma situação em que o paciente que estava

prestando assistência veio a falecer, e isso aconteceu no

1º ano do curso... no momento fiquei um pouco abalada,

mas depois de conversar com algumas pessoas consegui

entender, e encarei como um processo natural.” (Aluno

D/05)

“Quando fui fazer estágio de saúde coletiva na área

verde, local cheio de barracos e muita pobreza, fiquei

muito abalada ao ver a situação daquelas pessoas, porém

não deixei transparecer para eles minha impressão.

Porém, fiquei pensando naquelas pessoas por um bom

tempo.” (Aluno E/04)

Com esses depoimentos, verifica-se que o processo de aparecimento de novas formas de comportamento dos alunos é configurado a partir do conteúdo extraído da ideologia e dos códigos do meio que os rodeia como apontou Vygotsky (1999, p. 117) e assim como Lane (1999, p. 17) escreveu:

Caberia ainda, na especificidade psicossocial, uma análise das

relações grupais enquanto mediadas pelas instituições sociais e

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papéis sociais e representações decorrentes de atividades e relações

sociais tidas como “adequadas, corretas, esperadas”, etc.

Isso quer dizer que, diante das novas experiências (a morte, insensibilidade dos profissionais, a miséria, cheiro e aparência repugnante) o aluno é “treinado” a reprimir as suas emoções de forma a “não deixar transparecer” e deverá inclusive passar uma “energia positiva através de suas ações”, ele é treinado a não sentir medo e caso fracasse e sinta medo, ele mesmo se condenará, taxando-se de bobo e infantil.

O aluno de enfermagem, durante todo o curso, enfrenta esses elementos de sentido que são inúmeros. Alguns se destacam e deixam marcas difíceis de apagar: a agonia da morte, expressão do olhar, insensibilidade dos profissionais e professores, discriminação, humilhação, comentários negativos, gritos de dor, choro de criança, cenas e cheiros repugnantes, alegria, nudez, intervenções invasivas tanto físicas como psíquicas, conflitos interpessoais, manipulação de crenças, valores e hábitos.

(23)

E, ao perguntarmos a este professor se o tema morte foi incluído em sua aula, ele negará, alegando que sua especialidade é anatomia e caberá ao professor de ética ou psicologia, falar sobre morte e morrer. Outra alegação será a falta de tempo, visto que a disciplina tem conteúdo grande a cumprir e uma carga horária apertada. Segundo Shor (2000, p.12).“Os professores enfrentam aulas demais, alunos demais, e controle administrativo demais de tal modo que a necessidade de alguma coisa que funcione em classe é muito maior do que uma aparente necessidade de teoria”

Por outro lado, a negação dos sentimentos e necessidades também está representada no cotidiano do profissional enfermeiro. Como demonstrou um estudo realizado por Takahashi (1991, p.228) sobre a emoção na prática de enfermagem segundo relatos de enfermeiros de UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) e UI (Unidade de Internação) de três hospitais da rede municipal de São Paulo: “A emoção interfere negativamente no desempenho profissional, portanto: o profissional não deve sentir emoções; o profissional deve controlar emoções” e ainda para o enfermeiro de UTI é explicitado que:

[...] o enfermeiro deve negar-se enquanto pessoa, valorizando

exclusivamente o objeto de seu trabalho. Assim: o enfermeiro deve

valorizar as necessidades dos pacientes e familiares; o enfermeiro

deve negar seus sentimentos, suas dores e suas necessidades; o

enfermeiro não deve permitir que questões pessoais interfiram na

sua prática profissional. (TAKAHASHI, 1991, p.228).

(24)

de Takahashi (1991) e Lunardi (1994) é a mesma de nossos alunos de enfermagem de hoje ante um cenário completamente diferente e distante (em tempo e espaço).

Destacamos que há 14 anos os estudos de Takahashi (1991, p. 227) mostraram a coexistência dos reflexos do contexto social determinante nos problemas inerentes ao enfermeiro, e evidenciam o importante papel das escolas que:

[...] durante todo o processo de formação dos enfermeiros, acabam

por transferir-lhes ou reforçar-lhes conceitos e valores muitas vezes

inviáveis à sua própria natureza humana. [...] Ainda, constatam-se

perfis profissionais divergentes entre ensino e a prática, levando à

maior fragmentação dessa Identidade.

E ainda propõe que, na formação do enfermeiro essas emoções não sejam contidas, mas canalizadas para atividades afetivas.

Todavia, o aluno encontra-se ainda nessa trama enfrentando o “sofrimento psicossocial” explicado por Sawaia (1994, p.50) "[...] como sofrimento que age rompendo o nexo entre o agir, o pensar e o sentir. O processo que usa é a supressão da emoção por senti-la suspeita e por não saber transformá-la em pensamento e ação, bem como a anulação do pensar na atividade...”, como conseqüência, aliena-se, e a ação torna-se mecânica e pragmática.

Outro achado evidenciado na pesquisa de Lunardi (1994) e que coincide com os de Takahashi (1991), é a contradição entre o ensinado nas escolas de enfermagem e os modelos encontrados na prática.

A autora vai mais longe revelando a denúncia de duas escolas pesquisadas:

[....] muitas minúcias ensinadas não são executadas, devido às

(25)

aprendizagem do fazer de modo correto. Estes se remetem a duas

possibilidades. A primeira, seria uma conivência velada presente na

formação de que apesar da aprendizagem da execução correta do

fazer, as estudantes e as enfermeiras poderiam executar de modo

incorreto este fazer, numa realidade em condições mais precárias,

seja de recursos materiais ou humanos. Esta possibilidade se

constituiria na aceitação, sujeição e conformismo de que se ensina o

correto, o ideal, para uma realidade com pacientes que tenham

condições financeiras de pagar esse correto e este ideal. E ainda

uma segunda possibilidade [...] seria o ensino de detalhes que

poderiam não comprometer a correção do procedimento e a

segurança do paciente, mas se constituiriam, na verdade, num

“aprimoramento”, ou melhor, num “aperfeiçoamento” disciplinar de

um procedimento ou de uma técnica. (LUNARDI, 1994, p.161, grifo

da autora)

O percurso que fizemos até aqui apontou-nos, o problema da relação entre o “deve ser” e as formas de fazer ou o trabalhar, e nos pede reflexão crítica sobre o enfrentamento com o instituído, ou seja, explicar porque o ensino de enfermagem se desenvolve tal como fazemos e porque tem sido assim através dos tempos.

(26)

2.2 Objetivo

A Enfermagem é uma prática social e como tal determinada historicamente. Nos movimentos de reforma curricular do curso de enfermagem da PUC-SP, pretende-se:

a) Explicar dialeticamente, pela perspectiva sócio histórica, a gênese da subjetividade social que produz os sistemas de sentidos na ação educativa.

(27)

3 NAS SENDAS DE UM NOVO FAZER CIENTÍFICO

A grande idéia básica de que o mundo não deve ser visto como um complexo de objetos completamente acabados, mas sim como um complexo de processos, no qual, objetos aparentemente estáveis, nada menos do que suas imagens em nossas cabeças (nossos conceitos), estão em incessante processo de transformação....

[...] Aos olhos da filosofia dialética, nada é estabelecido por todos os tempos, nada é absoluto ou sagrado. Vê-se em tudo a marca do declínio inevitável; nada resiste exceto o contínuo processo de formação e destruição, a ascensão interminável do inferior para o superior – um processo do qual a filosofia não passa de uma simples reflexão no cérebro pensante. FRIEDRICH ENGELS, Luidwing Feuerbach

A nossa jornada na busca de teorias e de método foi conduzida por vários pensadores, fluiu nas curvas e brechas das idéias que, integradas, formaram um conhecimento multidimensional que nos deu uma noção de como apreender as múltiplas faces deste estudo.

O caminho foi penoso, com vários obstáculos, atalhos e desvios, que algumas vezes nos faziam retornar ao ponto de partida, e muitas vezes nos perdíamos no labirinto epistemológico.

Ainda fortemente condicionados ao determinismo cartesiano, as dúvidas eram grandes, e traziam consigo o problema do método:

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Há uma teoria explicativa que permita verificar a parte no todo e o todo na parte de modo metodologicamente controlado?

Como prever a utilidade desta tese para outras escolas, se os fenômenos estudados são histórica e culturalmente determinados, se os seres humanos modificam o seu comportamento em função do conhecimento?

Como apreender os fenômenos sociais se eles são subjetivos e como tal não se deixam captar pela objetividade?

A tentação era grande: uma voz interior, com tendência racionalista junto com a positivista, nos intrigava com a idéia clássica da compartimentação, da fragmentação, da redução ao simples e ao lógico, dando valor a procedimentos que isolam amostras controláveis e testáveis.

“Isole um grupo e estude-o separadamente, atue sobre ele e depois

compare-o ccompare-om um grupcompare-o ccompare-ontrcompare-ole” um ccompare-orcompare-o ncompare-os ccompare-onduzia. O resultadcompare-o da pesquisa,

inevitavelmente, seria apenas a descrição da experiência e constatação de fatos já confirmados em outras pesquisas como: o profissional enfermeiro se constrói não só na objetividade, mas também na subjetividade.

Outra abordagem que nos atraía era analisar a interação professor-aluno, restringindo o objeto de pesquisa ao indivíduo, com tendência a psicologizar os problemas.

(29)

A Psicologia Social nos acolheu e ensinou como olhar para o objeto em estudo e compreender como ocorrem as inter-relações dos diferentes processos e contextos da prática educativa.

Além disso, nos aproximou de Vygotsky4 (2000, p.77) que propõe um reexame dos métodos de investigação psicológica mais do que uma simples modificação dos métodos de experimentação psicológica, que se baseiam numa estrutura estímulo-resposta.

Assim, a seguir, serão desenvolvidas algumas considerações sobre os pressupostos teóricos e epistemológicos no processo de produção de conhecimento, para efeito deste trabalho, sem a pretensão de esgotar o assunto, que para alguns podem parecer óbvias, mas que foram necessárias para alicerçar e subsidiar nossa discussão, assim como responder nossas dúvidas iniciais sobre o método.

Para Vygotsky (2000), a abordagem na análise das funções psicológicas é formada por três princípios:

a) Analisar processos e não objetos: qualquer processo psicológico ou do comportamento voluntário é um processo que sofre mudanças a olhos vistos.

Assim sendo, nosso estudo não é sobre um objeto que pode ser examinado a qualquer momento, que ficará parado à nossa espera. Pode durar segundos, ou dias e semanas; por isso, ele recomenda que a tarefa básica da pesquisa seja reconstruir cada estágio de desenvolvimento do processo, fazendo com que o processo retorne

4

(30)

ao estágio inicial. É importante salientar o que Rey (2003, p.202) escreve em relação aos processos sociais:

A constituição do indivíduo dentro da subjetividade social não é um

processo que siga uma trajetória universal, definida de forma

unilateral pelas características dos espaços sociais dentro dos quais

os indivíduos vivem. Pelo contrário, a constituição social do indivíduo

é um processo diferenciado, em que as conseqüências sociais

implicadas e para os indivíduos que as formam dependem dos

diferentes modos que adquirem as relações entre o indivíduo e o

social, dentro das quais ambos os momentos têm um caráter ativo,

isto é, cada momento se configura de formas muito diversas ante a

ação do outro, processo que acompanha tanto o desenvolvimento

social como o desenvolvimento individual.

b) Explicação versus descrição: a mera descrição não revela as relações dinâmico-causais reais subjacentes ao fenômeno. Difere da análise fenomenológica que se baseia nas características externas do fenômeno fenótipo, ele prefere explicar a origem (genótipos), isto é, a essência do fenômeno psíquico. Assim, são necessários meios especiais de análise científica para descobrir as diferenças internas e escondidas pelas similaridades externas.

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Do ponto de vista do estudo histórico do desenvolvimento, Vygotsky (2000) propõe que a procura de um método é um dos problemas mais importantes de todo o empreendimento para a compreensão das formas caracteristicamente humanas de atividade psicológica. Neste caso, o método é, ao mesmo tempo, o pré-requisito, o produto, o instrumento e o resultado do estudo.

Rey (2003, p.192) relata que Leontiev observou que a tese principal de Vygotsky nos mostrou caminhos para compreensão da psique não como um objeto pontual, mas como um sistema complexo e dinâmico organizado em sistemas de sentido.

Por isso, nossa pesquisa será realizada dentro de uma visão sócio histórica cultural das relações professor-aluno e como se integram o complexo sistema dinâmico de sentidos que inclui os aspectos afetivos e sociais (situações vividas) tecendo uma rede de significados pelos laços que unem à linguagem (emoções), ao universo ideológico, do simbólico e das representações no processo de ensino e de aprendizagem. É importante destacar que estaremos entrando num mundo de relações entre cenários, conhecimento, poder, instituições, pessoas e ideologias.

Em conseqüência, para explicar o complexo sistema psicológico da formação do profissional enfermeiro, consideraremos o processo e não o objeto, neste sentido, optaremos em explicar a origem do fenômeno psíquico e também nos concentraremos no desenvolvimento e não no produto.

(32)

3.1 O estudo da esfera subjetiva

“Como exprimir-se um coração, como outro irá entender...”

.Tiúttchev.

Este verso citado por Vygotsky em seu livro “A construção do pensamento e da linguagem” (2001), nos fala como é complexa e delicada a comunicação da dimensão subjetiva.

Chamou-nos a atenção, pois, tem sido uma de nossas dificuldades quando buscamos no discurso a produção de sentido nos movimentos das configurações simbólicas que atravessam o cotidiano de um processo. Como integrar essa dimensão complexa, sistêmica, dialógica e dialética na compreensão da constituição das formas superiores de organização do psíquico que pretendemos estudar?.

A comunicação é complexa, pois quando a linguagem se materializa – na fonética, na morfologia, no léxico, na semântica, no ritmo, na música – as categorias gramaticais escondem as categorias psicológicas.

(33)

signos, os desenhos, o silêncio e os gestos. Incluem-se também nas categorias psicológicas individuais dos interlocutores as diferenças como: cultura, idade, gênero, posição econômico-social, raça, experiências, crenças, ideologias.

Vygotsky (2001) condena o método de análise psicológica que decompõe a totalidade psicológica complexa em elementos, isto é, resolver a questão do pensamento e da linguagem, decompondo-a em pensamento e linguagem. Explica com a seguinte analogia: se uma pessoa ao tentar explicar cientificamente qualquer propriedade da água – a água apaga o fogo – ao dissolver a água em hidrogênio e oxigênio como meio de explicação dessa propriedade nunca poderia explicar que a água apaga o fogo, pois esses elementos são voláteis e oferecem combustão.

O autor justifica com seguinte explicação, que embora longa transcreveremos para uma melhor compreensão:

[...] a relação entre o pensamento e a palavra não é uma coisa mas

um processo, um movimento contínuo de vaivém do pensamento e

da palavra, e vice versa. Nesse processo, a relação entre o

pensamento e a palavra passa por transformações que, em si

mesmas, podem ser consideradas um desenvolvimento no sentido

funcional. O pensamento não é simplesmente expresso em palavras;

é por meio delas que ele passa a existir. Cada pensamento tende a

relacionar alguma coisa com outra, a estabelecer uma relação entre

as coisas. Cada pensamento se move, amadurece e se desenvolve,

desempenha uma função, soluciona um problema. Esse fluxo de

pensamento ocorre como um movimento interior através de uma

série de planos. Uma análise da interação do pensamento e da

palavra deve começar com uma investigação das fases e dos planos

diferentes que um pensamento percorre antes de ser expresso em

palavra. A primeira coisa que esse estudo revela é a necessidade de

se fazer uma distinção entre dois planos da fala. Tanto no aspecto

interior da fala – semântico e significativo – quanto no exterior –

(34)

próprias leis de movimento. A unidade da fala é uma unidade

complexa, e não homogênea. (VYGOTSKY, 1999b, p.156)

A palavra representa uma unidade viva do som e significado, por exemplo: as companhias de bebidas alcoólicas foram proibidas de utilizar imagens infantis atrativas para crianças em suas propagandas, porém a lei foi sancionada depois de uma dessas empresas exibir tais imagens por vários meses. Com o impedimento, a empresa tirou as imagens proibidas, mantendo apenas o slogan com as palavras: nã nã nã nã; para quem não acompanhou todo o processo, essas palavras não têm nenhum significado; porém, para outros, ao lerem estas palavras lembrarão da cerveja e dos caranguejos abaixando as calças e mostrando o bumbum falando nã nã nã nã (com ritmo próprio) e desaparecendo no mar após terem bebido a cerveja do homem.

Assim, o som da palavra desprovido de sentido ecoa como outros sons da natureza, do mesmo modo, o significado desprovido do som da palavra se transforma em mera representação reproduzindo a ideologia. Sem significado a palavra torna-se um som vazio.

Na música Palavras, dos Titãs, escrita por Marcelo Fromer e Sérgio Brito, há o seguinte trecho:

“ palavras não são más.

Palavras não são quentes

palavras são iguais

sendo diferentes...”

(35)

Vejam as mudanças da palavra amarelo nas frases que seguem: Ela deu um sorriso amarelo. Hoje o brasileiro vestiu verde e amarelo. Nos momentos finais do jogo o time amarelou.

Se isolarmos as palavras amarelo das frases acima, elas serão iguais, representarão o significado congelado no dicionário: da cor do ouro, da gema do ovo, do enxofre.

Por isso, devemos substituir o método de decomposição pelo método de análise que desmembra em unidades. Segundo Vigotsky (2001) essa unidade pode ser encontrada no aspecto interno da palavra: no seu significado é que se encontra o pensamento verbalizado. Vigotsky (2001) adverte que o determinante da natureza interna do significado não está onde se costuma procurar. “a palavra nunca se refere a um objeto isolado mas a todo um grupo ou classe de objetos. Por essa razão, cada palavra é uma generalização latente ...” Desta forma, possibilita, por intermédio da análise do sentido da linguagem do sujeito, verificar a parte no todo e o todo na parte, esclarecendo uma das nossas dúvidas iniciais relacionada ao método. E complementa:

[...] Sendo assim, fica evidente que o método de investigação do

problema não pode ser outro senão o método da análise semântica,

da análise do sentido da linguagem, do significado da palavra. Nesta

via é lícito esperar resposta direta à questão que nos interessa – a

da relação entre pensamento e linguagem, porque essa relação faz

parte da unidade por nós escolhida, e quando estudamos a

evolução, o funcionamento, a estrutura e o movimento dessa

unidade, podemos apreender muito do que nos pode esclarecer a

questão do pensamento e da linguagem, da natureza do

(36)

Voltemos aos exemplos da palavra amarelo: Um sorriso amarelo em nossa região significa desinteresse. Vestir verde amarelo significa patriotismo para todo brasileiro. O time amarelou em nossa região significa que se acovardou.

Para muitos não seriam necessárias estas explicações pois a palavra traz consigo uma significação isto é uma generalização latente. Do que decorre que, a generalização não tem natureza universal, o significado é definido em cada momento da história, lugar, cultura e experiências vividas.

Assim, as palavras só terão sentido e significado com os sujeitos que lhes dão “recheio”. Nós é que engravidamos as palavras, escreveu Merhy (2005) em um texto utilizando uma metáfora do processo de engravidamento das palavras citando o caso da

Integralidade no setor da Saúde:

[...] com muita facilidade, no caso da integralidade – que procura

expressar uma categoria analítica para o pensamento, com a

intenção de ser portadora de uma formulação de mudanças radicais,

para as ações de saúde – adotamos a postura de que a palavra é

portadora de sentido e significado por si e que basta adotá-la no

nosso falar, para sentirmos profundamente inovadores. Não é

assim. Somos testemunhas, no dia–a-dia dos nossos serviços, de

que são muitos os que falam em integralidade e que isso não

significa necessariamente que sejam protagonistas de novas

práticas de saúde. (MERHY, 2005, p.195).

(37)

categorias de ação visto que estas pressupõem a parceria, o diálogo. Minayo, (1996), afirma que:

[...] é o paradoxo da saúde no interior do fenômeno da doença, seu

potencial criativo. A riqueza dos mundos físicos e biológicos, a

infinita diversidade das formas de adaptação individual e social, as

imensas possibilidades de reconstrução de significados e da vida

cotidiana, que estão à disposição de profissionais e investigadores

da saúde para que possam compreendê-la e agir.

As pesquisas científicas que buscam compreender os aspectos da comunicação humana têm, inclusive, que dar clareza e transparência aos seus métodos e pressupostos epistemológicos para validar o conhecimento criado por sujeitos individuais e coletivos. Trata-se de um desafio muito grande uma vez que nem Vygotsky (2001) demonstrou certeza quando escreveu o resumo do resultado básico de toda a sua pesquisa:

Os processos que se consideravam tolhidos de modo uniforme

e imóvel são, de fato, interligados pela mobilidade. O que antes

se considerava uma construção simples, a pesquisa mostrou

que é complexa. No nosso empenho de delimitar os aspectos

externo e semântico da linguagem, a palavra e o pensamento,

não existe nada a não ser a aspiração de colocar em um

aspecto mais complexo e em um vínculo mais sutil a unidade

que, em realidade, é o pensamento discursivo. A complexa

estrutura dessa unidade, os complexos vínculos e as tradições

entre planos isolados do pensamento verbal só surgem no

desenvolvimento. (VYGOTSKY, 2001, p.483, grifo nosso)

(38)

é diferença, é interpretação de contrários, são infinitos processos que formam um só.”

Os pressupostos acima descritos deram uma ligeira noção de como trabalhar, porém o verdadeiro desafio é por onde começar?

Os indicadores da subjetividade aparecem por meio das mais diferentes formas de expressão e estão em desenvolvimento. Sendo um processo, não podemos congelar imagens, criar um universo empírico, estudar o fenômeno em grupos fora de seu cotidiano, porque assim se naturaliza e nos distanciamos das questões do dia a dia.

Spink, P.K, (2003) responde algumas das questões acima, conceituando um campo-tema: não é um lugar específico, delineado, separado e distante, mas se refere a processualidade. É um complexo de redes de elementos de sentidos que se interconectam. Pode ocorrer em qualquer lugar de interação social, bem como mediada por jornais, revistas, rádio, televisão, documentos públicos, artefatos, documentos de arquivo. Alguns podem acontecer com hora marcada com bloco de anotações e gravador.

Neste sentindo o pesquisador não só rompe com a neutralidade como também se torna sujeito ativo, participativo e reflexivo na produção teórica.

[...] a psicologia deve sair do campo das crenças produtoras de

certezas para entrar na aventura infinita da construção dos

complexos processos e configurações que caracterizam a

subjetividade como ontológica. Estamos no momento de estimular o

desenvolvimento de teorias locais que dêem conta das zonas de

sentido sobre o estudado, que não aparecem nas teorias clássicas

(39)

metafísicos implicados na certeza”.(MORIN, 2000, p. 77 apud REY,

2003, p.273)

Depois desta jornada chegamos a um ponto de parada para reflexão, e arriscamos em considerar que pesquisar em Psicologia Social é explicar toda materialidade encontrada nos mais diversos meios das tramas sociais, o que será confrontado e entrecruzado com o diálogo com as teorias locais para explicar o estudado e ampliar saberes e buscar caminhos próprios de soluções inovadoras. É um processo de construção de conhecimento sobre o objeto (devir, gênese, desenvolvimento, crise), tem caráter contrutivo-interpretativo (sistematização, essência e relação das coisas).

Então, ao organizar e reclassificar toda documentação coletada, demos conta de que a Tese estava sendo, pois nessa busca de encontrar significado para o problema em estudo, trabalhávamos juntamente com outros professores do curso, na solução desses problemas com a Reforma Curricular do Curso de Enfermagem.

(40)

Neste espaço, confrontam-se diferentes culturas e linguagens, diferentes interlocutores e diferentes cenários que freqüentemente divergem em relação às maneiras de ensinar e aprender, bem como em relação às estratégias que devem ser usadas e valorizadas.

Fig. 1 Representação esquemática – O complexo “sistema psicológico” do processo de construção de competência de futuros enfermeiros.

Não pretendemos, contudo, apenas alinhar as opiniões, mas o confronto dos diferentes olhares e esse diálogo coletivo é a maior riqueza deste estudo.

Dando continuidade aos ensaios de nossos primeiros passos de um novo fazer científico, decidimos nos embrenhar pela pesquisa da ação participante e, portanto, ao mesmo tempo desempenhar o papel no grupo como sujeito e pesquisadora. Também adotamos a “prática reflexiva” proposta por Shön (1982)

ENFERMEIRO: generalista, humanista, crítico e reflexivo

COMPETÊNCIAS

Dimensão técnica-científica Dimensão sócio-educativa Dimensão ético-política Dimensão percepção: avaliação antecipação e decisão

ELEMENTOS DE SENTIDO

Professor Aluno

Usuário Profissionais CONTEXTOS SOCIAIS PRODUTORES DE SENTIDO CURRÍCULO HISTÓRIA DO SUJEITO Diretrizes Curriculares do MEC

Projeto pedagógico da PUC-SP

(41)

citado por Moreira (1995) que compreende três componentes: conhecimento-em-ação, reflexão-em-ação e conversa-reflexiva-com-a-situação. Este último componente, segundo Moreira (1995) em transação com os materiais contextuais e os demais atores dá margem à descoberta e permite repensar a compreensão dos problemas e planejar o esquema da situação e propor possíveis soluções.

Sobre o pesquisador, dois conceitos se destacam:

Primeiro Oliveira Rosika e Oliveira Miguel (1981) apud Franco (2001, p.215), dizem:

Se o objetivo do pesquisador é contribuir para a

problematização uma clarificação da prática vivida pelo grupo,

ele deve preservar uma distância crítica da realidade e a ação

cotidiana do grupo. A verdadeira inserção implica, portanto,

uma tensão permanente entre o risco de identificação

excessiva do pesquisador com os protagonistas da situação em

que está inserido e a necessidade de manter um recuo que

permita uma reflexão crítica sobre a experiência em curso. É

preciso, justamente alcançar uma síntese entre a militante de

base e o cientista social, entre o observador e o participante

sem sacrificar nenhum dos dois pólos desta relação.

De outro lado, Góis e Ximenes (1998) dizem:

Há uma imensa capacidade da mente humana de estudar a si

mesma e o mundo objetivo, de se compreender como objeto de

si mesma e sujeito do mundo estudado e vivido, de ser parte e

de ser todo, de ser criatura de ser criador, de mudar o instante

e de ser mudado por ele, seja no cotidiano comum ou no ato de

investigar a si e a tudo mais.

(42)

A partir de um enfoque fundamentalmente interdisciplinar, o

pesquisador-produto-histórico parte de uma visão de mundo e

do homem necessariamente comprometida e neste sentido não

há possibilidade de gerar um conhecimento “neutro” nem um

conhecimento do outro que não interfira na sua existência.

(LANE, 1999, p.18)

Essa experiência, como pesquisadora, foi nova para mim, a consciência converge e movimenta em espiral os papéis se confundem e se alternam. Em razão de que ora sou objeto estudado, pois sou docente da escola, ora sou autora da ação, já que faço parte da comissão de reforma curricular, ora sou administradora da ação, visto que sou coordenadora do curso de enfermagem.

Este movimento dialético nos leva a compreender a prática transformadora como algo que é construído historicamente, já que cada ação traz consigo a marca de outras ações prévias.

Não pretendemos nos apropriar desse produto (o Projeto do Curso de Enfermagem e as transformações) como resultado da pesquisa. Situação semelhante vivenciou Sawaia (1987) em sua tese de doutorado e concordo com suas afirmações:

[...] inevitavelmente cairia num determinismo de causa e efeito,

que encobriria a dialética do real, que se move em espiral onde

o possível efeito volta como causa da causa anterior,

alterando-a e alterando-alteralterando-ando-se no processo, palterando-aralterando-a depois continualterando-ar alterando-avalterando-ançalterando-ando

sempre nesse sentido. E além de falsear o movimento

enviesará os resultados de forma assintosa, pois não

trabalhamos com situação experimental, de controle de

variáveis.

(43)

epistemológica em que nos metemos. Como um farol, iluminou um mar de opções diante de nossas dificuldades de encontrar uma teoria que fosse capaz de dialogar com uma realidade complexa, estudada. O autor nos ensina que atrás dos problemas específicos de investigação psicológica há um sistema social complexo, sendo assim o momento empírico está em diferentes situações.

O processo de formação do enfermeiro percorre diferentes espaços sociais, configurando a constituição subjetiva do comportamento individual e social. Passamos a considerar a categoria subjetividade social em nosso estudo. Rey (2003) escreveu;

[...] que integra o individual, o social e o histórico, não somente

na dimensão da linguagem ou das práticas discursivas e

narrativas, mas também em uma nova dimensão ontológica da

psique, como subjetividade de base dialético-complexa e de

natureza histórico cultural. (REY, 2003, p. 179).

A categoria de subjetividade social foi introduzida por Rey, (2003, p. 202) “com a intenção de romper com a idéia arraigada nos psicólogos, de que a subjetividade é um fenômeno individual, apresentou-a como um sistema complexo produzido de forma simultânea no nível social e individual”.

Tal fenômeno pode ser explicado nas palavras de Chauí (1997) “Subjetividade é uma estrutura de experiências significativas e significantes que não começam nem terminam na consciência de si de um sujeito, uma teia de sentidos tecidas na relação intercorporal no diálogo com o outro”.

(44)

que adquirem o status de “objetivo” diante do subjetivo individual, devem ser vistos como processos implicados dentro de um sistema complexo, a subjetividade social, da qual o indivíduo é constituinte e, simultaneamente, constituído.” Rey (2003, p.209) destaca que “as configurações que caracterizam a subjetividade social se concretizam nos espaços de relações dentro dos quais os indivíduos atuam.” Além disso, argumenta que “as configurações de um espaço da subjetividade social nos dá visibilidade sobre outros.”

Assim, nas sendas de um novo fazer científico, os próximos capítulos terão um caráter construtivo interpretativo e através de uma conversa-reflexiva-com-a-situação buscaremos teorias locais que dêem conta da dimensão ontológica da psique como subjetividade de base dialético-complexa e de natureza histórico cultural, para explicar a gênese da subjetividade social produzida pelos sistemas de sentido no ensino de enfermagem.

A pesquisa ação participante não tem um plano definido de ação; etapas a seguir não definem que elementos devem ser observados ou controlados; ela segue caminhos diferentes. Para garantir a cientificidade, deve-se evitar os obscurantismos manipuladores. (Sawaia ,1987).

O procedimento da pesquisa ação participante foi construído através de uma conversa reflexiva com a situação.

(45)

a) Partimos da história dos currículos de enfermagem do Brasil e confrontamos com fatos históricos do Curso de Enfermagem da PUC-SP.

b) As variáveis: os desencontros entre a teoria e a prática e as configurações subjetivas do espaço social em que ocorre a aprendizagem;

c) Finalmente, podemos ancorar no presente e focalizar o que nos move para uma mudança na construção do novo currículo, é aqui que o passado e o presente se fundem e o presente é visto à luz da História.

Neste sentido, confrontaremos as configurações subjetivas constituídas por elementos de sentidos ao longo da história dos currículos de enfermagem com as configurações subjetivas vivenciadas no momento atual de construção de um novo currículo.

Um farto material que representasse a linguagem (polifônicas idéias acerca de currículo) foi coletado, representando o “campo tema”, a processualidade de redes de sentidos que se interconectam: documentos públicos e institucionais, atas de reuniões da Congregação da Escola de Enfermagem Coração de Maria (nome inicial do Curso de Enfermagem – PUC-SP); publicações técnico-científicas, relatórios, participação em reuniões da Comissão de Reforma do Curso de Enfermagem,

(46)

Além disso, realizamos uma busca no arquivo de documentos históricos do Curso de Enfermagem da PUC-SP onde foram encontradas atas de reuniões da criação do curso 1950 até 1980.

Os aspectos registrados e selecionados, apriorísticamente, como importantes e que revelam mudanças que possam ser explicadas pela relação entre as diferenças internas e escondidas e as similaridades externas, foram colocados numa ordenação legal em vigor na sua época. Ou seja, houve a confrontação dos registros escritos encontrados (atas, capítulos de livros e textos em periódicos, teses e outros tipos de publicações) com a legislação de mudança curricular de cada época.

Para trabalhar com o conjunto amplo de informações, poderíamos lançar mão de recursos da informática, porém utilizamos o velho método de fichamento, pois queríamos reproduzir um movimento dialético que o cursor do mouse de um computador não daria conta.

Assim, simbolicamente, construímos uma arena para o debate, a parede da sala foi forrada com papel kraft, onde uma linha do tempo foi desenhada e dividida por períodos em que vigoraram as legislações pertinentes ao currículo de enfermagem.

Posteriormente, mantivemos indiretamente o diálogo com os vários interlocutores, as fichas com trechos extraídos dos textos foram compondo um quadro de cada época e, ao mesmo tempo, confrontávamos com registros das atas do Curso de Enfermagem da PUC-SP e a legislação vigente.

(47)

[...] é um discurso feito na ausência de interlocutor. Por isso é um discurso desenvolvido ao máximo, nele a decomposição sintática atinge o apogeu. Ali, graças à divisão dos interlocutores, raramente são possíveis a compreensão, as meias palavras e os juízos predicativos. Na linguagem escrita, os interlocutores estão em diferentes situações, o que exclui a possibilidade de existência de um sujeito comum em seus pensamentos. Por isso, comparado ao discurso falado, o escrito é, neste sentido, maximamente desenvolvido e uma forma de discurso sintaticamente complexa na qual, para enunciar cada pensamento isolado, precisamos de empregar muito mais palavras do que se faz na linguagem falada. (VYGOTSKY, 2000, p.452)

As atas das reuniões da Congregação da Escola Coração de Maria eram caprichosamente manuscrita e expressam imparcialmente, com detalhes, o âmago das discussões.

Considerando o ato pedagógico como uma prática social desse fato, o cenário é indissociável, complexo e contraditório, criando-se uma série de conexões caracterológicas que constituirão os espaços teóricos, hipotéticos, construtivo e interpretativo na busca de respostas à pergunta inicial:

Que realidade na qual tanto os fenômenos visíveis – imprevistos, fracassos, conquistas e celebrações – bem como os fenômenos invisíveis - as emoções, motivos necessidades, interesses – integram e condicionam a formação do indivíduo?

(48)

CAPÍTULO II

4 CURRÍCULO: os elos íntimos e complexos entre escola,

conhecimento, ideologia, instituições, identidade e subjetividade.

Qual a finalidade do currículo?

O objetivo de um currículo escolar é servir de guia, de modo a

favorecer um melhor aproveitamento da prática educativa. Nenhum

currículo, porém, dever ser considerado terminado ou permanecer

estático mesmo por alguns anos. Deve ser orientado pela própria

mudança social do ambiente, pelo desenvolvimento técnico, porque o

currículo precisa nascer das necessidades do meio, das

necessidades do aluno. Numa sociedade democrática, o interesse e

as necessidades do indivíduo estudante são tão importantes quanto

as necessidades da sociedade. As mudanças nos princípios

metodológicos, as novas teorias sobre o processo da aprendizagem,

os novos conceitos sobre o desenvolvimento físico, mental e

emocional do estudante afetam grandemente a construção ou

reconstrução de um programa educacional. É fácil, assim concluir-se

que as e Escolas face à revisão de programas, precisam determinar

sua filosofia e objetivos. [...] Desse modo, urge das escolas um

sistema de avaliação continuada de seus programas, importando,

assim numa interação perfeita entre o pessoal docente e deste com o

(49)

Oliveira (1955, 310) vislumbrava, na década de 50, a idéia de um currículo aberto e orientado para o social e que atendesse às necessidades do aluno aliada às necessidades da sociedade. Neste texto, a autora faz uma observação interessante relacionada ao modelo educacional aplicado naquela época e usado até os dias de hoje em algumas escolas. Consiste em oferecer aos estudantes matérias isoladas. “Tais cursos isolados necessitam, contudo de ter uma seqüência, ou continuidade, do contrário, somente os estudantes brilhantes são capazes de fazer aplicação dos conhecimentos”.

No momento atual em que se discutem as diretrizes curriculares para o ensino de graduação ouvimos o mesmo discurso que há cinqüenta anos atrás Oliveira proferia, “construção de currículos abertos e arejados”, “criar novas possibilidades de formação”.

Os discursos e as palavras nos seduzem e pressupõem nossa liberdade de criar novas formas de ensinar e aprender.

É preciso aproveitar essa possibilidade de avanço, tornando real o desejo de um ensino de enfermagem que a história está exigindo, os serviços de saúde e os alunos esperam e têm direito. Porém, é preciso entender porque as velhas idéias, práticas e ideologia da insistem em resistir à história.

(50)

Tomando-se por base de que “ele (o currículo) é um artefato social e cultural que precisa ser compreendido e discutido considerando-se as suas determinações históricas, sociais e lingüísticas” proposto por Meyer (2002) procuraremos explicar como ocorreram os elos íntimos entre escola, conhecimento, instituições, ideologia e subjetividade através da história. Para isto, emolduramos os diplomas legais do Curso de Enfermagem da PUC-SP, emitidos nas diversas épocas.

O uso da metáfora de moldura é útil, parafraseando Veiga-Neto (2003), porque ajuda-nos a compreender que, assim como examinar um quadro tanto podemos nos ater à pintura em si quanto podemos levar nosso olhar para além dela, comparar com outras obras, perguntar em que época foi produzida etc...

Como foi comentado anteriormente, um filme do cineasta Akira Kurosawa “Sonhos” (1990) em um dos 8 episódios, intitulado “Corvos”, demonstra o movimento dialógico e dialético do autor para investigar a imaginação do ser humano. Neste filme, o álter ego do cineasta penetra no quadro Corvos de Vicent van Gogh, e nas cenas subseqüentes ele aparece andando pelos quadros do pintor como se fossem reais e chega até Van Gogh, que está no local onde a tela foi pintada e, no momento de criação da cena, a revoada de corvos na plantação de trigo.

Faremos um movimento semelhante partindo do pressuposto de que currículo é um produto social e cultural, assim como a enfermagem é um produto social os diplomas e seus respectivos currículos foram colocados na moldura mais ampla de suas determinações econômicas, sociais e políticas, de sua história, de sua produção contextual, de sua emergência e das exigências do mercado de trabalho.

(51)

que afirma Silva e Moreira (2001), “como o currículo está implicado em relações de poder, transmite visões sociais particulares interessadas, produz identidades individuais e sociais particulares”.

Para Vygotsky (2000, p.85) “Estudar alguma coisa historicamente significa estudá-la no processo de mudança: esse é o requisito básico do método dialético”. Por isso, no nosso percurso através da história sobre currículo da enfermagem escolhemos ressaltar os momentos de mudanças.

(52)

4.1 A ESCOLA DE ENFERMAGEM CORAÇÃO DE MARIA:

religiosidade X modelo importado.

O primeiro quadro que apresentamos é o do surgimento do Curso de Enfermagem da PUC-SP, em 1950, um ano após a regulamentação do Ensino de Enfermagem no Brasil – Decreto 27426/49, e que, inicialmente, recebeu o nome de Escola de Enfermagem Coração de Maria. Hoje, intitula-se Curso de Enfermagem da PUC-SP da Faculdade de Ciências Médicas do Centro de Ciências Médicas e Biológicas campus situado na cidade de Sorocaba interior do Estado de São Paulo.

Inicialmente, a organização da escola foi confiada às irmãs franciscanas do Coração de Maria por orientação do Eminentíssimo Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, Arcebispo de São Paulo (1944-1964).

O primeiro currículo do curso foi construído baseado na Lei 775/49 de 6 de agosto de 1949 que no Art.20 orienta:

“Em cada Centro Universitário ou sede de Faculdade de Medicina,

deverá haver escola de enfermagem, com os dois cursos que trata o

art. 1º.”

(53)

A escola de Enfermagem Coração de Maria recebeu autorização para funcionamento através da Portaria nº 497 em março de 1951 e, posteriormente, após visita de três enfermeiras avaliadoras Haydée Guanais Dourado, Ana Jaguaribe Nava e Edith de Magalhães foi reconhecida pelo governo Federal pelo Decreto nº 32087 publicado no Diário Oficial em 13 de janeiro de 1953. Gardenal (1996).

Em 18 de agosto de 1955 foi aprovada pelo Conselho Universitário da Pontifícia Universidade Católica a admissão da Escola Coração de Maria como Instituição agregada à Universidade.

Embora a Escola de Enfermagem Coração de Maria fosse dirigida por uma Irmã Franciscana, a Congregação – órgão decisório para assuntos acadêmicos - era presidida por um médico que também era Diretor da Faculdade de Medicina.

O corpo docente era constituído por médicos que eram “encarregados responsáveis das cadeiras das ciências médicas”; às Irmãs Franciscanas ficava o cargo de Instrutoras das atividades práticas realizadas, predominantemente no Hospital.

Muito sutilmente, de uma forma natural, devido às circunstâncias, um grande valor era dado àqueles que ocupavam a posição de encarregados responsáveis da cadeira.

(54)

O poder do médico sobre as irmãs enfermeiras instrutoras dos estágios é representado pelo paradigma estratégico, isto é, não é um objeto, nem uma potência e nem uma instituição, é uma situação estratégica que surgiu na relação social, colocando a figura do médico em situação de superioridade perante as freiras.

Por outro lado, quando é conferido à Irmã Franciscana a Direção da escola, age outra força de poder o modelo jurídico, na forma de lei sancionada em 17 de setembro de 1955 pelo Presidente da República, que regula o exercício da enfermagem profissional sob o nº 260, e define como atribuições dos enfermeiros, além do exercício da enfermagem:

a) Direção dos serviços de enfermagem nos estabelecimentos hospitalares e de saúde pública, de acordo com o art.21 da Lei nº775, de 6 de agosto de 1949; b) Participação do ensino em escolas de enfermagem e de auxiliar de

enfermagem;

c) Direção de escola de enfermagem e de escolas de auxiliar de enfermagem; d) Participação nas bancas examinadoras e de práticos de enfermagem.

Retomando a 1951 na Escola de Enfermagem Coração de Maria, o curso foi estruturado nos moldes das outras escolas do país, previsto no Decreto 27426/49 que representava uma adaptação do “Curriculum Guide” elaborado em 1937 pela National League of Nursing – EUA uma versão americana do Sistema Nightingale,

ou seja, fortemente influenciada pelos estudos de Taylor sobre gerência científica, acentuando o trabalho parcelado e os procedimentos técnicos. Garcia, Chianca e Moreira (1995); Backes (1999).

(55)

para o Brasil, inicialmente, era para formar profissionais que contribuíssem no saneamento dos portos, em especial o do Rio de Janeiro.

O governo brasileiro enfrentava, naquela época, sérios problemas com o comércio de exportação, pois os países que negociavam com o Brasil começaram ameaçar em cortar relações se o governo não saneasse os portos, porque a tripulação dos navios que atracavam no porto do Rio de Janeiro era contaminada por doenças como febre amarela, varíola, peste, acarretava, inclusive, a morte de muitos.

A atuação das alunas na Saúde Pública tinha ideais humanitários e assistencialistas conforme observação feita em reunião da Congregação

Em seguida, dirigiu o mesmo professor, palavras de elogios ao

Serviço de Saúde Pública, levado a efeito pelas alunas da 3ª série,

no decorrer da Cadeira de Saúde Pública. Frisou bem, a

minuciosidade do trabalho das alunas nas visitas domiciliares, e no

Serviço de Saúde Pública instalado, na escola. Verdadeira obra de

caridade!. PUC-SP (1954)

Germano (1985, p. 37) apresenta dados que demonstram um aumento da tendência do mercado para o campo hospitalar: “em 1943, de 334 enfermeiras em serviço ativo, 66% trabalhavam na saúde pública e 9,5% em hospitais, em 1949, 49% das enfermeiras encontravam-se no campo hospitalar e 17,2%, na saúde pública.”

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médica via Institutos e viabiliza-se o crescimento de um complexo médico hospitalar para prestar atendimento aos previdenciários5

Do que decorre que com o crescimento da indústria hospitalar, o intento das americanas foi se consolidando com a criação de Cursos de Enfermagem em vários estados brasileiros, dentre eles a Escola de Enfermagem Coração de Maria, que, embora não declaravam utilizavam a mão de obra de alunos para manter o hospital. Como constatamos, há registro de exigência de 48 horas semanais com plantões nas enfermarias do hospital ligado à escola.

Além do regime de internato os alunos eram mantidos sob um rígido sistema educacional, estimulando a prática da passividade, disciplina, culto à hierarquia, obediência e abnegação.

A metodologia de ensino adotada na época nas escolas de enfermagem seguia o já citado sistema Nightingale, dava-se destaque à instrução programada, como relata a seguir:

Ao estabelecer uma estrutura curricular rígida não ensejava uma

formação mais “liberal” do enfermeiro a ênfase era mais no fazer do

que no pensar, repetir técnicas e usar bandejas prontas tolhendo a

criatividade do aluno. A centralização no estudo das doenças e não

no doente minimizava a reflexão maior sobre a natureza prática da

enfermagem e a contribuição do enfermeiro e do auxiliar de

enfermagem. (OLIVEIRA, 1981, p.22)

Estes aspectos podem ser comprovados pelo depoimento registrado na Ata da 1ª Reunião de Instrutoras da Escola de Enfermagem Coração de Maria –27/07/ 1957

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Fig. 1 Representação esquemática – O complexo “sistema psicológico” do processo  de construção de competência de futuros enfermeiros

Referências

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