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O trabalho do assistente social no “terceiro setor”: a superação das dificuldades e a construção de caminhos

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Academic year: 2018

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Lídia Lopes da Silva

O trabalho do assistente social no “terceiro setor”: a

superação das dificuldades e a construção de caminhos

MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Serviço Social, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Maria Carmelita Yazbek.

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DEDICATÓRIA

Dedico o presente trabalho à minha família, meu amor Evaldo, minha mãe Nadir e ameu irmão Fábio.

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Muitas são as pessoas que passam por nossa vida e sob diferentes aspectos, deixam conosco sua marca; nessa trajetória de pesquisador não foi diferente; muitas foram as pessoas que deixarão saudades e ânsia pelo reencontro.

Em primeiro lugar, agradeço a Deus, que se revela a mim em meu dia-a-dia, dando-me forças para superar as dificuldades e chegar até aqui sem me entregar às dificuldades.

Agradeço ao Evaldo, hoje meu noivo, brevemente meu esposo, mas sempre meu companheiro e amigo, que nunca deixou de me incentivar. Sinto muito orgulho de você!

À minha mãe que sempre foi capaz de enfrentar qualquer dificuldade para apoiar seus filhos.

Aos professores da Universidade de Taubaté, na qual me graduei; eles também são responsáveis por essa conquista. De forma especial a Prof.ª Dr.ª Maria Fernanda Teixeira Branco Costa, que acreditou em mim, leu meu projeto e me deu segurança para iniciar o mestrado; à Prof.ª Dr.ª Maria Teresa dos Santos, exemplo de pessoa e profissional, gostaria de estar mais perto dela e sei que sempre poderei contar com seu apoio; e à Prof.ª Dr.ª Mabel Mascarenhas Torres.

À Prof.ª Dr.ª Maria Lúcia Martinelli, por me acolher e incentivar. Ela muitas vezes repetiu algo que tem me ajudado profundamente em minhas escolhas da vida, que é “apostar na positividade”.

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Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – l CNPQ, às pessoas que o compõem, por trabalharem em prol da pesquisa deste país, enfrentando os desafios que esta atividade impõe. Ressalto o apoio que sempre recebi do Departamento de Pós-Graduação em Serviço Social, de forma especial, agradeço à secretária Kátia pela atenção que dispensa aos alunos.

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Quando a sociedade se transforma, um novo modo de viver se impõe e, com ele, irrompem novas necessidades humanas; para respondê-las, profissões se reorganizam e buscam estratégias para uma atuação mais efetiva. Esta pesquisa parte do pressuposto de que é momento de repensar os espaços de inserção do assistente social e busca contribuir para o debate acerca do exercício profissional, especificamente, no campo do “terceiro setor”, esfera que cresceu notavelmente na última década e ainda é pouco estudada. Para conhecer melhor as possibilidades de trabalho do assistente social no “terceiro setor” realizamos uma pesquisa qualitativa com quatro assistentes sociais de entidades representativas de tal setor. Quanto aos resultados, chegamos à delimitação do perfil das entidades pesquisadas, definidas a partir da legislação social como entidades de assistência social e encontramos, preponderantemente, a marca da religiosidade e da dedicação ao atendimento de crianças e adolescentes. No processo da pesquisa, foi dada ênfase às relações em torno dos recursos financeiros, por meio da qual constatamos a presença majoritária do Estado como financiador das atividades desenvolvidas; também se examinaram outras características como a direção, a captação de recursos e a presença dos voluntários. Ao analisarmos o fazer profissional do assistente social no “terceiro setor” e seus traços peculiares, refletimos, ainda, sobre pontos como: atividades, planejamento, valorização do trabalho, autonomia, destacando as redes sócio-assistenciais e a visão de cada sujeito a respeito do espaço público e privado. Estudamos a capacitação do profissional e sua inserção política como respostas frente às dificuldades do mercado de trabalho, porém constatamos que essa participação se dá apenas no espaço dos conselhos de direitos. Destacam-se nas falas desses profissionais uma boa articulação com a rede sócio-assistencial do município e o conhecimento da realidade local, o que colabora para uma atuação que ultrapassa o espaço institucional, resultante da preocupação com a qualidade dos serviços e com o cumprimento dos direitos.

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When society changes, a new way of life begins, and with it new human needs arise; in order to deal with them, professionals reorganise themselves and seek new strategies for a more effective role. This research starts from the fact that it is time to rethink about the social worker space and seeks to contribute to the professional exercise, particularly in the “third sector”, a field which has grown notably in the last decade, despite being little studied. To better know the social workers' work possibilities in the third sector, we have adopted a quantitative research with four carers representing such sector. As results we have reached the profile limits of those entities, defined by Law as Social Care entities, and have found the trace of religiosity and a remarkable dedication in attending to children and teenagers. During this research, financial resources were given priority, in which we have found that tha State is the major investor to the development of these activities; we have also examined other factors such as management, resource funds and volunteers participation. Analysing the social workers professional performance in the third sector and its peculiarities, we have thought about topics such as activities, planning, autonomy and work value, enhancing the social care network and the citizen's view about private and public spaces. We have studied the professionals' capacity and their political interest as an answer to the labour market difficulties, however we have noticed that this participation is only seen in the legal counselling sector. These professionals highlight a good relation with the council social care network and their local knowledge, which helps to further the institutional space, resulting from the necessity for better care and appliance of rights.

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Metodologia de Pesquisa ... 16

1.1 – O discurso humanista do mundo do trabalho e o processo ideológico ... 27

1.2 – Processos que se inter-relacionam e suas conseqüências para a política social no Brasil ... 29

1.3 – A reforma do estado brasileiro ... 36

2.1 – Apresentação e análise das organizações ... 58

2.2 – Características das organizações: financiamento, captação de recursos, voluntariado e critérios dos programas ... 67

3.1 – O Serviço Social diante do contexto atual ... 82

3.2 – O Serviço Social enquanto trabalho especializado ... 87

3.3 – Características do trabalho: atividades, planejamento, valorização profissional, autonomia, trabalho em equipe e demandas ... 90

3.4 – Algumas referências quanto ao “terceiro setor” enquanto empregador dos assistentes sociais ... 110

Relações de trabalho dos profissionais pesquisados, encontradas na pesquisa de 2005 ... 113

3.5 – Entrevistas: relação público x privado, visão do “terceiro setor”, conhecimentos legais, capacitação e participação política ... 120

Redes ... 120

Uma nota sobre as limitações desse estudo ... 154

INTRODUÇÃO ... 10

CAPÍTULO 1 – Globalização, neoliberalismo, reestruturação produtiva: processos que ser inter-relacionam ... 22

CAPÍTULO 2 – O “terceiro setor: análises e definições ... 45

CAPÍTULO 3 – O “terceiro setor” enquanto empregador dos assistentes sociais ... 82

CONCLUSÃO ... 145

BIBLIOGRAFIA ... 155

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INTRODUÇÃO

Esta dissertação de mestrado volta-se ao aprofundamento de uma temática que desenvolvo desde o segundo ano (Iniciação Científica) da Graduação em Serviço Social, que é o chamado “terceiro setor”. Tem como objeto o exercício profissional do assistente social e as peculiaridades do “terceiro setor”, com a finalidade de explorar as competências e atribuições desses profissionais num espaço de trabalho de características próprias, que também precisam ser desvendadas.

Quando a sociedade se transforma, o nosso modo de viver também se modifica e com ele surgem novas necessidades humanas; para respondê-las, vemos as profissões requalificando-se. Esta pesquisa parte do pressuposto de que é momento de repensar os espaços de inserção do assistente social dentro do mercado de trabalho, mais especificamente no campo do “terceiro setor”, já que se trata de uma esfera que cresceu notavelmente na última década e ainda é pouco estudada.

Sua finalidade é contribuir para o debate em torno do exercício profissional do assistente social e suas relações com as conseqüências trazidas pelo padrão de acumulação flexível, a implantação do projeto neoliberal e a desresponsabilização do Estado no trato à questão social e às alterações do mundo do trabalho geradas, em última análise, pela chamada reestruturação produtiva.

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Assim, meu trabalho de conclusão de curso seguiu a mesma temática, sob o tema: As condições de trabalho do assistente social inserido no ”terceiro setor”. Desenvolvi uma pesquisa que contemplou as transformações do mundo do trabalho e sua relação com o Serviço Social, o sentido histórico do ”terceiro setor” e sua concepção, considerando um contexto social amplo. Nesse momento, nosso objeto foi a peculiaridade desse setor, enquanto campo de trabalho que demanda assistentes sociais para seus quadros de funcionários e que oferece determinadas condições ao fazer desse profissional (no que envolve sua atribuição, participação política e conhecimento da legislação) e como esses fatores se inter-relacionam.

Utilizei também a pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Serviço Social – CFESS, sobre o perfil do assistente social no Brasil, comparando resultados obtidos, por meio do TCC, com dados apresentados nessa pesquisa, sendo assim, a construção do questionário teve por base as questões utilizadas pelo CFESS1. Também foram cruzados os dados coletados com a pesquisa realizada pela Prof.ª Raquel de Matos Lopes Gentilli, por meio do relatório final da pesquisa, realizado pelo Conselho Regional de Serviço Social – CRESS – 17ª Região, Gestão 1996/1999.

No processo metodológico do trabalho de conclusão de curso, realizamos um levantamento documental das organizações do “terceiro setor” por meio da ficha de programação básica de estágio de Serviço Social da Universidade de Taubaté do ano de 2005, para verificarmos qual natureza predominava nos campos de trabalho; dentre o total de 38 unidades; obtivemos 16 públicas (42,11%), 7 privadas (18,42%) e 15 organizações do “terceiro setor” (39,47%). Nota-se claramente o “terceiro setor” como um campo de estágio amplo, que se aproxima em quantidade até mesmo do setor público, tradicionalmente o maior campo de inserção do Serviço Social.

Partindo daí, o universo da pesquisa contemplou os assistentes sociais inseridos nessas organizações, pois estes estão vivenciando uma prática profissional marcada pelas peculiaridades deste setor, em sua relação com o projeto neoliberal. O instrumental escolhido para a coleta de dados foi um questionário,

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contendo questões abertas e fechadas; outra característica desses sujeitos é que também supervisionam práticas de estagiários da Universidade de Taubaté, o que foi facilitador nesse processo, já que pudemos contar com a colaboração dos estagiários para o envio dos 15 questionários e a devolutiva de 09 deu-se via correios ou pelos próprios estagiários.

Ao final da pesquisa, os dados captados permitiram uma aproximação de alguns aspectos significativos, para melhor compreensão das condições postas pelo “terceiro setor” e do fazer profissional, marcado pelas suas peculiaridades. Assim temos:

Perfil geral dos profissionais entrevistados: sexo feminino, com idade entre

45 a 59 anos, formado a partir da década de 90 (na Universidade de Taubaté), relativamente há pouco tempo trabalhando no “terceiro setor”, comparado a seu tempo de atuação profissional, apresentando apenas a graduação.

Condições de trabalho mais encontradas no “terceiro setor”: condições

físicas do trabalho não adequadas; faixa salarial de 4 a 6 salários mínimos; vínculo empregatício celetista; carga horária a partir de 40 horas e os assistentes sociais advêm da esfera privada e pública, o que pode significar aposentadoria.

Conhecimento da legislação - dentre os profissionais entrevistados, a Lei de

Regulamentação da Profissão é a mais conhecida, seguida do Código de Ética; são bem menos conhecidas as Diretrizes Curriculares para o Curso de Serviço Social e a Tabela Referencial de Honorários, inclusive para esta última os dados apontam a necessidade de maior divulgação. Houve prevalência na discordância sobre o respaldo da legislação no cotidiano.

Fazer profissional X Legislação - os dados permitiram a aproximação da

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recursos financeiros para projetos são entendidos como suficientes pela maioria, mesmo estes sendo advindos de doações/captação entre a comunidade, o que significa serem estes esporádicos, característica já definida no “terceiro setor”.

Participação Política - Em termos gerais, pode-se considerar que existe

entre os entrevistados uma participação política expressiva, em sua maioria em movimentos sociais, especificamente da categoria de assistentes sociais. Essa participação, porém, torna-se comprometida, pois há predominância quanto a seu caráter eventual pelo fato de que metade dos participantes atua apenas como filiado e por ser ainda muito pequena a participação dos assistentes sociais entrevistados em conselhos de defesa de direitos e movimentos partidários.

Ao deparar-me com essas conclusões, percebi que seus resultados apontavam para a necessidade de aprofundamento de alguns pontos da pesquisa, de modo especial para o exercício profissional. Deste modo, este projeto de Mestrado, em partes, foi construído a partir dos resultados obtidos por meio do meu TCC. Meu interesse de pesquisadora e assistente social recém-formada também me provoca a explorar/apreender mais as questões que tratam do exercício profissional do assistente social, no caso específico, delimitando para a pesquisa aquele inserido no “terceiro setor”. Isso se remete ao fato de, na pesquisa já citada, ressaltar-se a dificuldade de alguns profissionais em reconhecer as delimitações de seu espaço de trabalho, suas competências e atribuições.

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Sabendo que, muitas vezes, a dificuldade do profissional em delimitar seu espaço vem acompanhada da desvalorização do assistente social, minha pesquisa de graduação demonstrou que a precarização de nossas condições de trabalho também se relaciona com o conhecimento que temos da própria legislação. Legislação essa que respalda nosso trabalho quanto ao reconhecimento de seu espaço e quanto às respostas que construímos com nossa participação política ou que deixamos de construir sem ela.

Assim, entendo que a pesquisa como instrumento do (no) agir profissional também possa contribuir para a formação dessa autoconsciência da categoria; por isso, é relevante repensar essas questões, ainda tão pouco valorizadas pelo fazer acadêmico. As transformações ocorridas em meio ao mundo do trabalho já vêm sendo objeto de estudos dos assistentes sociais há algum tempo em suas expressões variadas: no desemprego, nas perdas dos direitos trabalhistas, no enfraquecimento dos sindicatos, nas reestruturações dos processos de trabalho, enfim, sua repercussão para a classe trabalhadora e para a intervenção do assistente social. Porém, um tema que se relaciona a esse quadro conjuntural e, mesmo sendo muito próximo, ainda tem sido pouco estudado, é a inserção do assistente social nos campos de trabalho, enquanto categoria inserida numa divisão sócio-técnica e que, como as outras, também sofre com essas conseqüências.

Isto ficou comprovado quando levantei as teses e dissertações do banco de dados da Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP e constatei que dentre um total de 112 que tratam do tema “terceiro setor”, apenas duas o relacionam ao Serviço Social e datam de 2000 e 2006.

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institucionalização do Serviço Social. Assim, ao leitor atento, o capítulo aponta para o momento como propício a compreensão dos espaços de inserção do assistente social dentro do mercado de trabalho em suas novas configurações.

No segundo capítulo nos debruçamos sobre a trajetória histórica do “terceiro setor” e sua concepção, destacando a fragilidade desse conceito e suas diferenças quanto ao conceito de sociedade civil. Consideramos que este compõe um contexto social amplo, resultante dos ditames do projeto neoliberal e sua conseqüente reforma nas bases do Estado. Analisamos também a chamada responsabilidade social e o discurso “humanista” presente no mundo empresarial, com forte aproximação e interesses convergentes com o “terceiro setor”. Partimos para apresentação geral das organizações e entidades pesquisadas, dando ênfase às relações em torno dos recursos financeiros que as mantêm e como se dá ou não a presença dos voluntários.

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Metodologia da Pesquisa

Apreender um pouco da riqueza que os profissionais acumularam no decorrer de sua atuação profissional no “terceiro setor”, tão marcado por suas peculiaridades relacionadas ao projeto neoliberal, trazendo à tona suas concepções como sujeitos que fazem história e os significados de suas experiências, são alguns dos meus objetivos. Desse modo, disponho-me a sistematizar esse conhecimento, que é latente e precisa ser organizado, até mesmo para poder tornar-se um subsídio para os profissionais que estão em campo.

A partir dessa compreensão, fiz a escolha pela metodologia da “História Oral”, pois ao estudar o exercício profissional, tendo apenas como base minha pequena experiência, receio produzir algo distante do cotidiano dos profissionais e entendo que essa metodologia, por dar voz ao sujeito e valorizar sua experiência em face às exigências da divisão sócio-técnica do trabalho, permite uma pesquisa mais coerente com a realidade.

A concentração do interesse do pesquisador em determinados problemas, a perspectiva em que se coloca para formulá-los, a escolha dos instrumentos de coleta e a análise do material não são nunca fortuitos; todo estudioso está sempre engajado nas questões que lhe atraíram a atenção, está sempre engajado, de forma profunda e muitas vezes inconsciente, naquilo que executa. (QUEIROZ, 1992, p. 13).

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Os questionamentos que estiveram presentes no desenvolvimento da minha monografia só foram possíveis de serem respondidos no ano após o término da graduação, em 2006, quando iniciei no NIC - Núcleo de Estudo e Pesquisa Identidade, Cultura e Historia Oral do Departamento de Serviço Social da Universidade de Taubaté, sob a coordenação da Prof.ª Dr.ª Maria Fernanda Teixeira Branco Costa2. A partir daí, comecei a pensar a História Oral e retomar as dúvidas metodológicas que havia vivido.

(...) tornava-se fundamental buscar novas metodologias de pesquisa que mais do que buscar índices, modas, medianas, buscassem significados, mais do que buscar descrições, buscassem interpretações, mais do que buscar coleta de informações, buscassem sujeitos e suas histórias. Certamente, isso pressupõe um outro modo de fazer pesquisa, no qual não deixa de ser importante a informação quantitativa, mas sem que se excluam os dados qualitativos. Esses dados ganham vida com as informações outras, com os depoimentos, com as narrativas que os sujeitos nos trazem. (MARTINELLI, 1999, p. 21).

Essa experiência de repensar meu posicionamento de pesquisador foi muito prazerosa e diferente, pois estou descobrindo que posso valorizar minha trajetória subjetiva de pesquisadora. Embora a pesquisa sempre tenha me instigado, faltava-me um relacionafaltava-mento mais íntimo com ela. Processo este que também está possibilitando um reconhecimento maior sobre mim mesma.

Na sua defesa do dado qualitativo, aponta Maria Isaura que o único caminho para transformar a subjetividade do pesquisador, de algo prejudicial para algo que permita a compreensão da realidade, seria através de uma “constante auto-crítica do pesquisador” Ela reitera, assim, o seu enunciado a respeito do “preparo do pesquisador” através da “auto- análise”. (KOSMINSKY, 1999, p. 80).

Mergulhar e trazer à tona os significados das experiências vividas pelos assistentes sociais exige o contato “sujeito-sujeito”, ou seja, uma relação que se estabelece entre pessoas que possuem igual importância em um contato direto. Busca-se a singularidade do sujeito que só pode ser apreendida confrontando-a com o todo, isto é, ninguém vive à parte de um contexto social, e este não é composto,

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senão, pelo caráter singular de cada pessoa. Assim, os sujeitos sempre revelam respostas singulares, como explica Portelli (1997, p. 16):

A essencialidade do indivíduo é salientada pelo fato de a História Oral dizer respeito a versões do passado, ou seja, à memória. A memória é um processo individual, que ocorre em um meio social dinâmico, valendo-se de instrumentos socialmente criados e compartilhados. Em vista disso, as recordações podem ser semelhantes, contraditórias ou sobrepostas. Porém, em hipótese alguma, as lembranças de duas pessoas são – assim como as impressões digitais, ou, a bem da verdade, como as vozes – exatamente iguais.

É por meio da fala dos sujeitos que podemos apreender os sentidos que ele constrói, cotidianamente, para exercer sua profissão. Isto é possível por que as palavras são carregadas de sentido, elas são geradas pelos desejos e necessidades humanas para depois, no pensamento, adquirir significados e ser exteriorizadas constituindo-se em palavras.

(...) a linguagem tem a capacidade especial de nos fazer pensar enquanto falamos e ouvimos, nos fazer compreender nossos próprios pensamentos tanto quanto os dos outros que falam conosco. Ela nos faz pensar e nos dá o que pensar porque se refere a significados, tanto os já conhecidos por nós, bem como os que não conhecíamos e que descobrimos por estarmos conversando. (CHAUÍ, 2002, p. 149).

A História Oral, enquanto metodologia, permite por meio da coleta dos relatos orais, identificar os elementos que compõem a experiência profissional, bem como a percepção dos profissionais acerca de seu espaço de trabalho.

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Por conseguinte, para escolhermos os sujeitos da pesquisa, tivemos a preocupação que fossem profissionais representativos, envolvidos com a profissão e com os espaços de participação política. Desse modo, escolhemos para sujeitos conselheiros da Assistência Social, que ao mesmo tempo também são assistentes sociais inseridos no “terceiro setor”. Isso possibilitou análises contemplando o “terceiro setor” dentro do espaço da Assistência Social, enquanto rede de serviços. Ao total entrevistamos quatro sujeitos, dois do município de São José dos Campos, por ter a maior população e uma rede sócio-assistencial de alta complexidade, um de Caçapava e outro de Taubaté.

Como se pode notar, para delimitarmos o espaço geográfico da pesquisa, optamos pelo Vale do Paraíba, Estado de São Paulo, região entre leste do estado de São Paulo e do sul do estado do Rio de Janeiro. Localiza-se às margens da rodovia Presidente Dutra (BR-116), exatamente entre o Rio de Janeiro e São Paulo, dentro da megalópole formada pelas duas capitais. Mais precisamente, nos delimitaremos ao chamado Médio Vale, representado pelas cidades de São José dos Campos, Caçapava e Taubaté, por ser a região de mais fácil acesso para a realização da pesquisa.

O município de São Jose dos Campos é hoje um importante centro regional de compras e serviços do Vale do Paraíba e possui uma população de aproximadamente 610 mil habitantes. Seu processo de industrialização tomou impulso a partir da instalação do Centro Técnico Aeroespacial – CTA, em 1950, e da inauguração da Rodovia Presidente Dutra (1951), perpassando a parte urbana de São José dos Campos. Nas décadas seguintes, com a consolidação da economia industrial, São José dos Campos apresentou um crescimento demográfico expressivo que também acelerou o processo de urbanização no município.

Segundo Brisola (2003, p. 79),

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São José dos Campos, realizada em setembro de 1995, com a presença de 254 participantes, sendo 251 delegados e 3 observadores.

Atualmente, o Conselho Municipal de Assistência Social conta com dois assistentes sociais com vínculo empregatício no “terceiro setor”, um representando o segmento família e outro representando o CRESS - São José dos Campos.

O Município de Caçapava possui uma população de cerca de 57 mil habitantes e localiza-se à distância de aproximadamente 108 Km da capital do Estado, à qual se interliga por meio das Rodovias Presidente Dutra, Ayrton Senna e Carvalho Pinto. No sentido leste-oeste, o Município é atravessado pela Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA), usada para transporte de cargas pelo consórcio M. R. S., interligando-se às demais ferrovias do país que atingem os principais centros urbanos do sul e sudeste, com acesso ao “Mercosul”.

Os primeiros habitantes de Caçapava foram os bandeirantes com suas famílias. O ciclo do café trouxe um aumento da população. A exportação do café fez promover o trabalho escravo e a imigração européia, principalmente dos italianos e portugueses. O Município também foi o destino de muitos japoneses e sírio-libaneses, que chegaram a partir do início do século XX. Com a industrialização do Município, que vem ocorrendo nas últimas quatro décadas, instalaram-se ao longo da Rodovia Presidente Dutra indústrias de vários ramos. Houve certa demanda de migrantes vindos de outras partes do país, sobretudo da região nordeste. O Município também serve como referência de hospedagem para inúmeros trabalhadores, devido à proximidade com grandes centros urbanos como Taubaté e, principalmente, São José dos Campos.

O Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS) de Caçapava foi criado em 26 de setembro de 1997 e possui duas assistentes sociais com vínculo empregatício. No “terceiro setor”, elas representam os segmentos criança e adolescente e idoso.

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região, abrigando empresas como Volkswagen, Ford, LG, Alstom e Usiminas, dentre outras, além da Aviação do Exército.

O Conselho Municipal de Taubaté foi criado pela Lei nº 4.046, de 04 de abril de 2007, tem como competência, dentre outras, zelar pela efetivação do sistema descentralizado e participativo da assistência social, atuar na formulação de estratégias e controlar a execução da política de assistência social; aprovar o Plano Municipal da Assistência Social, inscrever as entidades e organizações de assistência social que prestem serviços no Município para os efeitos da Lei Orgânica de Assistência Social, divulgar e promover a defesa dos direitos sócio-assistenciais, etc. A posse do Conselho se deu em 27 de junho de 2007.

Fixada, pois, nesse espaço é que se realizou a presente pesquisa, ora traduzindo e ora contrastando o relato dos assistentes sociais nela inseridos com o referencial teórico adotado. Finalizo citando novamente Portelli (1997, p. 17), com uma passagem que, de forma simples e rica, sintetiza muito do que expus até aqui.

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Capítulo 1 - Globalização, neoliberalismo, reestruturação produtiva: processos que se inter-relacionam.

Este capítulo inicia-se situando historicamente os fenômenos: neoliberalismo, reestruturação produtiva e globalização, na sua característica de inter-relacionamento, cujos resultados são as transformações contemporâneas, detendo-se principalmente naquelas que envolvem o mundo do trabalho. Evidentemente, não será possível analisar esses fenômenos em profundidade, o que se faz aqui é uma busca de análise de nosso objeto a partir dessa conjuntura.

No decorrer do trabalho, nos preocuparemos em como essas mudanças perpassam também a profissão do Serviço Social, entendendo-a de modo exógeno, para desvendar os desafios impostos por esse triplo fenômeno para os assistentes sociais e para os trabalhadores de uma forma em geral.

Parte-se do entendimento de que, para compreensão das conseqüências do processo de transformações do mundo do trabalho para a categoria dos assistentes sociais, é necessário recorrer a uma contextualização histórica. Tais transformações tiveram como eixo de referência a reestruturação produtiva, datada da crise do capitalismo dos anos 70 do século passado, que teve entre suas principais expressões os ditames do projeto neoliberal e sua conseqüente influência na reforma das estruturas do Estado.

Conforme Perry Anderson (2002, p. 09), na sua análise “Balanço do Neoliberalismo”, as idéias neoliberais foram pensadas bem antes da crise de 70.

O neoliberalismo nasceu logo depois da II Guerra Mundial, na região da Europa e da América do Norte onde imperava o capitalismo. Foi uma reação teórica e política veemente contra o Estado intervencionista e de bem-estar. Seu texto de origem é O Caminho da Servidão, de Friedrich Hayek, escrito já em 1944.

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Estado na economia ameaçava a liberdade, até mesmo política, conduzindo a um desastre próximo ao que foi o nazismo alemão. Nas décadas 1950 e 1960 essas idéias não conseguem aderência na sociedade, já que o capitalismo vive a chamada idade do ouro. Apenas quando o capitalismo começa a se desgastar e procura uma nova estratégia para se manter é que essas idéias ganham forças.

As raízes da crise, afirmam Hayek e seus companheiros, estavam localizadas no poder excessivo e nefasto dos sindicatos e, de maneira mais geral, do movimento operário, que havia corroído as bases de acumulação capitalista com suas pressões reivindicativas sobre os salários e com sua pressão parasitária para que o Estado aumentasse cada vez mais os gastos sociais. (ANDERSON, 2002, p. 10).

Assim, o neoliberalismo é uma ideologia política que se firma com o objetivo de deter a inflação e recuperar os lucros perdidos com a crise referida acima. O Estado deixa de ser um “vigia da economia” e passa a ser um instrumento de apoio ao processo de acumulação do capital. Sabemos que o posicionamento do Estado sempre é o de servir à manutenção do poder dominante, por isso, quando o momento histórico coloca em xeque a classe dominante, o Estado passa a adotar novas estratégias e transforma até mesmo seu modo de intervir na sociedade. Resulta, pois, que a perspectiva neoliberal cria a tese do Estado mínimo, no qual o Estado deve reformar a administração, com medidas como: corte de gastos, contenção de crédito, diminuição dos tributos sobre as empresas, retomada do equilíbrio orçamentário com a eliminação do déficit público, enfim, medidas que tenham a finalidade de proteger o próprio capital e, por conseguinte, o empresariado.

Para entendermos a importância do controle do Estado para uma determinada classe social, cito Stavenhagen:

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classes terá sempre por objetivo o controle do poder do Estado (VELHO; PALMEIRA; BERTELLI, 1969, p. 136).

Ao mesmo tempo em que o Estado se reestrutura, o mundo do trabalho também sofre a chamada reestruturação produtiva, fruto do esgotamento do padrão fordista/ taylorista3, advindo da crise de acumulação do capital, na década de 1970, na qual se sentiu a necessidade de um modelo que fosse capaz de revolucionar os padrões de produção e sistema de estoque; o modelo que responde a essa necessidade é o chamado “toyotista” ou “acumulação flexível”. Instaura-se uma nova era de produção que:

[...] é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. Ela se apóia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. (HARVEY apud ANTUNES, 1995, p. 21).

Os motivos que realmente levaram à crise financeira foram os excessos provocados pelo fordismo e taylorismo; a ideologia neoliberal, porém, utiliza deste momento para atacar o Estado intervencionista, indicando os gastos com as políticas públicas como um dos responsáveis pela crise. Assim, direitos já conquistados foram sendo retirados da classe trabalhadora e os gastos com as políticas sociais foram diminuídos com cortes de serviços prestados à população e com a queda de qualidade dos serviços que continuaram, buscando-se, assim, atingir o maior dos objetivos da reestruturação que era a volta do acúmulo de capital.

O objetivo de toda reengenharia utilizada nas empresas é o corte de gastos, que no nosso cotidiano é o corte de pessoas, ou sua diminuição dos salários, por meio da equacionalização das funções, a fim de tornar a empresa mais competitiva.

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A todo o momento que o capitalismo sente-se ameaçado, temos em nossas vidas um resultado mais catastrófico. Esta situação não ocorre por ser necessária, como analisado por Perry Anderson. Para o neoliberalismo, a desigualdade é saudável para economia, assim, a taxa de desemprego é impulsionada, objetivando criar um exército de mão-de-obra reserva para quebrar e fragilizar os sindicatos.

O neoliberalismo não conseguiu atingir todos seus objetivos porque a desregulação do mercado gerou condições para que o capital fosse mais investido em especulação financeira do que em produção. Sabemos que nunca os bancos tiveram um lucro tão alto quanto após a propagação do ideário neoliberal. E também por conta do aumento do desemprego, impulsionado pelo neoliberalismo, o Estado continuou a gastar com políticas públicas para a manutenção da sobrevivência da população, mesmo tentando diminuir esses gastos.

A partir do ano de 1989, com a queda do muro de Berlin, a estrutura econômica, política e geográfica do mundo passa a ser redesenhada, podendo, este ano e a década que o segue, serem considerados aceleradores do tempo histórico. Nesse período, o mundo vê o capitalismo comemorar sua vitória sobre a derrocada do socialismo; com ela surgem novos mercados a serem conquistados e novas potências dão início ao processo mundial de globalização. Esta pode ser entendida como o fim das fronteiras para o capital, não existindo mais leis de controle econômico; o próprio capital é quem faz suas próprias leis. (HOBSBAWM, 1995).

Nesse período, o neoliberalismo se reafirma, já que sempre declarou como uma de suas metas a destruição do comunismo, e se renova, num momento em que começavam a evidenciar seus limites, uma vez que boa parte do leste europeu passa a ser “reformada” com base nesse projeto. Assim, o neoliberalismo vai ganhando hegemonia entre partidos e governos, tanto de direita quanto de esquerda, refletindo-se em privatizações massivas.

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cada local oferece. Mas o que realmente marca a globalização é o fortalecimento do mercado financeiro, que vem gerando mais lucro e acumulação que qualquer outro setor que compõe a economia. Para isso ele impulsiona a tecnologia de modo que as transações ocorram por todo o mundo ao mesmo tempo. Tornou as relações sociais efêmeras e distantes, com a sensação de proximidade, assim mudou o sentido do tempo e do espaço. Citando Giddens (1991, p. 69):

A globalização pode assim ser definida como a intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorridos a muitas milhas de distância e vice-versa.

Conforme analisado por Viviane Forrester (1997), vivemos um novo mundo, que possui um modelo inédito, o da cibernética, da automação, das tecnologias revolucionárias e que agora exerce o poder, tornando-se tão distante da nossa vida, que parece até mesmo que ele só existe na imaginação. A autora entende que está bem mais evidente a preocupação em criar o virtual, fazer novas combinações, negociar valores, mesmo antes de eles existirem. Enquanto isso, a vida da sociedade em geral, está sendo governada, sem que nós possamos participar da maioria das decisões, sem que muitas pessoas não consigam nem ao menos acessar projetos de assistência social. A grande maioria da sociedade continua acreditando que nada disso, nem as decisões políticas e econômicas e nem a miséria social, nos dizem respeito.

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1.1 - O discurso humanista do mundo do trabalho e o processo ideológico.

A reestruturação produtiva não comporta apenas aspectos referentes à engenharia da produção, mas ao contrário, talvez, sua maior cartada tenha sido a nova imagem que vem adotando, expressado por alternativas compostas de políticas que basicamente se referem a dois âmbitos: o da qualidade e o da responsabilidade social. Ambos são marcados pela ofensiva neoliberal que reveste a empresa com um discurso humanista, para atingir um diferencial na sua imagem, ou seja, uma estratégia de marketing que “agrega valor” ao que a empresa representa para a sociedade. Isso pode ser percebido no fato das empresas se referirem aos funcionários como seus “colaboradores”.

É óbvio que os funcionários são quem produz a riqueza da empresa, mas esta se apropria da riqueza produzida através da exploração aos trabalhadores, demonstrando o quanto esse discurso é ideológico e só gera vantagens para a empresa, pois enquanto o trabalhador acredita que ele e a empresa são parceiros, já que colaboração traz a idéia de mutualidade, ele está sendo explorado.

Também é muito comum a empresa incentivar os funcionários a criar novos produtos e repensar os processos de trabalho, de forma que atinja a diminuição de custos. Em troca o funcionário recebe um prêmio concreto podendo ser valor financeiro ou não, e também seu agradecimento, reconhecendo e destacando este funcionário diante dos outros, enquanto que a empresa por um longo período lucrará com aquela idéia, mesmo que demita esse funcionário.

Mesmo assim, os trabalhadores continuarão elevando os níveis de produtividade da empresa sem perceber que ela está diminuindo seus salários, flexibilizando seus direitos, necessariamente explorando a capacidade física e intelectual do trabalhador. Esta é uma das formas pela qual podemos notar que a globalização, a reestruturação produtiva e o neoliberalismo são estratégias que se entrecruzam; embora sejam diferenciadas, elas apóiam-se em busca do mesmo objetivo: a manutenção do capitalismo, através do controle sobre a classe trabalhadora e das idéias presentes em nossas vidas.

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conceito de qualidade total4 também emergiu, visto constituir uma maneira de conseguir a aprovação do consumidor, apresentando-se de uma forma material e simbólica através dos selos de certificação, que significam excelência em produção ou prestação de serviços, o que, logicamente, resulta em facilidades de créditos para a empresa.

Sabemos que para o mercado esta qualidade refere-se apenas ao resultado do processo, que gera o produto final. Porém, não é apenas a qualidade do produto que se propaga, a qualidade é propagada também como qualidade de vida para todos. Trata-se de um discurso que não se concretiza na vida dos trabalhadores. Concluindo, aquilo que é lógica do discurso empresarial e da classe dominante, por meio da ideologia, transmitida por meio das propagandas, passa a ser a lógica acreditada por todos.

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1.2 - Processos que se inter-relacionam e suas conseqüências para a política social no Brasil

Hayek nunca considerou a democracia como valor central do neoliberalismo. Entendia que a liberdade e a democracia poderiam consistir em um problema, se cada indivíduo dispusesse de sua renda e de sua propriedade como bem quisesse. Isso propiciou a existência na América Latina de um programa neoliberal baseado em ditaduras de qualidade cruel. “O Chile de Pinochet começou seus programas de maneira mais dura: desregulação, desemprego massivo, repressão sindical, redistribuição de renda em favor dos ricos, privatização dos bens públicos”. (ANDERSON, 2002, p. 19).

Nos países latinos que adotaram programas neoliberais, concentrou-se mais poder no executivo, por isso tiveram sua legislação alterada e as constituições golpeadas com reformas e emendas. Os governos que desejavam implantar gestões neoliberais utilizavam-se de uma estratégia que elevava a inflação a picos e depois apresentava o programa neoliberal como a única solução, o que não difere do que os setores dominantes vêm fazendo na área social. O neoliberalismo utiliza estratégias variadas para falir o atendimento dos serviços prestados pelo Estado, fazendo com que este diminua o repasse de recurso, privatize alguns serviços, para depois lhe dar o título de incompetente e se apossar dele.

Então, no Brasil, principalmente a partir do Governo Collor, intensificada pelo Governo de Fernando Henrique Cardoso e continuada pelo governo atual, mesmo com suas particularidades, a política neoliberal atribuindo ao Estado o título de incompetente, cria um espaço para a privatização dos serviços públicos. Conseqüentemente a esta lógica, se o Estado era incompetente, as empresas mantidas por ele também seriam, pois não tinham concorrência e comportavam um número grande de funcionários obsoletos, gerando gastos dispendiosos, o que colaborava no crescimento da dívida pública.

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período; e, por fim, porque os serviços prestados pela empresas privatizadas caíram em qualidade e aumentaram os preços, como nos casos da energia elétrica e telecomunicações. No Brasil, estas últimas têm sido recordistas em reclamações registradas contra elas nos serviços de defesa do direito de consumidor. Além disso, reduziram os empregos, por meio de processo de enxugamento e terceirização. (LESBAUPIN; MINEIRO, 2002).

As privatizações deveriam gerar recursos destinados à redução da dívida pública, segundo o governo. No entanto, a despeito da alienação de cerca de 75% do patrimônio público, a dívida líquida do setor público, puxada pelos juros elevados e pela redução do ritmo do crescimento econômico, não parou de crescer, criando crescentes dúvidas sobre a capacidade de pagamento federal, dos estados e municípios. (MATTOSO, 2002, p. 28).

Biondi (2003, p. 8) define a política de privatização do governo brasileiro como “negócio da China” para os “compradores”, mas péssimo para o Brasil.

Assim é a privatização brasileira: o governo financia a compra no leilão, vende “moedas podres” a longo prazo e ainda financia os investimentos que os “compradores” precisam fazer – até a Light recebeu um empréstimo de 730 milhões de reais no ano passado. E, para aumentar o lucro dos futuros “compradores”, o governo engole dívidas bilionárias, demite funcionários, investe maciçamente e até aumenta tarifas e preços antes da privatização.

Biondi (2003) faz várias denúncias vergonhosas quanto ao processo de privatização brasileiro, dentre elas destacamos:

• Na maioria das privatizações, os valores foram pagos em prestações e com juros

vergonhosamente baixos, fato muito bem escondido pela mídia.

• Ao fazer as primeiras privatizações, o governo aceitou “moedas podres”, isto é,

títulos antigos emitidos pelo governo que podiam ser comprados até pela metade do preço. Resultando, em apenas uma volta de parcela da dívida do governo em títulos, sendo nula a entrada de dinheiro nos cofres públicos. Na verdade, essas estatais foram compradas pela metade do preço anunciado e ainda, os títulos foram financiados em até 12 anos.

• Depois de “comprarem” as estatais, as empresas privadas ainda ganham

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• Próximo à privatização, o governo dobrou os investimentos nas estatais, tudo isso

gerou um aumento da dívida do país e um programa de “ajuste fiscal”, reduzindo os investimentos no atendimento às necessidades da população.

Fica claro que o processo de privatização do governo FHC, atribuindo ao Estado um título de incompetência, teve por objetivo privilegiar as multinacionais em detrimento do interesse público.

Analisando as conseqüências da passagem da responsabilidade estatal para a sociedade civil nos países da América Latina, percebemos que a precarização no atendimento à população tende a ser maior. Primeiro por constituirmos países dependentes do imperialismo norte-americano, que tem a obrigação de cumprir com as ordens dos organismos financeiros internacionais, e segundo porque nunca houve de fato uma prestação de serviços de qualidade à população, por parte do Estado brasileiro. O governo brasileiro sabe acompanhar bem as recomendações dos organismos internacionais, utilizando políticas sociais cada vez mais limitadas, mais minimizadas, desmontando o serviço público.

Segundo Gaudêncio Frigotto (2001), vemos que nesse período, quem dirige a vida social são os grandes organismos do capital. O Consenso de Washington5 e suas conseqüências demonstram claramente essa dominação. O Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e a Organização Internacional do Trabalho interferem no nosso cotidiano adaptando-o aos seus interesses privados. Cada vez mais o capital está se reproduzindo por si mesmo, através de dois elementos de importância: o conhecimento e a tecnologia, que fazem com que o capital vá se desprendendo da força de trabalho. Ficamos à mercê dos interesses do capital que, por estar se tornando independente da mão-de-obra, de fronteiras e de mercado, acabam minimizando seus gastos, ao mesmo tempo em que maximizam seu lucro.

Com isso, a globalização contribui para o aumento do desemprego e proliferação da pobreza que atinge países subdesenvolvidos e desenvolvidos.

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Então, concluímos que estamos diante de uma pobreza globalizada. No entanto, não podemos deixar de considerar que a globalização não é um processo que pretende ser homogêneo, pelo contrário, aumenta a exclusão social6, ao mesmo tempo em que acumula riquezas para os setores dominantes. Neste sentido, é verdadeira a afirmação de Mattoso (2002, p. 35) que:

[...] o Brasil é um caso exemplar de aceitação das regras do Consenso de Washington, que redundaram neste constrangimento ao crescimento. As aberturas comercial e financeira, em sua forma passiva e subordinada, conduziram à sobrevalorização cambial com juros elevados e ao progressivo constrangimento do crescimento.

Complementando a afirmação anterior, o mesmo autor aponta para ampla subordinação ao capital financeiro internacional e para a ausência de resultados positivos desta postura para a população brasileira.

A mundialização de bens e capitais sob a supremacia do capital financeiro não trouxe a esperada convergência da riqueza nas nações, mas a reafirmação da hegemonia e da centralidade dos Estados Unidos, que de Washington distribuiu seu consenso. Para os países que abandonaram um projeto nacional próprio, o Consenso de Washington tornou-se um must, uma política única de um pensamento único, cujos comportamentos desviantes seriam combatidos com os movimentos voláteis e disciplinadores do capital financeiro. (MATTOSO, 2002, p. 23).

A globalização colaborou para o processo de redução dos postos de trabalho, porque todo o lucro da produção é destinado ao país de origem da empresa, assim ela não favorece o crescimento da economia, fundamental para geração de empregos. Favorece, também, a importação de produtos de países desenvolvidos para subdesenvolvidos, gerando uma transferência da nossa riqueza para outro país e junto com ela nossos empregos.

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A globalização financeira e a livre mobilidade de bens e capitais têm induzido os países da periferia que se integram subordinadamente à economia global a adotarem aberturas financeira e comercial indiscriminada e taxas de juros elevadas como forma de atrair capitais, tornando crescentemente problemático o desenvolvimento sustentado de suas economias. (MATTOSO, 2002, p. 26).

Além do desemprego, as empresas também se fortalecem enfraquecendo os sindicatos, estes conseguem menos acordos coletivos e sentem dificuldade em reverter os salários baixos, o que resulta na queda do nível de sindicalização. Hoje, os sindicatos passaram a lutar mais pela manutenção dos direitos do que pela conquista, já que os atuais sofrem ameaças contínuas. O INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) adota critérios cada vez mais rígidos para os segurados, se é que podemos classificar o contribuinte assim, já que está cada vez mais difícil o acesso aos benefícios garantidos ao trabalhador.

A miséria humana é expressa de forma fria pelos números, ocultando a situação real vivida pelo trabalhador e sua família. A mídia costuma atribuir o desemprego à falta de qualificação pessoal, transmitindo a falsa idéia de que existem os empregos, porém, são as pessoas que não estão preparadas para assumi-los. Ainda a precarização das condições de trabalho é menos visível do que o desemprego, considerando o crescimento da informalidade como a única saída para milhões de pessoas.

Outra conseqüência desse processo de “reforma” do país aos moldes dos países hegemônicos, está sendo vista num movimento de ampla reforma da legislação vigente. Vemos o caso da nossa Constituição de 1988, que foi fruto da conquista dos trabalhos e hoje vem sofrendo com tantas emendas, que aos poucos estão descaracterizando aquela constituição resultante da luta da sociedade civil organizada. Conforme Rouanet (1993, p. 25):

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A tabela a seguir demonstra essa transformação constitucional em uma área apenas, a do trabalho, que é o foco desta pesquisa, mas que também não se diferencia de outras áreas.

Principais Mudanças na Legislação Trabalhistas a Partir do Plano Real

Medida Instrumento Data Regulamentação da participação dos trabalhadores

nos lucros e resultados

MP 794 Lei nº 10.101

1994 2000 Regulamentação das cooperativas Lei nº 8.949 1994 Desindexação salarial MP 1.053 1995 Denúncia da convenção 158 da OIT (vigorou por 10

meses)

Decreto 2.100 1996

Desvinculação da correção do salário mínimo de qualquer índice de reposição da inflação

MP 1.906 1997

Precarização das relações de trabalho dos funcionários públicos

• Limitação de dirigentes das associações de

classe

• Controle das negociações salariais nas

empresas salariais

Decreto 2.066 1996

• Reforma administrativa com flexibilização de

direitos;

• Arrocho salarial;

• Não reconhecimento do direito de greve

Decreto 2.028 1996

Adoção do contrato por prazo determinado Lei nº 9.061 e Decreto 2.490

1998

Regulamentação do banco de horas Lei nº 9.061 e Decreto 2.490

1998

Suspensão temporária do contrato de Trabalho MP 1.726 1998 Regulamentação da Jornada parcial (com redução

proporcional de salários e benefícios)

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Aumento do período de 4 meses para um ano para compensação de jornada extra através do banco de horas

MP 1.727 1998

Proposta de alteração do arcabouço institucional das relações de trabalho

Proposta de Emenda

Constitucional nº 623

1998

Instituição das Comissões de Conciliação Prévia – CCP

Lei nº 8.959 2000

Procedimento Sumaríssimo (julgamento entre 15 e 30 dias)

Lei nº 9.957 2000

Extinção do Juiz Classista

Flexibilização do artigo 7 Da Constituição Federal – Possibilidade da negociação coletiva flexibilizar a CLT.

Já foi aprovado na Câmara dos Deputados. Nesse momento se

encontra no Senado Federal e o

Governo acena com a possibilidade de postergar a tramitação para o início de 2003

2001

(35)

1.3 - A reforma do Estado Brasileiro

Ao serem modificadas as condições históricas do processo de acumulação capitalista com os processos de globalização e ajuste neoliberal, o Estado moderno também tem que modificar suas atribuições, pois está à mercê do capital. Assim, em nome da competitividade do mercado, as leis trabalhistas são alteradas e o Estado passa por um processo de reforma em suas bases.

O Brasil possui uma inserção subalterna na ordem mundial. A nação brasileira, em sua gênese, traz a marca do personalismo e da troca de favores, dos desmandos dos poderosos e da ausência de poder dos trabalhadores. Dessa cultura resulta o patrimonialismo, no qual os interesses privados da elite prevalecem sobre os coletivos.

(...) a proposta neoliberal é a de cortar ainda mais o gastos públicos, agravando a já iníqua situação de alocação de recursos para as

políticas sociais. Essa perversa combinação vem gerando um círculo vicioso, cuja ruptura tem sido marcada por propostas de “reformas” no âmbito social que nem sequer têm minimizado aquilo que se considera como “seqüelas transitórias” do ajuste. Pelo contrário, sob a denominação de “reformas” têm-se provocado na América Latina processos de desmonte dos incipientes aparatos públicos de proteção social. (SOARES, 2000, p. 71).

A reforma do Estado não é um fenômeno isolado; está inserida nas mudanças internacionais. Ela expressa a concretização de um movimento conservador que quer suprimir o Estado de Bem-estar Social.

Este tema entra nos debates políticos em 1980. Os países que iniciaram as reformas liberais foram Inglaterra, Estados Unidos, Nova Zelândia, Austrália e vários outros países europeus, como Alemanha e Itália. Na América Latina, Chile, México e Argentina foram os países que iniciaram as experiências de reforma do Estado, ainda na década de 1980.

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A reforma do Estado brasileiro na era da globalização, quase sem exagerar (embora os que me conhecem sabem que sou dado ao exagero), parece um esforço das classes dominantes em fazer cumprir um dos mais sombrios anátemas de Marx e Engels no Manifesto. Aquele que dizia que os governos não passam de comitês executivos da burguesia. O governo brasileiro, os governos latino-americanos em geral, se esforçam pra estar entre os primeiros e mais fiéis a homenageá-los, fazendo valer seus mais sombrios anátemas. Que estranha homenagem! Bem que o presidente brasileiro, que teve Marx e Engels como mestres, no passado, poderia achar outra maneira melhor de render-lhes tributo!

Os países passam a se integrar em blocos supranacionais. Como exemplo, em 1994, cria-se a Organização Mundial do Comércio, que altera as políticas domésticas dos governos nacionais e diminui a autonomia dos Estados que a integram. O Mercosul possui baixa complementaridade comercial entre os parceiros, pois eles disputam mercado por produtos similares.

Em nossa avaliação, essa disputa por mercados gera problemas internos aos países, já que para atrair o investimento interno fazem-se propostas de relaxamento de legislação, doação de terrenos e, na maioria das vezes, esse investimento não melhora a vida da população, não há um retorno eficaz por parte das empresas.

Borón (SADER; GENTILLI, 1999, p. 38) chama a atenção para o poderio das empresas privadas, que além de assumirem um tamanho estatal, interferem em seus mecanismos decisórios, a favor de seus interesses particulares.

Contudo, no final do século XX, se pode construir um argumento que inverte radicalmente os termos da proposta hobbesiana. Em que sentido? No sentido de que os Leviatãs agora são muitos, e não só um, como queria o filósofo político. E, mais importante ainda, esses Leviatãs são privados, são as grandes empresas que, nas últimas décadas, garantiram seu predomínio nos mercados mundiais até limites inimagináveis faz poucos anos. Como sabemos, o poderio que hoje caracteriza os megacomglomerados da economia mundial – gigantescas burocracias privadas que não prestam conta a ninguém nem a nada – não tem precedentes na história.

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Essa reforma, na visão de Oliveira (SADER; GENTILLI, 1999, p. 72), atinge tanto as classes dominantes quanto as dominadas.

A reforma do Estado era dos dois lados, um tema candente, atual e central da luta política, sob todos os ângulos. Não é à toa que ela esteve no centro das últimas campanhas políticas. A agenda da última década foi pautada toda ela em torno da reforma do Estado. Quando se fala de privatização, quando se fala de reforma do estatuto de funcionários, está se falando da questão do Estado. Essa questão era e continua sendo crucial para os dois blocos principais, esquematicamente, os dois blocos que em duas grandes eleições, em 89 e 94, debateram propostas que distinguiam perfeitamente os dominantes procurando redefinir o papel do Estado no controle dos dominados, enquanto a oposição procurava precisamente utilizar o Estado para aumentar os conteúdos e espaços de autonomia dos movimentos populares: porque é disso que se trata, quando se fala de reforma do Estado, do ângulo popular e do ângulo das classes e do grande bloco dominante.

Para atrair o capital externo, o governo deixa de proteger a indústria nacional, e esta perde competitividade. Esse capital especulativo, ao primeiro sinal de risco, abandona o país levando seu lucro e sem deixar novos empregos. Por isso, somos favoráveis à denominada taxa Tobin, que significa um controle ao capital especulativo.

Enquanto imposto sobre as transações cambiais com fins especulativos, o tributo Tobin inaugura uma forma de relação entre o público e o privado, completamente diferente da espécie habitual de aliança entre a esfera política e a financeira (...): Tributar as operações de câmbio para penalizar a especulação, controlar o movimento de capitais de curto prazo significa fazer uma séria advertência política aos principais agentes econômicos e afirmar que o interesse geral deve prevalecer sobre os interesses particulares e a necessidade de desenvolvimento sobre a especulação internacional.

(CHESNAIS, 1999, p. 12).

Outro problema do nosso país é que a carga tributária só afeta empresas pequenas e de médio porte e penaliza os consumidores.

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menos taxadas do que no mundo desenvolvido. (SADER; GENTILLI, 1999, p. 53).

FHC propõe uma reforma na administração pública com base em uma administração gerencial, ou seja, uma discussão técnica esvaziada de conteúdo político. Buscou ajuda da grande mídia, que respondeu em apoio à reforma em nome do medo da volta da inflação. Acreditamos que quanto a essa questão caiba a crítica de Boaventura (2000, p. 331).

A modernidade tem uma maneira peculiar de combinar a grandeza do futuro com a sua miniaturização, isto é, de classificar e fragmentar os grandes objectivos do progresso infinito em soluções técnicas que se distinguem essencialmente pelo facto de a sua credibilidade transcender aquilo que a técnica pode garantir. As soluções técnicas, que são parte integrante da cultura instrumental da modernidade, têm um excesso de credibilidade que oculta e neutraliza o seu défice de capacidade. Daí que tais soluções não nos incentivem a pensar o futuro, até porque elas próprias já deixaram de pensar a muito tempo.

Para o bloco dominante, a crise do Estado seria desatada pelo corte de gastos públicos e privatização das empresas. Fica claro que o processo de privatização do governo FHC, atribuindo ao Estado o título de incompetente, teve por objetivo privilegiar as multinacionais em detrimento do interesse público.

O Plano Diretor que orientou a reforma do Estado tinha por base que o Estado deveria estar fora do setor produtivo e de que a crise do Estado relacionava-se aos gastos sociais.

Sabemos que os custos das demandas sociais é argumento clássico das reformas neoliberais, utilizado desde a década de 1970 até os dias de hoje. Por isso, mesmo com a Constituição Federal de 1988, a Política Social ficou aquém do necessário, devido às exigências do Banco Mundial.

Foi uma reforma do papel do Estado, na qual reformar significou transferir para o setor privado tudo que fosse possível.

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A administração gerencial prevê maior autonomia na gestão orçamentária, financeira, pessoal, de compras e contratações, ou seja, em nossa opinião, menos controle dos gastos públicos.

O Estado impulsionou a criação de parcerias, criando legislação para firmar contratos de gestão. Ora, é ilusório pensarmos em parceria, já que esta pressupõe atividades em um mesmo nível de colaboração; o que ocorre na realidade é a transferência de recursos para as organizações sociais que prestam serviços, mas em que não há uma fiscalização eficaz sobre os gastos e sua atuação. Assim, podemos concluir que tais contratos não passam de uma terceirização do setor público.

É uma maneira de transferir os custos e responsabilidades do Estado para a sociedade civil, já que pela proposta liberal o Estado deve ficar menos na área social e mais forte na organização das condições gerais para a manutenção do lucro privado.

O esvaziamento do setor público e o conseqüente desmantelamento de seus serviços sociais fizeram-se acompanhar por um retrocesso histórico, qual seja, o retorno à família e aos órgãos da sociedade civil sem fins lucrativos, como agentes do bem-estar social. Isto vem implicando a renúncia explícita do Estado em assumir sua responsabilidade na prestação de serviços sociais (sobretudo saúde e educação) em bases universais. (SOARES, 2000, p. 80).

No Plano Diretor, o cidadão passou a ser visto como cliente, o que demonstra a isenção do sentido político. A propaganda ideológica do governo FHC foi para justificar a reestruturação na máquina estatal, utilizou-se da bandeira do ajuste de caixa, sem esclarecer os efeitos sociais dessa medida, apenas a demonstrou como um sistema que acabaria com os privilégios do funcionalismo público.

A reforma da Previdência Social é parte importante do processo de ajuste fiscal; outro ponto importante é a sua privatização.

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maioria dos casos, não leva em consideração nem a evolução histórica nem a composição estrutural de cada sistema de seguridade social, desrespeitando, portanto, as especificidades de cada país. O caso brasileiro não foge a essa regra. (SOARES, 2000, p. 86).

O grande problema da Previdência Social é que suas fontes estão secando, devido à queda do nível do emprego e aumento da informalização do mercado.

O Partido dos Trabalhadores (PT), quando oposição, afirma que essa crise era relacionada aos desvios de recursos e sonegação do setor privado com a Previdência. Esse discurso ficou esquecido com a reforma do governo Lula. Para Lúcia Cortes da Costa (2006, p. 194) “é mais fácil retirar dos trabalhadores do que fazer valer as leis que prevêem como crime à sonegação fiscal”, com o que concordamos veementemente; foi mais fácil para o PT adotar o discurso que criticava a fazer uma reforma justa para os trabalhadores.

Na reforma do Estado foi articulada a redução da máquina pública com a reforma administrativa. O poder público se retira da operacionalização dos serviços e cria parcerias com o setor privado.

Essa proposta surge em 1990, como orientação do Banco Mundial, que considerava a despesa com serviços sociais ineficiente. Perdeu-se o caráter universal no atendimento; para o Banco, apenas os que não podem pagar pelos serviços devem recebê-los. Isso em nosso entendimento descaracteriza a condição de direito e contraria a Constituição Federal e o Sistema Único de Saúde.

Uma das estratégias neoliberais mais disseminadas (...) é a

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Ocorre que as camadas médias não reivindicam o acesso aos serviços, por serem vistos como de má qualidade, reforçando a tese do Banco Mundial de que o Estado deve atender apenas aos mais pobres.

O modelo chileno de prestação de serviços foi divulgado pelo Banco Mundial como um exemplo a ser seguido, mantendo uma rede de serviços, baseada no modelo de parcerias com o setor privado.

Introduz-se a falsa idéia do “autofinancimento” dos serviços. A experiência chilena de privatização dos serviços de saúde, introduzindo tarifas pretensamente seletivas nas unidades públicas de saúde, além de restringir a acesso, demonstrou a sua ineficácia em aumentar o volume de recursos do setor, já que a grande maioria da população que procurava esses serviços não tinha condições de pagar por eles. (SOARES, 2000, p. 71).

Esse discurso oculta o descompromisso do Estado e para FHC o Estado deve assumir apenas a tarefa de um facilitador do processo, subsidiando as iniciativas da sociedade civil, sem ser o responsável pela sua operacionalização. Além da descentralização dos serviços, que passam a ser de responsabilidade executiva dos níveis estaduais e municipais.

Com esse tipo de reforma do Estado não há política social possível. O Estado que não pode mais ter moeda não pode fazer mais discriminação monetária; não pode mais fazer discriminação orçamentária; não pode ter iniciativa para criar as políticas sociais que são necessárias. A política social, que desde a grande depressão transitou da caridade pública ou privada para inscrever-se como uma macro política estrutural, no nível da política monetária, no nível da política fiscal e no nível da política industrial, a política social presente no desenvolvimento do capitalismo no segundo pós-guerra, transformou-se numa política estruturante, voltou a ser uma coisa do privado. (SADER; GENTILLI, 1999, p.77).

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Certamente, nivelar o governo Lula com base nos governos anteriores, como a mídia vem fazendo, utilizando o discurso de que este governo é mera continuidade de seu antecessor, é um equívoco ou falta de atenção. Muitas mudanças ocorreram e outras estão em processo. Observando algumas ações do atual governo, vemos que embora o neoliberalismo esteja presente, existe a preocupação de não afastar totalmente o Estado da vida social.

Nesse espaço não poderemos nos aprofundar e nem apresentar todas as alterações ocorridas. Mas, um bom exemplo, é o programa Bolsa Família, mesmo não possuindo, de fato, características emancipatórias, sua cobertura marca a responsabilidade estatal presente nas regiões que mais sofrem com a desigualdade do país.

Um artigo da Revista Carta Capital (2008, p. 16) traz uma posição diferenciada do restante da mídia, ao destacar duas constatações do Banco Mundial: “o Bolsa Família é um programa exemplar e deve servir de modelo para futuras experiências” e “a mídia brasileira faz uma cobertura excessivamente negativa do programa e tem dificuldade em reconhecer seus avanços ou discutir maneiras para aperfeiçoá-lo.” O artigo critica a mídia por falta de equilíbrio e a classe média por não perceber os ganhos gerais que a redução da miséria traz ao Brasil. Quanto à constatação do Banco Mundial, mesmo com as críticas que temos a ele, sua análise foi um fato importante, pois vem de fora do Brasil; só não concordamos com a afirmação de que o programa seja exemplar. Sem dúvida essa constatação serviu para chamar atenção da mídia para uma cobertura do programa mais coerente com a realidade e menos superficial.

Imagem

Fig. 7 - Gráfico: Condições salariais
Fig. 8 - Gráfico: Nº de vínculos empregadícios X Nº de vínculos  empregadícios em Serviço Social
Fig. 10 - Gráfico: Carga horária semanal
Fig. 12 - Gráfico: Natureza do emprego anterior

Referências

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