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Participação da mTOR na potencialização do efeito tipo-antidepressivo da cetamina pela guanosina no teste da alimentação suprimida pela novidade

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Academic year: 2021

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PARTICIPAÇÃO DA mTOR NA POTENCIALIZAÇÃO DO EFEITO TIPO-ANTIDEPRESSIVO DA CETAMINA PELA GUANOSINA NO TESTE DA ALIMENTAÇÃO SUPRIMIDA

PELA NOVIDADE

Dissertação submetida ao Programa de Pós-Graduação em Neurociências da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do Grau de Mestre em Neurociências

Orientadora:

Prof. Dra. Ana Lúcia Severo Rodrigues

FLORIANÓPOLIS 2019

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Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor, através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC.

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Agradeço imensamente à minha avó Maria Salete Camargo, pela incondicionalidade de sua presença em minha vida. Sobretudo por dedicar sua vida a mim, você não mediu esforços para que eu chegasse até esta etapa de minha vida;

À minha família (mãe, tias e irmão) pelo amor, incentivo e apoio incondicional, especialmente por sempre terem confiado em mim e depositado confiança em minhas escolhas;

Ao meu companheiro Guilherme Freitas de Carvalho, de forma especial, pelo amor, carinho e presença, mas especialmente pela compreensão e paciência. Sem você e Nunu a estrada seria mais difícil e menos feliz;

À minha orientadora Dra. Ana Lúcia Severo Rodrigues, agradeço plenamente pela excelente orientação, competência e profissionalismo e por ser um exemplo de ser humano. Sobretudo por dividir todo o seu conhecimento durante esse período;

À minha amiga Ana Paula Dalmagro pelo carinho, apoio e incentivo imensurável, pelos sorrisos que tornaram meus dias mais divertidos;

Aos meus amigos Francis e Júlia pelas ajudas constantes no laboratório, mas especialmente pelo apoio, brincadeiras e burritos. Jamais vou esquecer de vocês;

Aos meus queridos amigos Manoella, Junior, Katleen, Felipe, Dimas, Filipe, André, Bruna, Elsa e Sabrina pela amizade incondicional, pelas brincadeiras e festas;

À minha amiga e ex-orientadora Ana Lúcia Bertarello Zeni por ter me oportunizado o contato com a ciência, mas especialmente pelo carinho e suporte. Obrigado por tudo.

À equipe do Laboratório de Neurobiologia da Depressão, Aline, Daiane, Morgana, Vivian e Priscila pelo apoio e pelas contribuições durante este período;

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Agradeço também a todos os professores e aos meus colegas que me acompanharam durante o mestrado, foi um prazer conhecê-los;

À todas as pessoas que, direta ou indiretamente, contribuíram para que este trabalho se realizasse;

À FAPESC e UFSC pelo apoio financeiro e pela infraestrutura. Muito obrigado!

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A depressão é um transtorno de humor incapacitante altamente prevalente e uma causa comum de mortalidade. Apesar da alta prevalência no mundo, as bases neurobiológicas desta condição clínica ainda não estão totalmente compreendidas. O potencial da cetamina para o tratamento da depressão refratária tem sido considerado uma das descobertas mais importantes nos últimos anos, no entanto seu o uso repetido é limitado devido aos efeitos adversos. Desta forma, a busca por estratégias que possam atenuar os efeitos adversos da cetamina tornam-se necessárias. De fato, abordagens emergentes como as estratégias de potencialização foram postuladas para este propósito. Portanto, no presente trabalho buscou-se potencializar o efeito da cetamina pela guanosina no teste da alimentação suprimida por novidade, um paradigma comportamental capaz de detectar comportamentos relacionados à depressão/ansiedade. Neste trabalho, observou-se que a administração aguda com guanosina (0,05 mg/kg, p.o.), similar à cetamina (1 mg/kg, i.p), produziu um rápido efeito em animais submetidos ao teste da alimentação suprimida pela novidade. Além disso, a coadministração com doses sub-efetivas de guanosina (0,01 mg/kg, p.o.) e cetamina (0,1 mg/kg, i.p.) foi efetiva em animais submetidos ao teste da alimentação suprimida pela novidade, o que sugere uma potencialização do efeito da cetamina pela guanosina. Subsequentemente, decidiu-se investigar o mecanismo de ação intracelular subjacente a este efeito. Os resultados sugerem que a potencialização da resposta da cetamina pela guanosina provavelmente envolve a via da mTOR, visto que a administração da rapamicina (0,2 nmol/sítio, i.c.v., um inibidor seletivo da mTOR) aboliu completamente este efeito. Além disso, esta resposta comportamental de potencialização está associada com um incremento da fosforilação da mTOR (Ser2448) no

hipocampo de camundongos submetidos ao teste da alimentação suprimida pela novidade, o que por sua vez reforça o papel da via de sinalização intracelular mediada pela mTOR na potencialização do efeito da cetamina pela guanosina. No entanto, não foram observadas alterações no imunoconteúdo de p70S6K, PSD-95, GluA1 e sinapsina (proteínas sinápticas alvo da mTOR) no hipocampo de camundongos. Em conjunto, os dados desta pesquisa fornecem evidências de que a guanosina é capaz de potencializar o efeito da cetamina, e esta estratégia pode ser útil para o tratamento da depressão e da ansiedade.

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Depression is a disabling mood disorder with high prevalence and a common cause of mortality. Despite the high prevalence in the worldwide, the neurobiological bases of this medical condition remain incompletely understood. The ketamine’s potential for the treatment of refractory depression has been considered one the most important discoveries in the last years, however, repeated use of ketamine is limited due to its side/adverse effects. Therefore, the search for effective augmentation strategies that may reduce ketamine doses is welcome. Indeed, emerging approaches as the augmentation strategies have been postulated for this purpose. Thus, this study sought to augment the effect of ketamine by guanosine in the novelty-suppressed feeding test, a behavioral paradigm able to detect depression/anxiety-related behavior. Acute administration of guanosine (0.05 mg/kg, p.o.), similar to ketamine (1 mg/kg, i.p.), produced a rapid behavioral response in mice submitted to novelty-suppressed feeding test. Moreover, the coadministration of sub-effective doses of guanosine (0.01 mg/kg, p.o.) and ketamine (0.1 mg/kg, i.p.) was effective in mice submitted to novelty-suppressed feeding test, which suggests an augmented effect. Subsequently, the intracellular mechanism underpinning the augmentation effect of ketamine by guanosine was investigated. Our results suggest that augmentation response of ketamine by guanosine in the novelty-suppressed feeding test probably involves the activation of mTOR signaling since the treatment with rapamycin (0, 2 nmol/site, i.c.v., a selective mTOR inhibitor) completely abolished this effect. This augmentation strategy also increased mTOR phosphorylation (Ser2448) in

the hippocampus of mice subjected to the novelty-suppressed feeding test, reinforcing the role of mTOR in this augmentation response. However, no changes in the p70S6K, PSD-95, GluA1, and synapsin immunocontents (target synaptic proteins of mTOR) were found in the hippocampus of ketamine plus guanosine-treated mice. Overall, results provide evidence that guanosine is able to augment the effect of ketamine in the NSF test via mTOR activation, a finding that might have therapeutic implications for the management of depression/anxiety.

Keywords: Ketamine. Depression. Guanosine.

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Figura 1. Critérios diagnósticos da depressão de acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. ... 22 Figura 2. Hipótese monoaminérgica da depressão. ... 25 Figura 3. Estrutura química da cetamina. ... 30 Figura 4. Mecanismo farmacológico da cetamina subjacente ao efeito antidepressivo de ação rápida ... 33 Figura 5. Estrutura química da guanosina. ... 36 Figura 6. Mecanismos envolvidos no efeito neuroprotetor da guanosina. . 38 Figura 7. Protocolo experimental para avaliação do efeito

tipo-antidepressivo da guanosina e da cetamina em camundongos submetidos ao teste da alimentação suprimida pela novidade. ... 48 Figura 8. Protocolo experimental para avaliação da potencialização do efeito da cetamina pela guanosina em camundongos. ... 49 Figura 9. Protocolo experimental para avaliação do envolvimento da mTOR na potencialização do efeito da cetamina pela guanosina em

camundongos. ... 50 Figura 10. Efeito do tratamento de uma única administração de guanosina ou cetamina em camundongos submetidos ao teste da alimentação

suprimida pela novidade. ... 54 Figura 11. Potencialização do efeito da cetamina pela guanosina em camundongos submetidos ao teste da alimentação suprimida pela novidade. ... 56 Figura 12. Envolvimento da mTOR na potencialização do efeito da

cetamina pela guanosina em camundongos submetidos ao teste da

alimentação suprimida pela novidade. ... 58 Figura 13. Efeito da administração única com guanosina (0,01 mg/kg), cetamina (0,1 mg/kg) ou a associação de guanosina e cetamina sobre a fosforilação (A) e imunoconteúdo total (B) de mTOR no hipocampo. ... 60 Figura 14. Efeito da administração única com guanosina (0,01 mg/kg), cetamina (0,1 mg/kg) ou a associação de guanosina e cetamina sobre a fosforilação (A) e imunoconteúdo total (B) de p70S6K no hipocampo. ... 62 Figura 15. Efeito da administração com guanosina (0,01 mg/kg) ou

cetamina (0,1 mg/kg), isoladas ou associadas sobre o imunoconteúdo de PSD-95 (A), GluA1 (B) e sinapsina (C). ... 64

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4E-BP – Proteína ligadora do fator de alongamento 4E 5-HT1A – Autorreceptores serotoninérgicos do tipo 1ª ADP – Adenosina-5’-difosfato

Akt – Proteína cinase B

AMP – Adenosina- 5´-monofosfato

AMPA – Alfa-amino-3-hidroxi-metil-5-4-isoxazolpropiónico ANOVA – Análise de variância

ATC – Antidepressivo tricíclico ATP – Adenosina-5’-trifosfato

BDNF – Fator neurotrófico derivado do encéfalo CCVD – Canais de cálcio dependentes de voltagem DO – Densidade óptica

DSM – Manual de diagnóstico e estatístico de transtornos mentais E.P.M – Erro padrão da média

EAAT1 – Transportadores de aminoácidos excitatórios do tipo EAAT2 – Transportadores de aminoácidos excitatórios do tipo eEF2K – Proteína cinase do fator de alongamento eucariótico 2 FGF-2 – Fator de crescimento de fibroblasto 2

GABA – Ácido γ-aminobutírico GDP – Guanosina-5’-difosfato

GluA1 – Subunidade 1 de receptores AMPA GMP – Guanosina-5’-monofosfato

GSK3β – Glicogênio sintase cinase 3β GTP – Guanosina-5’-trifosfato HO-1 –Heme oxigenase-1 i.c.v. – Intracerebroventricular i.p. – Intraperitoneal

iMAO – Inibidor da monoamina oxidase

ISRS –Inibidor seletivo de recaptação de serotonina MAO – Monoamina oxidase

MAPK – Proteína cinase ativada por mitógeno mGLU – Receptor metabotrópico de glutamato MPP+ – 1-metil-4-fenilpiridinio

mRNA – Ácido ribonucleico mensageiro

mTOR – Proteína alvo mecanístico da rapamicina NGF – fator de crescimento do nervo

NMDA – N-metil-D-aspartato OMS – Organização mundial da saúde p.o. – Per os

p70S6K – Proteína ribossomal S6 cinase de 70 kDa PI3K – Fosfatidilinositol 3’ cinase

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PSD-95 – Proteína de densidade sináptica de 95 kDa Ser – Serina

TGF-β – Fator de crescimento transformador β Thr – Treonina

TNF – Teste do nado forçado

TrkB – Receptor tropomiosina cinase B TSC – Teste de suspensão pela cauda

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1INTRODUÇÃO ... 21

1.1 TRANSTORNO DEPRESSIVO MAIOR ... 21

1.2 SISTEMA GLUTAMATÉRGICO ... 28

1.3 SISTEMA PURINÉRGICO ... 34

1.4 ESTRATÉGIAS ANTIDEPRESSIVAS DE POTENCIALIZAÇÃO ... 39

2JUSTIFICATIVA ... 43 3 OBJETIVOS ... 45 3.1 OBJETIVO GERAL ... 45 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 45 4 MATERIAIS E MÉTODOS ... 47 4.1 ANIMAIS ... 47

4.2 AGENTES FARMACOLÓGICOS E TRATAMENTO ... 47

4.3 TESTE DA ALIMENTAÇÃO SUPRIMIDA PELA NOVIDADE ... 50

4.4 IMUNODETECÇÃO DE PROTEÍNAS POR WESTERN BLOTTING 51 4.5 DOSAGEM DE PROTEÍNAS ... 52

4.6 ANÁLISES ESTATÍSTICAS ... 52

5 RESULTADOS ... 53

5.1 EFEITO DA GUANOSINA E CETAMINA EM CAMUNDONGOS SUBMETIDOS AO TESTE DA ALIMENTAÇÃO SUPRIMIDA PELA NOVIDADE ... 53

5.2 ENVOLVIMENTO DA mTOR NA POTENCIALIZAÇÃO DO EFEITO DA CETAMINA PELA GUANOSINA EM CAMUNDONGOS ... 57

5.3 EFEITO DA COADMINISTRAÇÃO DE GUANOSINA E CETAMINA SOBRE O IMUNOCONTEÚDO HIPOCAMPAL DE mTOR, p70S6K, PSD-95, GluA1 E SINAPSINA ... 59

6 DISCUSSÃO ... 65

7 CONCLUSÕES ... 71

8 PERSPECTIVAS ... 73

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1 INTRODUÇÃO

1.1 TRANSTORNO DEPRESSIVO MAIOR

Os transtornos do espectro do humor, incluindo o transtorno bipolar e o transtorno depressivo maior, são condições clínicas altamente prevalentes e que causam um significativo comprometimento na qualidade de vida tanto dos indivíduos quanto dos seus familiares (KESSLER; MERIKANGAS; WANG, 2007; MERIKANGAS et al., 2017). Em particular, o transtorno depressivo maior (que será tratado nesta dissertação como depressão) é um transtorno neuropsiquiátrico crônico e recorrente, que é tipicamente caracterizado por prejuízos afetivos, cognitivos e fisiológicos que podem afetar gravemente o bem-estar do indivíduo acometido (NEMEROFF, 2007; PAPAKOSTAS; IONESCU, 2015; ROISER; ELLIOTT; SAHAKIAN, 2012).

Do ponto de vista sintomatológico, um indivíduo com depressão deve apresentar pelo menos cinco dos seguintes sintomas (Figura 1), por um período mínimo de duas semanas, e quase que diariamente: i) humor deprimido evidente; ii) diminuição no interesse ou prazer em todas ou quase todas as atividades; iii) diminuição ou aumento no apetite, associado com alterações no peso sem dieta alimentar aparente; iv) insônia ou hipersônia; v) agitação ou retardo psicomotor; vi) sensação de fadiga; vii) sentimento excessivo de inutilidade ou culpa; viii) diminuição na capacidade de concentração e tomada de decisões; ix) pensamentos recorrentes de morte ou ideação suicida (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2013).

Além disso, é necessário que um dos dois primeiros sintomas esteja presente, e o que os sintomas apresentados causem prejuízo nas áreas sociais ou ocupacionais. Por fim, é conveniente destacar que os sintomas apresentados não sejam atribuídos ao uso de qualquer substância ou fármaco pelo indivíduo e não sejam associados a qualquer outra condição médica como por exemplo, episódios de mania, esquizofrenia ou qualquer outro transtorno (ARMOUR; JANA; ELHAI, 2016; OTTE et al., 2016). A depressão é atualmente a principal causa de incapacitação a nível global e também a principal causa de mortes por suicídio por ano (OMS, 2017). Estima-se que globalmente mais de 300 milhões de pessoas são acometidas pela depressão, o que equivale a cerca 6% da população adulta mundial, com prevalência de 1 a cada 6 adultos ao longo da vida (18% a mais do que há dez anos).

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Figura 1. Critérios diagnósticos da depressão de acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais

Para ser diagnosticado com depressão, o paciente deve apresentar por um período de no mínimo duas semanas, pelo menos cinco dos sintomas acima apresentados, e um dos dois primeiros sintomas (humor deprimido ou diminuição do interesse/prazer – destacados com a estrela amarela) devem estar obrigatoriamente presentes (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2013). Imagem adaptada de Otte et al. (2016). Figura elaborada pelo autor usando imagens do Mind the Graph.

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Particularmente, o Brasil é o país com o maior índice de indivíduos com depressão na América Latina, com maior destaque para a cidade de São Paulo que apresenta uma prevalência anual de 10,4%, uma média que supera os índices mundiais (BROMET et al., 2011; OTTE et al., 2016). Estes dados refletem um número considerável de pessoas com uma necessidade potencial de usar os serviços de saúde, que por sua vez, torna-se um desafio socioeconômico no atual cenário (MUNHOZ et al., 2016). Somado a este fato, destaca-se que apesar da existência de tratamentos para a depressão, menos da metade das pessoas acometidas por esta condição médica no mundo e, em alguns países menos de 10%, recebem ajuda médica. As atuais barreiras incluem a falta de recursos e de profissionais capacitados, o estigma social associado aos transtornos mentais, além de falhas no diagnóstico (OMS, 2017).

Embora o grande problema que este transtorno representa, acometendo indivíduos de todas as idades e esferas sociais, a sua fisiopatologia ainda permanece por ser totalmente entendida. Isso deve-se ao fato, que a depressão é uma entidade clínica complexa, incluindo diferentes mecanismos e sistemas, o que torna difícil identificar uma única causa e tratá-la de forma adequada (NEMEROFF, 2007; PYTKA et al., 2016a, 2016b). Sobretudo, este distúrbio tem sua origem derivada de uma interação entre múltiplas suscetibilidades envolvendo fatores genéticos e ambientais, assim como disfunções neuroendócrinas, neuroquímicas e moleculares (BERTON; NESTLER, 2006).

No entanto, uma das primeiras teorias bem articuladas acerca da neurobiologia da depressão foi baseada no sistema monoaminérgico. Este sistema foi inicialmente implicado na fisiopatologia da depressão após a constatação de que a reserpina, um fármaco anti-hipertensivo que provoca a depleção de noradrenalina, causava como efeito adverso sintomas relacionados à depressão (FREIS, 1954; CELANO et al., 2011). Paralelamente a essa descoberta, o papel das monoaminas na depressão foi apoiado ainda mais com a descoberta dos primeiros agentes antidepressivos, os antidepressivos tricíclicos (ATC) e inibidores da monoamina oxidase (iMAO), os quais possuem efeitos robusto na transmissão monoaminérgica (OTTE et al., 2016). Historicamente, até o final da década de 1940 não havia tratamentos realmente eficazes para a depressão, mas foi na década de 1950 que os primeiros medicamentos antidepressivos foram descobertos, um passo substancial para a terapia antidepressiva (PEREIRA; HIROAKI-SATO, 2018). Estes achados iniciaram-se com a síntese de uma série de aminas fenotiazínicas com propriedades anti-histamínicas significativas e de longa duração. Dentre as mais potentes, destacaram-se a prometazina e clorpromazina, que

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obtiveram sucesso terapêutico como antipsicóticos, formando a base do desenvolvimento dos primeiros antidepressivos (DOMINO, 1999).

Neste sentido, em 1957 o psiquiatra suíço Roland Kuhn demonstrou que a imipramina, um fármaco anti-histamínico derivado da prometazina e com a estrutura química semelhante à da clorpromazina, apresentou propriedades antidepressivas potenciais (DOMINO, 1999; KUHN, 1958). De fato, pacientes depressivos tratados com imipramina mostraram uma melhora notável dentro de 1 a 6 semanas de terapia diária (DOMINO, 1999; KUHN, 1958). Desta forma, o primeiro ATC foi descoberto e posteriormente liberado para o uso clínico, o qual possui como mecanismo de ação a inibição da recaptação de serotonina e noradrenalina (PEREIRA; HIROAKI-SATO, 2018).

Em paralelo ao estudo da imipramina, a história da iproniazida começou no hospital Seaview (Nova York) em 1953, onde os médicos Irving Selikoff e Edward Robitzek demonstraram que a iproniazida (um fármaco antituberculínico) melhorou os sintomas de depressão em pacientes com tuberculose (CRANE, 1957). Alguns anos mais tarde, especificamente em 1957, os psiquiatras Nathan Kline, Harry Loomer e John Saunders foram os primeiros a apresentar resultados positivos avaliando a eficácia da iproniazida em pacientes depressivos não tuberculosos (FINBERG, 2014; LÓPEZ-MUÑOZ; ALAMO, 2009). O mecanismo de ação da iproniazida consiste na inibição da enzima monoamina oxidase (MAO), responsável pela degradação das monoaminas serotonina, noradrenalina e dopamina (BERTON; NESTLER, 2006; FINBERG, 2014; OTTE et al., 2016).

A descoberta dos mecanismos de ação da iproniazida e da imipramina foi de fundamental importância para a formulação das teorias etiológicas iniciais da depressão. Em 1965 sugeriu-se a teoria catecolaminérgica, postulando que a depressão poderia ser causada por baixos níveis de noradrenalina no sistema nervoso central (SCHILDKRAUT, 1965; SCHILDKRAUT; GORDON; DURELL, 1965). Outras convincentes descobertas, mas desta vez acerca do papel da serotonina, também contribuíram para tentar explicar a patogênese da depressão (COPPEN, 1967; LAPIN; OXENKRUG, 1969), especialmente quando descobriu-se que os ATCs poderiam também bloquear a recaptação da serotonina em neurônios pré-sinápticos. Diante disso, postulou-se também a teoria serotoninérgica da depressão, a qual se baseava em um déficit de serotonina na fenda sináptica em certas regiões encefálicas (LAPIN; OXENKRUG, 1969). Essas teorias foram reformuladas, e posteriormente postulou-se a teoria monoaminérgica (Figura 2), a qual destaca que pacientes com depressão apresentam uma

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diminuição de neurotransmissores monoaminérgicos (basicamente serotonina, noradrenalina e dopamina) na fenda sináptica (DELGADO, 2000).

Figura 2. Hipótese monoaminérgica da depressão

Em indivíduos saudáveis (humor eutímico), vesículas contendo serotonina, noradrenalina ou dopamina são liberadas na fenda sináptica onde exercem suas funções nos neurônios pós-sinápticos, por meio da ativação dos seus respectivos receptores. Após a interação, estas monoaminas são recaptadas por sistemas de recaptação de volta ao neurônio pré-sináptico, onde são degradadas pela MAO, originando metabólitos que podem ser reciclados para a produção de novos neurotransmissores. Em indivíduos com depressão, ocorre uma diminuição na biodisponibilidade de monoaminas na fenda sináptica, o que por sua vez acarreta em uma menor interação e ativação de receptores do neurônio pós-sináptico, o que por sua vez propicia o aparecimento de sintomas depressivos (DELGADO, 2000). Além disso, as enzimas MAOs continuam exercendo a sua função de degradação de monoaminas intensificando ainda mais este déficit. Contudo, após o início do tratamento com antidepressivos, como os ISRS ou os ATCs, ocorre o bloqueio dos sistemas de recaptação de monoaminas, contribuindo para um aumento na biodisponibilidade destes neurotransmissores na fenda sináptica, enquanto que os iMAO atuam inibindo a atividade desta enzima e diminuindo assim a degradação dos neurotransmissores. Estes mecanismos em conjunto promovemuma melhora nas condições de humor do paciente. Abreviaturas: ATC: antidepressivos tricíclicos; iMAO: inibidores da enzima monoamina oxidase; ISRS: inibidores seletivos da recaptação de serotonina; MAO monoamina oxidase. Figura projetada usando imagens do Servier Medical Art. Fonte: autor

Além disso, reportou-se que a reversão destes parâmetros, quer seja pela inibição da recaptação destes neurotransmissores ou pela

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inibição da sua degradação pelas enzimas MAO poderia ser capaz de produzir um efeito antidepressivo (BERTON; NESTLER, 2006; NESTLER et al., 2002; OTTE et al., 2016).

Contudo, apesar da imipramina e iproniazida serem uma das únicas alternativas para o tratamento da depressão, estes fármacos apresentavam efeitos adversos consideráveis, com destaque para a hepatotoxicidade (PEREIRA; HIROAKI-SATO, 2018). Portanto, outros ATCs como a amitriptilina, nortriptilina e desipramina foram sintetizados pela modificação da estrutura da imipramina com intuito de reduzir seus efeitos adversos, embora poucos resultados satisfatórios foram obtidos nesta perspectiva. Considerando essas limitações, pela primeira vez na história da psicofarmacologia, a postulação da teoria monoaminérgica da depressão levou a uma nova metodologia de busca para novas drogas terapêuticas, visando agentes mais seletivos o que possibilitaria a diminuição da frequência e a probabilidade de efeitos indesejáveis (LÓPEZ-MUÑOZ; ALAMO, 2009).

Em 1970 o neurofarmacologista David Wong sintetizou algumas moléculas com base nas butilferonas, que atuavam com certa especificidade apenas sobre o metabolismo da serotonina (WONG; LICINIO, 2001). Somado a este fato, descobriu-se que substâncias que inibiam seletivamente a recaptação de serotonina no encéfalo apresentavam um potencial terapêutico na depressão. Dentre os fármacos que se destacaram como inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), cita-se a fluoxetina. A fluoxetina foi descoberta em 1984 por David Wong, Ray Fuller e Bryan Molloy no laboratório farmacêutico Eli Lilly e entrou em comercialização em 1988, após uma série de estudos clínicos confirmando sua eficácia, mas com a vantagem de possuir menos efeitos adversos quando comparado aos ATCs (MONTGOMERY, 1989). A fluoxetina teve o crescimento mais rápido em uso entre as drogas psicotrópicas na história, tornando-se o antidepressivo mais vendido de todos os tempos e o segundo medicamento mais vendido no mundo (LÓPEZ-MUÑOZ; ALAMO, 2009). Em vista da crescente necessidade de medicamentos para tratar a depressão e tendo como protótipo a fluoxetina, outros ISRS foram liberados no mercado posteriormente como o citalopram, fluvoxamina, paroxetina e sertralina. Portanto, a descoberta dos ISRS é considerada um momento chave na farmacoterapia da depressão (PEREIRA; HIROAKI-SATO, 2018).

Contudo, da década de 80 até os dias atuais houve avanços modestos no campo do desenvolvimento de fármacos para a depressão. A maior parte das prescrições médicas ainda concentra-se nos ISRS como medicamentos de primeira escolha para o tratamento dos sintomas

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depressivos, seguida dos ATCs e os iMAO (BERTON; NESTLER, 2006; NEMEROFF, 2007). Embora o uso destes medicamentos seja bastante disseminado na clínica com efeitos importantes para o tratamento da depressão, é importante destacar que o tratamento com os mesmos inclui limitações (BOKU et al., 2017), tais como: i) a baixa taxa de efetividade, pois cerca de 50% a 60% dos pacientes não respondem de maneira adequada ao tratamento; ii) o alto índice de refratariedade, iii) a demora considerável na resposta terapêutica, podendo ser superior a 4 semanas de tratamento; iv) e uma série de efeitos adversos como as dores de cabeça, constipação, alterações de peso, e principalmente disfunção sexual (BET et al., 2013; CRISAFULLI et al., 2011; SERRETTI; MANDELLI, 2010; PAPAKOSTAS; IONESCU, 2015). Em virtude das informações elencadas aqui, enfatiza-se a necessidade de pesquisa e desenvolvimento de novos agentes antidepressivos, com maior eficácia e menos efeitos adversos.

Por fim, tendo em vista que os agentes antidepressivos acima mencionados modulam o sistema monoaminérgico, restabelecendo os níveis de monoaminas poucas horas após a administração, mas com a resposta terapêutica só ocorrendo apenas após várias semanas de tratamento, a teoria monoaminérgica tem sido considerada excessivamente simplista (OTTE et al., 2016). Além disso, considerando que o aumento nos níveis de monoaminas na fenda sináptica desencadeia uma série de alterações em vias de sinalização intracelulares, novos estudos têm buscado identificar eventos mais relevantes para a ocorrência do efeito terapêutico tardio dos antidepressivos convencionais e a interação com outros sistemas de neurotransmissão.

Nesta perspectiva, reportou-se recentemente que a serotonina pode ser coliberada com o glutamato, e os antidepressivos parecem afetar este mecanismo (FISCHER; JOCHAM; ULLSPERGER, 2015). Em particular, a administração aguda com ISRS bloqueia o transportador de serotonina, o que leva a um aumento dos níveis extracelulares deste neurotransmissor. Este aumento nos níveis de serotonina ativa os autorreceptores serotoninérgicos do tipo 1A (5-HT1A), que exercem efeito inibitório no neurônio pré-sináptico. Assim, a administração com ISRS diminui as taxas de disparo, e por sua vez acarreta em menor liberação de serotonina e também de glutamato. Quando os autorreceptores dessensibilizam, aproximadamente após cerca de 2 a 3 semanas de administração com ISRS, as taxas de disparo são restabelecidas, restaurando também o componente glutamatérgico. Curiosamente, este período para o restabelecimento de níveis sinápticos adequados de glutamato para o fortalecimento das sinapses excitatórias

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corrobora com a janela de atraso no efeito dos antidepressivos convencionais. Este mecanismo supracitado, poderia explicar pelo menos parcialmente, o aumento de monoaminas na fenda de maneira aguda, mas com o efeito terapêutico apenas acontecendo tardiamente após administração com antidepressivos moduladores monoaminérgicos. Além disso, essa descoberta não descarta a teoria monoaminérgica, mas denota o papel da neurotransmissão glutamatérgica na neurobiologia da depressão (FISCHER; JOCHAM; ULLSPERGER, 2015).

1.2 SISTEMA GLUTAMATÉRGICO

O sistema glutamatérgico compreende um dos principais sistemas excitatórios do sistema nervoso central, cujo principal neurotransmissor é o glutamato (SANACORA; TRECCANI; POPOLI, 2012). Fisiologicamente, o glutamato está envolvido em uma série de funções neuronais, principalmente relacionadas ao aprendizado e a memória, bem como migração, diferenciação e sobrevivência neuronal (HILLHOUSE; PORTER, 2015). O glutamato é sintetizado pela glutaminase dos neurônios pré-sinápticos a partir da desaminação da glutamina e armazenado em vesículas, que são exocitadas de maneira dependente de potencial de ação. Subsequentemente, o glutamato liberado na fenda sináptica pode então atuar sobre receptores de membrana farmacologicamente e funcionalmente distintos; os receptores ionotrópicos e os metabotrópicos (SANACORA; TRECCANI; POPOLI, 2012). Os receptores do tipo ionotrópico incluem as famílias de receptores N-metil-D-aspartato (NMDA), alfa-amino-3-hidroxi-metil-5-4-isoxazolpropiónico (AMPA) e cainato, enquanto que os metabotrópicos (nomeados de mGlu1 a mGlu8) incluem os receptores glutamatérgicos acoplados à proteína G estimulatória ou inibitória (PAUL; SKOLNICK, 2003).

Após interação com estes receptores, o glutamato é removido principalmente pelos transportadores de aminoácidos excitatórios do tipo 1 e 2 (EAAT1 e EAAT2) de astrócitos, e convertido intracelularmente em glutamina, através da ação da enzima glutamina sintetase. Os mecanismos que permitem que a glutamina seja utilizada pelos neurônios novamente dependem do efluxo desse aminoácido dos astrócitos para o meio extracelular, seguido pelo influxo para o interior neuronal, sendo ambos os eventos mediados por transportadores específicos (JENSTAD et al., 2009). Subsequentemente, uma vez no interior dos neurônios, a glutamina pode ser convertida novamente em glutamato pela enzima glutaminase,

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com posterior estocagem em vesículas sinápticas (NICIU; KELMENDI; SANACORA, 2012).

Desta forma, os processos astrocitários para remoção do glutamato da fenda configuram-se como um componente funcional importante para as sinapses, uma vez que é reportado que o excesso de glutamato pode levar a casos de toxicidade e morte neural, um fenômeno denominado excitotoxicidade glutamatérgica (POPOLI et al., 2011). Este evento é mediado principalmente pelos níveis elevados de influxo de cálcio pelos receptores que compõem este sistema, com destaque para os receptores NMDA (MURROUGH; ABDALLAH; MATHEW, 2017). De fato, evidenciou-se um aumento de glutamato no córtex de pacientes depressivos, sugerindo que a excitotoxicidade glutamatérgica poderia contribuir para o desenvolvimento dos sintomas depressivos (HASHIMOTO; SAWA; IYO, 2007).

Com base na premissa que o sistema monoaminérgico não explica totalmente a fisiopatologia da depressão e considerando que a administração de antagonistas de receptores NMDA produz efeito tipo-antidepressivo em modelos animais de depressão (TRULLAS; SKOLNICK, 1990), em 1999 Phil Skolnick propôs os antidepressivos para o novo milênio, os quais se baseiam na modulação do sistema glutamatérgico. Skolnick postulou que o sistema glutamatérgico poderia estar subjacente à fisiopatologia da depressão. Particularmente, pelo fato que a administração crônica com antidepressivos convencionais, baseados no sistema monoaminérgico, diminui os níveis de ácido ribonucleico mensageiro (mRNA) que codifica as subunidades do receptor NMDA e consequentemente atenua a função deste receptor (SKOLNICK, 1999). Desta forma, as vias de sinalização que levam a este mecanismo fornecem evidências para descobrir novos antidepressivos.

Em 2000 Robert Berman e colaboradores publicaram um estudo inovador, que pela primeira vez mostrou que era possível obter efeitos antidepressivos rápidos e duradouros (BERMAN et al., 2000). Estes pesquisadores demonstraram que uma única administração endovenosa e subanestésica de cetamina, um anestésico antagonista dos receptores NMDA, apresentou um rápido efeito antidepressivo em pacientes depressivos. Notavelmente, este efeito foi observado 4 horas após a administração de cetamina, e um efeito progressivo foi também evidenciado até 3 dias, um evento inédito para a farmacoterapia da depressão. A cetamina é um derivado das fenciclidinas (Figura 3), vendida comercialmente como uma mistura racêmica de dois isômeros opticamente ativos, a R-cetamina e a S-cetamina (KURDI; THEERTH; DEVA, 2014). O isômero S apresenta uma afinidade maior pelos

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receptores NMDA, com um poder de ligação 4 vezes maior do que a forma R. Na clínica esta molécula é frequentemente utilizada como agente anestésico, principalmente devido a sua capacidade de produzir inconsciência e imobilidade (PAUL et al., 2014).

Figura 3. Estrutura química da cetamina

A cetamina é um fármaco derivado das fenciclidinas, sintetizado a partir do brometo de ciclopentilo, o-clorobenzonitrilo e metilamina. Comercialmente, este fármaco é utilizado como uma mistura racêmica de dois isômeros opticamente ativos, a R-cetamina (esquerda) e a S-cetamina (direita). PubChem CID: 3821.

Após a descoberta de Berman, compostos que modulam o sistema glutamatérgico vêm recebendo atenção especial, especialmente a cetamina. Nesta perspectiva, um grande número de evidências clínicas corroboraram o efeito antidepressivo rápido, robusto e sustentado de uma única dose subanestésica da cetamina. Vale destacar que este rápido efeito antidepressivo é observado em pacientes refratários ao tratamento de dois ou mais antidepressivos típicos, até mesmo com ideação suicida (ABDALLAH et al., 2018; DIAZGRANADOS et al., 2010; PRICE et al., 2009; ZARATE et al., 2006). Este efeito pronunciado e extremamente rápido contrastou com a farmacoterapia clássica baseada em monoaminas que demora de 3 a 4 semanas para apresentar o efeito terapêutico (BOKU et al., 2017; OTTE et al., 2016).

O mecanismo de ação pelo qual a cetamina exerce os seus efeitos ainda é alvo de muitos estudos, os quais têm mostrado que o mecanismo responsável pelo efeito antidepressivo de ação rápida desta molécula vai

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além do antagonismo do receptor NMDA. Em 2010, Li e colaboradores denotaram que o efeito antidepressivo da cetamina parecia ser inicialmente dependente da ativação da proteína alvo mecanístico da rapamicina, a mTOR (LI et al., 2010). Este mecanismo foi subsequentemente detalhado ainda mais pelo mesmo grupo de pesquisa, o qual evidenciou que o mecanismo de ação da cetamina envolve uma série de eventos complexos que dependem de diferentes alvos moleculares (DUMAN et al., 2012; LI et al., 2011).

Notavelmente, o rápido efeito antidepressivo da cetamina parece ser desencadeado através do antagonismo dos receptores NMDA em interneurônios GABAérgicos, impedindo a ação inibitória deste sistema sobre o tônus glutamatérgico, em função da diminuição do influxo de íons cloreto (ABDALLAH et al., 2016). Os neurônios glutamatérgicos, por sua vez, aumentam a liberação de glutamato na fenda sináptica. Subsequentemente, o glutamato promove uma ativação preferencial de receptores AMPA, visto que os receptores NMDA ainda encontram-se bloqueados pela cetamina. Uma vez ativados, os receptores AMPA promovem um influxo transitório de cargas positivas, basicamente de íons sódio, aumentando o potencial de membrana com consequente ativação e abertura dos canais de cálcio dependentes de voltagem (CCVD) (ABDALLAH et al., 2016; LEPACK et al., 2014).

A entrada de cálcio, advinda dos CCVD, promove a exocitose de vesículas sinápticas contendo o fator neurotrófico derivado do encéfalo (BDNF) na fenda sináptica, que então pode ativar seus receptores tropomiosina cinase B (TrkB) (LEPACK et al., 2014). Uma vez ativados, estes receptores provocam a estimulação de vias de sinalização mediadas por fosfatidilinositol 3’ cinase (PI3K)/proteína cinase B (PKB/Akt) que culminam na ativação da mTOR (DUMAN; VOLETI, 2012; LI et al., 2010, 2011; LIU et al., 2016b; ZHANG et al., 2018; ZHOU et al., 2014). A mTOR regula a etapa inicial da tradução de proteínas envolvidas no controle da síntese de proteínas requeridas para a formação de novos espinhos dendríticos e sinaptogênese.

Em particular, a mTOR pode fosforilar e reprimir a proteína ligadora do fator de alongamento 4E (4E-BP) e ativar proteína ribossomal S6 cinase de 70 kDa (p70S6K), que inibe a cinase de fator de alongamento eucariótico 2 (eEF2K), modulando positivamente a síntese de proteínas sinápticas (HOEFFER; KLANN, 2010; LI et al., 2010).

Entre as proteínas que tem a sua tradução regulada por mTOR, destacam-se aquelas relacionadas com a formação de novos espinhos dendríticos e sinaptogênese tais como a proteína de densidade sináptica de 95 kDa (PSD-95), subunidades de receptores AMPA (GluA1) e a

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sinapsina I (DUMAN et al., 2012; LI et al., 2010). No grupo de pesquisa demonstrou recentemente que uma única administração de cetamina aumentou a fosforilação de mTOR e p70S6K, bem como o imunoconteúdo de PSD-95 no hipocampo de camundongos submetidos ao modelo de depressão induzida por corticosterona (PAZINI et al. 2016). Neste sentido, a via de sinalização mediada pela mTOR ocupa um lugar de destaque no mecanismo de ação de antidepressivos com ação rápida, como a cetamina (LI et al., 2010). O mecanismo farmacológico da cetamina está ilustrado na Figura 4.

Desta forma, o ano de 2000 marcou a mudança na história do desenvolvimento de agentes antidepressivos, e juntamente com o mecanismo de ação da cetamina posteriormente elucidado, estes achados são considerados a descoberta mais importante dos últimos 50 anos para a área da neurobiologia da depressão (OTTE et al., 2016; PEREIRA; HIROAKI-SATO, 2018). No entanto, o uso crônico da cetamina em pacientes é limitado devido aos efeitos adversos psicomiméticos e/ou dissociativos e neurotóxicos que pode produzir, como experiências extracorpóreas, alucinações e pesadelos realistas (BEHRENS et al., 2007; SLEIGH et al., 2014). Portanto, considerando essas limitações, a investigação de moléculas que possam compartilhar mecanismos de ação semelhantes à cetamina, mas que tenham efeitos adversos limitados, surge como uma estratégia terapêutica promissora. Dentre as moléculas que apresentam um potencial efeito antidepressivo semelhante à cetamina, destaca-se a guanosina, um componente do sistema purinérgico.

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Figura 4. Mecanismo farmacológico da cetamina subjacente ao efeito antidepressivo de ação rápida

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Farmacologicamente, postula-se que a cetamina atue bloqueado os receptores NMDA em interneurônios GABAérgicos (A), diminuindo assim o tônus inibitório sobre neurônios glutamatérgicos (B). Desta forma os neurônios glutamatérgicos liberam vesículas contendo glutamato na fenda sináptica, que ativam preferencialmente os receptores AMPA, uma vez que os receptores NMDA ainda encontram-se bloqueados pela cetamina (C). Ao serem ativados, os receptores AMPA induzem um influxo de sódio transitório que despolariza a célula e ativa os CCVD, que induzem a exocitose de vesículas contendo BDNF, ativando os receptores TrkB. Uma vez ativados, estes receptores podem ativar vias de sinalização, como a via PI3K/Akt/mTOR, culminando na síntese de proteínas sinápticas como sinapsina, a PSD-95 (que ancora receptores AMPA) e subunidades de receptores AMPA (GluA1), que são translocados para a membrana, contribuindo para a sinaptogênese e seu efeito antidepressivo rápido (D). Abreviaturas: 4E-BP: proteína ligante do fator de elongamento 4E; Akt: proteína cinase B; AMPA alfa-amino-3-hidroxi-metil-5-4-isoxazolpropiónico; BDNF: fator neurotrófico derivado do encéfalo; CCVD: canais de cálcio voltagem-dependente; GABA: Ácido γ-aminobutírico; Glu: glutamato; GSK3β. Glicogênio sintase cinase 3β; mTOR: proteína alvo mecanístico da rapamicina; NMDA: N-metil-D-aspartato; p70S6K: proteína ribossomal S6 cinase de 70 kDa; PI3K: fosfatidilinositol 3’ cinase; PSD-95: proteína de densidade pós-sináptica de 95 kDa; TrkB: receptor tropomiosina cinase B. Figura projetada usando imagens do Servier Medical Art. Fonte: autor

1.3 SISTEMA PURINÉRGICO

O sistema purinérgico configura-se como um complexo e essencial sistema de sinalização celular, sendo fundamental para uma série de processos fisiológicos, incluindo respostas imunes e inflamação, neurorregeneração e neurogênese (BURNSTOCK, 2016; HEINE; SYGNECKA; FRANKE, 2016; MIRAS-PORTUGAL et al., 2016; OLIVEIRA; ILLES; ULRICH, 2016; RIBEIRO et al., 2016). De fato, a noção de que esse sistema poderia estar indiretamente envolvido na regulação e disfunção do humor foi proposta há quase um século (KRAEPELIN, 1921), e evidências recentes confirmam esta hipótese (ALI-SISTO et al., 2016; CSOLLE et al., 2013; ORTIZ et al., 2015).

As purinas compreendem uma classe de moléculas essenciais para as células e são derivadas das bases nitrogenadas adenina e guanina. Entre os derivados da adenina inclui-se os nucleotídeos mono, di ou trifosfatados adenosina-5’-trifosfato (ATP), adenosina-5’-difosfato (ADP) e adenosina- 5´-monofosfato (AMP), enquanto os derivados da guanina compreendem a trifosfato (GTP), guanosina-5’-difosfato (GDP) e guanosina-5’-monofosfato (GMP). Fazem ainda parte deste sistema os nucleosídeos adenosina, inosina e guanosina, as bases nitrogenadas adenina, guanina, hipoxantina e seus metabólitos xantina e ácido úrico (BURNSTOCK, 2007; CICCARELLI et al., 2001).

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O conceito de sinalização purinérgica foi primeiramente proposto por Burnstock em 1972, o qual sugeriu que o ATP poderia agir como neurotransmissor (BURNSTOCK, 1972), uma ideia que gerou críticas inicialmente devido o papel energético dessa molécula já bem estabelecido. Estudos subsequentes levaram à descoberta de receptores transmembrana para o sistema purinérgico, os quais foram categorizados em dois grandes grupos de acordo com seus ligantes. Os receptores purinérgico do tipo 1 (P1) tem o nucleosídeo adenosina como ligante enquanto que, os receptores purinérgico do tipo 2 (P2) ligam-se ao ATP ou ao ADP (BURNSTOCK, 2007). Particularmente, os purinoceptores da família P1 são receptores metabotrópicos e são divididos em quatro subtipos: A1, A2A, A2B e A3. Os receptores A1 são acoplados à proteína G inibitória levando a uma diminuição da atividade da adenilato ciclase e consequente diminuição nos níveis de AMP cíclico intracelular, enquanto que os receptores A2A são acoplados à proteína G estimulatória, levando ao aumento dos níveis de AMP cíclico. Os purinoceptores pertencentes à família P2 são receptores subdivididos em P2X (receptores ionotrópicos) e P2Y (receptores metabotrópicos) (BURNSTOCK, 2007). Estes receptores são amplamente distribuídos no sistema nervoso central, participando da transmissão sináptica e mediando interações entre os neurônios e as células da glia (BURNSTOCK, 2008).

A pesquisa purinérgica tem se concentrado principalmente nos nucleotídeos à base de adenina e na adenosina, enquanto os componentes derivados da guanina deste sistema têm recebido menos atenção. Contudo, demonstrou-se que o GTP pode desempenhar uma possível ação como neurotransmissor, sobretudo pelo fato que sua presença foi confirmada em vesículas sinápticas (WAGNER; CARLSON; KELLY, 1978). Além disso, evidenciou-se que a sua captação para as vesículas depende de um sistema de transporte dependente de gradiente eletroquímico (SANTOS; SOUZA; TASCA, 2006), semelhante ao observado para o transporte de neurotransmissores clássicos.

Os neurônios e as células gliais podem liberar os derivados da guanina em situações fisiológicas. Estes são liberados no espaço extracelular pelos transportadores de nucleosídeos mais provavelmente como nucleotídeos, que são rapidamente catabolizados pelas enzimas ecto-5'-nucleotidases em guanosina (CICCARELLI et al., 1999). Em cultura de astrócitos, a inibição da atividade da ecto-5’-nucleotidase reduz significativamente o acúmulo extracelular de guanosina indicando que a concentração extracelular deste nucleosídeo é derivado principalmente da hidrólise extracelular de nucleotídeos (SCHMIDT; LARA; SOUZA, 2007). A guanosina (Figura 5), ao contrário da adenosina, é

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preferencialmente acumulada em resposta a danos celulares. Enquanto as purinas extracelulares à base de adenina são rapidamente metabolizadas após um insulto, a concentração de guanosina aumenta progressivamente (CICCARELLI et al., 1999). Neste sentido, sugeriu-se que a guanosina poderia ser um neuroprotetor endógeno (CICCARELLI et al., 1999, 2001; SCHMIDT; LARA; SOUZA, 2007). De fato, pesquisas reportaram o efeito neuroprotetor da guanosina em vários modelos de doenças e insultos, incluindo modelos de isquemia cerebral (DAL-CIM et al., 2011, 2013, 2016; HANSEL et al., 2014, 2015; RAMOS et al., 2016; THOMAZ et al., 2016), septicemia (PETRONILHO et al., 2012), intoxicação aguda por amônia (CITTOLIN-SANTOS et al., 2017), encefalopatia hepática (PANIZ et al., 2014), doença de Alzheimer (LANZNASTER et al., 2017), doença de Parkinson (MASSARI et al., 2017), hipóxia (OLESKOVICZ et al., 2008), epilepsia (LARA et al., 2001; de OLIVEIRA et al., 2004; TORRES et al., 2010) e citotoxicidade induzida pelo MPP+ (PETTIFER et al., 2007), glutamato (MOLZ et al., 2011), azida (QUINCOZES-SANTOS et al., 2014), metilmercúrio (ROOS et al., 2009) e lipopolissacarídeo (BELLAVER et al., 2015).

Figura 5. Estrutura química da guanosina

A guanosina é um nucleosídeo da guanina que ocorre naturalmente no sistema nervoso central, cuja estrutura que compreende uma guanina ligada a um anel de ribose. C10H13N5O5; peso

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Vale ressaltar que estes efeitos parecem estar ligados, pelo menos em parte, à sua capacidade de atenuar a neuroinflamação e o estresse oxidativo (BETTIO; GIL-MOHAPEL; RODRIGUES, 2016a), bem como por estimular a captação de glutamato e reduzir sua liberação na fenda sináptica (FRIZZO et al., 2005; MOLZ et al., 2011; MORETTO et al., 2009; VINADÉ et al., 2005). Contudo, apesar dos receptores de superfície celular específicos para guanosina ainda não terem sido identificados, vários estudos indicaram que esse nucleosídeo desempenha um papel importante como molécula de sinalização extracelular, ativando vias moleculares que levam a efeitos neuroprotetores e tróficos (BAU et al., 2005; RATHBONE et al., 2008; RIBEIRO et al., 2016; SCHMIDT; LARA; SOUZA, 2007; SU et al. 2009, 2013; TRAVERSA et al., 2002, 2003). Os mecanismos subjacentes aos efeitos neuroprotetores da guanosina estão ilustrados na Figura 6.

Considerando o rápido metabolismo das purinas, estudos buscaram determinar se as propriedades neuroprotetoras da guanosina poderiam ser de fato atribuídas a esse nucleosídeo e não a algum efetor. Nesse contexto, observou-se que os níveis plasmáticos de guanosina aumentam de forma dose e tempo-dependentes após administração intraperitoneal desse nucleosídeo (GIULIANI et al., 2012), sendo que sua concentração encontra-se duplicada após 90 minutos da administração (JIANG et al., 2008). É conveniente enfatizar ainda, que a guanosina é amplamente distribuída nos tecidos corporais após administração sistêmica, sendo capaz de entrar no sistema nervoso central em 7,5 min, onde suas concentrações continuam a aumentar, atingindo um pico em torno de 30 min após administração intraperitoneal (GIULIANI et al., 2012; JIANG et al., 2008). Um padrão similar foi observado após administração por via oral, evidenciado pelo aumento dose-dependente nas concentrações de guanosina e seus metabólitos no líquido cefalorraquidiano (SCHMIDT et al., 2010; VINADÉ et al., 2005).

Esses dados são suportados pelo fato que a guanosina é captada por transportadores de nucleosídeos (NAGASAWA et al., 2007; PENG et al., 2005), os quais podem ser encontrados em células intestinais, microvasos encefálicos e na barreira hematoencefálica (JONES; HAMMOND, 1995; KALARIA; HARIK, 1988; PATIL; UNADKAT, 1997). A guanosina, por sua vez, pode ser convertido em guanina através da atividade da enzima purina nucleosídeo fosforilase (SCHMIDT et al., 2010), De fato, demonstrou-se previamente que as concentrações máximas de seus metabólitos (guanina, xantina e ácido úrico) no plasma foram detectadas 15-30 min após a administração de guanosina,

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indicando que esse nucleosídeo pode ser rapidamente metabolizado após administração exógena (GIULIANI et al., 2012; JIANG et al., 2008).

Figura 6. Mecanismos envolvidos no efeito neuroprotetor da guanosina

Os astrócitos são a principal fonte de derivados da guanina (DG) no sistema nervoso central, e eles são catabolizados em guanosina por meio de ectonucleotidases, um fenômeno que é intensificado em situações de insulto (A). Evidências convincentes demonstraram que guanosina estimula a captação de glutamato pelos astrócitos e sua conversão a glutamina pela GS (B), evitando eventos excitotóxicos e produzindo efeito neuroprotetor. A guanosina também promove a ativação das vias de sinalização intracelular mediadas pela PI3K/Akt/GSK-3β e MAPK, desempenhando um papel importante no efeito neuroprotetor deste nucleosídeo, que em conjunto acarretam em respostas antiapoptótica, anti-inflamatória e antioxidante (C). Essa sinalização parece estar relacionada com a ativação de um possível receptor específico para guanosina, mas sua existência ainda é alvo de debate, embora também não se descarta a interação da guanosina com outros receptores. Abreviaturas: Akt:proteína cinase B; DG: derivados da guanina; Guo: guanosina; GSK-3β: glicogênio sintase cinase 3β; GS: glutamina sintetase; Glu: glutamato; HO-1: heme-oxigenase-1; MAPK: proteína cinase ativada por mitógeno; PI3K: fosfatidilinositol 3’ cinase; GuoR: receptor potencial para guanosina. Figura projetada usando imagens do Servier Medical Art. Fonte: autor

Não obstante, a guanosina também está sendo investigada como um potencial modulador de humor, devido à sua participação na neurotransmissão glutamatérgica (BETTIO; GIL-MOHAPEL; RODRIGUES, 2016b). De fato, um recente estudo demonstrou que os níveis de guanosina estão reduzidos no soro de pacientes depressivos (ALI-SISTO et al., 2016), o que sugere o envolvimento deste nucleosídeo

Guo

Glu

A

B

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na neurobiologia da depressão. Dentro deste contexto, nosso grupo de pesquisa demonstrou que a guanosina administrada de forma sistêmica ou central produz efeito tipo-antidepressivo em dois testes preditivos amplamente utilizados, o teste de suspensão pela cauda (TSC) e teste do nado forçado (TNF); efeito este que parecer ser dependente da modulação dos receptores de NMDA, ativação da via de sinalização intracelular PI3K/mTOR (BETTIO et al., 2012) e diminuição do dano oxidativo hipocampal (BETTIO et al., 2014). Além disso, o efeito antidepressivo do tratamento crônico com guanosina está associado ao aumento da diferenciação neuronal do hipocampo (BETTIO et al., 2016)

É conveniente enfatizar ainda que, apenas uma única administração de guanosina foi capaz de prevenir o fenótipo tipo-depressivo induzido pelo estresse crônico imprevisível e pela administração exógena de corticosterona, assim como a cetamina, evidenciando um efeito tipo-antidepressivo de ação rápida (BETTIO, 2016). Cabe destacar também, que uma única administração do antidepressivo convencional fluoxetina não apresentou o mesmo efeito, reforçando a responsividade destes modelos apenas a moléculas com rápido efeito antidepressivo mediante uma única administração.

Diante das evidências supracitadas, é provável que guanosina poderia apresentar uma ação antidepressiva semelhante à cetamina e diferente dos antidepressivos convencionais no que diz respeito a seu mecanismo de ação (BETTIO; GIL-MOHAPEL; RODRIGUES, 2016b). É importante destacar ainda que, uma única coadministração com uma dose sub-efetiva de guanosina e uma dose sub-efetiva de cetamina exerce um efeito tipo-antidepressivo no TSC, o que sugere um potencial efeito de aumento (BETTIO et al., 2012), o qual merece uma investigação mais detalhada em relação aos mecanismos subjacentes a este efeito.

1.4 ESTRATÉGIAS ANTIDEPRESSIVAS DE POTENCIALIZAÇÃO Quando o tratamento com os antidepressivos de primeira escolha é ineficaz, estratégias antidepressivas de segunda linha são requeridas, as quais incluem a otimização da dose do antidepressivo, mudança para outro antidepressivo ou a combinação com outro antidepressivo, bem como as estratégias de potencialização (BAROWSKY; SCHWARTZ, 2006). As estratégias antidepressivas de potencialização (augmentation strategies) compreendem a associação de um medicamento antidepressivo combinado a um determinado composto, visando o aumento da eficácia da terapia.

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Estudos reportaram que a farmacoterapia baseada na estratégia antidepressiva de potencialização produz resultados significativamente melhores do que o tratamento isolado (CUSSOTTO; CRYAN; O’LEARY, 2017; HAN et al., 2014; KALE; ADDEPALLI, 2014). Outro ponto que merece atenção na estratégia de potencialização, é a possibilidade de redução da dose a ser administrada do antidepressivo em uso, o que por sua vez pode reduzir seus efeitos adversos. Vale destacar que esta estratégia tem sido sugerida para pacientes refratários ao tratamento com antidepressivos convencionais (OTTE et al., 2016), com o objetivo de obter a remissão dos sintomas mais rapidamente, quando a monoterapia não apresenta uma boa eficácia.

Historicamente, as estratégias de potencialização foram inicialmente estudadas na década de 1980, tendo o lítio como foco. O trabalho desenvolvido por De Montigny em 1981 foi o primeiro relatório extensivo descrevendo a potencialização de efeitos antidepressivos pelo lítio. Este trabalho demonstrou um efeito antidepressivo significativamente mais rápido e melhor quando o lítio foi adicionado ao tratamento com ATCs em pacientes refratários ao tratamento (DE MONTIGNY et al., 1981). No começo, postulou-se que a administração de lítio em pacientes refratários aos ATCs induzia uma dessensibilização dos autorreceptores 5-HT1A, restabelecendo a liberação da serotonina (WANG; FRIEDMAN, 1988). Subsequentes evidências sugerem que a potencialização do efeito de ATCs pelo lítio pode ter eventos secundários, particularmente relacionado a vias de sinalização intracelular (BAROWSKY; SCHWARTZ, 2006).

Portanto, a descoberta do lítio estabeleceu o caminho para a pesquisa de estratégias antidepressivas de potencialização. De fato, o lítio como um agente potencializador da resposta antidepressiva continuou a ser o foco de muita pesquisa e aplicação clínica, com relatórios convincentes acerca do seu potencial uso na depressão (BAROWSKY; SCHWARTZ, 2006). No entanto, o uso do lítio com esta finalidade tornou-se menos comum na prática a partir dos anos 2000, enquanto o uso de agentes antipsicóticos está sendo cada vez mais utilizado para este fim (ZHOU et al., 2015).

Não obstante, moduladores glutamatérgicos também foram sugeridos como agentes efetivos para potencialização da resposta antidepressiva, notadamente pelas evidencias de que este sistema de neurotransmissão está subjacente a fisiopatologia da depressão, mas também porque os antidepressivos modulam a função do receptor NMDA (BAROWSKY; SCHWARTZ, 2006; SKOLNICK, 1999). Fortalecendo todas essas questões acima mencionadas e com o objetivo de obter-se a

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remissão em pacientes com depressão, esforços consideráveis devem ser feitos para investigar o benefício da associação de um determinado composto com antidepressivos, podendo aumentar assim a sua eficácia e reduzir os efeitos adversos (KALE; ADDEPALLI, 2014; THOMAS; KHANAM; VOHORA, 2016).

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2 JUSTIFICATIVA

A depressão é um transtorno neuropsiquiátrico altamente prevalente e incapacitante tornando-se cada vez mais comum na sociedade moderna, o que por sua vez causa uma profunda carga socioeconômica (NEMEROFF, 2007; OMS, 2017; PAPAKOSTAS; IONESCU, 2015). Esta condição clínica apresenta natureza heterogênea e complexa, onde muitos sistemas podem contribuir para sua fisiopatologia, dificultando assim a identificação de uma única causa subjacente (DUMAN, 2014; MAES et al., 2012; PYTKA et al., 2016a, 2016b).

Infelizmente, embora exista uma série de medicamentos antidepressivos utilizados no tratamento da depressão – como os baseados no sistema de monoaminas; o mesmo inclui limitações como a baixa taxa de efetividade e a demora considerável na resposta terapêutica, refletindo diretamente sobre sua eficácia e tolerabilidade (CRISAFULLI et al., 2011; PAPAKOSTAS; IONESCU, 2015). Tendo em vista estes motivos, enfatiza-se a necessidade de pesquisa e desenvolvimento de novas alternativas terapêuticas, com destaque para os antidepressivos de ação rápida como a cetamina, mas com menos efeitos adversos, bem como para as estratégias de potencialização da resposta antidepressiva pela associação de um antidepressivo com um outro composto.

Dentre as moléculas que apresentam um potencial efeito antidepressivo rápido e com a capacidade de potencializar o efeito da cetamina, destaca-se a guanosina, o nucleosídeo da guanina. Estudos anteriores forneceram evidências que a guanosina compartilha, pelo menos parcialmente, os mecanismos de ação da cetamina. Dentre estes efeitos é possível citar a liberação de fatores neurotróficos, ativação da via de sinalização mediada pela mTOR e modulação do sistema glutamatérgico. Desta forma, é provável que a guanosina poderia também aumentar a transmissão sináptica e apresentar um rápido efeito antidepressivo (BETTIO; GIL-MOHAPEL; RODRIGUES, 2016b). Além disso, é importante destacar que uma única coadministração com uma dose sub-efetiva de guanosina e uma dose sub-efetiva de cetamina exerce um efeito tipo-antidepressivo no TSC, o que sugere um potencial efeito antidepressivo sinérgico (BETTIO et al., 2012), o qual merece uma investigação mais detalhada em relação aos mecanismos subjacentes a este efeito.

Somado ao supracitado, tendo em vista que um dos grandes desafios atuais é a pesquisa de fármacos com propriedade antidepressiva rápida, o desenvolvimento de novos testes é fundamental para melhor

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elucidar os mecanismos subjacentes a compostos que apresentam este efeito. Poucos testes comportamentais são capazes de diferenciar os efeitos de antidepressivos convencionais e antidepressivos de ação rápida como a cetamina. Entre estes testes cita-se o teste da alimentação suprimida pela novidade, o qual é sensível apenas a administração crônica de antidepressivos convencionais (DULAWA; HEN, 2005; POWELL; FERNANDES; SCHALKWYK, 2012), embora sensível apenas uma única administração da cetamina (BRACHMAN et al., 2016; FUKUMOTO; IIJIMA; CHAKI, 2014; IIJIMA; FUKUMOTO; CHAKI, 2012), tornando-o capaz de rastrear agentes com rápido efeito.

Desta forma, considerando que o uso crônico da cetamina é limitado devido aos efeitos adversos que pode produzir, a estratégia de potencialização do efeito da cetamina pela guanosina pode ter relevância terapêutica, principalmente relacionado a redução de dose da cetamina, possivelmente reduzindo seus efeitos adversos. Adicionalmente, esta abordagem é inédita no que concerne a uma única coadministração de doses sub-efetivas de guanosina e cetamina. Portanto, estes dados nos incentivam a fazer a seguinte proposta.

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3 OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

Investigar a possível potencialização do efeito tipo-antidepressivo da cetamina pela guanosina em camundongos e se a via de sinalização intracelular mediada pela mTOR participa neste efeito.

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

a) Verificar o possível efeito rápido da guanosina no teste da alimentação suprimida pela novidade;

b) Averiguar o efeito de ação rápida da cetamina no teste da alimentação suprimida pela novidade;

c) Investigar a possível potencialização do efeito rápido da cetamina pela guanosina no teste da alimentação suprimida pela novidade;

d) Avaliar o envolvimento da mTOR na possível potencialização do efeito rápido da cetamina pela guanosina no teste da alimentação suprimida pela novidade;

e) Analisar o efeito da administração combinada de cetamina e guanosina sobre o imunoconteúdo de proteínas das vias tróficas de sinalização celular tais como mTOR, p70S6K, PSD-95, GluA1 e sinapsina no hipocampo de camundongos submetidos ao teste da alimentação suprimida pela novidade.

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4 MATERIAIS E MÉTODOS

4.1 ANIMAIS

A utilização de animais nesta pesquisa foi aprovada pela Comissão de Ética do Uso de Animais (CEUA) da UFSC, sob o protocolo 7485180518. Utilizou-se camundongos Swiss machos (30-40 g) com 60-90 dias de idade, mantidos a 20-22°C com livre acesso a água e comida, em ciclo claro/escuro 12:12 h. Os animais foram fornecidos pelo Biotério Central da Universidade Federal de Santa Catarina e mantidos no Biotério Setorial do Departamento de Bioquímica. Todas as manipulações foram realizadas entre às 9 h e 17 h, sendo que cada animal foi utilizado somente uma vez. Os animais tiveram livre acesso à ração comercial para camundongos e água filtrada potável. Ressalta-se ainda, que os camundongos foram agrupados em um número de 10 em caixas (dimensão 49 x 34 x 16 cm) de polipropileno opaco branco com tampa de arame.

4.2 AGENTES FARMACOLÓGICOS E TRATAMENTO

No primeiro conjunto de experimentos (Figura 7), realizou-se uma administração sistêmica de guanosina e cetamina nos animais com intuito de obter as doses efetivas e sub-efetivas destes compostos no teste da alimentação suprimida pela novidade.

Para conduzir este protocolo de tratamento, os camundongos foram distribuídos aleatoriamente em cinco grupos experimentais (n=9-10/grupo): (1) controle (veículo); (2) guanosina (0,01 mg/kg, p.o.); (3) guanosina (0,05 mg/kg, p.o.); (4) cetamina (0,1 mg/kg, i.p.) e (5) cetamina (1 mg/kg, i.p.). A guanosina foi administrada oralmente (p.o.) enquanto que a cetamina foi administrada por via intraperitoneal (i.p.) em um volume de 10 ml/kg. A guanosina e a cetamina, obtidas da Sigma Chemical Co., St. Louis, U.S.A, foram dissolvidas em água destilada e solução salina (0,9%), respectivamente. Após 60 minutos da administração única de guanosina e, 30 minutos da administração de cetamina, os animais foram submetidos ao teste comportamental.

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Figura 7. Protocolo experimental para avaliação do efeito tipo-antidepressivo da guanosina e da cetamina em camundongos submetidos ao teste da alimentação suprimida pela novidade

Neste protocolo, para avaliar o efeito da guanosina e da cetamina, a guanosina (0,05 e 0,01 mg/kg, p.o.) foi administrada 60 min antes do teste enquanto que a cetamina (1 e 0,1 mg/kg, i.p.) foi administrada 30 min antes do teste comportamental. ASN: alimentação suprimida pela novidade; i.p.: via intraperitoneal; p.o.: via oral. Fonte: autor

Subsequentemente, em um segundo conjunto de experimentos (Figura 8), para testar a hipótese da potencialização do efeito da cetamina pela guanosina, investigou-se o efeito da coadministração com doses sub-efetivas de guanosina (0,01 mg/kg, p.o.) e cetamina (0,1 mg/kg, i.p.). Após 60 minutos da administração única do veículo ou guanosina e, 30 minutos da administração de cetamina, os animais foram submetidos ao teste comportamental.

No terceiro conjunto de experimentos, foi investigado se a potencialização do efeito da cetamina pela guanosina poderia ser dependente da ativação de mTOR. Para isto, os animais receberam rapamicina (um inibidor seletivo de mTOR, 0,2 nmol/sítio, i.c.v.), 45 e 15 minutos depois da coadministração única com doses sub-efetivas de guanosina (0,01 mg/kg, p.o.) e cetamina (0,1 mg/kg, i.p.), respectivamente. Decorridos 15 minutos da administração de rapamicina, os animais foram submetidos ao teste comportamental, conforme indicado na Figura 9.

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Figura 8. Protocolo experimental para avaliação da potencialização do efeito da cetamina pela guanosina em camundongos

Neste protocolo, para investigar a possível potencialização do efeito da cetamina pela guanosina no teste da ASN, uma dose sub-efetiva de guanosina (0,01 mg/kg, p.o.) foi associada com uma dose sub-efetiva de cetamina (1 e 0,1 mg/kg, i.p.). A guanosina foi administrada 60 min antes do teste enquanto que a cetamina foi administrada 30 min antes do teste comportamental. ASN: alimentação suprimida pela novidade; i.p.: via intraperitoneal; p.o.: via oral. Fonte: autor

Em especial, para o procedimento de administração da rapamicina via i.c.v., os animais foram anestesiados por cerca de 15 segundos utilizando um recipiente com algodão embebido em isoflurano. Este procedimento permitiu a contenção dos animais possibilitando a administração dos agentes farmacológicos, utilizando uma agulha de 0,4 mm de diâmetro conectada por uma cânula de propileno a uma seringa Hamilton de 25 μl. A agulha foi inserida à mão livre, perpendicularmente no crânio, diretamente no ventrículo lateral esquerdo, utilizando-se o bregma como referência. O local da injeção foi de 1 mm para a direita ou a esquerda do ponto médio de uma linha imaginária traçada até a base anterior das orelhas (1 mm lateral e 1 mm posterior ao bregma, com uma perfuração de 2,4 mm de profundidade). A fim de se verificar o local exato da injeção, os animais foram dissecados e analisados macroscopicamente após os testes (PAZINI et al., 2016). Os resultados de camundongos que apresentaram qualquer sinal de hemorragia cerebral, ou procedimento de injeção malsucedido, foram excluídos da análise estatística (<5 %). É importante mencionar ainda que todas as drogas foram preparadas no dia da administração e as doses foram escolhidas com base em trabalhos prévios e por estudos realizados por nosso grupo de pesquisa (BETTIO et al., 2012; LUDKA et al., 2013).

Referências

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