Posse
Noção de Posse
Posse Direito Real de Gozo
Artigos 1251º e seguintes do Código Civil
A palavra "Posse" índica o poder de facto exercido sobre certa coisa, não de modo fugaz mas sim de modo duradouro, logo implica que haja uma relação entre uma pessoa, a qual exerce o poder, e a coisa, sobre a qual o poder é exercido.Aqui existe
essencialmente um domínio factual sobre uma determinada coisa, por isso a posse consubstancia um direito com uma natureza muito especial, dado que ao contrário dos outros direitos reais pressupõe acima de tudo o tal facto material de subordinação de certa coisa a uma determinada vontade. Nesta perspectiva têm posse: o proprietário, o usufrutuário, o comprador de um bem alheio havendo a tradição do bem, bem como o próprio ladrão, pois do ponto de vista factual a coisa furtada está sob o domínio daquela vontade. Querendo com isto dizer que corresponde à apreensão material, ao domino factual físico de uma coisa.
Distinção entre Posse Causal e Posse Formal (Posse strito sensu) Posse Causal "ius possidendi"
Aqui existe uma causa, a qual consiste na titularidade de um direito real que a justifica. A pessoa exerce a posse porque tem um direito que lhe permite exercê-la. Aqui a tutela integra-se no esquema da garantia do próprio direito real que fundamenta a posse causal. O possuidor causal corresponde também ao titular do direito real, por isso se diz que é uma situação possessória que coincide com a titularidade de 1 direito real de gozo. Posse Formal "ius possessionis"; Posse
Aqui não existe causa, a tutela é autónoma.
O artigo 1251º (…) do Código Civil explicita que a posse - posse formal - não se identifica com o exercício do próprio direito real, existe uma mera actuação que apenas exteriormente é parecida com o exercício do direito real, logo não é assimilável à posse causal.
Existem aspectos do regime da posse que só são concebíveis para a posse formal, sendo eles: os caracteres da posse, artigos 1259º a 1262º do Código Civil, e a usucapião, artigos 1287º a 1301º do Código Civil.
O domínio factual sobre determinada coisa só admite duas qualificações: a posse formal, artigo 1251º do Código Civil e a posse precária, artigo 1253º do mesmo diploma legal.
Em principio a posse é juridicamente muito relevante, dado que dá ao possuidor uma série de vantagens que a lei designou por efeitos da posse, artigos 1268º a 1275º do
Código Civil; ao contrário da simples detenção a qual é juridicamente menos relevante, porque coincide com o usual empréstimo, mandato ou representação.
Diferença entre Concepção Objectiva e Concepção Subjectiva da Posse Concepção objectiva da posse (perfilhada por Jhering - germanofalo)
Nesta concepção sempre que existir domínio de facto sobre uma coisa, por regra existe posse, excepto se a lei declarar esse domínio de facto não qualificável como posse, mas sim como detenção. Atento o disposto no artigo 1251º do Código Civil, é necessário que o domínio de facto se refira a um direito real, caso contrário não existe posse, dando assim lugar à detenção. Para este autor é necessário haver corpus "elemento material da posse"+ animus detinendi " ou seja apreensão material do corpus com vontade de continuar com essa retenção em interesse próprio.
Concepção subjectiva da posse (perfilhada por Savigny - romanista)
O que aqui distingue a posse da detenção é um elemento psicológico denominado por "animus possidendi" (que é um animus especialmente qualificado). Este elemento psicológico não existe na detenção.
Aqui o domínio de facto sobre a coisa é designado por "corpus" e o elemento subjectivo específico por "animus possidendi", sendo, neste caso, indiferente a pessoa que tem o domínio de facto estar de boa ou de má fé.
Nesta concepção se existir animus há posse, no caso de não ser possível presumir o animus haverá detenção.
Na jurisprudência a concepção do animus possidendi aceite é a concepção subjectiva, na medida em que na maior parte das situações é difícil distinguir a posse da detenção, porque não é possível determinar se o domínio de facto se baseia numa actuação consentida ou apenas tolerada, a lei estabeleceu uma presunção no nº2 do artigo 1252º do Código Civil; já que nos termos da alínea c) do artigo 1253º do citado diploma legal na detenção se actua para outrem, ao contrário na posse actua-se para si.
(Importante: o Prof. Mesquita Cordeiro e o Prof. Oliveira Ascensão adoptam a teoria objectivista, concepção também adoptada pelo legislador no art. 1251 C.C., contra eles estamos nós e o resto do mundo que entendemos mais coerente a teoria subjectivista, porque mais exigente nos elementos da posse e por tanto menos susceptível de falhar) Caracteres da posse formal (ou espécies)
Posse Titulada e Posse não titulada Artigo 1259º do Código Civil.
Esta distinção faz-se em função da existência do título da posse, titulo este que consiste no chamado modo legítimo de adquirir, ou seja, acto jurídico translativo, isto é, quando a aquisição da posse está fundamentada num acto translativo, num acto que pode transmitir direitos reais.Assim, existindo um título, em principio a posse será titulada.
Se o acto translativo for substancialmente inválido mas se tiver respeitado a forma constitui titulo e portanto será posse titulada, ao contrário se o acto translativo não observou a forma legal, ou mesmo se não for justo, não constitui titulo logo a posse é não titulada, é o caso por ex. de uma posse fundada num contrato de promessa, mesmo que o contrato observe os formalismos legais, porque o seu efeito não é a transmissão do direito e não é um contrato translativo, a posse que nele se funda é sempre não titulada. O negócio jurídico tem de ser idóneo, atributivo e susceptível de ser apto a transmitir um direito real, não o transmitindo tão somente porque padece de algum vicio que gera a nulidade.
Atento o disposto no nº2 do artigo 1260º do Código Civil a posse titulada presume-se de boa fé, ao invés a não titulada presumir-se-á de má fé.
Posse de boa fé e Posse de má fé Artigo 1260º do Código Civil
A posse é de boa fé quando o possuidor no momento da aquisição ignorava que estava a lesar o direito de outrem.
Aqui existe um critério objectivo que serve para definir a boa ou má fé em função de uma pessoa de normal diligência. O critério é o conhecimento ou desconhecimento daquele que adquire a posse.
Logo, está de má fé quem devia saber que estava a lesar o direito de outrem, mesmo que no caso concreto o não saiba.
A posse de boa fé tem inúmeras vantagens, designadamente em relação aos frutos, pois o possuidor tem o direito de ficar com os rendimentos da coisa, apesar dessa coisa não lhe pertencer, artigo 1270º nº1 e 2 do Código Civil.Mas quando o legitimo titular do direito exigir a restituição da coisa, cessa a boa fé. Se a posse for de má fé, o possuidor não só tem direito a restituir a coisa e os rendimentos, como também tem ainda que responder pelos rendimentos que não obteve, mas que uma pessoa de normal diligência teria obtido, artigo 1271º do mesmo diploma legal.Tudo isto fica sanado se o possuidor puder invocar a usucapião que nos termos do artigo 1288º do Código Civil tem eficácia retroactiva, assim sendo o possuidor fica como se tivesse efectivamente direito sobre a coisa. A posse de boa fé também tem vantagens em termos de benfeitorias realizadas pelo possuidor, pois se este for obrigado a restituir a coisa ao legítimo proprietário, embora não possa recusar, salvo a usucapião, tem o direito a ser compensado pelas benfeitorias realizadas, se estas forem necessárias ou úteis nos termos do artigo 1273º do Código Civil. Embora neste âmbito seja indiferente a boa ou má fé do possuidor. No caso das benfeitorias serem voluptuárias se o possuidor estiver de boa fé tem o direito de retirar as benfeitorias, mas se estiver de má fé nos termos do artigo 1275º do Código Civil está impedido de o fazer. Por fim a posse de boa fé tem ainda vantagens nos termos da usucapião no que respeita aos prazos, mas importa referir que apesar de tudo a má fé não impede a usucapião.
Posse pacífica e Posse violenta Artigo 1261º do Código Civil
A posse é pacifica quando adquirida sem violência e é violenta quando para a adquirir o possuidor recorre à coacção física ou moral.
No caso da posse ser violenta os prazos para a usucapião não começam a contar enquanto a posse não passar a pacifica; enquanto a posse for violenta só o lesado pode intentar uma acção possessória para se defender, mas dentro do prazo de caducidade, o qual só começa a contar quando a posse deixar de ser violenta. Atento o disposto no artigo 1267º do Código Civil se a posse for violenta o lesado tem um ano para se defender sendo que a contagem do prazo só terá inicio quando cessar a violência. Posse pública e Posse oculta
Artigo 1262º do Código Civil
A posse é pública quando for exercida de maneira a que as pessoas por ela
eventualmente afectadas possam ter conhecimento da mesma, não importa se a posse é mesmo conhecida, o fundamental aqui é que esta possa ser conhecida pelos eventuais afectados.
A relevância desta distinção é semelhante à distinção entre posse pacífica e posse violenta.
A posse é oculta quando não há publicidade, mas isso não implica que esta deixe de ser posse. Os efeitos desta no que respeita a prazos são, contudo, próximos dos da posse violenta, sendo regra geral fixados os mesmos preceitos. Contudo a posse oculta não se presume de má fé.
Aquisição e perda da posse
Os modos de aquisição da posse distinguem-se em: 1 Modos de aquisição originária
2 Modos de aquisição derivada
1
a) Apossamento
b. Inversão do título da posse
O apossamento consiste na colocação da coisa sob o domínio da vontade de certa pessoa através da prática de actos materiais sobre essa coisa, que revelem intenção de apropriação. Os actos jurídicos não implicam o apossamento, é necessário que esses actos materiais sejam reiterados, logo têm de ser suficientes para que se possa presumir com alguma certeza a tal intenção de apropriação.
b. Artigos 1263º alínea d) e 1265º do Código Civil
A inversão do título da posse supõe que aquele que vai adquirir a posse já tivesse anteriormente o domínio de facto sobre a coisa a título de detenção. A inversão do título da posse implica uma conversão da simples detenção em posse formal, sendo que isto ocorre
originariamente, pois ocorre contra a vontade do anterior possuidor. A inversão do título pode resultar de um acto do próprio detentor ou de um acto de terceiro. Mas para haver tem de haver 1 declaração receptícia entre os interessados, excepto se for por acto de 3º no entendimento do Prof. Gonzalez.
2
a. Tradição (=entrega) b. Sucessão na posse c. Constituto possessório
a. Artigo 1263º alínea b) do Código Civil – (traditio longa manu)
Verifica-se quando o anterior possuidor cede ou transmite a sua posse ao novo possuidor entregando a própria coisa ou entregando algo que simbolize essa coisa. Daí que mais que a tradição material móveis e simbólica imóveis é necessário que a entrega seja feita pelo possuidor, e por outro lado que essa entrega seja feita com intenção de transmitir a posse, dado que não é qualquer entrega que implica a aquisição da posse. Mas quem recebe está longe física/ dessa coisa.
b. Artigo 1255º do Código Civil
Há um fenómeno de aquisição mortis causa (sem corpus e sem ânimus). Os sucessores do antigo possuidor, que aceitem a herança adquirem a posse que pertencia ao falecido. Aqui existe uma vantagem, pois a aquisição da posse dá-se mesmo sem a aquisição material da coisa, a posse adquire-se a partir do
momento da morte. Logo, neste caso, o sucessor tem posse jurídica mesmo sem ter posse de facto.
c. Artigos 1263º alínea c) e 1264º do Código Civil – (2 modalidades distintas a do n.º1 e a do n.º 2 do art. 1264)
1º - E uma situação em que alguém adquire a posse sem que a coisa objecto dessa posse lhe seja entregue, assim adquire a posse sem obter o
domínio de facto, mas mesmo assim o adquirente do direito real em causa é tido como seu possuidor (ex. A proprietário, vende, mas continua a ser arrendatário até à morte). Se a posse anterior existia no alienante, este passa a mero detentor em nome do adquirente;
2.º - Se a detenção existir em terceiro, este mantém a detenção, mas passa a exerce-la em nome do adquirente e não do alienante (ex. A vende a B uma casa que é arrendada por C).
d) traditio brevi manu, que acontece quando há acordo e a coisa estava na detenção do adquirente mesmo antes de este ter posse formal. Por ex. A empresta 1 moradia a B e posteriormente por comum acordo vende-lha, mas por algum motivo não se transmite o direito de propriedade.
Acessão da posse (também é 1 modo de aquisição derivada) Artigo 1256º do Código Civil
A acessão só existe quando o título aquisitivo da posse não seja a morte do anterior possuidor, havendo assim uma transmissão da posse por acto inter vivos.(É a soma de tempos sucessórios).
(e são requisitos:
1. Que as posses anteriores tenham sido adquiridas por 1 aquisição derivada; 2. Que sejam contíguas.
Efeitos da posse
Artigos 1268º e seguintes do Código Civil
Os efeitos da posse são os benefícios que o possuidor retira.
1 Presunção da titularidade do direito (+ importantes) 2 Frutos
3 Benfeitorias
1 Artigo 1268º do Código Civil
Parte-se do pressuposto que quem tem uma coisa em seu poder, é porque tem um direito que justifica a posse dessa coisa, logo quem tem a posse presume-se que é proprietário, usufrutuário, etc.
O artigo citado estabelece a presunção legal de que quem tem a posse de uma coisa tem o direito correspondente a essa posse. Pelo simples facto de ser possuidor confere desde logo uma protecção a este que resulta da presunção legal, a qual é importante porque quem tem uma presunção a seu favor não tem de provar aquilo que se presume. Assim sendo, quem se opõe ao possuidor é que tem de provar que o possuidor não tem a titularidade do direito e fazer a chamada prova diabólica. No caso de sobre a mesma coisa alguém tem posse e um terceiro um registo de aquisição entra em conflito duas presunções: a presunção de titularidade derivada do registo (artigo 7º do Código de Registo Predial) e a presunção derivada da posse (artigo 1268º do código Civil), aqui prevalece a titularidade assente na inscrição do facto constitutivo ou aquisitivo do direito, se anterior ao início da posse, podendo naturalmente o possuidor, para
demonstrar a antiguidade da sua posse, se titulada, invocar a presunção do nº2 do artigo 1254º do Código Civil.
2 Artigos 1270º e 1271º do Código Civil
Sempre que o possuidor estiver de boa fé a posse irá favorecê-lo, principalmente no que diz respeito a frutos naturais e civis produzidos pela coisa possuída.
3 Artigos 1273º a 1275º do Código Civil (+ art. 216º) 4 Artigos 1287º a seguintes
A usucapião é um dos efeitos mais relevantes da posse, é um modo de aquisição de direitos reais de gozo devido à manutenção da posse durante um determinado período de tempo, isto é, a usucapião supõe que exista posse, a qual tem de ser uma posse efectiva, pública e pacífica, artigo 1297º do Código Civil (+ art. 1300º). Este instituto destina-se a atribuir um direito a uma determinada pessoa. Os detentores não podem invocar a usucapião, atento o disposto no artigo 1290º do Código Civil.
De acordo com o artigo 1257º do Código Civil, para que a posse se mantenha basta que exista a possibilidade de a exercer.
Atento o disposto no artigo 1293º do citado diploma legal as servidões prediais não aparentes e os direitos de uso e de habitação não podem ser adquiridos pela usucapião. Efeitos do registo da aquisição por usucapião
Tem-se entendido que a aquisição por usucapião não depende do registo, daí que por um lado o possuidor quando invoca a usucapião adquire o direito correspondente à sua posse independentemente de depois proceder ao registo ou não dessa aquisição, pois analisando o artigo 5º nº2 alínea a do Código de Registo Predial o registo tem um efeito meramente enunciativo, pois a usucapião já pressupõe a publicidade. Mas, o registo acaba por ser necessário, pois a transmissão e oneração de direitos adquiridos por
usucapião estão sujeitas à regra do artigo 9º nº1 do Código de Registo Predial, ou seja o transmitente e o alienante tem de ter registo a seu favor. Por outro lado, a aquisição por usucapião não depende do registo porque esta aquisição sobrepõe-se a qualquer outro facto aquisitivo, mesmo contra factos que constam de registo.
Meios de Defesa da posse 1. Meios judiciais
Acções possessórias
Artigos 1276º a 1286º do Código Civil
As acções possessórias são acções que se destinam a defender judicialmente a posse, pois quem tem posse tem um direito. Quando se concedem acções
possessórias estas têm como fim proteger directamente a posse e indirectamente o direito que fundamenta a posse.
Na classificação que resulta do Código Civil, há 4 espécies de acções possessórias:
a) Acção de prevenção b) Acção de manutenção c) Acção de restituição d) Embargos de terceiro
a) Artigo 1277º do Código Civil
A acção de prevenção pressupõe que o possuidor tenha um receio objectivo que um terceiro o possa privar da posse ou dificultar o exercício desta. Trata-se de uma acção que se destina a condenar um terceiro na cessação dos actos que causam o tal receio. Esta acção tem natureza de providência cautelar. Acção não tem prazo de caducidade podendo ser intentada enquanto o receio existir. Ainda não há nenhuma ingerência do ponto de vista material, mas há justo receio e fundado.
b) Artigo 1278º do Código Civil
Aqui supõe-se que exista uma perturbação ao exercício da posse. A acção de manutenção supõe que o possuidor tem o domínio de facto sobre a coisa, mas está impedido de exercer normalmente a sua posse, pois existe um terceiro a praticar actos materiais que causam a dificuldade no exercício da posse - apenas ainda não houve esbulho-.
c) Artigo 1278º do Código Civil
Aqui visa-se obter a restituição da coisa, logo o possuidor tem que ter sido privado do exercício da posse. Esta acção pode ser intentada, quer se tenha uma privação total ou parcial do exercício da posse - tem de ter havido 1 esbulho -. d) Artigo 1285º do Código Civil
Trata-se de um meio de defesa da posse, este instituto tem uma especificidade que é o facto da ofensa à posse resultar de um acto judicial, daí que tenha sido necessário criar um procedimento próprio para reagir contra esse acto. Em principio o embargo de terceiro pode ser intentado enquanto estiver a decorrer o processo dentro do qual se efectuou a apreensão, isto é, enquanto não se realizar a venda judicial.
2. Meios extrajudiciais a. Acção directa b. Legitima defesa