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Os novos (paradigmáticos) desafios dos contratos agrários: a questão da fixação da remuneração nos arrendamentos rurais

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO

CURSO DE DIREITO

Henrique Missau Ruviaro

OS NOVOS (PARADIGMÁTICOS) DESAFIOS DOS CONTRATOS

AGRÁRIOS: A QUESTÃO DA FIXAÇÃO DA REMUNERAÇÃO NOS

ARRENDAMENTOS RURAIS

Santa Maria, RS

2018

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Henrique Missau Ruviaro

OS NOVOS (PARADIGMÁTICOS) DESAFIOS DOS CONTRATOS AGRÁRIOS: A QUESTÃO DA FIXAÇÃO DA REMUNERAÇÃO NOS ARRENDAMENTOS RURAIS

Monografia apresentada ao Curso de Direito, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Me. José Fernando Lutz Coelho

Santa Maria, RS 2018

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DEDICATÓRIA

O prédio da Antiga Reitoria, onde se situa a Faculdade de Direito da Universidade Federal de Santa Maria, sem os seus Professores e os seus Alunos

seria um corpo desalmado. Não haveria qualquer relampejo de sapiência, entusiasmo, perseverança, estímulo, brio e vitalidade, nas salas de aula, nos corredores, na sala do Tribunal do Júri, no auditório, na biblioteca, nas dependências

da Assistência Judiciária e do Diretório Livre do Direito, não fossem aqueles que bravamente ensinam e aqueles que humildemente aprendem. Os Professores e os

seus Alunos são a verdadeira alma da universidade.

Dedico este trabalho monográfico de conclusão de curso, pois, aos valorosos Mestres e Alunos do glorioso Direito da UFSM, que, mesmo diante do nítido descaso

dos sucessivos governos com a educação brasileira, empregam, diariamente, força e hombridade para ensinar e aprender o bom Direito. A Faculdade de Direito da

Universidade Federal de Santa Maria, assim como o nosso histórico prédio da Antiga Reitoria, são vivos, fortes, viscerais e espirituosos graças aos seus Alunos e

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AGRADECIMENTOS

O trabalho que, mui alegremente, ofereço à análise e à crítica da Academia não foi construído de maneira solitária. A escrita de um trabalho monográfico somente pode se dar da maneira projetada pelo Investigador quando ombreado por um sem número de pessoas que, mesmo sem saberem, colaboram para que as inquietudes saiam do campo das ideias e adentrem ao mundo acadêmico.

Não há, nesse sentido, moeda nem gesto capaz de agradecer pela felicidade que a conclusão desta monografia me proporciona. Os desafios de escrever um trabalho monográfico de conclusão de graduação em Direito seriam muito maiores se não estivesse ladeado pelos bons. Resta-me agradecer.

À minha família, esteio da minha tranquilidade e berço da minha perseverança, onde sempre encontro amparo aos desafios constantes do estudo das ciências jurídicas. Não fosse ela, não haveria, certamente, as proteções que, diariamente, estimam-me a angariar mais objetivos.

Aos colegas de escritório, onde as dúvidas se quedam brandas e os desafios constantes. Conforme sempre destaco, o melhor Direito nasce nos Escritórios de Advocacia, onde o Jurisdicionado chora, ri e confessa detalhes que jamais poderiam ser levados aos autos processuais.

Aos mestres da Universidade Federal de Santa Maria, que, mesmo diante do descaso dos sucessivos governos com a educação pública, diariamente, emprestam aos seus alunos o conhecimento e a bravura necessários aos grandes acadêmicos do Direito. O Curso de Direito da UFSM somente tem o prestígio que construiu ao longo das décadas graças também aos seus Docentes.

Aos colegas da Universidade Federal de Santa Maria, já que não há conhecimento construído de maneira solitária. Não fossem os debates das longas (e, muitas vezes, frias) noites, no prédio da Antiga Reitoria, certamente, a história desta monografia não seria esta. O pincel que redigiu este texto é o mesmo que redige as incontáveis angústias do estudo universitário público brasileiro.

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Pido a los santos del cielo Que ayuden mi pensamiento, Les pido en este momento Que voy a cantar mi historia Me refresquen la memoria, Y aclaren mi entendimiento.

Venga santos milagrosos, Vengan todos en mi ayuda, Que la legua se me añuda Y se me turba la vista; Pido a mi Dios que me asista En ama ocasión tan ruda.

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RESUMO

OS NOVOS (PARADIGMÁTICOS) DESAFIOS DOS CONTRATOS AGRÁRIOS: A QUESTÃO DA FIXAÇÃO DA REMUNERAÇÃO NOS ARRENDAMENTOS RURAIS

AUTOR: Henrique Missau Ruviaro ORIENTADOR: José Fernando Lutz Coelho

A história do Brasil foi redigida com o mesmo nanquim que redigiu a história da agricultura e da pecuária. Desde antes da chegada dos portugueses ao solo brasileiro, os usos do solo tem sido a principal fonte de exploração econômica brasileira. Após a chegado dos europeus, passou-se a regulamentar o uso e o gozo do solo, em incontáveis legislações. Atualmente, o Estatuto da Terra e o Decreto nº 59.566/66, trazem uma série de normas cogentes, que devem ser respeitadas por aqueles que contratam o uso da res agrária. Quanto à fixação da remuneração, por exemplo, a legislação prevê que os contratos de arrendamento rural devem pactuar o pagamento em quantia fixa de dinheiro. A jurisprudência, porém, diverge sobre o assunto: enquanto o STJ entende pela invalidade daquela cláusula que contraria o ditame legal, o TJRS entende pela validade. O presente trabalho, nesse sentido, diante de tal cenário, propôs-se a verificar a (in)validade daquela cláusula contratual que fixa o preço dos contratos de arrendamento em produto. Para tanto, adotou-se o método de abordagem dialético e os métodos de procedimento histórico, comparativo e monográfico. Após as fundações do trabalho, concluiu-se que a cláusula que fixa o contrato de arrendamento em produto é válida, sob o viés do Direito Costumeiro, bem como que há uma necessidade de se refundar o Direito Agrário pátrio, uma vez que nem o Decreto nº 59.566/66 nem o ET são, atualmente, suficientes a amenizar os novos paradigmáticos desafios dos agricultores e dos pecuaristas brasileiros.

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RESUMEN

LOS NUEVOS (PARADIGMÁTICOS) DESAFÍOS DE LOS CONTRATOS RURALES: LA CUESTIÓN DE LA FIJACIÓN DE LA REMUNERACIÓN EM LOS

ARRENDAMIENTOS RURALES

AUTOR: Henrique Missau Ruviaro ASESOR: José Fernando Lutz Coelho

La historia de Brasil fue redactada con el mismo nanquín que redactó la historia de la agricultura y la ganadería. Desde antes de la llegada de los portugueses a suelo brasileño, el uso del suelo ha sido la principal fuente de la explotación económica de Brasil. Después de la llegada de los europeos, se pasó a regular el uso y el goce del suelo, en incontables legislaciones. En la actualidad, el Estatuto de la Tierra y el Decreto nº 59.566/66, traen una serie de normas que deben ser respetadas por aquellos que contratan el uso de la agricultura. En cuanto a la fijación de la remuneración, por ejemplo, la legislación prevé que los contratos de arrendamiento rural deben pactar el pago en cantidad fija de dinero. La jurisprudencia, sin embargo, diverge sobre el asunto: mientras el STJ entiende por la invalidez de aquella cláusula que contraría el dictamen legal, el TJRS entiende por la validez. El presente trabajo, en ese sentido, ante semejante senador, se propuso verificar la (in) validez de aquella cláusula contractual que fija el precio de los contratos de arrendamiento en producto. Para ello, se adoptó el método de abordaje dialéctico y los métodos de procedimiento histórico, comparativo y monográfico. Después de las fundaciones del trabajo, se concluyó que la cláusula que fija el contrato de arrendamiento en producto es válida, bajo el sesgo del Derecho Costumeiro, así como que hay una necesidad de refundar el Derecho Agrario patrio, ya que ni el Decreto 59.566 / 66 ni el ET son actualmente suficientes para amenizar los nuevos paradigmáticos desafíos de los agricultores y de los ganaderos brasileños.

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul . 46 Gráfico 2 - Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ... 49 Gráfico 3 - Decisões Monocráticas do Superior Tribunal de Justiça ... 50 Gráfico 4 - O STJ e o Preço dos Contratos de Arrendamento Rural ... 51

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ART Artigo CC Código Civil

CF Constituição Federal

CRFB Constituição da República Federativa do Brasil ET Estatuto da Terra

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística RS Rio Grande do Sul

STJ Superior Tribunal de Justiça

TICs Tecnologias de Informação e Comunicação TJ Tribunal de Justiça

TJRS Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul UFSM Universidade Federal de Santa Maria

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11 2 CONTRATOS AGRÁRIOS: A REGULAMENTAÇÃO DO USO DA TERRA NO BRASIL ... 15 2.1 ORIGEM HISTÓRICA COLONIAL DA LEGISLAÇÃO QUE REGULAMENTA O

USODATERRAEMTERRAEBRASILIS ... 16

2.2 APRESENTAÇÃODOS CONTRATOS AGRÁRIOS TÍPICOS E SUAS NORMAS COGENTES... 30 3 O ENTENDIMENTO SOBRE A (IN)VALIDADE DA CLÁUSULA QUE FIXA A REMUNERAÇÃO EM PRODUTO NOS CONTRATOS DE ARRENDAMENTO 42

3.1 A FIXAÇÃO DO PREÇO NOS CONTRATOS AGRÁRIOS SOB A LUZ

LEGISLATIVA,DOUTRINÁRIAEJURISPRUDENCIAL ... 43 3.2 A QUESTÃO DA REMUNERAÇÃO DOS CONTRATOS DE ARRENDAMENTO

RURALEANECESSIDADEDEUMAREFUNDAÇÃODODIREITOAGRÁRIO 52 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 61 REFERÊNCIAS ... 66

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1 INTRODUÇÃO

Tecer linhas, mesmo que sem o condão de apaziguar as discussões sobre o tema, uma vez o trabalho monográfico não propicie tanto, demonstra-se tarefa mui desafiadora. O Direito Agrário (e, por ricochete, os Contratos Agrários) é, conforme se extrai da literatura, ciência extremamente mutante.

No decorrer das últimas décadas, os interesses daqueles que utilizam dos imóveis rurais transformara-se. No momento histórico em que se discutia a edição da Lei nº 4.504/65 (Estatuto da Terra), as questões fundiárias tomavam conta do cenário nacional. Atualmente, tais controvérsias tornaram-se menos acirradas, ao passo em que novos paradigmas agrários passaram a tomar conta do debate

jusagrarista – dentre os quais se encontram desde questões envolvendo a proteção

aos recursos naturais, até controvérsias sobre a fixação da remuneração dos contratos agrários.

Importante salientar, nesse sentido, que o Direito Agrário é um dos primeiros ramos do Direito a ser explorado no Brasil. Desde a chegada dos portugueses ao país, no simbólico ano de 1500, utiliza-se da terra para a extração e o cultivo de recursos e, portanto, necessita-se regulamentar tal uso. A história do Brasil, por conseguinte, foi escrita com o mesmo nanquim que pintou a história da agropecuária pátria.

Enquanto, nesse sentido, a primeira legislação a tratar do uso da terra fora editada no ano de 1501, as mais modernas normas a tratarem de tal thema são da década de 1960 – Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64) e Decreto nº 59.566/66. Em tais legislações, nesse sentido, após grande desenvolvimento cultural e histórico do

jusagrarismo, positivou-se o contrato de arrendamento, prevendo normas de ordem

cogente, cujo respeito é, em tese, obrigatório por aqueles que pactuam o uso dos imóveis rurais.

A obrigatoriedade de tais normas reflete o caráter social do Direito Agrário – não sendo classificado nem como Direito Público nem como Direito Privado, mas como Direito Social, onde e quando se respeita a liberdade contratual das partes sem que se olvide da obrigatoriedade de algumas normas contratuais. Dentre as normas cogentes, destacam-se aquelas que tratam sobre os prazos mínimos dos contratos, a fixação da remuneração, a indenização por benfeitorias edificadas (e,

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consequentemente, a retenção da res pelo não pagamento de tais indenizações), a preempção, etc.

No que se refere, em especial, àquelas normas que tratam da fixação do preço nos contratos agrários de arrendamento, há bastante controvérsia tanto na doutrina quanto na jurisprudência nacionais.

A legislação – tanto o Estatuto da Terra quanto o Decreto nº 59.566/66 – positiva que os contratos de arrendamento rural devem, obrigatoriamente, ter o preço pactuado em dinheiro, sendo possível a conversão do seu pagamento em produto.

Parcela da doutrina e Tribunais pátrios, como é o caso do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (em sede de Recurso de Apelação), entendem que os contratos agrários de arrendamento rural que fixam o preço em produto são válidos, uma vez que respeitam o Direito Costumeiro daqueles agricultores e pecuaristas interioranos do Estado do Gaúcho. O Superior Tribunal de Justiça, por outro lado, em sede de Recurso Especial, entende pela invalidade daquela cláusula contratual, uma vez a mesma ser contrária ao texto legal.

Tem-se, então, que a questão referente à fixação do preço, nos contratos agrários de arrendamento rural, causa divergência na jurisprudência dos tribunais pátrios. Enquanto, conforme destacado, o STJ entende ser inválida a cláusula contratual que fixa a remuneração em produto, o TJRS, seguindo a exegese de outros tribunais estaduais, entende pela validade da referida cláusula. Dessa forma, o questionamento que surge, à Academia, ao Investigador e, principalmente, ao Jurisdicionado, é, à luz da doutrina e da jurisprudência dominantes, sobre a (in)validade da cláusula. É válida a cláusula contratual de fixar o preço em produtos nos contratos agrários de arrendamento rural? Ainda, o Direito Agrário e a legislação agrária brasileira estão aptos a solucionar os novos dilemas do jusagrarista?

Objetivou-se, neste trabalho monográfico, responder o problema suscitado, analisar a (in)validade da cláusula contratual de fixação do preço em produto nos contratos agrários de arrendamento rural de acordo com a doutrina e com a jurisprudência dos Tribunais Pátrios. Para tanto, buscou-se expor as características dos contratos agrários, analisar o posicionamento doutrinário sobre a fixação da remuneração dos referidos contratos, bem como analisar o posicionamento jurisprudencial – sobretudo no que se refere às jurisprudências do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e do Superior Tribunal de Justiça.

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A fim de melhor realizar a pesquisa, adotou-se o método de abordagem dialético, uma vez ser clara a divergência tanto entre a doutrina quanto entre os julgados dos tribunais referidos. Como método de procedimento, utilizou-se o método histórico, com a finalidade de abordar a criação da cultura jusagrarista que impera hoje, no Brasil, bem como os métodos comparativo e monográfico, a fim de realizar estudos de caso comparando as raciodecidendi dos julgados dos tribunais.

O segundo capítulo do presente trabalho, intitulado por “Contratos agrários: a regulamentação do uso da terra no Brasil”, foi dividido em dois subitens. O primeiro, denominado por “Origem histórica colonial da legislação que regulamenta o uso da terra em terrae brasilis”, abordou a formação da cultura jusagrarista que impera hoje no país, apresentando desde as primeiras legislações que positivaram o uso da terra até as mais recentes ordenações pátrias. O segundo subitem, labelado “Apresentação dos contratos agrários típicos e suas normas cogentes”, por sua banda, tratou de analisar os contratos agrários típicos sob o viés do Estatuto da Terra e do Decreto nº 59.566/66, apresentando as suas normas cogentes.

O terceiro capítulo, por seu turno, intitulado por “O entendimento sobre a (in)validade da cláusula que fixa a remuneração em produto nos contratos de arrendamento”, foi dividido, também, em dois subitens. O primeiro, denominado por “A fixação do preço nos contratos agrários sob a luz legislativa, doutrinária e jurisprudencial”, abordou exclusivamente a fixação da remuneração dos contratos agrários de arrendamento, apresentando, além dos textos legais, os posicionamentos da doutrina e da jurisprudência – sobretudo aquela emanada do Tribunal de Justiça o Estado do Rio Grande do Sul (em nível de decisão de Recurso de Apelação) e do Superior Tribunal de Justiça (em nível de decisão de Recurso Especial). O segundo subitem, por sua vez, intitulado por “A interpretação do direito agrário e a necessidade de uma refundação”, abordou as mutações ocorridas nas ciências agrárias ao longo das últimas décadas, bem como a insuficiência da lei agrária brasileira em solucionar os conflitos oriundos de tais avanços. Dessa maneira, defendeu-se a necessidade de se refundar o Direito Agrário e, consequentemente, inovar a legislação nacional no que tange a coisa rural.

A relevância de tal estudo, nesse sentido, está em levar ao debate acadêmico as mudanças ocorridas no meio rural nas últimas décadas e as desafiadoras inovações necessárias ao mundo jurídico e legislativo, a fim de proporcionar que o Direito Agrário se reaproxime do Jurisdicionado com o propósito de solucionar

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aqueles problemas oriundos do campo. Uma legislação agrária insuficiente para a solução de tais conflitos se mostra temerária, gerando, ainda mais, controversas e atritos às coisas rurais.

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2 CONTRATOS AGRÁRIOS: A REGULAMENTAÇÃO DO USO DA TERRA NO BRASIL

O uso da terra, não só no Brasil ou nos países do continente americano, mas em todo o globo, tem revelado corolários outrora inimagináveis, variando, desde a degradação do meio-ambiente1, até a produção potencializada2 dos grãos que alimentam o planeta e desenvolvem a tecnologia3. Se, por um lado, produzem-se, em especial no Brasil, quantias cada ano maiores de milhares de sacas dos mais variados grãos, como é o caso do arroz, da soja, do milho etc., de outro se desmata quantidades insubstituíveis de hectares, bem como se assolam rios e se escravizam trabalhadores.

Desse modo, os contratos agrários, conforme destaca o Professor Sílvio Salvo Venosa4 (2016, p. 926):

[...] não podem [...] ser tratados à margem do sistema geral dos negócios jurídicos. Em seu exame, não se arredam os princípios fundamentais e tradicionais dos contratos. Esse é, aliás, o sentido expresso no art. 13 da Lei nº 4.947/66, ao determinar que nos contratos agrários sejam aplicados os princípios gerais que regem os contratos no direito comum, no que concerne ao acordo de vontades e ao objeto, observados, contudo os preceitos de direito agrário que enumera. [...].

A fim de proteger o meio-ambiente, na data de 30 de novembro de 1964, o Legislador editou a Lei nº 4.504, dispondo sobre o Estatuto da Terra (ET) – o que,

1

No caso brasileiro, mais especificamente no caso amazônico, conforme se extrai de dados fornecidos pelo Greenpeace, organização não governamental militante nas causas ambientais, “maravilhas à parte, o ritmo de destruição segue par a par com a grandiosidade da Amazônia. Desde que os portugueses pisaram aqui, em 1550, até 1970, o desmatamento não passava de 1% de toda a floresta. De lá para cá, em apenas 40 anos, foram desmatados cerca de 18% da Amazônia brasileira – uma área equivalente aos territórios do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro e Espírito Santo” (GREENPEACE, 2018, s/p).

2

Dados colhidos do Censo Agropecuário de 2006 do IBGE revelam que, naquele ano, no Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, havia 326 estabelecimentos agrícolas produtores de arroz em grãos. Os mesmos, revela o mesmo censo, produziu cerca de 19.604 (dezenove mil seiscentos e quatro) toneladas de grãos de arroz, das quais foram vendidas cerca de 18.784 (dezoito mil setecentos oitenta e quatro) toneladas, o que corresponde ao valor de R$ 9.415.000,00 (nove bilhões e quatrocentos e quinze mil reais) (IBGE, 2006, s/p).

3

Importante destacar, nesse singular tocante, que os grãos produzidos pela agricultura não são destinados única e exclusivamente à alimentação, mas também ao desenvolvimento de novas tecnologias menos danificadoras ao meio-ambiente. Nesse sentido, atualmente, a tecnologia desenvolvida junto aos grãos, como é o caso da soja, possibilita a fabricação de pneus, de combustível e outros tantos produtos fundamentais aos dias atuais.

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O Prof. Sílvio Salvo Venosa é um dos grandes nomes do Direito Civil brasileiro, tendo sido Juiz de Direito e Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Atualmente, além de professor e palestrante, milita na Advocacia. A primeira edição da obra citada se deu no início dos anos 2000, quando o Brasil atravessava grandes confrontos fundiários, o que veio a ser apaziguado com o passar do tempo. Atualmente, a obra está na sua 17ª edição.

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mais tarde, foi regulamentado pelo Decreto nº 59.566/66. Em que pese haver projetos parlamentares para a edição de uma nova legislação dispositiva sobre o uso da terra, bem como sobre a preservação do meio ambiente, no Brasil, a referida legislação é, atualmente, a mais recente ordenação brasileira que dispõe sobre o tema. A promulgação do ET e do Decreto mencionado, no entanto, deu-se, conforme se demonstrará, a partir de uma evolução histórica que teve início nos anos coloniais, no simbólico marco de 1.500, quando os portugueses, capitaneados por Pedro Álvares Cabral, atracaram suas naus no litoral brasileiro e passaram a explorar as terras do Novo Mundo.

O presente capítulo, construído sob o método de procedimento histórico5, tem como objetivo analisar, mesmo que os limites do trabalho monográfico não proporcionem que se faça de forma aprofundada, a construção das legislações agrária e ambiental brasileiras, desde a chegada dos europeus ao Brasil até a atualidade. A fim de torna-lo mais didático, nesse sentido, dividiu-se o capítulo em dois subitens: o primeiro, denominado por “Origem histórica colonial da legislação que regulamenta o uso da terra em terrae brasilis” e o segundo, da mesma forma, labelado por “Apresentação dos contratos agrários típicos e suas normas cogentes”.

2.1 ORIGEM HISTÓRICA COLONIAL DA LEGISLAÇÃO QUE REGULAMENTA O USO DA TERRA EM TERRAE BRASILIS

O Direito é, certamente, um fenômeno social. As leis, as normas, os julgados e todas as outras fontes que constroem as ciências jurídicas não são in res natura, mas frutos de uma construção social que surgiu desde os primórdios das comunidades. As ciências jurídicas são construções humanas criadas no bojo da evolução das sociedades, após incontáveis variações e adaptações. Em outras palavras, Otávio Augusto Dal Molin Domit6 (2016, p. 23), em destacada obra sobre a

iura novit cúria e a causa de pedir, salientou que:

O direito, como ciência do espírito, como fenômeno que não se encontra in

res natura, mas brota da sociedade, como obra exclusiva e iniludível

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O método de procedimento histórico consiste na investigação de acontecimentos, processos e momentos do passado para verificar a sua influência na sociedade atual. Nesse sentido, a utilização de tal método se fez importante par que fosse possível investigar o momento histórico da criação tanto da Lei n.º 4.504/64 quanto do Decreto n.º 59.566/66.

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Otávio Augusto Dal Molin Domit é investigador processualista civis brasileiro e Advogado. Bacharel, Mestre Doutor em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A obra citada é fruto das suas investigações junto ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e está na sua primeira edição.

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manifestação cultural do homem, fruto de sua construção, responde ao seu modo de pensar, à sua maneira de enxergar o mundo, sofrendo variações e adaptações segundo os valores prevalentes em determinado momento histórico. É dizer, reage o direito à história, não lhe sendo infenso [...].

O estudioso do Direito, portanto, tem as suas investigações atreladas à análise histórica. Isso porque resta clara a necessidade de se investigar a realidade cultural que fora construída ao longo dos anos. Em especial, no case do Direito Agrário – e, por ricochete, do Direito Contratual Agrário –, insta que seja estudada a criação da cultura agraria e ambiental que hoje impera na comunidade jusagrarista brasileira. Nesse sentido, conforme destaca Otávio Augusto Dal Molin Domit (2016, p. 23), em obra já mencionada, “[...] o exame desse substrato teórico oferece valiosos elementos para a compreensão da função e causa de uma dada forma jurídica na época em que concebida ou recepcionada”.

Assim, sendo a investigação histórica deveras importante para a análise da conjuntura social, jurídica e política que se vive hoje, o início da pesquisa se apresenta não pode ter outro introito que não o histórico. Buscar a gênese histórica da cláusula de fixação da remuneração dos contratos agrários de arrendamento rural tem o corolário natural de prover melhor compreensão crítica dos textos legais que o regulamentam e dos julgados controversos que almejam apaziguar as discussões sobre a questão. A análise histórica é, por isso, passo fundamental e escopo deste trabalho monográfico de conclusão de curso.

O uso da terra está, nesse sentido, diretamente ligado à história do país. Ao longo dos anos, tanto as culturas regionais dos povos brasileiros quanto a economia local são escritas com o nanquim da agropecuária. Conforme se extrai da obra de Luís Felipe Perdigão de Castro7 (2016), se a matriz social, econômica e política brasileira não é, à rigor, agrícola, as bases da civilização brasileiras são, indubitavelmente, rurais.

Muito antes de os portugueses, no simbólico ano de 1.500, conhecerem o território que, outrora, denominar-se-ia por Brasil, os indígenas e os outros povos que naquelas terras habitavam já utilizavam da terra para extrair os alimentos e a matéria-prima que seriam base das suas mantenças. Após a chegada dos

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O referido Autor é Doutorando em Ciências Sociais – área de concentração de Estudos Comparados sobre as Américas – pela Universidade de Brasília. O material citado fora publicado junto à Revista Brasileira de História e Direito, que é uma publicação semestral open acess editada pelo Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito – CONPEDI.

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portugueses, toda a vida colonial concentrou-se, durante anos, ocupando propriedades rústicas.

A utilização das propriedades rurais brasileiras pelos europeus trouxe à luz a necessidade de uma regulamentação sobre o uso da terra. Isso porque, em um primeiro momento, conforme se demonstrará neste subitem, o uso inicial das terras do Brasil se deu de maneira descriminada, com grandes níveis de desmatamento de madeiras nativas – muitos regularizados por contratos de arrendamentos rurais firmados entre a Coroa (Arrendadante e Proprietária das terras) e os Arrendatários (geralmente portugueses fidalgos).

Desse modo, enquanto o uso da terra pelos indígenas, até o presente momento, tem sua regulamentação desconhecida – em que pese acreditar-se haver, à época, algum tipo de regulamentação exercida pelos mesmos – foi após a chegada dos europeus, no entanto, que se passou a legislar o uso da terra.

Compreender a dinâmica da evolução da legislação agrária do país, desde a chegada dos portugueses, com as Ordenações do Reino, até os dias atuais, com o ET e com o Decreto nº 59.566/66, faz-se tarefa deveras pertinente e desafiadora pela academia, já que, conforme já destacado, a história do país está estritamente entrelaçada à história do uso das terras brasileiras.

O uso da terra no Brasil, ao longo da história do país, flutuando sobre as épocas colonial, imperial e republicana, revelou características mui distintas e importantes. Enquanto, em determinados momentos, importou-se em legislar visando incentivar a migração de portugueses que desejassem ocupar os solos brasileiros, a fim de evitar que outros países europeus o fizessem, visou-se, em outros momentos, tanto o viés econômico quanto, como ocorre ultimamente, o viés ambientalista.

O último viés, aliás, esteve presente em todos os momentos históricos de uso da terra no Brasil – independente das demais pretensões supramencionadas. Conforme destacam Albenir Itaboraí Querubini Gonçalves8 e Cassiano Portella Ceresér9 (2013, p. 112),

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O citado autor é especialista e Mestre em Direito pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e desenvolve investigações no que se refere ao Direito Agrário e aos Contratos Agrários. O referido livro, que está em sua primeira edição, foi lançado em 2013, quando o Brasil já não atravessava mais grandes confrontos agrários.

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O referido livro, que está em sua primeira edição, foi lançado em 2013, quando o Brasil já não atravessava mais grandes confrontos agrários.

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O Brasil, nação de incomensuráveis recursos ambientais, não poderia ficar alheio à questão ambiental. Em assim sendo, os problemas acerca da questão ambiental no Brasil retroagem ao momento de seu descobrimento. Ao desembarcarem, os descobridores se depararam com a exuberância e riqueza de nossa terra, iniciando contrabando de diversos exemplares de nossa fauna e flora. Diante deste quadro, a preocupação com a questão ambiental do país remota a sua origem.

O acesso à terra, de mesma maneira, variou muito, no decorrer da história nacional. Enquanto, nos primeiros anos de colonização, o acesso à terra se deu de maneira quase que exclusivamente arrendatória, atualmente, o contrato de arrendamento tem se demonstrado, conforme destaca Luís Felipe Perdigão de Castro (2016), a maneira menos adotada para acessar as terras no Brasil.

No início da colonização brasileira, por outro lado, tal modalidade de acesso à terra demonstrava-se muito utilizada, uma vez fora a adotada pela Coroa Portuguesa para incentivar a vinda de portugueses para ocupar os solos do Brasil. Nesse sentido,

Não obstante o arrendamento florestal viabilizasse a intensa exploração colonial, havia excesso de terras e falta de pessoas para, não somente derrubar as matas, como também cultivar as terras. Portanto, a introdução da prática do arrendamento no Brasil é parte de uma [...] obra, em que a Coroa Portuguesa tinha como principal objetivo retirar recursos para o comércio (CASTRO, 2016, p. 197).

Ao largo da história nacional, tanto nos tempos coloniais, quanto nos tempos imperiais, ou seja, nos tempos republicanos, muitas foram as legislações que positivaram o uso da terra – dentre as quais restam Constituições, Leis esparsas, Códigos etc.

A fim de tornar mais didático o exame da vasta legislação pátria que regulamentou o uso da terra do Brasil, insta que se analise, em um primeiro momento, a legislação esparsa para, em um segundo momento, investigar a legislação constitucional e, finalmente, a legislação mais moderna – positivada sob a égide dos códigos.

Da observação da legislação esparsa, resta destaque àquelas que influenciaram diretamente na construção da cultura agraria nacional, como é o caso do Regimento Tomé de Souza, bem como do Regimento Pau-Brasil, do Alvara de 27 de fevereiro de 1701 e da Carta Regia de 1701. Nesse sentido, a análise detalhada de seus dispositivos legais se faz necessária, conforme se demonstrará.

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A primeira legislação que trabalhou a ideia do uso da terra no Brasil é data do ano de 1501. Tal norma teve como objetivo conceder a exclusividade da exploração do pau-brasil para uma empresa ítalo-lusitana cujo maior acionista era Fernando de Noronha. A exploração do pau-brasil por tal empresa se deu por meio de um contrato de arrendamento rural (mui provável que seja o primeiro contrato de arrendamento rural lavrados com objeto solos do Brasil), onde a empresa de Noronha figurava como Arrendatária e a Coroa Portuguesa, por sua vez, figurava como Arrendadante.

A primeira legislação, por outro lado, a tratar sobre a maneira pela qual se deveria usar as terras do Brasil foi o Regimento Tomé de Souza, datado de 17 de dezembro de 1548. Em tal legislação, que é conhecida como “Constituição do Governo Geral”, o Rei estabeleceu as normas jurídicas que vigorariam na Colônia, assim como estimulou as tendências latifundiárias, recomendando a concessão de terras para fins agropecuários, no Brasil.

No referido documento, tratou-se desde a centralização da administração da colônia (vide art. nº 1º), até o uso da terra (haja vista o disposto nos art. nº 8º, do art. nº 9º e do art. nº 10º). Nesse tocante, conforme, à época, o Brasil não era objeto de cobiça europeia, havia imensa necessidade de os portugueses povoarem a Colônia10, com o propósito de evitar que outros povos o fizessem. No referido regimento, de acordo com o que se extrai da doutrina de Raymundo Laranjeira11 (1981), o Rei estimulou o uso da terra

1548 – Regimento de Tomé de Souza, de 17 de dezembro, que propositadamente estimulou mais ainda as tendências latifundiárias do sistema sesmarial: recomendava que as doações de terras, para fins de construção de engenhos, fossem canalizadas às pessoas de posses bastantes (LARANJEIRA, 1981, p. 25).

Ao longo dos primeiros anos de povoação da Colônia, nesse sentido, outras legislações foram editadas pela Coroa Portuguesa, a fim de estimular o uso da terra, no Brasil, bem como de povoar o Novo Mundo. Referência especial merece o

10

Art. 8º, Regimento de Tomé de Souza: porque minha tenção é que a dita povoação seja tal, como atrás fica declarado, hei por bem que ela tenha de termo e limite seis léguas para cada parte, e sendo caso que por alguma parte não haja as ditas seis léguas, por não haver tanta terra, chegará o dito termo até onde chegarem as terras da dita Capitania, o qual termo mandareis demarcar, de maneira que, em todo tempo, se possa saber por onde parte (PORTUGAL, 2018, s/p).

11

Raymundo Laranjeira pode ser considerado como literatura clássica no Direito Agrário brasileiro. A obra citada foi editada e lançada em 1981, quando o país vivia em estado de exceção e atravessado sério confrontos rurais.

(22)

Regulamento de 12 de dezembro de 1.605, intitulado, posteriormente, como Regimento Pau-Brasil, onde o então Rei de Portugal, ao ser informado das desordens que ocorriam no sertão brasileiro, bem como do corte exacerbado da mata nativa do pau-brasil, outorgou o referido regimento proibindo, em seu parágrafo 1º, qualquer corte do pau-brasil, sob pena de morte daquele que ou cortar ou ordenar o corte.

Em que pese, nesse sentido, em uma primeira análise, parecer a legislação ventilar a ideia de proteção ao meio-ambiente, evitando o corte indiscriminado da mata nativa brasileira, a real intenção da Coroa era proteger, além dos recursos naturais, o seu patrimônio econômico, uma vez era de conhecimento, à época, o grande valor que aquela madeira nativa detinha – haja vista sua possibilidade de extração de tinta natural. Nos dias atuais, por outro lado, conforme se demonstrará alhures, a proteção ao meio-ambiente é a mens legis da legislação agraria pátria.

No segundo século desde a chegada dos europeus em solos brasileiros, em 1605, a Coroa, por ser, destaca-se, um estado forte, onipotente e onipresente, passou a interferir direta e rigorosamente sobre o que seria permitido e o que seria proibido fazer, nas terras brasileiras. Com isso, conforme se extrai das lições de Raymundo Laranjeira, no Regulamento de 12 de dezembro de 1605, proibiu-se o corte do pau-brasil, produto pertencente à Coroa (LARANJEIRA, 1981).

O pau-brasil, portanto, passou a ter o seu corte proibido pela Coroa sob pena de morte e perda de suas terras àqueles que ou cortassem ou mandassem cortar a árvore sem a autorização do Rei. Evento similar ocorre, ainda, nos dias atuais, quando para cortar ou mandar cortar mata nativa, insta que aquele que intentar fazer tenha autorização estatal12, concedida mediante projeto de reflorestamento e justificativa para o corte.

Cerca de 200 anos após a chegada dos europeus aos solos brasileiros, em 27 de fevereiro de 1701, a Coroa Portuguesa editou o Alvará de 27 de fevereiro que determinou a obrigatoriedade de os lavradores plantarem também a mandioca na região do Recôncavo Baiano (LARANJEIRA, 1981).

Conforme se extrai da legislação avulsa que regulamentava o uso da terra no Reino, à Coroa restava forte interesse econômico da terra colonial. Em que pese,

12

Aquele que cortar a mata nativa sem a devida autorização estatal, conforme se extrai do art. nº 39 da Lei nº 9.606/1998, configura crime ambiental e tem pena de detenção de um até três anos e/ou multa.

(23)

nesse sentido, extrair-se da regulamentação apresentada determinações para o plantio de determinadas culturas, bem como para o não corte da mata nativa, a preocupação com o meio ambiente estava ausente, uma vez que a real preocupação do Reino de Portugal era o dinheiro que poderia auferir da Colônia. Nesse tocante,

Essa legislação avulsa, margeante das Ordenações do Reino, deixam transparecer que só a função econômica da terra colonial interessaria à Coroa portuguesa, ávida de maiores rendimentos sobre as nossas culturas. Por isso mesmo que se deu margem à proliferação dos latifúndios, no Brasil. Os imensos tratos de terra sesmeiras eram compatíveis com a lavoura canavieira do litoral e com a pecuária extensiva dos sertões, as quais bem se achegavam à ganância, cada vez mais larga, da aristocracia latifundiária. Eram os nobres e outros apaniguados do reino os que mais se iam apropriando do território sesmariado (LARANJEIRA, 1981, p. 28-29).

Foi com o Decreto nº 1.318 que passou a se preocupar com os danos causados ao solo e, consequentemente, à coletividade. No referido diploma legal, o Legislador positivou, em seu capítulo oitavo, sobre a conservação das terras devolutas e alheias, constituindo, com isso, providências contra os que se apossassem dessas terras ou nelas praticassem qualquer dano – seja com a derrubada da madeira ou com a provocação de incêndios.

Raymundo Laranjeira (1981, p. 36-37), em sua clássica obra que versa sobre a propedêutica do Direito Agrário brasileiro, destacou que:

O Regulamento da Lei n. 601 veio a lume quatro anos mais tarde, em 30 de janeiro de 1854. Foi o Decreto n. 1.318, que enquadrou a matéria do seguinte modo, em nove capítulos, aclarando, naturalmente, o próprio conteúdo do diploma principal: 1. ‘Da Repartição Geral das Terras Públicas’, com disposição de normas para funcionamento de órgão especial, incumbido de promover o novo esquema agrário do País; 2. ‘Da Medição de Terras Públicas’, com regras para medir as terras devolutas, ensejando um regulamento especial13, que foi editado em 08 de maio de 1854; 3. ‘Da Revalidação e Legitimação das Terras e modo prático de extremar o domínio público e particular’, estabelecendo a maneira de separar as terras públicas das terras privadas que contavam com título legítimo de aquisição de seu domínio, e criando os processos tendente a revalidar ou legitimar os terrenos particulares, concebidos como irregulares; 4. ‘Das Medições das Terras que se acharem no domínio particular por qualquer título legítimo’, mostrando a necessidade de medição dessas terras, para obter-se o título formal de possessão, sesmaria ou concessão; 5. ‘Da Venda das Terras Públicas’, propondo-se a vendagem das terras de domínio do Estado, depois de medidas e demarcadas, excetuando-se as reservas das para

13 “Diante dessa Lei inovadora, completada pelo seu Regulamento, aprimoraram-se as raízes da

formação do Direito Agrário Brasileiro, estruturando-se então num esquema legislativo tipicamente nosso [...]” (LARANJEIRA, 1981, p. 37).

(24)

certos fins; 6. ‘Das Terras Reservadas’, determinando-se reservada de terras devolutas para aldeamento dos silvícolas, com sua absorção pela cultura da raça branca; também para utilização das matas, visando à construção naval; para assento de estabelecimentos públicos, fundação de povoações, abertura de estradas e outras servidões; 7. ‘Das Terras Devolutas situadas nos limites do Império com países estrangeiros’, isto é, sua destinação à feitura de colônias militares e civis, nas faixas de fronteira; 8. ‘Da Conservação das Terras Devolutas e Alheias’, constituindo providências contra os que se apossassem dessas terras ou nelas praticassem dano, com a derrubada de madeiras e provocação de incêndio; 9. ‘Do Registro das Terras Possuídas’, estatuindo os critérios para o registro de terras nas Freguesias’.

Ao longo dos anos coloniais e imperiais, nesse tocante, a legislação agrarista e ambiental brasileira restaram, indubitavelmente, como fator enriquecedor do agrarismo brasileiro. Sua construção fora marcada por diversos marcos históricos, como a colonização do Brasil (bem analisada pelos primeiros ordenamentos da Coroa Portuguesa, que, em concordância com o demonstrado alhures, tinham como objeto a povoação das terras brasileiras, a fim de evitar que outros Reinos as tomassem14), a exploração das riquezas naturais brasileiras (de acordo com o que se extrai dos contratos de arrendamento firmados entre a Coroa e os seus Capitães Hereditários, vide exemplo de Fernando de Noronha) e, finalmente, proteção – mesmo que sob interesses meramente econômicos e mercantis – da mata nativa (consoante se extrai do Regimento Pau-Brasil que proibiu o corte sem a autorização do Reino do Pau-Brasil, sob pena de morte daquele que cortou e daquele que mandou cortar e sob pena de perda de suas terras daquele que mandou cortar).

Além da legislação destacada neste primeiro subitem deste primeiro capítulo deste trabalho monográfico, fora editado, desde o simbólico ano de 1.500 até a atualidade, conforme destaca Raymundo Laranjeira (1981), um incontável número de ditames legais sobre o meio rural, seja delimitando o tamanho das propriedades rústicas, seja regulamentando o que poderia ou não ser cultivado em cada propriedade, dentre outras tantas regulamentações.

14 Nesse sentido, destaca Raymundo Laranjeira (1981, p. 19) que “descobrindo o nosso território em

1500, Portugal pouco ou nada fez nos trinta anos seguintes para desenvolvê-lo. Somente quando percebeu que seu mundo das Américas era alvo da cobiça de outras nações, foi que se dispôs à tentativa de colonizar o país. Mas nesta ideia de colonização não se entranharia apenas o intuito de conter as investidas estrangerias, através de um maior número de colonos portugueses, que estivessem prontos para a defesa territorial. Nela se incrustaria, também, uma vontade mais efetiva da Coroa em servir-se do solo, para usufruir melhores dádivas econômicas, já que a atividade extrativista do pau-brasil não era estimulante e se frustrara a expectativa de se achar metais na costa brasileira”.

(25)

Não obstante toda a normatização já destacada neste trabalho monográfico, insta, ainda que se investigue os textos constitucionais que, ao longo da história brasileira, coloriram tanto a proteção ao ambiente quanto o uso das terras no Brasil. Antes de adentrar a sua análise, no entanto, faz-se mister que se construa uma tabela, tornando mais lúcido, cristalino e didático o estudo das legislações já apresentadas.

Tabela 1 - Legislação Agrária e Ambiental no Brasil

ANO DATA LEGISLAÇÃO TEOR

1501 - -

Concessão exclusiva para exploração do pau-brasil a um consórcio luso-italiano cujo principal sócio era Fernando de Noronha

1512 - Ordenações

Manuelinas Criação da primeira empresa colonizadora do Brasil 1516 - Alvará de 1516 Deu às pessoas interessadas em povoar o Brasil todos

os implementos necessários

1530 20/12/1530 Carta Régia Autorizou Martim Afonso de Souza a tomar posse das terras brasileiras

1532 20/02/1532 Carta Regia Incentivou a migração de colonizadores ao Brasil

1534 - Carta de Doação e Foral

Enquanto as cartas de doação eram documentos que concediam o uso das terras aos donatários (como hoje ocorre entre Arrendadantes e Arrendatários), os documentos forais eram legislações que regulamentavam tal ato, bem como a maneira como deveria ser usada a terra.

1548 17/12/1548 Regimento Tomé de Souza/ Regimento dos Povoadores

Estimulou as tendências latifundiárias do sistema sesmarial, recomendando a doação de terras para fins de criação de engenhos

1551 21/07/1551 Alvará de 21 de julho

Excluiu-se do pagamento do dízimo aqueles que construíssem e reformassem engenhos de cana de açúcar

1590 08/12/1590 Alvará de 08 de dezembro

Estimulou a migração de pessoas interessadas em formar lavouras no Brasil

1605 12/12/1605 Regimento Pau-Brasil

Proibiu-se o corte do pau-brasil – produto pertencente à Coroa

(Continua) (Conclusão)

ANO DATA LEGISLAÇÃO TEOR

1680 01/01/1680 Alvará de 1º de abril

Reconheceu-se o direito dos Índios à propriedade das terras

1682 16/03/1682 Carta Régia

Determinou-se que se tomassem as terras de quem não se encontrava satisfazendo as obrigações impostas pelo regime sesmarial

1695 27/12/1695 Carta Regia Fixou em 05 (cinco) léguas o limite máximo das porções de sesmarias

1697 07/12/1697 Carta Regia Reduziu para 03 (três) léguas o limite máximo das porções de sesmarias

1701 27/02/1701 Alvará de 27 de

fevereiro Ensejou a diversificação de culturas

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fundo de 10 (dez) léguas da costa

1753 20/10/1753 - Requisitou demarcação das terras para que fossem concedidas em sesmarias

1769 18/08/1769 Lei da Boa Razão

Regulamentou a aquisição de terras devolutas por ocupação

1770 03/03/1770 Alvará de 03 de março

Instituiu outros trâmites administrativos para o processo de concessão de sesmarias

1785 05/01/1785 Alvará de 05 de janeiro

Declarou ser o cultivo a condição essencialíssima para a concessão de sesmarias

1822 17/07/1822

Resolução do Príncipe Regente

Extinguiu o sistema sesmarialista

1823 22/10/1823

Provisão da Mesa do Desembargo

do Paço

Proibiu a concessão de sesmarias até que a Assembleia Geral Constituinte a regulamentasse

1850 18/08/1850

Lei de Terras do Império – Lei nº 601/1850

Criou o instituto de concessão de terras devolutas e reconheceu como propriedade todas as sesmarias que confirmassem sua produção

1903 06/01/1903 Decreto nº 979 Tratou sobre a proteção do salário dos trabalhadores agrícolas.

1907 27/03/1907 Decreto nº 6.437

Tratou sobre a proteção do salário dos trabalhadores agrícolas.

1916

Primeiro Código Civil

brasileiro

Tratou com especificidade dos contratos de arrendamento rural (art. nº 1.211 e art. nº 1.215) e de parceria rural (art. nº 1.410 e art. nº 1.423).

1989 22/02/1989 Lei nº 7.735/89 Criou-se o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA

Fonte: Do autor (2018).

Conforme demonstrado, a primeira legislação que passou a tratar com maior proximidade sobre os contratos agrários foi o Código Civil de 1916 – primeiro CC brasileiro –, em seus artigos nº 1.211, nº 1.215, nº 1.410 e nº 1.423.

Com relação aos contratos agrários, mais especificamente ao Contrato de Arrendamento Rural, o Código Civil de 1916 apresentava princípios gerais marcadamente oriundos da autonomia da vontade – Pacta sunt servanda. Tal entendimento resultava no tratamento igualitário entre as partes contratantes, fazendo o seu texto criar obrigações entre ambos, sem autorizar que o Estado interferisse nas avenças.

Ademais, em seus dispositivos legais, o Código Civil de 1916 se revelou extremamente atencioso ao que ora era pactuado pelas Partes Contratantes. Por outro lado, conforme se demonstrará em capítulo futuro, a atual legislação que regulamenta o uso da terra e os contratos agrários brasileiros assim não se apresenta – impondo normas cogentes que interferem tanto nas relações do homem com a terra quanto nas relações privadas e patrimoniais entre os contratantes.

(27)

Há de se ressaltar, ainda, conforme destaca Raymundo Laranjeira (1981, p. 42-43):

Conquanto se observe o Diploma Civilista como fonte de Direito Agrário, nele encontramos, naturalmente, só o enfoque sobre relações privadas na matéria rural. E o que nele se insere como conotação agrarista pode ser sintetizado nos seguintes itens:

a) critério de divisão entre os bens públicos e particulares; [...]

b) regramentos a respeito da posse e do regime de propriedade [...]

c) normas sobre espécies de direitos reais, incidentes no meio rurígena, como enfiteuse, servidões, usufruto, rendas constituídas sobre imóveis, penhor, anticrese, etc.

A redação do Código Civil, portanto, se apresentava importante, à época, uma vez haver dado relevância jurídica às questões rurais, mas se mostrava insuficiente, por outro lado, já que não abordava a integralidade dos interesses agrícolas. Deu-se, assim, a criação de um projeto de elaboração do primeiro Código Rural15 brasileiro, que mais tarde, inspirou à criação da legislação que, hoje, rege o uso do solo do Brasil.

Passada a investigação de toda a legislação esparsa que criou a cultura agrícola brasileira, importante que se estude, ainda, antes de analisar as questões pertinentes ao problema de pesquisa que se almeja responder, explorar os textos constitucionais que fundaram o pensamento rural da atualidade.

No que se refere aos textos constitucionais e suas relevâncias à cultura agraria brasiliana, é importante que se verifique a historicidade dos textos constitucionais brasileiros no que tange ao uso da terra e aos contratos agrários. As normas constitucionais, nesse sentido, desde a primeira constituição do Brasil se apresentam como norteadoras sobre a maneira como se utilizam as terras brasileiras – conforme se demonstrará.

Ao longo da história do Brasil, 09 (nove) foram as Constituições (outorgadas e promulgadas – inclui-se, aqui, a constituição luso-brasileira, apesar de não ser uma carta magna exclusivamente do Brasil) que regulamentaram a estrutura do estado. Extrai-se das mesmas, nesse sentido, a preocupação ambiental e agraria que, em muitos textos constitucionais, acompanhou o Legislador ao editá-las.

15

[...] ainda que elaborado a nível de alcance restrito, só para o Rio Grande do Sul, tal projeto já evidenciava o empenho de juristas patrícios na tentativa de destacar uma nova especialidade jurídica, face à inegável singularidade da matéria agrária e porque o Direito Civil era insuscetível de abarcar, a contento, as situações vigentes no meio rurígena brasileiro (LARANJEIRA, 1981, p. 42).

(28)

Nesse tocante, em que pese a primeira16 de nossas constituições17 pouco tratar sobre assuntos rurígenas, a mesma trouxe aspirações inovadoras ao viés agrarista da legislação brasileira. Enquanto estabeleceu que se criasse uma legislação civilista – o Código Civil de 1916 –, determinou que se garantisse o direito de propriedade e a viabilidade de cessão desta para o uso público mediante indenização.

No que se refere às questões ambientais, no entanto, ensinam Albenir Itaboraí Querubini Gonçalves e Cassiano Portella Ceresér (2013, p. 112-113) que:

A Constituição Imperial de 1824 não trazia em seu corpo qualquer disposição acerca da questão ambiental. No entanto, ao referir-se as Câmaras Municipais, dispunha que a estas cabiam as atribuições que naquele período corresponderiam a matéria ambiental. Essas atribuições eram extremamente amplas, uma vez que diziam respeito a competências sobre feiras, abatedouros de gado, limpeza, saúde, entre outras mais. Deste modo, o meio ambiente era tutelado pela competência legislativa das Câmaras Municipais.

A segunda de nossas constituições, datada de 1891, transferiu às Províncias as terras devolutas contidas em suas áreas, bem como apresentou a previsão legal para a desapropriação por necessidade pública mediante indenização prévia – algo similar ao que acontece hoje e é regulado pelo Direito Administrativo.

A Constituição de 1934 [...] estabeleceu um grande marco: conferiu competência privativa à União para “legislar sobre normas fundamentais de Direito Rural, bens de domínio federal... águas... florestas, caça e pesca e sua exploração... incorporação dos silvícolas à comunidade nacional” (art. 5.º, XIX, letras c, j, m), fixando ainda a competência concorrente da União

16

O referido texto constitucional é datado em 1824. Em um estudo de Direito comparado, no ano de 1804, com inspirações romanísticas, na França, o Código de Napoleão “rompeu com o modo definitivo com o passado feudal, de modo consagrar a propriedade privada e o princípio da autonomia da vontade dos contratos” (GRASSI NETO, 2013, p. 37). Assim, na França, naquela época, passou-se a respeitar a pacta sunt passou-servanda – o que veio a ocorrer, no Brasil, com o Código Civil de 1922. Nesse sentido, ainda, destaca Roberto Grassi Neto (2013, p. 37) que “com efeito, foram essas as diretrizes seguidas de modo geral pelos legisladores das codificações surgidas ao longo do século XIX e no início do século XX. Comparada ao direito à propriedade em si, a produção agrícola desenvolvida no imóvel assumia relevância meramente secundária, sendo que eventual cessão do uso e gozo da terra dava-se sempre independentemente de comprometimento do seu direito real. Nessa época, com efeito, os contratos de exploração temporário da terra, como a locação e a parceria, são caracterizados principalmente pela proteção ao princípio da autonomia da vontade do proprietário, à qual ficavam sujeitos os direitos do locatário, e pela falta de dispositivos incentivando o incremento à produção, preocupação que surgiria apenas posteriormente, com o reconhecimento de que terra deve desempenhar a função social de abastecimento do mercado”.

17

Em que pese a primeira Constituição a tecer linhas sobre o estado brasileiro ser datada de 1822, conforme tratava-se de uma constituição Luso-brasileira, neste trabalho acadêmico, não será reconhecida como a primeira constituição brasileira. Reconhece-se, nesta monografia, como primeira constituição brasileira aquela datada de 1824, por ser exclusivamente destinada ao território nacional.

(29)

com os Estados para fiscalização das leis sociais e promoção da colonização (art. 10, V e VI)

[...]

O Constituinte determinou ainda a redução de impostos incidentes no imóvel rural de até 50 hectares, com valor de 10 contos de réis (art. 126); trouxe a plano constitucional a usucapião, procurando propiciar terra própria a “todo brasileiro que, não sendo proprietário rural ou urbano, ocupar por dez anos contínuos, sem oposição ou reconhecimento de domínio alheio, um trecho de terra de até 10 hectares, tornando-o produtivo por seu trabalho, e sendo nele sua morada habitual...” (art. 125), e estimulou, também, de preservar que, “dentro de uma faixa de cem quilômetros, ao longo das fronteiras, nenhuma concessão de terras ou vias de comunicação e abertura destas se efetuarão sem audiência do Conselho Superior de Segurança, estabelecendo este o predomínio de capital e trabalhadores nacionais e determinando as ligações interiores necessárias à defesa de zonas servidas pelas estradas de penetração” (art. 166) (LARANJEIRA, 1981, p. 102).

Oportuno destacar, ainda, que, no que se refere às questões ambientais, em concordância com o que se extrai da obra de Gonçalves e Ceresér (2013), a Constituição Federal de 1891, primeira do então período Republicano, apresentou algumas tentativas de proteção ao meio ambiente. Foram, no entanto, todas inócuas, uma vez que a ideia de proteção ao meio ambiente e aos recursos naturais ainda era incipiente, tanto no cenário nacional quanto no cenário internacional.

Em 193418, o Constituinte não apresentou a mesma preocupação com o agroambiental visto na sua carta pretérita. Desta vez – malgrado ainda restassem como previsão de competência legislativa da União –, apresentou-se ausente o texto constitucional que tratasse das águas, da floresta, da caça, da exploração agropecuária, etc.

18 Ainda, sob a ótica do Direito Comparado, salienta Grassi Neto (2013, p. 37) que “guarda, por igual,

especial interesse o estudo da legislação e da doutrina italianas mais recentes, por meio das quais foram introduzidos e desenvolvidos os conceitos de atividade agrária e de empresa agrária. A evolução, com efeito, é facilmente perceptível mediante simples comparação entre os modelos legais de 1865 e aquele de 1942. O primeiro texto cuida dos contratos agrários ainda se baseando nas concepções do Código francês e dando especial ênfase ao direito de propriedade; o último vale-se noção de função social da propriedade e introduz a ideia de empresa agrária, resultante da fusão dos conceitos de empresa e de atividade agrária”. Segue dizendo que “com o Codice Civile de 1942, a Itália abandona o modelo legislativo segundo o qual a produção agrícola era praticamente colocada em segundo plano diante da excessiva preocupação com a tutela da liberdade contratual e da propriedade privada, e passa a adotar a ideia diametralmente oposta, no sentido de que o direito a esta última deveria ser condicionado ao cumprimento de uma função social. A terra tornou-se mero instrumento de uma empresa com contornos especiais, a empresa agrária, cujo objetivo principal é a produção. Conquanto naquele momento não tenha ocorrido mudança de maior monta no rol dos contratos agrários, estruturados em iaffitto, mezzadria, colinia parziaria e soccida, houve sensível alteração de enfoque, na medida em que todas as formas típicas passaram a ser atreladas à aludida noção de empresa”.

(30)

Quanto à Constituição seguinte, de 194619, na matéria de influência no meio agrário, ela reeditou alguns preceitos progressistas da Carta de 34, evoluindo por adaptar-se e adaptar novos princípios no tempo de restabelecimento da democracia no país, muito embora extirpasse um ou outro dispositivo do diploma de 37, com pronto interesse nacionalista, como o art. 144, e não repisasse a regra daqueloutra Constituição, programadora das normas básicas de Direito Agrário

[...]

Com o advento de nossa Quinta República, inaugurada em 1964, a matéria constitucional agrária foi alvo de estimativas relevantes, através da Emenda n. 10, à Constituição de 194620. Nos parágrafos do art. 156 [...], houve alterações e adição: o primeiro passando a aumentar a área de aquisição de terras pelos posseiros para cem hectares; o segundo diminuindo o limite máximo de alienação de terras públicas, ou sua concessão, para três mil hectares e o terceiro mudando levemente de redação, sendo acrescido de uma outra parte, nos seguintes termos: “A área, nunca excedente de cem hectares, deverá ser caracterizada como suficiente para assegurar, ao lavrador e sua família, condições de subsistência e progresso social e econômico, nas dimensões fixadas pela lei, segundo os sistemas agrícolas regionais (LARANJEIRA, 1981, p. 103-104).

Foi a partir da década de 1970, conforme destacam Gonçalves e Ceresér (2013) que, mui em decorrência de uma maior cultura consciente sobre as questões ambientais, editaram-se leis e se criaram instituições para participar mais efetivamente da proteção dos recursos naturais. As questões ambientais, que, outrora não detinham grande relevância aos olhos populares, passaram a ser percebidas por todos, ao redor do globo, gerando, assim, maior pressão popular aos Estados Nações para que respeitassem o meio ambiente.

Já a atual Carta Constitucional, outorgada em 1988, é tida como a mais completa Carta Política no que tange aos Direitos Rurais e Ambientais. No que tange aos Direitos Agrários, a CRFB de 1988 trata da pequena propriedade como um direito fundamental, das terras da União, dos Estados, dos Municípios e dos Particulares, das políticas agrícola e fundiária, do Imposto Territorial Rural, da Justiça Agrária dentre outros incontáveis temas atinentes ao Direito Agrário – e, por ricochete, aos Contratos Agrários. No que tange aos Direitos Ambientais, a Carta de 88 destacou um de seus capítulos ao Meio Ambiente, sendo extremamente

19

Na época do pós-guerra, a partir de 1945, a legislação agrária também veio a surgir alterações no cenário internacional. Em uma análise de Direito Comparado, destaca Roberto Grassi Neto (2013, p. 38) que “ressalta-se que as reformas legislativas na Europa do pós-guerra, buscando simultaneamente a modernidade e a simplificação, acabaram sendo sentidas também no âmbito dos contratos agrários, especialmente na França e na Itália, na medida em que estes países adotaram denominada conversão compulsória de todos os contratos associativos em arrendamento”.

20 “Temos que a nossa Primeira República abrange o período da data de sua proclamação, em 1889,

até a da Revolução de 1930; a Segunda, que principia daí e termina com o advento do Estado Novo, em 1937; a Terceira, que toma esse tempo até a queda de Getúlio Vargas, em 1945; a Quarta, que abarca a faixa de 1945 a 1964 e a Quinta República, que foi instituída em abril de 1964” (LARANJEIRA, 1981, p. 105).

(31)

inovadora, ao determinar que a competência para legislar sobre as questões ambientais passaria a ser exclusivamente da União.

A criação da cultura jurídico-legislativa agrarista que se apresenta hoje, no Brasil, é, portanto, oriunda de uma vasta gama de legislações infraconstitucionais e constitucionais que lapidaram a ideia agropecuária brasileira. Se, atualmente, a nossa CF de 88 apresenta um viés altamente ambientalista, isso se dá graças ao desenvolvimento histórico da legislação construído desde os tempos coloniais.

A questão ambiental, atualmente, tem se revelado indispensável ao desenvolvimento sadio do país. Dentro desse contexto, tanto as autoridades do Estado quanto os Cidadãos e o povo possuem papéis indiscutíveis para o bom desenvolvimento de uma cultura consciente sobre o uso da terra de maneira a preservar o meio ambiente (GONÇALVES; CERESÉR, 2013).

No entanto, conforme se demonstrará no próximo subitem e no próximo capítulo, atualmente, a legislação agrária brasileira tem ultrapassado o viés plenamente ambientalista e tem invadido a esfera privada daqueles que usam da terra. Nos Contratos Agrários, por exemplo, há normas cogentes que tratam de questões contratuais puramente patrimoniais, sendo de ordem pública dita a sua natureza ambientalista.

Com a finalidade de abordar com maior precisão as cláusulas contratuais dos Contratos Agrários de Arrendamento – mais precisamente, conforme se fará no segundo capítulo deste trabalho monográfico, a cláusula contratual que pactua o preço das referidas contratações – passa-se a estudar a atual conjuntura dos Contratos Agrários nominados brasileiros

2.2 APRESENTAÇÃO DOS CONTRATOS AGRÁRIOS TÍPICOS E SUAS NORMAS COGENTES

Antes de adentrar ao thema deste capítulo, importante que se saliente que, em paralelo aos tipos contratuais, há as categorias contratuais. Estas se tratam de categorias exclusivamente científicas dadas como meio de simplificação para a precisão das dimensões daquele contrato.

(32)

Nas palavras de Cristiano Chaves de Farias21 e de Nelson Rosenvad22 (2016, p. 272):

A classificação permite uma “arrumação exaustiva da realidade”, afinal as classes de contratos resultam de repartições feitas com base em critérios que têm a ver com a ocorrência ou a verificação de certas qualidades. A recondução de contrato a esta ou àquela classe não significa mais do que a sua repartição do que o seu agrupamento, consoante tenha esta ou aquela característica.

As categorias contratuais, assim sendo, são delimitadas de acordo com critérios simples de classificação – tais como: contratos sinalagmáticos23 ou unilaterais; contratos reais ou consensuais24; contratos gratuitos ou onerosos25;

21

Cristiano Chaves de Farias é Promotor de Justiça no Ministério Público do Estado da Bahia. Sua obram em coautoria com Nelson Rosenvald, representa os novos civilistas brasileiros. O livro citado é a 16ª edição da obra, sendo publicado em 2016, quando o Brasil já não atravessava grandes confrontos agrários.

22

Nelson Rosenvald é Procurador de Justiça no Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Sua obram em coautoria com Nelson Rosenvald, representa os novos civilistas brasileiros. O livro citado é a 16ª edição da obra, sendo publicado em 2016, quando o Brasil já não atravessava grandes confrontos agrários.

23 Os negócios jurídicos bilaterais – também conhecidos como negócio jurídicos sinalagmáticos – são

aqueles resultantes da entrada no mundo jurídico da vontade de mais de um figurante. Em outras palavras, os negócios jurídicos sinalagmáticos são aqueles em que há uma bilateralidade de obrigações, sendo uma obrigação causa da outra. Aqueles que se interessarem no thema podem buscar mais informações em Farias e Rosenvald (2016).

24

A classificação diz respeito à constituição do contrato. Os consensuais são aqueles que o acordo de vontade pactuado entre os Contratantes é suficiente para o seu aperfeiçoamento. De outro lado, o contrato real é aquele que não basta o solo consensu, sendo necessária a tradição do objeto para a efetivação do negócio jurídico pactuado entre as Partes. Aqueles que se interessarem no thema podem buscar mais informações em Caio Mário da Silva Pereira (2017).

25

Os contratratos comutativos e aleatórios divergem na expectativa sobre o resultado útil do mesmo. Conforme destaca Paulo Nader (2016), “[...] nos contratos aleatórios, as partes não têm conhecimento prévio dos resultados patrimoniais da relação jurídica estabelecida. Já nos comutativos, tem-se a definição no momento da celebração do ato negocial”. Aqueles que se interessarem no thema podem buscar mais informações em Nader (2016).

Referências

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