CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO E M DIREITO
" A INTERPRETAÇÃO DO DIREITO "
D isse rta ça o subm etida a U niversidade Fe deral de Santa C a ta rin a p a ra obtenção do grau de M estre em C iências H um anas - E specialidade D ireito.
Henny M ary H ildebrand da Silva Gouvea
w m / A
E s ta d isse rta ç a o foi julgada p a ra obtenção do titulo de M estre em Cien - cias H um anas - E specialidade Direito e aprovada em sua f o r m a final pelo P r o g r a m a de P os-G raduaçao.
/ a< Coordenador do C urso de P o s-G ra d u aç a o
AGRADECIMENTOS
A autora e x p re s s a seu profundo agradecim ento /
aos P r o f e s s o r e s do Curso de P o s - G raduaçao em D ireito - Doutor es L uiz X
F ernando Coelho, Luiz A lberto W arat, A ri K ardec de Melo, Clovis de Soii to G oulart, Osni de M edeiros Regis, Osvaldo F e r r e i r a de Melo, Paulo Heii rique B lasi e R o sa M aria C ardoso da Cunha - cujos ensinam entos, o rie n - taçao e im e n sa dedicaçao to r n a ra m possivel e sta d isse rta ç a o ; aos filhos ,
X
que durante o periodo de afastam ento p e rm a n e c e r a m estudiosos e c u m p ri d o res dos seus d e v eres, aos seus alu n o s, que tiv e ra m paciência e dedica_
~ ^ X
çao n a e s p e r a e m in istraçao das aulas em que e r a obrigatorio o afastam en to; a seus pais que a h o sp ed aram , a seu m arido p ela ajuda p re s ta d a nos
S ~ --- /
m om entos de dificuldade, a A ssociaçao de A m igos da FURB, pelo a u x i lio financeiro concedido, e, finalm ente, a A rlete Popenga R am os que pa cientem ente datilografou os o rig in a is.
RESUMO
O objetivo deste trabalho e um estudo descritivo e re tro s p e c ti vo do p ro b le m a da i n t e r p r etaçao do D ireito.
T r a ta - s e de um velho, e nao obstante, se m p re novo p ro b lem a . ✓
E daqueles que sem p re sed u z iram os ju ris ta s .
No entanto, a lite r a tu r a e sp ecializad a nao contem ainda o b ra s que p o ssa m ser co n sid erad as como aptas a u ltr a p a s s a r o tem a, o qual
o-✓
ferec e s e m p re novos aspectos, despontam novas c o n tro v é rsia s, pois a e- voluçao do Direito, a autonom ia adquirida pelas disciplinas ju rid ic a s,
exi-w / a, ^
gem p e rm an e n te rev isã o da m a téria, que nao tem apenas in te re s s e acade-✓
mico, m as que se re v e s te da m ais am pla utilidade p ra tic a na in te rp r e ta
-~ ~ ~ X
çao, aplicaçao e integração das r e g r a s ju rid icas.
A ssim sendo, na p rese n te d isse rta ç a o a autora p ro c u r a apre
-a o / /
sentar u m a visao re tro s p e c tiv a do qu£ ja se a firm a v a como c a r a c te r is tic o
/ w /
do D ireito Romano em m a té r ia de interp r etaçao juridica. ✓
Apos sintetizar o que se evidenciou como de esp ecial in te re s se
X A /
no tocante aos m étodos e escolas de h e rm e n e u tica juridica, p r o c u r a - s e en fatizar o desenvolvim ento de um pensam ento la tin o am e ric a n o e b r a s i l e i
-✓
ro sobrê a m a téria , sem p re ten d e r a c r e s c e n ta r algo de novo, salvo a es - p ectativa de que as p e sso a s que lidam com o D ireito, em especial, aque las investidas de funções jurisdicionais, ao in te rp re ta r os textos normati-^ vos, se le m b r a s s e m que o D ireito e u m a fo rç a viva, e u m a luta constante,
\
e u m a realid ad e concreta, e que a le tr a da lei, m uitas vezes, e sta divor - ciada d e ssa realidade, to rn an d o -a injusta e obsoleta. ' /
SUMMARY
The aim this w ork is to p re se n t a d escriptive and retro sp ej: tive study of the law interp retatio n p ro b lem . It is an old and, n e v e rth e le s s , ever new p ro b lem which has always seduced the ju ris ts.
The specialized lite ra tu re , how ever, does not p o s se s s
w orks uet that can be considered capable of su rp a ssin g the them e which ever again offers new asp ec ts. New c o n tro v e rsie s a rise because the law evolution the autonom y conquered by legal disciplines, re q u ire constant rev iew of the
subject not only concerned to academ ic life, but have also p ra c tic a l utility in interpreting, applying, and integrating the juridical ru le s.
So, in the p re s e n t d issertatio n , the author t r i e s to p re s e n t a re tro sp e c tio n of what has been claim ed as c h a ra c te ris tic of Rom an Law,
concerning legal interpretation.
After su m m ariz in g w hatever was specially re la te d to the methods and approaches of legal h e rm en eu tics, we seek to em p h asize the development of the L a tin -A m e rica n and B razilian thought about the subject, not intending to add anything new but the hope that those people who deal with Law, p a rtic u la rly those in charge of jurisdictional functions, when in te rp re tin g the p receptive texts, r e m e m b e r that Law is a living pow er, is a constant struggle, is a concrete reality , and that the d e c re e s text is often divorced fro m this reality, making the Law iniquitous and obsolete.
SUMARIO
P ag .
I n tr o d u ç ã o ... 1
CAPITULO I Interp retação no D ireito R o m a n o ... 6
2. 1. Opinião de S a v ig n y ... . . ... 7 2 .2 . Opinião de I h e r i n g ... 11 2 .3 . Opinião de B o n fa n te ... 14 2 .4 . C o n sid eraço es C r i t i c a s ... 18 2.4 . 1. As leis d e f e it u o s a s ... . ... 20 2. 4. 2. As a n ti n o m ia s ... .. 29 2 .4 .3 . L acunas e~ a n a l o g ia ... 37 CAPÍTULO II ^ / S istem as e E sco la s de Interpretação Ju ríd ica . . . ... 51
1. O s is te m a tradicional ...51 2. A e sco la h i s t ó r i c a ...54 3. O s is te m a teleologico ...56 4. O positivism o juridico ...60 ✓ . 4 .1 . O positivism o p s ic o lo g ic o ...• • • • ...61 4 .2 . O positivism o s o c io lo g ic o ... 63 4. 2. 1. A te o ria de G e n y ... 63 4. 2. 2. A te o ria de H e c k ...66
4 .2 .3 . A te o ria de E h erlich e K a n ta r o w itz ... 67
/ 4 .3 ...O positivism o l o g i c o ... .. 70
5. C onsider açoes C r i t i c a s ... 73
CAPITULO III A Interp retaçao ná A m e ric a L a t i n a ... ... 88
2. C arlo s C o s s i o ... .. 96 3. R oberto Jose V e rn e n g o ... 102 4. L uis A lberto W a r a t ... ...106 5. C o n sid e ra ço es C r i t i c a s ... 113 CAPITULO IV A liiterprétaçao no B rasil ...117 1. Miguel R e a l e ... 123 2. T er cio Sampaio F e r r a z J r ... 128 3. Luiz F ernando C o e lh o ... 136 M S . . . 4. C o n sid eraç o es C ritic a s ... 141
Conclü s ao ... ...144
A lei, destinada a fixar u m a re laç a o de direito, e x p r e s s a sem p re um pensam ento sim p les ou complexo que poe esta relaçao de direito ,
ao abrigo do e rro ou da a rb itra rie d a d e .
/ X X X
P o re m , p a r a que se consiga tal resultado na p ra tic a, e n e c e s s á rio que X
seu espirito seja inteiram en te percebido em toda a sua p u re z a por aque les a que se r e f e r e , os quais devem c o lo c a r-s e no ponto de v ista do le g is lador, re p ro d u z ir artificialm ente suas o p e ra çõ e s e reco m p o r a lei em
sua inteligencia.
Tal procedim ento da in te r p r etaçao pode, portanto, se r d e fin i do como a rec o n stru ç ã o do pensam ento contido na lei.
A interp r etaçao da lei em nada difere da in terp retaçã o de
qual-X X
quer outro pensam ento ex p resso pela linguagem , p o re m , re v e la um c a r a -X
ter p a rtic u la r e proprio quando á decom pom os em suas p a rte s c o n stitu ti vas.
X
Quatro elem entos se distinguem nela: o g ram atical, o logico, o
X X
h isto rico e o sistem ático.
O elem ento gram atical tem por objeto as p a la v ra s de que o X
legislador se serv e p a r a nos com unicar seu pensam ento: e a linguagem da lei.
X ~
O elem ento logico tem por objeto a decom posição do p en sam en ~ X
to ou as re la ç õ e s lógicas que unem suas diferentes p a rte s . X
O elem ento historico tem por objeto, o estado do direito exis
-X x
tente sobre a m a téria , na epoca que a lei foi dada, d e te rm in a o modo de
m X
açao da lei e a m udança por ela introduzida, que e p re c isa m e n te o que o X
elemento h istorico deve e s c la r e c e r.
X X
O elemento sistem ático tem por objeto o laço intimo que une as instituições e r e g r a s do direito no sentido de u m a unidade.
E s s e s quatro elem entos sao im p o rtan tes na in te rp re ta ç a o e de vem ser levados em consid eração .
W X A.
O objeto da in te rp re taç a o e t i r a r de cada lei a m aior instrução
/ A x
possivel e, em consequencia, o resu ltado s e r a individual e fecundo.
O exito da in te rp retaç a o adm ite graus em relaç ão d ire ta ao ta- lento do in te rp re te e ainda do talento do leg islado r que, soberano n e sta m a téria , pode e x p rim ir e condensar em seu texto as ideias positiv as.
D este modo, a legislação e a in te rp retaça o e x e rc e m e n tre si influencias r e c ip ro c a s , p ro s p e ra m juntas e a su p erio rid ad e de cada u m a e p a r a a o utra, condição e garantia de desenvolvim ento.
O te m a da in terp retaç ao do D ireito e x erce u m a inegável a tr a - çao sobre ju r is ta s e filosofos do D ireito e ao e x am in a rm o s a l it e r a t u r a sc bre as te o ria s da in terp retaça o o b se rv a m o s um fato: por in te rp reta ç a o , ju
✓
r is ta s e filosofos do D ireito entendem coisas muito v a ria d a s. P a r a alguns autores o p ro b lem a da interp retaça o r a d i c a - s e no conhecim ento- da lei ou autentico conhecim ento do Direito: a ss im , in te rp re ta r s e r ia conhecer. En tao, os p ro b lem a s suscitados pela in terp retaç ao juridica, s e r ia m proble -
m as tipo epistem ologico ou logico.
P a r a o u tro s a u to res, que ren eg am o aspecto cognoscitivo, a questão resi- de num a eleição d e c isó ria dentro de um m a rco de v aloraçao.
In te rp re ta r s e r ia co m p reen d er c e rto s v a lo res , c erto s sentidos axiologico ou politicos que podem d a r- s e em d e term in a d as situações sociais e, com consequencia, adotar decisões fundando-se n e s s a s v a lo raç o e s. P a r a ou tro s au to res, ainda, os p ro b le m a s in te rp re ta tiv o s nao sao p ro b le m a s r e • lativos,' nem a objetividade do conhecim ento, nem a determ in açao de va - lo r e s . O p ro b lem a da interp retaça o judicial g ira ria, a ssim , ao re d o r da questão de r a c io n a liz a r - s e o exercicio de um poder autocratico. E p a ra outros, ainda, a in terp retaça o pode s e r v ista como um p rocedim ento m e diante o qual se tra n s m ite m e se e la b o ra m c e r ta s info rm aço es p orque,eir definitivo, toda i n t e r p r etaçao pode se r esquem atizada, considerando um certo ponto de p a rtid a em que algum a inform açao in g r e s s a no p ro c e sso , ou e forn ecid a ao orgao elaborador; um m ecan ism o cen tral de elaboraçao
ou de p ro c e ssa m e n to da inform açao re c e b id a e um produto re s u lta n te de_si se p ro c e ssa m e n to , que p a re c e como u m a decisão que o orgao in te rp re ta - tivo fo rm u la.
As m udanças econom icas e sociais sao o fundo e a ra z a o de
" * *
ser de toda a evolução juríd ica. O D ireito e feito p a r a tra d u z ir em dispc) siçoes positivas e im p e ra tiv as toda a evolução social. P o rtan to , o D ir e i to deve ser inte rp retad o no sentido das concepçoes sociais que ten d em a
se g en eraliz a r e a se im por.
E ste e o p ro b le m a que se nos ap re sen ta, exigindo u m a solução o que to rn a a questão re la tiv a a h e rm e n e u tic a de u m a im p o rtan c ia vital ,
~ *
em face da evolução social e juridica.
Na p re s e n ç a do direito codificado, su rg e m novos d ire ito s, no vos institutos. O desenvolvim ento t r a z consigo m utações nas i e l a ç o e s
ju-S A
rid ic a s, aguardando que o D ireito lhes de a sua sançao e a elas e sten d a a
A* / /
sua tutela. A r e n o v a ç a o to r n a - s e n e c e s s a r ia , p o re m , ela sendo feita serr
/ « /
metodo, c r ia u m a situaçao de desiquilibrio e d e sa rm o n ia en tre o D ireito S
legal e as idealidades ju rid ic a s da h o ra p re se n te .
T o rn a -se n e c e s s a r ia a r e f o rm a da leg islação , m as, enquanto nao se r e f o r m a a lei, a vida social continua a re a g ir sobre o direito . E c
*
juiz e sta colocado no meio do tum ulto.
✓ A. /
Ele, como in te rp re te e rev ela d o r do D ireito, nao poder a, coir
X / /
o auxilio de e stre ito s principios de logica, p r o c u ra r d e c ifra r qual foi, nc m om ento da elaboraçao da lei, a ideia do legislador, ja ag o ra div o rciad a da rea lid ad e . E ste e o p ro b le m a que n e c e ssita estudos e soluçoes. E, a s sim , tom a m o s como n o ssa a afirm açao de Rumph:
✓ ~
"E m D ireito, como no m ais, a ideia de evolução significa que
* S ~ ~
tudo e m ovim ento, m as que nos, em face d e ssa evolução, nao devem os a ; ✓
sum ir atitude p a ssiv a de e sp ectad o res, cuinprindo-nos, ao r e v e s , tom ar p a rte n e sse m ovim ento e nele co lab o rar, colocados no meio da v ida e
a-A /
le r ta s a todas as exigencias da p ra tica; profundam ente desconfiados de to das as soluçoes que o passado antecipadam ente p re te n d e s se im p o r - n o s " .
Na escolha do te m a " A Interp retaçao do D ireito ", os no sso s objetivos foram :
1. P o sicio n a r a im portancia das disciplinas T e o ria G eral do D ireito e H e rm eneu tica, nas faculdades de D ireito, disciplinas e sta s, p a r e c e -n o s , de im p o rtan c ia vital p a ra os futuros advogados, p ro f e s s o r e s e ou m a g istra d o s.
2. D eixar aos nossos m a g istra d o s u m a m ensagem :
A fe cega no poder das fo rm u las legais, nao pode s e r defendida por
nin-S
guem.
_ /
O sim p les so co rro da lei e s c r ita nao e bastante p a r a que o ju risconsulto p o s sa desem penhar a sua m issão , porquanto, cabe ao juiz relev an te funçao na revelaçao do D ireito, em consequencia do dever que lhe incum be de p re e n c h e r as lacunas da lei.
O m agistrado deve to m ar a lei tal qual se a p re s e n ta no texto ,
/ / /
examina-la: sem preconceito e in te rp r e ta - la de acordo com as ideias e as n e c e ssid a d e s da realidade atual. E, quando, em determ inado topico, v e ri ficar a sua caducidade ou ruina, deve por m aos a ob ra, calafetar os bura cos e ad aptar, da m elhor m a n e ira p ossivel, aos n o sso s tem pos, a velha construção.
O nosso proposito ao escolher este te m a p a r a d iss e rta ç a o de m e strad o , e bem modesto: consiste em r e v i s a r alguns p re s s u p o s to s da in te rp re ta ç a o , partindo dos rom ano s ate os au to res m a is m o d ern o s e as suas r e s p e c tiv a s escolas de in te rp retaça o .
Ele nos foi inspirado nas d iv e rsa s aulas do C urso de M estrado em D ireito, a cujos p ro fe ss o re s muito a g ra d e c e m o s.
w ^ /
A d isse rtaç a o e com posta de u m a introdução, u m a p a rte h isto-ric a , u m a p a rte refe re n te as escolas de mterpretaçaç» na A m e isto-ric a L atin a
\
e no B ra sil.
de Savigny, Von Ihering e Bonfante.
No Capitulo II, p ro c u ra m o s fa z e r um estudo, sem m a io re s p re ten sõ es, das d iv e rsa s escolas de in terp retaçao :
✓ / . X
a esco la dogm atica, a escola h istó rica, a esco la tèleologica, a e sc o la
so-✓ w /
ciologica, a esco la da liv re indagaçao cientifica, a,escol-a do D ireito liv re ou da liv re p esq u isa do Direito e de alguns au to res m a is re c e n te s.
X AM X
No Capitulo III, fazem o s um estudo da in te rp retaç ão na Ame - r i c a L atina, procurando endatizar o desenvolvim ento de seu pen sam en to.
X X V ~
O Capitulo IV e a p a rte re fe re n te a in terp r etaçao no B rasil.
X AM ✓ ^
O metodo que u sa m o s p a r a desenvolver a d isse rta ç a o e em fun çao de um estudo bibliográfico, que tem como objetivo obter info rm aço es do que existe, a fim de poder in te rp r e ta r o D ireito B ra sile iro .
Interp retaçao no D ireito Romano
P a r a os ro m a n o s a interp retaçao tinha por objetivo o rec o n h e -✓
cimento da lei em sua verdade. A ssim , a lei subm etida ao c rité rio da nos
A M /
sa inteligencia, tinha de a p a re c e r-n o s como v e rd a d e ira . E s ta o p e raçao e indispensável a toda aplicaçao da lei a vida r e a l e e p re c is a m e n te n este c a ra te r de n e ce ssid ad e constante que se funda a sua legitim idade.
A in terp retaç ao nao e sta r e s tr ita , como c re e m m uitos, ao caso acidental de obscuridade da lei, som ente que n este caso, possue- m ais im p o rta n c ia e m a io re s consequencias.
A necessid a d e d e ssa operaçao intelectual p e rm a n e c e a m e s m a , ✓
qualquer que seja a obscuridade da lei. A ssim e que os ro m a n o s estabele
/ m /
r a m o principio pelo qual, devido a n a tu re z a de suas funções, e sta o juiz se m p re obrigado a dar um sentido a lei m ais o b s c u ra e a decidir confor - me e ss e sentido, da m e s m a fo rm a que a m aior in c e rtez a que p o s sa m o- f e r e c e r os fatos de um p ro c esso , nao o disp en sa nunca de p ro n u n c ia r a
sentença.
A inte rp retaç ao e u m a a rte que se aprende pelo estudo dos grandes modelos, que a antiguidade e os tem pos m odernos o fe re c e m em
a-A X
bundancia, ao co ntrario do que sucede com a te o ria d e ssa a rte , que, por
A /
c ircu n stan c ia s acidentais, e sum am ente pobre.
Nao se ensina a arte da interp retaç ao , como nenhum a das a rte s , /
som ente por meio de r e g r a s ; p o rem , contemplando as o b ra s dos grandes m e s tr e s , penetrando no segredo de sua sup erio rid ad e, pondo em ativida - de as faculdades que re c la m a m a ciência e aprendendo a d irig ir p a r a bom
caminho os n o sso s e sfo rç o s.
2. 1. Opinião de Savigny
A in terp retaçao e u m a operaçao intelectual que tem por objeto o reconhecim ento da lei na sua verdade. A ssim , a lei su b m e tid aa o c ritério da n o s sa inteligencia, deve a p a re c e r- n o s como v e rd a d e ira .
Diz Savigny que os ro m a n o s reconhecendo a autoridade da inter pretaçao autentica e da in terp retaça o usual, nao e stab elec iam nenhum a r e
gra p a rtic u la r. ✓
P o r e m , se e x am in a rm o s o uso que os ro m a n o s faziam de suas r e g r a s , notam os que a p ra tic a nao estava sem p re de acordo com a te o ria . F req u en tem en te tra n sp a s sa v a m os lim ites da in te rp retaç a o v e rd a d e ira e entravam no dominio da form açao do direito, de modo que su^as i n t e r p r e tações extensivas, tir a d a s do motivo da lei, c o rrig ia m , nao a e x p re ssã o , m as sim a lei m e sm a , e constituíam v e rd a d e ira s inovaçoes. A ssim , tam
-X V
bem, aplicavam o principio de analogia a m ais de um "ius sin g u lare", o que se encontrava em oposição d ire ta com suas doutrinas.
E s ta contradiçao se explica pela posição dos antigos ju ris c o n sultos, que tinham em suas m aos o desenvolvim ento do direito de u m a m a n e ira m ais d ire ta que os jurisco n su lto s m odernos e por e sta ra z a o a pala v ra " in te rp r e ta c io " nao designa sim plesm ente a in te rp re taç a o p u ra , m as, sim , a trad iç ao , isto e, todas as fo rm a s do direito cientifico com a liberdade de açao e o grau de autonom ia que a ciência tinha na antiga Ro - ma.
C o m p re e n d e ra m os antigos ju risc o n su lto s, que suas funções nao estav am d e te rm in a d as muito cla ra m en te e que podiam u s u rp a r os di - reito s do p re to r ou do im p e ra d o r.
E s s e s jurisc o n su lto s tinham nao som ente m a is independencia , m as tam b em , m a io re s m eios de investigações que os jurisc o n su lto s m ais
m odernos.
Sob os im p e ra d o re s, as c o isas m u d a ra m e e sta m odificaçao ,
X X m
foi sobretudo, visivel a p a rtir dos m eados do seculo III da e r a c ris ta . O direito cesso u de d e se n v o lv e rse pelos editos dos m a g istra d o s e a posi
-m X
çao independente dos jurisco n su lto s to rn o u -se incom pativel com o aum en to da autoridade im p erial.
P o r outro lado, a ciência do D ireito depositada nos antigos ju risco n su lto s, quase nao tinha m ais r e p r e s e n ta n te s vivos. D este modo, a in te rp retaç ão veio a cair nas m aos dos juizes, com sua atividade lim ita
-~ X
da por p r e s c r iç õ e s inteiram en te novas e a r b i tr a r ia s , que , se em
Verda-X X
de, fo ra m com pletadas por Justiniano, ja e sta v am ha muito tem po e sta b j ✓
lecid a s. A ssim e que Constantino ordena: ’’inter aequitatem jusque in te r- p ositam in terp retatio n e m nobis solis et oportet et licit in sp ic e re ", quer dizer que quando o rig o r do direito tem n e cessid ad e de ser mitigado pela "aequitas", e sta in te r p r etaçao som ente p e rten c e ao im p e ra d o r. Aqui, e- videntem ente, nao se t r a ta de p u ra in te rp re ta ç ã o , m a s de u m a m
odifica-M 4 S
çao da lei, de u m a conquista da "aequitas" sobre o dominio do direito es-X M
crito, ate entao em vigor.
O direito que o p re to r e x e rc ia legalm ente por meio do seu e
-S ~
dito e que os jurisc o n su lto s se atribuiam , esta, desde entao, exclusiva - mente re s e rv a d o ao im p era d o r, m udança muito de acordo com a nova ' constituição do Estado.
Um decreto de Valentiniano e M arciano e stab elece que im p e ra
X «
dor explique e adoce o rig o r das leis, p o re m , e sse decreto nao atribue ao im p e ra d o r tal direito de m a n e ira exclusiva e sua red açao p a re c e
refe-N ~
r i r - s e som ente a benignidade da lei, o que constitue m a is u m a inovação r e a l do que u m a in te rp r e ta ç ao .
X ^
P o r ultim o, u m a constituição r e m e te ao im p e ra d o r todos os X ~
caso s em que o direito consuetudinario nao e stav a ainda bem estab elec i -do, p o re m o texto nao estabelece se se tr a ta de u m a in te rp reta ç a o funda da no costum e ou de um direito consuetudinario p ro p ria m e n te dito.
a/ x
As constituiçoes de Justiniano sao, sobre esta m a té ria , mui-to m ais d ire ta s e muimui-to m ais im p e ra tiv a s. A p r i m e i r a e do ano 529, pouco depois da prom ulgaçao do antigo Codigo e poucas p a la v ra s podem r e
-/
sum ir o seu pensam ento: "As antigas leis p roduzem a duvida sobre se a interp retaçao das leis que em anam do Im p erad o r tem fo rça o b rig ato ria .
/ / /*
E s ta duvida sofistica, in te iram en te ridicula, fica dissipada pela p re se n te constituição.
✓ ~
Tem fo rç a o b rig a to ria toda in te rp retaç ã o que em ane do Im p e ra d o r, seja por r e s c rip to , seja em um juizo ou seja sob qualquer o u tra fo rm a. Segun do a nova constituição do Im pério, som ente o Im perador faz as leis,
so-/ / / /
mente ele deve in te rp r e ta -la s . O Im p erad o r e o unico juiz e in te rp re te " . Dita constituição e n c e r r a dois dispositivos inteiram en te dis
-✓ ✓ N ~
tintos. O p rim e iro e a fo rç a o b rig a to ria atribuida as in te rp re ta ç õ e s im - p e ria is, qualquer que seja sua form a;
✓ — • . X
o segundo e a proibição de toda a in terp retação privada. E ste segundo e novo e o m ais im portante, no entanto, e o p rim e iro que exige algum as ex plicaçoes. Justiniano nao pretendia, evidentem ente, introduzir um d irei- to novo, m as som ente c o n firm a r e tir a r as duvidas do que se d e v eria com
✓ a»
p ree n d er por si m esm o: a ss im e que nao se fala dos efeitos da in te rp re - taçao im p e rial, a cujo resp e ito se r e m e te aos usos estabelecidos.
Em consequencia, a in te rp retaç ã o contida num edito e r a o b rig ato ria pa - r a todos, da m e s m a m a n e ira que às leis; a contida num decreto, se o jui- zo e r a definitivo, e r a igualm ente o b rig a to ria p a r a todos e aplicavel a to dos os c aso s sem elh an tes, como d isse o "p rin cip iu m " do texto; enfim, a
’ * ‘; • ✓
in te rp retaç ao contida num a sentença interlocutor ia ou em um r e s c rip to , que nao e r a publico, som ente tinha fo rç a de lei no negocio p a ra o qual ha via sido dada. A constituição de Justiniano nao atribue, de m a n e ira algu m a, fo rç a de lei aos r e s c rip to s in te rp retativ o s, como faz o "p rin cip iu m " com resp e ito aos d e creto s que contem sentenças definitivas.
A segunda p re s c riç ã o de Justiniano, re la tiv a a in te rp retaç a o , e n c o n tra -se na ata de prom ulgaçao do Digesto de 593, na lei 2 a ., § 21 , C. de vet ju re enucl. (I, 17); r e f e r e - s e a proibição de toda com posiçap
li-t e r a r i a e se com pleli-ta com e sli-te s li-te rm o s: " Os liv ro s e sobreli-tudo os com en ta rio s so b re as leis, estao proibidos Quando houver duvidas sobre o sen
X A V M
tido de u m a lei, os juizes devem su b m e te -la a decisão do Im p e ra d o r, que
X X X X X
e o unico leg islado r e o unico in te rp rete legitim o. E s ta s duas disposiçoes se e x p re ss a m tao secam ente que nao induzem a nenhum a o u tra in te rp re - -tação a não ser esta: a inte rp retaç ao das le is p e rte n c e exclusivam ente ao
Im p erad o r.
Como cónsequencia n a tu ra l tem o s a proibição da ciência da in
M X w A. x
te rp re ta ç a o p a r a o futuro. E verdade que a proibição nao e ra com pativel com a in terp retaç ao livre do luiz, p o re m Justiniano nao a entendia a ss im ,
M X M
pois sua segunda disposição im punha aos juizes a obrigaçao absoluta de X
r e c o r r e r ao Im perador se m p re que tiv e ss e m algum a duvida sobre o senti X
do da lei, e qui tam b em Justiniano estava de acordo consigo m esm o: todo o que e s tiv e r a em contato com o direito, p ro f e s s o r ou juiz, devia abdicar
• a N ~ a
da lib e rd a d e de sua inteligencia e l im i ta r - s e a o p eraçao m ecanica, pois as
m X
p r e s c riç õ e s do Im perador e ra m evidentem ente ditadas com o m esm o esjjí rito.
Um a vez fixado o sentido das p r e s c r i ç õ e s de Justiniano, r e s t a
w X
falar de sua aplicaçao re a l e de seus resu lta d o s p rá tic o s.
Toda inc erteza sobre o sentido de u m a lei e r a evidentem ente , diferida ao Im p erad o r, o qual reso lv ia , nao por in te rp reta ç a o autentica consignada num edito, m as por meio de r e e s c r it o s que som ente tinham
X
fo rç a o b rig a to ria no caso especial p a ra o qual haviam sido dados. E ste e_s tado de coisas p a re c e h a v e r -s e mantido co n stantem ente, porque oito anos depois da prom ulgaçao do Digesto, quando pela N ovela 113 se p ro ib ia os r e e s c r it o s privados, Justiniano d isse e x p re ss a m e n te que as consultas e o s r e e s c r it o s sobre a interp retaçao das leis co ntinuariam como a n te rio rm e n te.
Mais tarde, em 544, a Novela 125 proibiu as consultas, sem a ludir a r e s tr iç ã o da Novela 113, p o re m e sta r e s tr iç ã o subsistia, pois nao se pode c r e r que Justiniano depois de haver p ro s c rito solenem ente e em
d iv e rso s lu g a re s, a in terp retaç ão p rivada, a houvesse resta b e le c id o u m a ✓
m a n e ira ind ire ta e subreticia.
A Novela 125, sem duvida nenhum a t r a ta som ente das consul
-S m / A
tas que se su b traiam a jurisdição o rd in a ria p a r a su b m e te -la s ao I m p e r a dor, constituido, entao, como juiz.
\
-Se, sobre este ponto a legislação nao e duvidosa, sua aplicaçao o ferece, ao co n trario , tais dificuldades, o que teve como resu ltado m
ulti-m / /
plicar as dem andas de in te rp retaç a o , ate o ponto de to rn a r im p o ssiv el p a- r a o Im p e rad o r o despacho de todo outro negocio. P o re m , as p r e s c riç õ e s de Justiniano nao tiv e ra m e sse efeito, porque os juizes, a quem Ju stin ia-I no p roibia a in te rp retaç a o , tinham em seu abono, p a ra sair das dificulda des, a apatia e a a rb itra rie d a d e e nao solicitavam m ais do que as que ele
podia expedir, (l). - —
2. 2. Opinião de Ihering
P a r a Ihering, a antiga 11 Interpretatio " dos ro m a n o s nao
m /
e ra u m a si^çiples explicaçao da lei, m as, como o proprio nom e indica, * (in te rp re s : conciliador, negociador ), a conciliaçao do direito e scrito com as exigencias da vida.
Ele com preendia, pois, a p re p a ra ç ao do direito com a intenção de faze
-✓ ~ S • ~
lo v aler na justiça; as form u las do p ro c e sso , a sua adaptaçao as re la ç õ e s ju rid ic as; a confecção dos fo rm u lá rio s p a r a os c o ntratos; os atos judiciais;
/ S
as disposições de u ltim a vontade de qualquer especie; a d e sc o b e rta de'
ca-S S
m inhos e m eios p a ra to rn a r possivel, de um modo indireto, fins jurid icos cuja p e rse cu ç ã o d ire ta podia se r duvidosa.
P a r a o reconhecim ento do principio da autonom ia individual em suas t r e s aplicações capitais; de atos en tre vivos, disposiçoes de u ltim a vontade e a sso c ia ço es, a lei abriu de antem ao, vasto cam po ao liv re m ovi
/ / A
mento do c o m ercio juridico, e a ju risp ru d ê n c ia velou p a ra que e ss e m o v i mento nao se p e rd e s s e na inc erteza, m as que fosse mantido por vias segu
ras.
Com a in te rp retaç ao p ro p ria m e n te dita das disposiçoes da lei, a ju r is p ru
-' N ^
dencia satisfez as n e c essid a d es c re s c e n te s da vida e manteve a lei a altu - r a dos p ro g r e s s o s do tem po.
A ju risp ru d ê n cia, no direito antigo, longe de c o n sid era r que a sua m issão e r a s u b m e te r- s e serv ilm e n te aos te rm o s da lei, ju lg av a -se cha m ada p a ra com pletar o seu sentido, faz end o -a p ro g re d ir e dando-lhe maio r e s alcances. Sem falar da extensão, por analogia, das disposiçoes da lei
✓ /
ha um grande num ero de casos em que os ju risc o n su lto s intro d u ziram , con tra ria n d o os term os, da' l e i ,, novas disposiçoes ju rid ic as, que v ie ra m a .se r n e c e s s a r ia s com o d e c o rre r dos tem pos, afastando-se, p a r a isso, de
in te rp re ta ç õ e s tra d icio n a is, quando nao e ra m as m ais exatas.
E m sum a, a lei nao e ra le tr a m o rta a qual o p re se n te se ligava obstinadam ente em rec o rd a ç a o do p assad o . E r a u m a fo rç a viva que re g u la va seus p a sso s com os do tem po.
/ . /
Muitos séculos m ais ta rd e, quando Cicero tinha ante os olhos a
* ys. X
arv o re m a je sto sa que a ju risp ru d ê n c ia t i r a r a de um frag il ram o , podia
en-\ — — ■
t r e g a r s e a ilusão de que nao v ira jam ais sobre a t e r r a u m a o b ra tao per
-✓ ^
feita como a lei.d as XII Tabuas; e, no entanto, nao via tudo o que ela tinha chegado a se r, porque a sua o rig e m d e sa p a re c ia ante seus olhos.
O conhecim ento das leis, a a rte da interp r etaçao e as açoes das
X N /
le is, diz Pom ponius, e stav am , na epoca que se seguiu a Lei das XI Ta - buas, nas m aos dos Pontifices, designando-se todos os anos um m em bro de seu colégio p a r a a d m in istra r a justiç a. As leis e ra m a ce ssív e is a todos ,
/ / ’ v «
qporem os Pontífices tinham direito re se rv a d o a sua interp r etaçao.
A introdução da P r e t ó r i a assinalou o p rim e iro passo p a r a a t r a ’ tra n sfo rm a ç a o d esse estado de c o isa s. Pouco a pouco o poder do P r e to r foi crescen d o e os Pontifices se v ira m privados de toda a particip açao na ad- m in istra ça o da justiça.
E s ta tra n sfo rm a ç a o devia ter n e c e s sa ria m e n te influenciado no conhecim ento do desenvolvim ento do direito, nele introduzindo m odifica
-çoes. E s s e s conhecim entos estav am e stre g u e s nas m ao s dos Pontifices e
^ X X
entao se com eçou a dar aos p re to re s e sse conhecim ento, a tra v é s do cole-X gio pontificial. E r a o meio m ais eficaz e sim ples de se e n tr a r no Colégio Pontificial.
O Colégio Pontificial era, por a ssim d izer, a faculdade de D i reito em que o futuro ju ris ta fazia os seus estudos e onde colava g ra u .S o
-X
mente os "filii nobelium " tinham e n trad a no colégio, que r e c r u ta v a seus X
m em b ro s dentre os p a tric io s. No ano 425 A. C. , c r i a r a m - s e quatro novos
X X
lu g a res no Colégio dos Pontifices, concedendo-se aos plebeus o seu a c e s so. Com a e n trad a dos plebeus, a ju risp ru d ê n c ia tOTnou-se u m a a rte e u- m a ciência liv re s . Im ediatam ente c o m e ç a ra m a e n tra r em vigor as re s p o s
X
tas publicas.
Na antiga jurisp ru dên cia, a in te rp re ta ç a o das leis nao se e s c r a vizava ao texto legal. A pesar da obediencia aos textos, os ro m a n o s tinham
— X
o bom senso de nao sa c rific a r ao capricho do leg isla d o r, suas intim as con vicçoes sobre os in te re s se s da vida. A ju risp ru d ê n c ia nao se cingia a ex
-X A
plicar o conteúdo da lei, in te rp re ta v a -a segundo q u e ria faze-lo e, subm e - ten d o -se ap aren tem en te a l e i , colo cav a-se, na rea lid a d e , fo ra dela.
Mais de u m a de suas explicações desm en tiam o texto e o sentido da lei , nao se podendo ocultar que em m uitas c irc u n sta n c ia s zom bava de seus te r mo s .
A m edida que se m udavam as n e ce ssid a d es da vida, m udava com elas a in te rp reta ç a o . E ra, portanto, u m a in te rp re taç a o de finalidade.
E is as r e g r a s que guiavam a in te rp retaç a o antiga. No fundo , X
m otivadas por u m a necessidade im p e rio s a da vida p ra tic a , todas as suas inovaçoes desafiavam a critica. A acusaçao que C icero faz ia aos ju ris c o n
sultos antigos, de h av erem corrom pido o direito, nao contem nada de se - rio. A c au sa im pulsiva d e ssa corrupção nao p ro c e d ia deles, m as da
na-X
çao. Ainda que q uizessem deter a m a rc h a n a tu ra l da epoca, a to r re n te os a r r a s t a r i a e a chaga novam ente se a b riria . Mas a sua a rte sabia p ro v e r o
X w X
n e c e ssá rio e su p rir a legislaçao;' esta so in te rv iria no caso em que a ju ris prudência fosse impotente p a ra satisfaz e r as n e c e ssid a d e s ju rid ic as da epo
ca. E la m e re c e , pois, p a ra o seu tem po, o titulo de " viva vox ju ris civi-/ A» lis ", que, m ais ta rd e , se deveu ao P r e t o r . Nao e r a o eco, m a s o orgao vivo do direito. Tal foi tam b em a opinião dos ro m a n o s da epoca p o s te rio r.
R ica e fecunda p a ra o funcionam ento do direito, e sta doutrina
S *
antiga se c a ra c te riz a v a , alem disso, por e sse outro elem ento que lhe e proprio: sua adesao , sob o ponto de v ista da fo rm a , as leis ex isten tes. Os p ro p rio s ro m a n o s o fiz e ra m n o tar. A ju risp ru d ê n c ia ainda nao d e s e m penhava o papel de fo r ç a cria d o ra , fe-lo m ais tard e, p re c is a m e n te em Ro^ ma, onde gozou d e sse brilhante p a p e l. (2).
2.3 . Opinião de Bonfante
C h a m a -se in te rp retaça o a operaçao logica que se executa p a ra entender o que a lei p r e s c re v e . P o d e -s e distinguir a in te rp re ta ç a o le gal e a doutrinal, p o re m , a p rim e ira , que em ana do leg islad o r, nao e a v e rd a d e ira in te rp reta ç a o .
- A v e rd a d e ira in te rp retaç a o , ou seja, a doutrinal, executada pe
a /
la jurisp ru d ê n c ia , to m a c a rá te r diverso, segundo se tra te de a c la ra r o
/ X
que e e x p re ssa m e n te sancionado pela lei.'ou explicar o que e sta im p lic ita mente contido na legislaçao.
E sta segunda f o r m a de in te rp retaç a o , por cau sa do seu procedim ento e
s-/ M />
pecifico, tom a o nom e de analogia ou interp retaçao analógica.
E xam inem os em p rim e iro lugar , a interp retaçao em seu sen - tido e strito . Toda n o rm a de direito deve ser inte rp retad a . P o re m , de u m a
m a n e ira especial, en ten d e-se que e p rec iso in te rp re ta r as leis o b s c u ra s , ou im p erfeita s na ex p ressão e as que, fazendo p arte de um m esm o codigo, p a re c e m c o n tr a d iz e r -s e entre si.
D istingue-se, n este caso, a in te rp retaça o gram atical e a in te rp reta ç a o lo- gica. D ev e-se, p o re m , -observar que nao se tr a ta de duas esp e cie s diver - sas, m as de dois m om entos ou de duas fases do p ro ce sso logico.
o sentido que r e s u lta do valor linguistico das p a la v ra s e das locuçoes u- sadas pelo leg isla d o r e de sua construção sintaxica. E n e c e s s á rio ta m
-X X X A
bem n e sta analise o b s e rv a r o tecn icism o dos te r m o s jurid icos, que tem
A. X X
com fre q u en c ia um sentido especifico e diverso dos u so s o rd in á rio s .
X M W A
P o re m , pode acontecer que a in te rp retaç a o g ra m atic a l nao de,
- X
em absoluto, um sentido claro e v e ro s s im e l.*
M / X
C om eça aqui a t a r e f a da in terp retaça o logica. N esta segunda fase convem ~ ' ' X
c o n s id e r a r - s e p rim e iro a conexão entre as v a ria s p a rte s da lei; em segun do lugar, a conexão da lei com o u tra a n te rio re s ou p o s te rio re s ; em t e r c e i ro lugar, o fim a que se destina a lei, a " ratio legis " , como dizem os ro m anos; por sua vez, o fim da lei se deve obter de m uitos elem entos; a con
w X
diçao ju rid ic a e social de onde em ana a lei, a " occasio legis ", os p re c e
-M X
dentes, as d e c la ra ç õ e s dos que co n trib u iram p a ra fo rm u la -la , etc.
— X ~ X
Se todos e s s e s m eios nao fo re m u teis, nao ha outro cam inho que o de p r e
-~ x v x
f e r ir a in te rp reta ç a o que da a lei um sentido m a is razo av el e equitativo ou m enos rem o to ao direito existente.
X ^
A in te rp retaç a o logica quando, em sua funçao m ais grave, in - duz a c o r r ig ir a ex p re ssã o inexata do preceito legislativo, to m a o nom e de extensiva (plena interpretatio), se o conceito a que se r e f e r e a lei e m a is amplo que a inexata ex p re ssão deste; r e s tr itiv a , se tal conceito e m a is r e s
X
tringido; m odificativa, se e de qualquer modo div erso . E ntretanto, ta is ex p re s s õ e s , p rin cip a lm en te as duas p r im e ir a s , am bas trad ic io n ais, não sao
X
muito c la ra s , porque p a re c e que a lei m esm o, isto e, seu conceito, se am plia ou se re s tr in g e , o que nao s e r ia in te rp re ta r, m as, sim , violar a
X
lei. Na rea lid a d e , o que se am plia ou se r e s trin g e e a p alav ra, baseando - se p re c is a m e n te no-pensam ento descoberto,' porque a vontade da lei consis te no seu pensam ento e nao nas p a la v ra s.
A analogia, ou seja, aquela fo rm a su p erio r de in te rp re ta ç a o que
~ X
indaga nao o pensam ento expresso, , m as o pensam ento im plicito na leg isla - çao, consiste n isso.
Qualquer relaçao entre pesso a s no ambito de u m a instituição
ju-/ # X «.. X x
rid ic a e relaç a o ju rid ic a e, portanto, deve ser julgada, em caso de litigio , segundo as n o rm a s de direito.
P o r e m , o leg isla d o r nao ordenou em cada u m a das instituições m ais que aquelas re la ç õ e s que se a p re se n tam com m aio r freq u en cia.
N este caso, como se procede quando, por u m a conjuntura excepsional ou por um desenvolvim ento das condiçoes sociais, so b rev em a n e cessid ad e de dar sentença so b re u m a figura nao p re v is ta pelo leg islad o r ?
Indagando em tal caso, qual s e r ia seu pensam ento ? M X
Em casos a ss im , u s a - s e a indução legitim a, ou seja, d e d uz -se a p a rtir da relaça o o rd e n a d a pelo legislador que tiv e r m aior analogia com a r e l a - çao que se a p re s e n ta no caso duvidoso ou o b scuro.
m X
P or exem plo, *se nao e sta estabelecido e x p re ssa m e n te como se decide a - c e r c a da culpa dos contratantes, em caso de p e rm u ta , se deve aplicar a
X
n o rm a que o leg isla d o r estabeleceu p a r a a c o m p ra e venda. E evidente
«w / X
que este p rocedim ento de inte rp retaç ao analógica conduz, seguindo a
logi-. V ~ X
ca do direito (ratio ju ris), a construção de p rincipios g e ra is que s e rv e m
X W / X
p a ra u m a s e rie de instituições jurid ic as ou ta m b em p a r a todo um s is te m a legislativo, como ta m b em e evidente que as re la ç õ e s in e re n te s a institui - çoes nao ju rid ic a s (por exem plo, a amizade),' nao sera o nunca ju rid ic a s , m ediante nenhum a analogia.
P o rta n to , o p ro b lem a das lacunas leg isla tiv as tem sentido nas re la ç õ e s ju rid ic a s e se re so lv e m ediante este p rocedim ento, com o auxilio nos casos e x tre m o s, da finalidade das instituição; nao te m sentido nas r e - laçoes nao ju rid ic a s .
x x x
P o r e m , e tam b em natu ral que nao se deva r e c o r r e r a este p ro
-m X
cedim ento nas n o rm a s que constituem exceção aos p rin cip io s fundam entais das instituições; a base do " ius singulare " nao se pode r a z o n a r por ana - logia.
A in te rp re taç a o do direito justinianeu o fe rec e dificuldades par - tic u la re s por c au sa da sua form ação especial e pelo modo como nos foi
/ s ' s X
tran sm itid o . A ssim , na duvida convem que se p ro ce d a a c ritic a do texto ,
X ^ ✓
porque nenhum m a n u scrito e autentico. E s ta legislaçao e sta constituida em
X X
sua p a rte fundam ental por fragm entos de o b ra s ju rid ic as que contem r è
-X M X
gras d o u trin a ria s, razo n am ento s, decisões e, enfim, textos u tilissim ò s pa
X X m
X X
u m a lei, mas dialéticos e d em onstrativos; e de tais textos convem e x tra ir a n o rm a do direito.
✓ /
Dito isso, nem sem p re e facil fixar os lim ite s p re c is o s da n o r m a e e sta b e le c e r com seg u ran ça absoluta se a d eclara çã o do jurisconsulto
X a
r e p r e s e n ta um motivo etico ou econom ico ou se d e v e -se a ce ita r, ao m e - nos, o direito justinianeu, como principio de D ireito. Alem disso, os fra_g m entos in se rid o s na com pilaçao justinianea, fo ra m com bastante f re q u e n - cia, interpolados, nao r a r a s vezes ineptam ente, pelos com piladores^ e frequentem ente, ainda que genuino o texto do frag m en to , a in te rp retaç ao
X ~
logica pode m udar o sentido original daquele, por sua conexão com
ou-X ao
tr a s le is ou com o espirito geral da legislaçao justinianea, ou por e sta r isolado do contexto em que se falava.
E m sem elhante caso tem os u m a dupla in terp retação : h is tó ric a ou le g isla - tiva.
/ / A
M axim as e enunciados juridicos p o ssu e m , com frequencia, u m a X
eficacia com pletam ente d iv e rsa no pensam ento do jurisconsulto- e- no dos c o m p ilad o res, nao pela coordenação com o u tra s leis, m as tam b em por
-x /
que o texto e sta inserido num a r u b r ic a especial ou no titulo geral de " r e - gulis iuris
AO X X V . AO
A extensão analógica dos principios novos as instituições anti -X
gas deve p ro c e d e r com u m a c e r ta liberdade, pois o valor juridico e o ca
-X X
r a c te r n o rm a l ou singular do principio se deve e sta b ele c e r por u m a se rie
~ X
de ap licaçõ es ou de outros indicios desunidos de todo o s is te m a leg isla ti - vo, como s e ria m as finalidades e as tendencias da nova legislaçao; e ta m
-X A ' « V X
bem, a e ss e resp e ito sucede com freq u en cia que a posição entre o que e
X X
re g u la r e o que e excepcional, m uda com pletam ente do D ireito clássico ao Direito justinianeu.
AO X X
F req u e n te s sao os textos puram ente h isto rico s cujo teor e im
-X X
com pativel e im possivel no D ireito justinianeu;
—o A ' . X X
nao r a r a s as re tic e n c ias legislativas tam b em de principios fundam entais e
A- . X X \
fontes ro m a n a s p a r a re s o lv e r as antinom ias v e rd a d e ira s e aceitar um outro principio sao: a posição do fragm ento na r u b r ic a p rincipal da insti
-m - - /
tuiçao ou acidentalm ente em o u tra ru b ric a , a cronologia dos v a rio s f r a g
-✓ ✓
m entos, que nos ajude a co m p ro v ar qual e o principio que r e p r e s e n ta um ✓
desenvolvim ento p ro g re ssiv o e o que m ais concorda com espirito da le g is lação justinianea, e, enfim, a interpolaçao m e s m a r e a liz a d a em u m a de - la s.
✓
Dificuldades analogas o fe re c e m as Novelas nas quais o leg isla
-A /
dor se a p re s e n ta , com frequencia, como in te rp re te .
Nao se concede nenhum a p ro e m in e n cia de u m a p a rte da com pilaçao sobre a outra, por exem plo, as Instituías, como se acreditou um certo tem po ,
/ X
ou ao Codigo, ja que todas se devem c o n sid e ra r como em anadas do Impe - ra d o r Justiniano e no m esm o dia.
E m tais condiçoes o " C orpus Iuris " e o m elhor cam po p a r a o
/ /
in te rp re te do D ireito, tanto pelos m é rito s insuperados dos ju ris c o n s u lto s , ✓
de quem em anavam os frag m e n to s, como tam b e m pelos defeitos ig u alm e n te insuperados (do lado form al), da legislaçao justinianea.
w / A
A doutrina da in te r p r etaçao e p a rte e ssen cial da ciência do D i reito Romano (3).
2. 4. C o n sid e raçoes C ritic a s
Se a interp r etaçao tejn por objeto d a r-n o s a conciencia • da *
lei, tudo o que nao p e rte n ç a ao conteúdo desta, qualquer que seja, sua a-/
finidade com o dito conteúdo, ficà, rig o ro s a m e n te falando, estranho ao ob
* •
jeto da in te rp re ta ç a o .
A p re se n ta v a -se , a ssim , em p r i m e i r a linha, o motivo da lei (ratio legis). A " ratio legis 11 tem dois sentidos diferentes: 1) a r e g r a
su-/ ~ A
p e rio r de direito, da qual e a lei dedução e consequencia; 2) o efeito que
S M / a m
soluta entre e s te s dois sentidos. Ao c o n trario , d e v e -se adm itir que sao in se p arav eis no pensam ento do leg islado r.
O fe re ce m , no entanto, a diferen ça re la tiv a de que um e outro
X r ~ s
p redom inam notavelm ente em algum as leis, predom inio que faz re la ç õ e s a distancia estab elec id as entre o "ius C om m une" e o "ius sin g u lare". No p ri m eiro p re d o m in a a influencia das r e g r a s a n te rio re s , cujo desenvolvim ento
/ /
com pleta a lei e seu objetivo e tra d u z ir o direito em c a r a c t é r e s visiv eis e a ss e g u ra r sua execução; no segundo , a açao da lei sobre o futuro e o pon to de v ista pred o m in ante. Uma lei a c e r c a da u s u ra , por exem plo, que v ie r a em so co rro dos devedores pobres, e s ta ria u n icam ente influenciada pe - la m a n e ira g eral de que o legislador deve interp o r sua p roteção tu tela r 1
A X
quando u m a c la s se da sociedade ve sua sorte p ro m e tid a no dominio do di - r eito.
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Pode ser m ais ou m enos certo o motivo da lei, p o rem , nunca e n e c e ssá rio que se encontre expresso nela, e ainda que isto se verifique,
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p e rm an ece s e m p re distinto do seu conteúdo, sem que p o ssa , em nenhum caso, to m a r p a rte integrante nela.
A ignorancia que tem o s sobre o motivo da lei em nada dim inue a sua auto- rid ad e. A sua f o r ç a ob rig ato ria p e rm a n e c e a m e s m a ainda que tenham os a c e rte z a que a lei nao tece nenhum motivo v e rd a d eiro .
A in c e rte z a sobre o motivo da lei pode p ro c e d e r de m uitas c au sas. A lgum as v e ze s nos ap erceb em o s de m uitos m otivos sem os saber coar denar; o u tra s, u m motivo evidente, e x p resso no texto, p a re c e estranho a
A M / S
lei, em consequencia da supressão de ideias in te rm e d ia ria s que, se expres sas, d e s tru iria m e sta aparente contradiçao . (4).
E x iste m diversos graus de relaç ao entre o motivo e o conteúdo
— / / s
da lei. U m as v e ze s ap resen tam a relaçao p u ram en te logica do principio a consequencia, e, n este caso, sao am bos idênticos (5), o u tra s vezes, pelo
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contrario, am bos os te rm o s, motivo e conteúdo, a p a re c e m muito s e p a ra -dos um do outro (6). Segundo estes diferentes caso s, os m otivos re c e b e m .
a denom inação de especiais ou gerais.
O motivo da lei pode ser invocado com proveito e segurança, ✓
quando se t r a t a de saber qual e a n a tu re z a da r e g r a contida na lei, se p e r tence ao direito absoluto ou ao direito supletivo, ao "ius com m une " ou ao
"ius sin g u lare".
Nao obstante estas d iferen ças o fe r e c e re m um c a ra te r com um , que consiste em que todas se r e f e r e m a e s s e n c ia da lei m e sm a , p o ssu e m u m a n a tu re z a com um objetiva, por cuja cau sa podem ser por todos re c o - nhecida e, se em c erto s casos, nos p a re c e m ocultos, sao exceções nada fre q u en tes. P o r e sta m e s m a ra z a o , se distinguem c la ra m e n te os fatos que p o ssu e m u m a relaça o p u ram en te subjetiva com o pensam ento do leg isla do r e, entre os quais se podem contar os acontecim entos que d e ra m cau sa a u m a lei, p o rem , que pu d eram dar lugar a m edidas d iferentes, a c o n sid e ra - çao de p e sso a s e de c ircu n sta n cia s que d e te rm in a ra m ao leg islado r estabe le c e r u m a r e g r a geral e p e rm an en te (7), fatos cujo conhecim ento sao p a r a nos tao acidental como a ignorancia dos m otivos da lei.
2 .4 .1 . As L eis D efeituosas
✓ M
Ate aqui vim os a in te rp re ta ç a o das leis no seu estado n o rm al, ou m elhor dizendo, aquelas cuja e x p ressã o e n c e r r a um p en sam en
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to com pleto que autorizadam ente c o n sid era m o s como o conteúdo v e r d a deiro da lei. P a s s a m o s a g o ra as leis defeituosas, ao exam e das suas difi culdades e aos m eios de v e n c e -la s.
P odem os dividir os defeitos em duas c la s se s principais: 1) e x p re ssã o indeterm inada, nao contendo nenhum pensam ento com pleto;
2) e x p re ssão im p ró p ria , cujo sentido e sta em contradiçao com o v e rd a d e i
ro pensam ento da lei.
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E sta s duas e sp ecies de defeitos nao exigem o rem ed io de u m a m a n e ira igualm ente im periosa: o p rim e iro deve s e r, em todos os c aso s , corrigido e nao oferece nenhum perigo; o segundo e m ais delicado de t r a - ta r e exige m a io re s p rec au ç õ e s. Os m eios que tem o s a nosso dispor sao
os que p a ss a m o s a expor.
C onsiste o p rim e iro em e xam inar o conjunto da legislaçao; ✓ o segundo, em r e f e r i r a lei ao seu motivo; o te r c e ir o , em a p re c ia r o m é rito do resultado obtido pela in te rp retaç a o .
a) E xam e da legislaçao em seu conjunto
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E ste meio pode ser aplicado de duas m a n e ira s a in te rp r e ta çao da u m a lei defeituosa: pode ser in te rp re ta d a a p a rte defeituosa com a ajuda de o u tra s p a rte s dá m e s m a lei, sendo este o caminho m ais seguro (8); p o de-se, tambejm, in te rp re ta r a lei defeituosa com a ajuda de o u tra s
leis (9).
A interp retaçao obtida por este ultim o meio s e r a tanto m a is cer
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ta quanto m ais p ró x im a estiv e r da finalidade das o u tra s leis; a ss im , se e-✓
m anam do m esm o leg islado r, se o b te ra um grau m ais élevado de c e rte z a .
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Nao obstante, podem os, tam bem , nos s e rv ir das leis a n te rio re s , na su - ^ /
posição leg itim a de que o legislador as tinha em vista, e que devem te r ’ servido p a r a com pletar o seu pensam ento (10). P o r ultim o, s e rv e m p a r a
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este fim as leis p o s te rio re s , p o rem , este caso r a r a s vezes e n tra no dom i nio da in te rp retaç ao pura, posto que e sta s leis podem m odificar a lei
de-4
feituosa ou dar u m a interp retaça o autentica, a qual nao e in te rp reta ç a o ’ p ro p ria m e n te dita. Quando se e m p reg a m as leis p o s te rio re s como m eios de in te rp retaç ao pura, su p o e-se que o e sp irito da antiga legislaçao se conservou na nova (1 1).
b) Motivo da lei
Uma lei defeituosa se in te rp re ta tam b em por seus m otivos , p o re m , este meio de in terp retaça o e x erce um dominio m a is r e s tr it o que o an te rio r, porque seu em prego depende da c e rte z a d estes m otivos e da sua
<■» . * m
-tivos podem s e r v ir de rem edio a p r i m e i r a c la sse de defeitos (ex p ressão indeterm inada), r a r a s vezes à segunda (expressão im p ró p ria).
c) A preciaçao do resu ltado obtido
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A apreciaçao do resu ltado obtido e de todos os m eios de in -te rp re ta ç a o o m ais aventureiro, pois o in -te rp re -te c o rr e o risc o de exce - d e r - s e nos seus p o d eres e e n tra r no dominio da leg islaçao.
✓
Somente d e v e-se r e c o r r e r a ela e e m p r e g a -la p a ra p r e c is a r o sentido de u m a e x p re ssão indeterm inada, nunca p a r a r e f e r i r o texto ao pensam ento
da lei.
Os m eios de in te rp retaç ao nos o fe rec e m as m e s m a s graduações que os defeitos da lei, a ssim , o p rim e iro e u m a aplicaçao geral, o seguri do pede muito m ais r e s e r v a e o te r c e iro deve c ir c u n s ta n c ia r- s e nos m ais e stre ito s lim ite s.
A indeterm inaçao que o b scu re c e um pensam ento, pode r e f e r i r
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se a u m a ex p ressão im co m p leta ou a u m a ex p re ssã o ambigua.
A ex p ressão incom pleta de u m a lei tem p re c isa m e n te o c a r a te r de um discu rso interrom pido que deixa, portanto, em suspenso, seu s e n tido, tal s e r ia o caso de u m a lei que exige castigos em um ponto qual - quer e nao fixa seu num ero (1 2).
A am biguidade, que se a p re s e n ta frequentem ente e po ssu e g r a ves consequencias, pode consistir: I') na e x p ressã o ; 2) num a construção an
fibiolo gica.
Com respeito a p rim e ira , u m a s v e ze s a e x p re ssão e m p reg ad a p a ra designar u m a individualidade se aplica a o u tra s individualidades da
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m e s m a especie, o qual sucede com m enos fre q u ên c ia nas leis que nos a - tos e nos contratos (13); o u tra s vezes, a ex p re ssã o e m p reg ad a p a r a t r a - duzir u m a ideia a b stra ta a p re sen ta dois significados difetentes (14), ou so m ente a p re se n ta duas acepções, u m a extensa e o u tra r e s t r i t a (15).
a. / / ' Uma construção anfibiologica pode tam b ém p ro d u zir um senti- do equivoco, da qual nao estao excluidas as leis, ainda que e sta especie de am biguidade se de m ais freq u en tem en te nos co ntratos.
Todas e s s a s am biguidades, a p esa r de sua diversidade ap aren te, po ssu em em com um o fato de nos im p e d ire m de entender com seg u ran ç a o pensam ento completo da lei.
A ambiguidade procede do leg islado r e pode advir da o b sc u ri
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dade de suas ideias ou da in se g u ra n ça no manejo da lingua, ou de am bos ;
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p o re m , qualquer que seja a sua o rig e m , o in te rp rete tem de dar rem ed io a ela, pois nao se pode liv ra r nenhum a r e g r a de u m a lei de tal m a n e ira de feituosa. P o d e -s e rec o n h ec e r e p ro v a r e sta ne ce ssid ad e por u m a arg u m e n
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taçao logica; p o re m a argum entaçao se lim ita a f a z e r c onstar a n a tu re z a
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da duvida, sem dar a sua solução, a qual ha de se b uscar nos t r e s m eios de in te rp retaç ao ja en u m erad o s e que sao todos aplicaveis, reduzindo - se a questão de seu m erito a d e te rm in a r a o rd e m na qual ser ao e m p reg a d o s.
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D e v e r- s e - a , a ssim , r e c o r r e r em p rim e iro lugar ao exam e da legislaçao em seu conjunto e; se isto b asta r p a r a fixar o sentido da lei, a-
b a n d o n a r-s e -a os r e s ta n te s m eios de in te rp re ta ç a o como m enos seg u ro s. E m segundo lugar, d e v e r - s e - a consultar o motivo da lei e, sen
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do possivel, o que tenha m ais afinidade com o conteúdo dela m e sm a , pois som ente se r e c o r r e r a em seu defeito, como meio subsidiário, ao motivo
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geral. Se, por exem plo, o motivo de u m a lei e a "aequitas" e tal e o c a r a -te r do direito n o rm a l, d e v e r - s e - a p r e f e r ir a in -te rp retaç a o que a " a eq u i tas " justifique (16).
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E m te r c e iro lugar p o d era deter m in a r - s e o sentido da lei p ela apreciação dos re su lta d o s que p ro d u z em as d iv ersas in te rp re ta ç õ e s. A ssim , d ev era p r e f e r i r - s e a que seja m ais racio n al (17), a que re sp o n d a
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m elhor as n e ce ssid a d es da p ra tic a (18); e, por ultim o, a que seja m a is hu m ana e m enos violenta (19).
A segunda c la sse de defeito se r e f e r e a im p ro p ried ade dos t e r - m os. E im p ró p ria u m a ex p ressão quando da u m sentido claro e d e te rm in a
do, p o re m diferente do pensam ento r e a l da lei. E m v ista d esta c o n tr a d i ção, p e rg u n ta -se qual deve p re v a le c e r; a g o ra bem: sendo a p a la v ra o mei- o e o pensam ento o objeto, deve aquela s u b o rd in a r-s e a este, com o qual
deve e sta b e le c e r relaçao de conform idade, e, em virtude, r e t if ic a r - s e a ex p ressã o (20). E s ta re g r a , anatacavel em teo ria, pode, em sua aplica -
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çao, o casion ar grandes c o n tro v é rsia s, pois toda.dificuldade se red u z a p ro v ar o fato em questão.
E s ta segunda especie de defeito a p re s e n ta m enos v a ried ad es ’ que a p rim e ira , isto e, a refe re n te a e x p re ssã o ind eterm in ad a. A e x p r e s são diz u m a s v ezes m enos, o u tras vezes m a is que o pensam ento; e e stas
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sao as unicas diferen ças que re s u lta m de suas r e la ç õ e s lógicas. T r a t a - s e entao, de re tific a r a ex p ressão , no p rim e iro caso por u m a in terp retaça o extensiva; no segundo caso por u m a in te rp retaç a o r e s t r i t i v a (2 1) e am -
bas p o ssu e m por objeto colocar em h a rm o n ia a f o r m a com o pensam ento. Os proced im en to s, com a ajuda dos quais se c o rrig e u m a ex- p re s s ã o im p ró p ria , d iferem muito dos em p reg ad o s p a r a fixar u m a expres sao in d eterm in ad a. P r im e ira m e n te su p o e-se que e x ista um pensam ento de term inado sob u m a expressão defeituosa; esta re laç a o nao adm ite, como a indeterm in açao , provas lógicas, seriao, som ente, p ro v a s h is tó ric a s e,
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e por conseguinte, m enor a sua c e rte z a e suscetivel de d iv e rso s graus. O utra c irc u n sta n c ia aum enta, todavia, a dificuldade da m a téria : a expres sao do signo m a is imediato e m ais natu ral do p en sam en to. A ex p re ssã o in d eterm in ad a exige n e c e ssa ria m e n te o rem ed io da in te rp re ta ç a o , pois sem ela nao ha lei, nem texto que aplicar: aqui, pelo c o n trario , a l e t r a da lei nos da um sentido claro e suscetivel de aplicaçao.'
P o r ultim o, quando se t r a ta de u m a ex p re ssã o ind eterm inada, a operaçao que a ssin a la o defeito nao e a que o corrige: aqui, as duas ó p e ra ç o e s se
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confundem. Com efeito, julgam os que e im p ró p ria a ex p re ssã o c o m p aran - do-a com o pensam ento re a l da lei; logo, conhecer e s ta im probidade e p r e ciso que nos se ja conhecido o pensam ento, em cujo caso, en co n tram o s lo - go o rem ed io .
referid o acim a, m ostrando como podem s e rv ir p a r a c o r r ig ir a e x p re ssã o im p ró p ria de u m a lei defeituosa.
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O exam e da legislação em seu conjunto e, ta m b e m aqui, o meio m ais seguro e o senatusconsulto, que tem esp ecialm ente por objeto , a " h e re d itatis petitio ", nos pro p o rcio n a um exem plo de sua aplicação.
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Com efeito, segundo este senatusconculto, o possu id o r de boa fe que ven - deu os bens da su ce ssão , deve r e s titu ir o preço que rec eb e u por eles (pre tia quae p e rv in isse n t). A generalidade de tal e x p ressã o com preende o ca - so em que o preço da venda, se houvesse perdido, depois de recebid o jp o - re m , a contm uaçao se e x p re s s a que se excetua este caso, em v ista do
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qual e p rec iso entender as p a la v ra s " p re tia quae p e rv e n is se n t" , num s e n tido re stritiv o : o preço recebido e conservado. Como outro exem plo, ci - ta re m o s as leis c rim in a is . Se, em sua disposição final p ro n u n cia a lei u - m a pena geral c o n tra um delito, depois de haver estabelecido o u tra pena contra um caso p a rtic u la r do m esm o delito, este caso p a rtic u la r se exce - tua da lei g eral (2 2).
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O segundo meio, que consiste em r e f e r i r o pensam ento e o m
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tivo da lei, p a r a c o rr ig ir a e x p re ssão , e m ais im portante, p o re m , de apli caçao m a is delicada. N este ponto deve t e r - s e em oconta a distinção entre motivos esp e c ia is e g e rais.
O motivo especial e muito adequado p a r a o fim da in te rp re ta ç ã o e nunca e n co n tra m elhor aplicaçao que ali onde o sentido lite r a l da lei apa r e c e em contradiçao com ele. Quando, por exem plo, u m a disposição e s t a belecida em favor-de c e r ta s p e sso a s, produz , em u m a de suas aplicações, um v e rd a d eiro prejuizo p a ra as m e sm a s, e p re c iso evitar e sta contradiçao e c o rr ig ir a disposição geral por u m a in te rp retaç ao r e s tr it iv a (23).
P o r conseguinte, se um contrato fraudulento se converte em proveitoso pa-X X “
r a a p a rte enganada, o contrato e valido, ainda que o edito d ec la re a nulida de dos co n trato s fraudulentos (24). Se um m enor entabula um pleito sem a a ssistê n c ia do seu c u ra d o r e o ganha, seus atos sao validos (25); da m e s m a fo rm a u m a tra n sa ç a o sobre alim entos nao a u to rizad a pelo p re to r, deve exe c u ta r- s e quando a condição do dem andante ap arece m elh o rad a (26).