• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 1. Equações Diferenciais Parciais

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Capítulo 1. Equações Diferenciais Parciais"

Copied!
30
0
0

Texto

(1)

Cap´ıtulo

1

Equa¸

oes Diferenciais

Parciais

Nesse cap´ıtulo faremos um estudo b´asico das equa¸c˜oes diferenciais parciais. Discutiremos primeiro alguns aspectos gerais destas para de-pois estudar os principais exemplos. O caso mais importante ´e sem d´uvida o das equa¸c˜oes diferenciais parciais de segunda ordem e para estas dispensaremos a maior parte das nossas aten¸c˜oes, considerando desde a classifica¸c˜ao destas at´e o principal m´etodo para encontrar solu¸c˜oes que ´e o m´etodo de separa¸c˜ao de vari´aveis e suas aplica¸c˜oes em problemas como os chamados problema de Cauchy e problema de contorno.

(2)

1.1 Generalidades

Uma equa¸c˜ao diferencial parcial (EDP) ´e uma equa¸c˜ao dife-rencial envolvendo uma vari´avel dependente e duas ou mais vari´aveis independentes, ou seja, uma equa¸c˜ao da forma

F (x, y, . . . , u, ux, uy, . . . , uxx, uxy, . . .) = 0,

onde x, y, . . . s˜ao as vari´aveis independentes, u a vari´avel dependente e ux = ∂u/∂x, etc. A ordem de uma EDP ´e a ordem da maior derivada

parcial envolvida na equa¸c˜ao. Uma EDP ´e dita linear quando for linear em u e todas as suas derivadas, e quando a EDP for linear apenas na derivada de maior ordem dizemos que ela ´e quase-linear. Os exemplos mais importantes de EDP s˜ao as lineares de segunda ordem, que em n vari´aveis independentes s˜ao da forma

L[u] = n X i,j=1 Aij(x)uxixj + n X j=1 Bi(x)uxi+ F (x)u = G(x), (1.1)

onde x = (x1, . . . , xn), Aij = Aji e aproveitamos para definir o

opera-dor diferencial L[u]. Se G = 0 dizemos que a equa¸c˜ao ´e homogˆenea, caso contr´ario dizemos que ´e n˜ao-homogˆenea.

Os exemplos mais importantes de EDP s˜ao de segunda ordem e lineares. Considerando apenas duas vari´aveis independentes, devemos destacar (i) a equa¸c˜ao de onda

utt= c2uxx, (1.2)

onde c ´e uma constante identificada como sendo a velocidade da onda e u ´e a amplitude da onda, (ii) a equa¸c˜ao de condu¸c˜ao do calor, ou simplesmente equa¸c˜ao do calor,

ut= kuxx, (1.3)

onde k denota a difusividade t´ermica e u ´e a temperatura, e (iii) a equa¸c˜ao de Laplace,

uxx+ uyy = 0, (1.4)

onde agora u ´e, por exemplo, o potencial eletrost´atico. Essas equa¸c˜oes s˜ao ainda casos particulares da equa¸c˜ao do telegrafista (ou do tel´egrafo),

(3)

1.1. GENERALIDADES 3

onde a, b, c s˜ao constantes.

Uma fun¸c˜ao u = u(x, y, . . .) ´e uma solu¸c˜ao (ou superf´ıcie integral) dessa EDP se ela satisfaz a equa¸c˜ao na forma de uma identidade. En-contrar uma solu¸c˜ao de uma EDP ´e uma tarefa muito mais ´ardua do que no caso de uma EDO, tanto que podemos encontrar problemas em aberto apesar da enorme quantidade de estudos produzidos a este respeito. Nesse sentido um exemplo ajudar´a a ilustrar um pouco das dificuldades que teremos que enfrentar para estudar uma EDP.

Exemplo 1.1. Vamos considerar a equa¸c˜ao uxy= 0.

Como uxy = (ux)y= 0, sabemos que ux n˜ao depende de y, ou seja,

ux= f (x).

Pensando como uma EDO, a solu¸c˜ao dessa equa¸c˜ao seria u = R f (x) dx + k, onde k ´e uma constante arbitr´aria. Entretanto, o que temos acima ´e uma fun¸c˜ao de duas vari´aveis u = u(x, y) e uma derivada parcial ao inv´es de uma derivada ordin´aria. Uma vez que ao procedermos uma deriva¸c˜ao parcial em uma vari´avel as demais s˜ao mantidas constantes, a solu¸c˜ao mais geral dessa equa¸c˜ao ´e

u(x, y) = Z

f (x) dx + h(y) = g(x) + h(y),

onde g(x) e h(y) s˜ao fun¸c˜oes arbitr´arias. A situa¸c˜ao, portanto, ´e muito mais complexa do que no caso de uma EDO onde temos constantes arbitr´arias. Nesse cen´ario, duas perguntas surgem de imediato: (1) como especificar uma solu¸c˜ao particular? (2) como garantir que essa solu¸c˜ao seja ´unica?

Um problema envolvendo uma EDP consiste em encontrar uma solu¸c˜ao da EDP satisfazendo certas condi¸c˜oes. Por exemplo: encon-trar uma solu¸c˜ao que tem um determinado valor em uma dada hiper-superf´ıcie do espa¸co de coordenadas (x1, . . . , xn). O tipo e a utilidade

de uma condi¸c˜ao ir´a depender, como veremos, da equa¸c˜ao em quest˜ao. Dizemos que um problema ´e bem-posto (no sentido de Hadamard) se tivermos: (1) existˆencia: existe ao menos uma solu¸c˜ao; (2) unici-dade: existe no m´aximo uma solu¸c˜ao; (3) continuidade: a solu¸c˜ao dependende continuamente das condi¸c˜oes dadas. Encontrar as condi¸c˜oes que definem um problema bem-posto n˜ao ´e em geral uma tarefa f´acil. Existe um famoso exemplo, devido a Hadamard, que mostra que

(4)

mesmo para uma EDP aparentemente “simples” podemos n˜ao ter um problema bem-posto. De fato, vamos considerar a equa¸c˜ao de Laplace no semi-plano positivo, ou seja,

uxx+ uyy= 0, −∞ < x < ∞, y ≥ 0.

Vamos tomar as seguintes condi¸c˜oes de fronteira: u(x, 0) = 0, uy(x, 0) =

1

ksin kx,

onde k ´e uma constante. A solu¸c˜ao desse problema, que denotarmos por u = uk, ´e

uk(x, y) =

1

k2 sinh ky sin kx,

como pode ser verificado explicitamente por substitui¸c˜ao. Podemos ainda notar que

lim

k→∞

1

ksin kx = 0, −∞ < x < ∞. Por outro lado, para a solu¸c˜ao uk temos

lim

k→∞uk6= 0 se x 6= nπ,

ou seja, a solu¸c˜ao n˜ao depende continuamente das condi¸c˜oes dadas, de modo que esse n˜ao ´e um problema bem-posto.

Sobre a formula¸c˜ao de um problema, um dos resultados mais gerais ´e o chamado teorema de Cauchy-Kowalewski. Para apresentar seu enunciado vamos considerar que uma EDP de ordem N pode ser escrita na forma

∂Nu

∂yN = Φ(y, x, u, . . . , D α0

y Dxαu, . . .), (1.6)

onde x = (x1, . . . , xn) e usamos a nota¸c˜ao

Dα0 y u = ∂α0u ∂yα0, D α xu = ∂|α|u ∂xα1 1 · · · ∂x αn n ,

com |α| = α1+ · · · + αn. Dizemos que uma EDP ´e normal com rela¸c˜ao

`

(5)

1.1. GENERALIDADES 5

derivadas de ordem maior que N e as derivadas com rela¸c˜ao a t s˜ao no m´aximo de ordem N − 1, ou seja,

α0+ α1+ · · · + αn≤ N, α0≤ N − 1.

Para uma EDP na forma normal podemos definir o an´alogo do pro-blema de valor inicial para uma EDO, que ´e o chamado problema de Cauchy: encontrar uma solu¸c˜ao da EDP (1.6) satisfazendo as condi¸c˜oes ∂ku ∂yk y=y0 = φk(x), k = 0, 1, . . . , N − 1. (1.7)

Teorema [Cauchy-Kowalewski] I Seja o problema de Cauchy dado pela EDP (1.6) e condi¸c˜oes iniciais (1.7). Se as fun¸c˜oes φk(x) forem

anal´ıticas em uma vizinhan¸ca do ponto x0 = (x01, . . . , x0n) e a fun¸c˜ao

Φ(y, x, u, . . . , Dα0

y Dαxu, . . .) for anal´ıtica em uma vizinhan¸ca do ponto

(y0, x0, φ0(x0), . . . , Dαxφα0(x0), . . .) ent˜ao esse problema de Cauchy

pos-sui uma ´unica solu¸c˜ao anal´ıtica em uma vizinhan¸ca do ponto (y0, x0).

Prova: Veja I. Petrovsky, “Lectures on Partial Diferential Equati-ons”.3

Apesar da sua aparente generalidade, o teorema de Cauchy-Kowalewski ´e limitado em dois sentidos. Primeiro, ele est´a restrito a problemas en-volvendo fun¸c˜oes anal´ıticas e muitas vezes esse n˜ao ´e o caso pr´atico de interesse. Segundo, a afirma¸c˜ao do teorema ´e local, ou seja, em uma vizinhan¸ca de um ponto, enquanto muitas vezes o interesse e o problema s˜ao globais. Al´em disso, o teorema nada diz a respeito da continuidade – ali´as, o exemplo de Hadamard oferece justamente um exemplo de problema de Cauchy que n˜ao ´e bem-posto.

OBS: Para simplificar um pouco os problemas, vamos passar a con-siderar daqui em diante apenas casos lineares e quase-lineares. Isso, por´em, n˜ao representa uma grande perda de generalidade uma vez que as equa¸c˜oes mais importantes e conhecidas s˜ao as lineares.

(6)

1.2 EDP quase-linear de primeira ordem

A forma geral de uma EDP quase-linear de primeira ordem com n vari´aveis independentes ´e

n

X

i=1

Ai(u, x1, . . . , xn)uxi = G(u, x1, . . . , xn).

Vamos, por´em, para simplificar a nota¸c˜ao e facilitar a interpreta¸c˜ao geom´etrica, considerar apenas duas vari´aveis independentes, muito em-bora a generaliza¸c˜ao para n vari´aveis n˜ao apresente dificuldades. De-notando as vari´aveis independentes por x e y, escrevemos essa forma mais geral como

a(x, y, u)ux+ b(x, y, u)uy = c(x, y, u). (1.8)

Seja u = u(x, y) uma solu¸c˜ao dessa EDP. A fun¸c˜ao φ(x, y, u) = u − u(x, y) = 0 representa uma superf´ıcie no espa¸co de coordenadas (x, y, u) denominada superf´ıcie integral. Uma vez que

0 = uxdx + uydy − du = (ux, uy, −1) · (dx, dy, du),

sabemos que o vetor normal `a essa superf´ıcie integral ´e proporcional ao vetor (ux, uy, −1) no ponto P = (x, y, u). Por outro lado, a equa¸c˜ao

(1.8) pode ser vista como

(a, b, c) · (ux, uy, −1) = 0,

de onde podemos concluir que o vetor (a, b, c) pertence ao plano tan-gente `a superf´ıcie integral no ponto P = (x, y, u). J´a voltando o ra-cioc´ınio, dado o vetor (a, b, c), uma vez que uma superf´ıcie integral deve ser tangente a esse vetor temos uma infinidade de solu¸c˜oes para essa EDP. Al´em disso, se o vetor (a, b, c) deve pertencer ao plano tan-gente de uma superf´ıcie integral ent˜ao deve valer o seguinte sistema de equa¸c˜oes: dx a = dy b = du c . (1.9)

(7)

1.2. EDP QUASE-LINEAR DE PRIMEIRA ORDEM 7

Figura 1.1: Ilustra¸c˜ao das curvas caracter´ısticas

Esse sistema ´e chamado sistema caracter´ıstico da EDP (1.8). Como temos apenas duas equa¸c˜oes independentes, a sua solu¸c˜ao ´e dada pelas fun¸c˜oes

ψ(x, y, u) = A, φ(x, y, u) = B,

onde A e B s˜ao constantes arbitr´arias de integra¸c˜ao. Para cada va-lor dessas constantes, cada equa¸c˜ao representa um plano e a inter-sec¸c˜ao dos mesmos uma curva. Variando essas constantes obtemos uma fam´ılia bi-param´etrica de curvas. Isso est´a ilustrado na figura 1.1-A. Dizemos que uma curva satisfazendo o sistema (1.9) ´e uma ca-racter´ıstica da EDP (1.8). As caracter´ısticas est˜ao ilustradas em azul na figura 1.1. Para escolher uma das superf´ıcies integrais que represen-tar´a a solu¸c˜ao da EDP tomamos uma curva C tal que em cada um dos seus pontos a intersec¸c˜ao das superf´ıcies ψ e φ define uma caracter´ıstica e todas essas caracter´ısticas varrem a superf´ıcie integral que passa pela curva C, como sugere a figura 1.1-B. Essa curva C ´e a condi¸c˜ao ini-cial que define o problema de Cauchy. Claramente devemos encontrar problemas se essa curva for uma caracter´ıstica.

Exemplo 1.2. Para a EDP

(8)

temos o sistema caracter´ıstico dx x = dy y = du u cuja solu¸c˜ao pode ser dada na forma

u x = k1,

y x = k2,

onde k1 e k2 s˜ao constantes. As solu¸c˜oes da EDP s˜ao da forma

Fu x, y x  = 0, onde F ´e uma fun¸c˜ao arbitr´aria, ou ainda

u = xfy x 

,

onde f ´e uma fun¸c˜ao arbitr´aria. Escolhendo com condi¸c˜ao inicial que a superf´ıcie passe pela curva

x = t, y = t2, u = 1, devemos ter 1 = tf t 2 t  = tf (t) =⇒ f (t) = 1 t, e a solu¸c˜ao do problema ´e u = x 2 y .

Exemplo 1.3. Para a EDP

ux+ uy= u2

temos o sistema caracter´ıstico dx 1 = dy 1 = du u2, cuja solu¸c˜ao ´e x − y = k1, x + 1 u = k2. Para a EDP temos ent˜ao solu¸c˜oes da forma

x + 1

u= φ(x − y) =⇒ u = 1 φ(x − y) − x,

(9)

1.3. EDP LINEARES DE SEGUNDA ORDEM: CLASSIFICAC¸ ˜AO 9

onde φ ´e uma fun¸c˜ao arbitr´aria. Tomando como condi¸c˜ao que a superf´ıcie passe pela curva x = t, y = −t, u = t, temos t + 1 t = φ(2t) =⇒ φ(t) = t2+ 4 2t , e a solu¸c˜ao do problema ´e u = 2(x − y) 4 + y2− x2.

1.3 EDP lineares de segunda ordem: classifica¸

ao

Um dos pontos mais importantes para o estudo das EDP lineares de segunda ordem ´e a classifica¸c˜ao dessas equa¸c˜oes. Vamos come¸car considerando apenas duas vari´aveis independentes, de modo que a EDP mais geral ´e da forma

Auxx+ Buxy+ Cuyy+ Dux+ Euy+ F u = G. (1.10)

Agora, lembrando o curso de geometria anal´ıtica, sabemos que a equa¸c˜ao Ax2+ Bxy + Cy2+ Dx + Ey + F = 0

representa uma hip´erbole, par´abola ou elipse de acordo com

∆ = B2− 4AC      > 0 ⇒ hip´erbole = 0 ⇒ par´abola < 0 ⇒ elipse

Podemos emprestar essa nomenclatura e classificar a EDP (1.10) em hiperb´olica, parab´olica e el´ıptica em um ponto (x, y) conforme

∆ = B2− 4AC     

> 0 ⇒ EDP hiperb´olica = 0 ⇒ EDP parab´olica < 0 ⇒ EDP el´ıptica

(1.11)

Exemplo 1.4. Sejam as equa¸c˜oes

(10)

Para a primeira ∆ = 4x2y2, de modo que ela ´e do tipo parab´olico nas retas

x = 0 e y = 0 e hiperb´olico no resto do plano. Para a outra temos ∆ = −4x, sendo portanto do tipo hiperb´olico para x < 0, parab´olico para x = 0 e el´ıptico para x > 0.

Como a forma de uma equa¸c˜ao diferencial muda de um sistema de coordenadas para outro, poder´ıamos suspeitar que essa classifica¸c˜ao dependesse do sistema de coordenadas utilizado, o que nesse caso nos levaria a questionar a utilidade da classifica¸c˜ao proposta. Felizmente essa classifica¸c˜ao n˜ao depende do sistema de coordenadas, fato esse que serve tamb´em para justificar essa classifica¸c˜ao. Para vermos isso vamos fazer explicitamante uma mudan¸ca de vari´aveis (x, y) 7→ (ξ, η),

ξ = ξ(x, y), η = η(x, y), J = ∂(ξ, η) ∂(x, y) 6= 0. Expressando as derivadas ux e uy em termos de uξ e uη,

ux = uξξx+ uηηx,

. . . .

uyy = uξξξy2+ 2uξηξyηy+ uηηηy2

+ uξξyy+ uηηyy,

onde cometemos o abuso de nota¸c˜ao u(ξ, η) = u(ξ(x, y), η(x, y) = u(x, y), ent˜ao a eq.(1.10) assume a forma

A0uξξ+ B0uξη+ C0uηη+ D0uξ+ E0uη+ F0 = G0, (1.12) onde A0 = Aξ2x+ Bξxξy+ Cξy2, B0 = 2Aξxηx+ B(ξxηy + ξyηx) + 2Cξyηy, C0 = Aη2x+ Bηxηy+ Cηy2, D0 = Aξxx+ Bξxy+ Cξyy+ Dξx+ Eξy, E0 = Aηxx+ Bηxy+ Cηyy+ Dηx+ Eηy, F0 = F, G0 = G. (1.13)

Calculando agora (B0)2− 4A0C0 obtemos, ap´os algumas simplifica¸c˜oes, que

(11)

1.3. EDP LINEARES DE SEGUNDA ORDEM: CLASSIFICAC¸ ˜AO 11

o que mostra que ∆ = B2 − 4AC n˜ao muda de sinal perante uma

mudan¸ca de sistema de coordenadas e portanto a classifica¸c˜ao proposta n˜ao depende do sistema de coordenadas utilizado.

Essa independˆencia do sistema de coordenadas sugere procurarmos por uma express˜ao para a EDP na qual ela apresente sua forma mais simples, a sua forma canˆonica. Para isso vamos supor que a forma inicial da EDP ´e tal que

A 6= 0, B 6= 0, C 6= 0.

Uma simplifica¸c˜ao consider´avel na forma da equa¸c˜ao ir´a ocorrer se tivermos

A0 = C0 = 0.

Olhando para as eqs.(1.13) vemos que isso implica que as equa¸c˜oes diferenciais

Aξ2x+ Bξxξy+ Cξy2 = 0, Aηx2+ Bηxηy+ Cηy2= 0,

devem ser satisfeitas. Como a forma dessas equa¸c˜oes ´e a mesma, vamos usar a vari´avel ζ como sendo ξ ou η conforme o caso. Dessa forma a equa¸c˜ao a ser resolvida pode ser escrita como

A ζx ζy 2 + B ζx ζy  + C = 0. Ao longo da curva ζ = constante temos

dζ = ζxdx + ζydy = 0 =⇒ ζx ζy = −dy dx, e ent˜ao A dy dx 2 − B dy dx  + C = 0, e da´ı dy dx = B ±√B2− 4AC 2A ,

chamadas equa¸c˜oes caracter´ısticas. Vamos agora analisar as diferentes possibilidades.

(12)

(i) EDP hiperb´olica. Nesse caso B2 − 4AC > 0 e temos duas

equa¸c˜oes reais e distintas. As solu¸c˜oes dessas equa¸c˜oes representam curvas no plano (x, y) para as quais temos ξ = constante e η = constante. De fato, escrevendo as solu¸c˜oes dessas equa¸c˜oes na forma

φ1(x, y) = k1, φ2(x, y) = k2,

onde k1 e k2 s˜ao constantes, definimos as vari´aveis ξ e η como

ξ = φ1(x, y), η = φ2(x, y).

Com isso temos de fato A0 = C0 = 0 e podemos escrever uma EDP hiperb´olica na forma

uξη = H1(ξ, η, u, uξ, uη), (1.15)

que ´e chamada de primeira forma canˆonica de uma equa¸c˜ao hiperb´olica. Definindo outras vari´aveis α e β como

α = ξ + η, β = ξ − η,

podemos ainda escrever essa equa¸c˜ao hiperb´olica na forma

uαα− uββ= H2(α, β, u, uα, uβ), (1.16)

chamada segunda forma canˆonica de uma equa¸c˜ao hiperb´olica. ´E nessa forma que podemos identificar facilmente a equa¸c˜ao de onda

utt− uxx = 0

como uma EDP hiperb´olica.

(ii) EDP parab´olica. Como B2 − 4AC = 0 temos apenas uma equa¸c˜ao caracter´ıtica e apenas uma das equa¸c˜oes A0 = 0 e C0= 0 pode ser satisfeita. Escolhendo A0 = 0 e uma vez que (B0)2− 4A0C0 = 0, temos tamb´em B0 = 0, enquanto C0 6= 0. Com isso a forma canˆonica de uma equa¸c˜ao parab´olica ´e

uηη = H3(ξ, η, u, uξ, uη), (1.17)

ou

uξξ= H30(ξ, η, u, uξ, uη), (1.18)

Podemos assim identificar a equa¸c˜ao do calor uxx = ut,

(13)

1.3. EDP LINEARES DE SEGUNDA ORDEM: CLASSIFICAC¸ ˜AO 13

(iii) EDP el´ıptica. Nesse caso B2− 4AC < 0 e temos ra´ızes

com-plexas conjugadas e portanto n˜ao existem curvas caracter´ısticas reais. Para analisar esse caso ´e conveniente introduzirmos novas coordenadas α e β como

ξ = α + iβ, η = α − iβ.

Em termos dessas novas coordenadas a eq.(1.12) fica da forma A00uαα+ B00uαβ+ C00uββ = H4(α, β, u, uα, uβ),

onde A00, B00 e C00 s˜ao dados em termos de A0, B0 e C0 por express˜oes da mesma forma daquelas da eq.(1.13). Sendo assim, uma vez que

αξ = 1/2, αη = 1/2, βξ = −i/2, βη = i/2, segue que A00= 1 4(A 0+ B0+ C0), B00= i 2(C 0− A0 ), C00= 1 4(−A 0+ B0− C0).

Logo, se A0 = C0 = 0 temos B00 = 0 e A00 = C00, e com isso segue para forma canˆonica de uma equa¸c˜ao el´ıptica

uαα+ uββ = H40(α, β, u, uα, uβ). (1.19)

Com isso vemos que a equa¸c˜ao de Laplace uxx+ uyy = 0

´e uma EDP el´ıptica.

Exemplo 1.5. Vamos considerar a equa¸c˜ao y2uxx− x2uyy = 0.

Aqui temos

(14)

de modo que essa equa¸c˜ao ´e do tipo hiperb´olico exceto nas retas x = 0 ou y = 0. Nas demais regi˜oes podemos encontrar as curvas caracter´ısticas e reduzir a equa¸c˜ao `a sua forma canˆonica. As equa¸c˜oes a serem resolvidas s˜ao

dy dx = B ±√B2− 4AC 2A = ±2xy 2y2 = ± x y, ou seja, ydy ± xdx = 0 =⇒ d(y2± x2) = 0.

Definimos ent˜ao novas coordenadas ξ e η atrav´es de ξ = y2− x2, η = y2+ x2,

de modo que as curvas caracter´ısticas s˜ao ξ = k1 = constante e η = k2 =

constante. Fazendo essa mudan¸ca de vari´aveis – note que |J | = 16xy, de modo que devemos excluir os pontos em x = 0 e y = 0 onde a equa¸c˜ao n˜ao ´e hiperb´olica – ou usando diretamente as eqs.(1.13) encontramos a forma canˆonica dessa equa¸c˜ao como sendo

uξη=

η

2(ξ2− η2)uξ−

ξ

2(ξ2− η2)uη.

Exemplo 1.6. Para a EDP

x2uxx+ 2xyuxy+ y2uyy = 0

temos

B2− 4AC = 4x2y2− 4x2y2= 0,

ou seja, essa EDP ´e do tipo parab´olico (em todo plano). A equa¸c˜ao que temos para resolver ´e dy dx = B 2A = 2xy 2x2 = y x, cuja solu¸c˜ao ´e facilmente encontrada, ou seja,

y = kx,

onde k ´e uma constante. Com isso a nova vari´avel ξ ´e definida como ξ = y

x.

Para a outra vari´avel podemos tomar x ou y. Tomando η = y segue, ap´os algumas contas, que a equa¸c˜ao fica da forma η2u

ηη= 0, ou, para η 6= 0,

(15)

1.3. EDP LINEARES DE SEGUNDA ORDEM: CLASSIFICAC¸ ˜AO 15

Exemplo 1.7. Como exemplo de uma EDP el´ıptica temos uxx+ x2uyy = 0.

De fato,

B2− 4AC = −4x2,

e a EDP ´e el´ıptica para x 6= 0. Para as equa¸c˜oes caracter´ıstica temos dy

dx =

±√−4x2

2 = ±ix, de onde seguem as solu¸c˜oes

2y + ix2= k1, 2y − ix2= k2,

e coordenadas complexo-conjugadas

ξ = 2y − ix2, η = 2y + ix2. Logo, como coordenadas reais escolhemos

α = 2y, β = −x2.

Com essa mudan¸ca de vari´aveis encontramos ap´os os c´alculos usuais que a forma canˆonica dessa EDP ´e

uαα+ uββ= −

1 2βuβ.

Vamos agora fazer alguns coment´arios acerca da generaliza¸c˜ao dessa classifica¸c˜ao para o caso de n vari´aveis independentes. A EDP linear de segunda ordem mais geral ´e da forma da eq.(1.1). Dado o operador L[u], definimos sua parte principal ¯L[u] como

¯ L[u] = n X i,j=1 Aij(x)uxixj.

A parte principal ´e portanto definida `a partir da matriz A = {Aij},

que por sua vez ´e uma matriz real e sim´etrica. Fazendo a mudan¸ca de vari´aveis

(16)

encontramos que a eq.(1.1) fica da forma L0[u] = n X i,j=1 A0ij(y)uyiyj+ n X i=1

Bi0(y)uyi+ F (y)u = G(y),

onde A0ij = n X k,l=1 Alk ∂yi ∂xk ∂yj ∂xl ,

sendo que a express˜ao para Bi0(y) n˜ao vem ao caso. ´E f´acil notarmos que A0ij = A0ji. Em termos da matriz

A0 = {A0ij}

podemos escrever a rela¸c˜ao acima entre as entradas como A0 = JTAJ,

onde J ´e o jacobiano J = ∂(y)/∂(x). A matriz A, sendo real e sim´etrica, ´e diagonaliz´avel, e com uma escolha adequada das novas coordenadas o jacobiano J torna-se a matriz de diagonaliza¸c˜ao. Sendo assim, podemos escrever A0 como

A0=      λ1 0 · · · 0 0 λ2 · · · 0 . .. 0 0 · · · λn     

A classifica¸c˜ao da EDP pode agora ser feita em termos dos autova-lores λi (i = 1, . . . , n). Diremos que:

(i) Se λi > 0 (i = 1, . . . , n) (ou λi < 0, i = 1, . . . , n) a EDP ´e do tipo

el´ıptico.

(ii) Se λi 6= 0 (i = 1, . . . , n) mas existirem autovalores tanto

posi-tivo quanto negaposi-tivos, a EDP ´e do tipo hiperb´olico (ou tamb´em ultra-hiperb´olico). Se apenas um dos autovalores for negativo (e os demais positivos) – ou vice-versa – a EDP ´e do tipo hiperb´olico normal.

(17)

1.4. O PROBLEMA DE CAUCHY 17

(iii) Se existirem autovalores λi = 0 para i = 1, . . . , m com m < n,

a EDP ´e do tipo parab´olico. Se apenas um dos autovalores for nulo ent˜ao a EDP ´e do tipo parab´olico normal.

Exemplo 1.8. Para duas vari´aveis a matriz A correspondente ´e A =  A B/2 B/2 C  . Os autovalores λ s˜ao dados por

λ2− (A + C)λ + (AC − B2/4) = 0 =⇒ λ = (A + C) ±p(A + C)

2+ ∆

2 ,

onde usamos ∆ = B2 − 4AC. Com isso vemos que: (i) se ∆ = 0 um dos autovalores ´e nulo, o que correspondente ao caso parab´olico; (ii) se ∆ > 0 temos p(A + C) + ∆ > (A + C) e os autovalores tem sinais contr´arios, um positivo e um negativo, o que corresponde ao caso hiperb´olico; (iii) se ∆ < 0 temos p(A + C) + ∆ < (A + C) e os dois autovalores tem o mesmo sinal, o que corresponde ao caso el´ıptico.

1.4 O Problema de Cauchy

Vamos estudar nessa se¸c˜ao o problema de Cauchy para EDP de segunda ordem e com duas vari´aveis independentes. J´a vimos que esse problema pode ser formulado como

     uyy = F (x, y, u, ux, uy, uxx, uxy), u(x, y0) = f (x), uy(x, y0) = g(x).

Generalizando um pouco essa formula¸c˜ao, se C ´e uma curva no plano (x, y) dada por (x(t), y(t)), t ∈ I ⊂ R, e f (t) e g(t) s˜ao fun¸c˜oes definidas ao longo da curva C, temos o problema de Cauchy

         uyy = F (x, y, u, ux, uy, uxx, uxy), u C = f (t), ∂u ∂~n C = g(t),

(18)

onde ~n denota o vetor normal a C no plano (x, y). Diremos que essas condi¸c˜oes s˜ao os dados de Cauchy. Para n˜ao complicarmos desne-cessariamente o problema, vamos tomar t como sendo o parˆametro natural, o que implica em |~v|2 = (dx/dt)2+ (dy/dt)2= 1.

Vamos agora mostrar como esse problema pode ser resolvido. Da primeira condi¸c˜ao segue

du dt = ux dx dt + uy dy dt = f 0(t), e da segunda ∂u ∂~n = nxux+ nyuy = −ux dy dt + uy dx dt = g(t), ou seja,  dx/dt dy/dt −dy/dt dx/dt  ux uy  =f 0(t) g(t)  , cuja solu¸c˜ao ´e ux = f0(t) dx dt − g(t) dy dt, uy = g(t) dx dt + f 0 (t)dy dt.

Agora para as derivadas de segunda ordem podemos escrever uxx dx dt + uxy dy dt = dux dt , uyx dx dt + uyy dy dt = duy dt , Auxx+ Buxy + Cuyy = F (x, y, u, ux, uy),

onde as duas primeiras equa¸c˜oes resultam do uso da regra da cadeia e o lado direito das mesmas pode ser calculado diretamente das express˜oes acima para ux e uy, e a ´ultima equa¸c˜ao nada mais ´e o que a pr´opria

EDP. A condi¸c˜ao necess´aria e suficiente para que esse sistema tenha solu¸c˜ao para uxx, uxy e uyy ´e que

det   dx/dt dy/dt 0 0 dx/dt dy/dt A B C  6= 0,

(19)

1.4. O PROBLEMA DE CAUCHY 19 ou seja, A dy dt 2 − Bdx dt dy dt + C  dx dt 2 6= 0, ou ainda A dy dx 2 − Bdy dx+ C 6= 0.

Lembrando que A(dy/dx)2− B(dy/dx) + C = 0 ´e a equa¸c˜ao de uma curva caracter´ıstica, podemos dizer que a condi¸c˜ao necess´aria e sufici-ente para que possamos calcular as derivadas de segunda ordem ´e que a curva C n˜ao seja uma curva caracter´ıstica.

De maneira an´aloga determinamos as derivadas de ordem mais alta (desde, ´e claro, que A, B, C, f , g sejam fun¸c˜oes anal´ıticas) e represen-tamos a solu¸c˜ao na forma de uma s´erie de Taylor. Temos assim um esbo¸co da demonstra¸c˜ao do teorema de Cauchy-Kowalewski!

O problema de Cauchy ´e em geral bem definido apenas para as equa¸c˜oes do tipo hiperb´olico. De fato, dado o problema na forma canˆonica,      uyy= uxx+ F (x, y, u, ux, uy), u(x, y0) = f (x), uy(x, y0) = g(x),

podemos ver facilmente que a curva y = y0 n˜ao ´e uma curva

carac-ter´ıstica desse problema, de modo que podemos construir sua solu¸c˜ao segundo o racioc´ınio acima. J´a para outros tipos de EDP frequente-mente necessitamos de outros tipos de condi¸c˜oes, mais especificamente as chamadas condi¸c˜oes de contorno. Uma condi¸c˜ao de contorno ´e dita condi¸c˜ao de Dirichlet quando se refere ao valor de u(x) em uma hiper-superf´ıcie Σ e condi¸c˜ao de Neumann quando se refere ao valor de ∂u(x)/∂~n em uma hiper-superf´ıcie Σ.

1.4.1 O Problema de Cauchy para a Equa¸c˜ao de Onda

Vamos considerar o exemplo cl´assico de uma EDP hiperb´olica, a equa¸c˜ao de onda

(20)

As equa¸c˜oes para as caracter´ısticas s˜ao  dx dt 2 − c2 = 0 =⇒ dx dt = ±c, de onde seguem as curvas caracter´ısticas

x − ct = k1, x + ct = k2.

Com coordenadas ξ = x − ct e η = x + ct a equa¸c˜ao de onda assume a forma canˆonica uξη = 0 que tem como solu¸c˜ao u(ξ, η) = f (ξ) + g(η),

onde f e g s˜ao fun¸c˜oes arbitr´arias. Nas coordenadas originais, u(x, t) = f (x − ct) + g(x + ct),

que ´e a conhecida solu¸c˜ao de d’Alembert para a equa¸c˜ao de onda. Se tomarmos as condi¸c˜oes iniciais

u(x, 0) = φ(x), ut(x, 0) = ψ(x),

segue da primeira condi¸c˜ao que f (x) + g(x) = φ(x) e da segunda que −cf0(x) + cg0(x) = ψ(x) =⇒ g(x) − f (x) = 1 c Z x x0 φ(x0) dx0+ K, de modo que g(x) = 1 2c Z x x0 ψ(x0) dx0+k 2 + φ(x) 2 , f (x) = −1 2c Z x x0 ψ(x0) dx0− k 2 + φ(x) 2 .

Levando em conta os argumentos em f (x − ct) e g(x + ct) e somando essas express˜oes encontramos a solu¸c˜ao para a equa¸c˜ao de onda na forma u(x, t) = 1 2[φ(x + ct) + φ(x − ct)] + 1 2c Z x+ct x−ct ψ(x0) dx0. (1.20)

(21)

1.4. O PROBLEMA DE CAUCHY 21

Exemplo 1.9. Como condi¸c˜oes iniciais para o problema de Cauchy envolvendo a equa¸c˜ao de onda vamos tomar

u(x, 0) = φ(x) = (1 − |x|)[H(x + 1) − H(x − 1)], ut(x, 0) = 0.

onde H(x) ´e a fun¸c˜ao escada de Heaviside, H(x) =

(

1, x > 0, 0, x < 0.

O gr´afico de φ(x) est´a ilustrado em vermelho na figura 1.2.

Figura 1.2: Ilustra¸c˜ao da solu¸c˜ao do problema

Usando diretamente a eq.(1.20), temos para a solu¸c˜ao do problema u(x, t) =1

2[φ(x + ct) + φ(x − ct)].

O significado dessa solu¸c˜ao pode ser visto atrav´es da sua evolu¸c˜ao com rela¸c˜ao ao tempo. Tomando para efeito de ilustra¸c˜ao o valor c = 1, temos na figura 1.2

(22)

a ilustra¸c˜ao do gr´afico de u(x, t) para diferentes valores de t em diferentes cores, a saber: t = 0 em vermelho, t = 0.5 em verde, t = 1 em amarelo e t = 2 em azul. A interpreta¸c˜ao ´e clara: a onda inicial separa-se em duas, uma indo para a esquerda, correspondendo `a parte da solu¸c˜ao dada por (1/2)φ(x + ct), e uma indo para a direita, correspondendo `a parte da solu¸c˜ao dada por (1/2)φ(x − ct).

Exemplo 1.10. Seja o problema          utt= c2uxx, x > 0, t > 0, u(x, 0) = f (x), ut(x, 0) = g(x), u(0, t) = 0.

Um primeiro fato a ser notado ´e que esse problema apresenta uma condi¸c˜ao a mais que o anterior, que ´e a condi¸c˜ao em x = 0, ou seja, u(0, t) = 0, t ≥ 0. Esse ´e um exemplo de condi¸c˜ao de contorno ou de fronteira.

Sabemos que a solu¸c˜ao geral do problema ´e da forma u(x, t) = φ(x + ct) + ψ(x − ct). Das duas primeiras condi¸c˜oes obtemos

φ(x) = 1 2f (x) + 1 2c Z x 0 g(x0) dx0+k 2, ψ(x) = 1 2f (x) − 1 2c Z x 0 g(x0) dx0−k 2,

onde devemos ter o cuidado de levar em conta que f (x) e g(x) s´o est˜ao definidas para x ≥ 0. J´a a condi¸c˜ao u(0, t) = 0 implica em 0 = φ(ct) + ψ(−ct), ou seja, φ(ct) = −ψ(−ct), ou melhor,

φ(ξ) = −ψ(−ξ).

Para x − ct > 0 temos ainda x + ct > 0 (pois x > 0 e t > 0) e podemos escrever a solu¸c˜ao do problema na forma

u(x, t) =1 2[f (x + ct) + f (x − ct)] + 1 2c Z x+ct x−ct g(x0) dx0 (x − ct > 0). Por´em, para x − ct < 0 temos um problema na defini¸c˜ao de ψ(x − ct). De fato, nesse caso ψ(x − ct) = 1 2f (x − ct) − 1 2c Z x−ct 0 g(x0) dx0−k 2,

(23)

1.4. O PROBLEMA DE CAUCHY 23

e f (x) e g(x) n˜ao est˜ao definidas para x < 0. Por´em, a condi¸c˜ao que seguiu da condi¸c˜ao de contorno foi ψ(−ξ) = −φ(ξ). Com isso

ψ(x − ct) = −φ(ct − x) = −1 2f (ct − x) − 1 2c Z ct−x 0 g(x0) dx0−k 2, e agora n˜ao temos o mesmo problema pois ct − x > 0. Assim sendo, temos

u(x, t) =1 2[f (ct + x) − f (ct − x)] + 1 2c Z ct+x ct−x g(x0) dx0, (x − ct < 0).

Seja agora o problema n˜ao-homogˆeneo 1

c2utt− uxx = h(x, t).

Vamos integrar essa equa¸c˜ao na regi˜ao R ilustrada na figura 1.3. Es-crevendo τ = ct temos Z Z R h(x, τ ) dxdτ = Z Z R (uτ τ − uxx) dxdτ = − Z ∂R uxdτ + uτdx,

onde na ´ultima igualdade usamos o teorema de Green. A integral ao longo da caminho ∂R pode ser dividida em trˆes partes: ao longo do segmento de reta ligando o ponto (X − cT, 0) at´e (X + cT, 0), do seg-mento ligando (X + cT, 0) at´e (X, cT ), e do segmento ligando (X, cT ) at´e (X − cT, 0). Temos as integrais Z (X+cT,0) (X−cT ,0) (uxdτ + uτdx) = c−1 Z X+cT X−cT utdx, Z (X,cT ) (X+cT ,0) (uxdτ + uτdx) = Z (X,cT ) (X+cT ,0)

(−uxdx − uτdτ ) = u(X + cT, 0) − u(X, T ),

Z (X−cT,0) (X,cT ) (uxdτ + uτdx) = Z (X−cT ,0) (X,cT ) (uxdx + uτdτ ) = u(X − cT, 0) − u(X, T ), e com isso − Z Z R h(ξ, τ ) dxdτ = c−1 Z X+cT X−cT

(24)

Figura 1.3: Regi˜ao descrita no texto

Trocando a nota¸c˜ao (X, T ) para (x, t e usando ainda as condi¸c˜oes ini-ciais u(x, 0) = f (x) e ut(x, 0) = g(x) segue que

u(x, t) = 1 2(f (x + ct) + f (x − ct)) + 1 2c Z x+ct x−ct g(τ ) dτ +1 2 Z Z R h(x, t) dR. (1.21)

Exemplo 1.11. Para o problema n˜ao-homogˆeneo      uxx− c−2utt= 1, u(x, 0) = sin x, ut(x, 0) = 0,

a solu¸c˜ao segundo a eq.(1.21) ´e u(x, t) = 1 2(sin (x + ct) + sin (x − ct)) − 1 2 Z ct 0 Z x+ct−τ x−ct+τ 1 dξdτ, onde a integral dupla fornece a ´area do triˆangulo de altura ct e base (x + ct) − (x − ct) = 2ct, ou seja, (1/2)(ct)(2ct) = c2t2,

u(x, t) =1

2(sin (x + ct) + sin (x − ct)) − c2t2

(25)

1.4. O PROBLEMA DE CAUCHY 25

1.4.2 M´etodo de Riemann

O m´etodo de Riemann ´e um procedimento para resolver o pro-blema de Cauchy envolvendo uma EDP hiperb´olica linear, que toma-remos na forma canˆonica

L[u] = uxy+ aux+ buy+ cu = f (x, y),

onde a, b, c s˜ao constantes e x e y s˜ao coordenadas caracter´ısticas visto que a equa¸c˜ao est´a apresentada na forma canˆonica.

A id´eia do m´etodo ´e utilizar uma fun¸c˜ao auxiliar v = v(x, y) satis-fazendo certas propriedades desej´aveis e jogar parte do problema para essa fun¸c˜ao. Seja v ∈ C2. Usando as identidades

vuxy = uvxy+ (vux)y− (uvy)x,

avux= (avu)x− u(av)x,

bvuy = (bvu)y− u(bv)y,

temos

vL[u] = u(vxy− (av)x− (bv)y+ cv)

+ (vux+ bvu)y+ (avu − uvy)x

= uL†[v] + Ux+ Vy,

onde aproveitamos para definir L†, U e V . Com isso podemos usar o teorema de Green e escrever

Z Z D (vL[u] − uL†[v]) dxdy = Z Z D (Ux+ Vy) dxdy = I C (U dy − V dx).

Vamos tomar a curva fechada C como na figura 1.4, onde a curva L n˜ao ´e uma caracter´ıstica. Dessa forma temos

Z Z D (vL[u] − uL†[v]) dxdy = Z R Q (U dy − V dx) + Z P R U dy − Z Q P V dx. Mas Z Q P V dx = Z Q P (vux+ bvu) dx = Z Q P (bv − vx)u dx + uv|QP,

(26)

Figura 1.4: Curva fechada descrita no texto e com isso Z Z D (vL[u] − uL†[v]) dxdy = Z R Q (U dy − V dx) + Z P R u(av − vy) dy + Z Q P

u(bv − vx) dx − uv(Q) + uv(P ).

Nesse ponto vamos explorar a arbitrariedade da fun¸c˜ao auxiliar v. Va-mos escolher essa fun¸c˜ao, chamada fun¸c˜ao de Riemann, de modo que            L†[v] = 0, vx= bv, y = β, vy = av, x = α, v = 1, (x, y) = (α, β). (1.22)

Com essa escolha e lembrando as defini¸c˜oes de U e V segue que u(α, β) = uv(Q)− Z R Q uv(a dy−b dx)+ Z R Q

(vuxdx+uvydy)+

Z Z

D

vf dxdy, onde usamos L[u] = f . Se u e uxs˜ao dados em L, podemos ainda usar

a identidade

uv(R) − uv(Q) = Z R

Q

(27)

1.4. O PROBLEMA DE CAUCHY 27

em uv(Q) na express˜ao para u(α, β) para escrever u(α, β) = uv(R)− Z R Q uv(a dy−b dx)− Z R Q

(uvxdx+vuydy)+

Z Z

D

vf dxdy. Somando as duas express˜oes,

u(α, β) = 1 2(uv(Q) + uv(R)) − Z R Q uv(a dy − b dx) − 1 2 Z R Q u(vxdx − vydy) +1 2 Z R Q v(uxdx − uydy) + Z Z D vf dxdy. (1.23) Essa express˜ao ilustra bem o fato que a solu¸c˜ao no ponto P = (α, β) depende apenas dos dados de Cauchy em L.

Exemplo 1.12. Como exemplo do uso do m´etodo de Riemann, vamos resolver o problema de Cauchy associado com a equa¸c˜ao do telegrafista

     utt+ aut+ bu = c2uxx, u(x, 0) = f (x), ut(x, 0) = g(x).

As caracter´ısticas dessa equa¸c˜ao s˜ao claramente as mesmas da equa¸c˜ao de onda, de modo que, com a mudan¸ca de vari´aveis

ξ = x + ct, η = x − ct, a equa¸c˜ao do telegrafista fica

4c2uξη= acuξ− acuη+ bu.

As condi¸c˜oes iniciais devem agora ser tomadas em ct = (ξ − η) = 0, ou seja, em ξ = η, e ficam

u|ξ=η= f (ξ), (uξ− uη)|ξ=η= c−1g(ξ).

Existe uma forma ainda mais simples para essa EDP. Fazendo a mudan¸ca de vari´avel dependente

u = we−at/2 = we−a(ξ−η)/4c, temos a equa¸c˜ao

(28)

onde κ = (a2− 4b)/16c2. Para essa nova vari´avel as condi¸oes iniciais s˜ao

w|ξ=η= f (ξ), (wξ− wη)|ξ=η = c−1g(ξ) +

ac−1 2 f (ξ). Da eq.(1.22) temos que a fun¸c˜ao de Riemann deve satisfazer

         vξη+ κv = 0, vξ = 0, η = β, vη = 0, ξ = α, v = 1, (ξ, η) = (α, β). ´

E f´acil ver que essa EDP ´e equivalente `a equa¸c˜ao integral v(ξ, η) = 1 + Z ξ α Z η β (−κ)v(σ, ρ) dρdσ.

Vamos procurar pela solu¸c˜ao dessa equa¸c˜ao usando o m´etodo das aproxima¸c˜oes sucessivas, ou seja, construindo uma sequˆencia {vn(ξ, η)}∞n=0segundo

vn+1(ξ, η) = 1 + Z ξ α Z η β (−κ)vn(σ, ρ) dρdσ,

e tomando como primeiro termo da sequˆencia v0= 0. Com isso temos

v1= 1, v2= 1 − κ(ξ − α)(η − β), v2= 1 − κ(ξ − α)(η − β) + κ2 (ξ − α)2 2 (η − β)2 2 , e de uma forma geral (para n ≥ 1)

vn(ξ, η) = n−1 X i=0 (−κ)i((ξ − α)(η − β)) i (i!)2 .

Para n → ∞ e lembrando a defini¸c˜ao das fun¸c˜oes de Bessel temos que v(ξ, η) = J0(2 p κ(ξ − α)(η − β)). Com isso v|ξ=η=τ = J0(2 p κ(τ − α)(ξ − β)), (vξ− vη)|ξ=η=τ = √ κ(α − β) p(τ − α)(τ − β)J 0 0(2 p κ(τ − α)(τ − β)).

(29)

1.4. O PROBLEMA DE CAUCHY 29

O ponto Q ´e a intersec¸c˜ao da reta η = β com a reta L : ξ = η, ou seja, Q = (β, β), e o ponto R ´e a intersec¸c˜ao da reta ξ = α com a reta L = ξ = η, ou seja, R = (α, α). Ent˜ao

u(Q) = f (β), u(R) = f (α). Usando agora a eq.(1.23) e trocando (α, β) por (ξ, η) temos

w(ξ, η) = 1 2(f (ξ) + f (η)) + 1 2c Z ξ η G(ξ, η, τ ) dτ com G(ξ, η; τ ) = − c √ κ(ξ − η) p(τ − ξ)(τ − η)f (τ )J 0 0(2 p κ(τ − ξ)(τ − η)) + J0(2 p κ(τ − ξ)(τ − η))(g(τ ) + (a/2)f (τ )). Voltando para a vari´aveis (u, x, t) temos

u(x, t) =e −at/2 2 (f (x + ct) + f (x − ct)) + e−at/2 2c Z ξ η G(x, t, τ ) dτ, com G(x, t; τ ) = − 2ct √ κ p(τ − x)2− c2t2f (τ )J 0 0(2 p κ((τ − x)2− c2t2)) + J0(2 p κ((τ − x)2− c2t2))(g(τ ) + (a/2)f (τ )),

o que generaliza a solu¸c˜ao de d’Alembert da equa¸c˜ao de onda.

Exemplo 1.13. Vimos que a fun¸c˜ao de Riemann ´e solu¸c˜ao do problema (1.22), que consiste em uma EDP hiperb´olica satisfazendo certas condi¸c˜oes dadas sobre as curvas caracter´ısticas x = α e y = β. Esse ´e um exemplo do chamado problema de Goursat, ou seja, resolver uma EDP hiperb´olica com condi¸c˜oes dadas sobre as curvas caracter´ısticas. No exemplo anterior vimos um m´etodo de solu¸c˜ao usando aproxima¸c˜oes sucessivas. Vamos agora considerar um outro exemplo, que ´e o problema

         y3uxx− yuyy+ uy= 0, −∞ < x < ∞, −∞ < y < ∞, , u(x, y) C 1 = f (x), C1: x + y 2/2 = 4, 2 ≤ x ≤ 4, u(x, y) C 2 = g(x), C2: x − y 2/2 = 0, 0 ≤ x ≤ 2, f (2) = g(2).

(30)

Como B2− 4AC = 4y2 > 0 essa EDP ´e hiperb´olica. Vamos tentar encontrar

suas solu¸c˜oes `a partir da forma canˆonica. A equa¸c˜ao para as caracter´ıstica ´e dy

dx = ± 1 y, cujas solu¸c˜oes s˜ao

x + y2/2 = k1, x − y2/2 = k2.

Definimos ent˜ao as novas coordenadas ξ e η como ξ = x + y2/2, η = x − y2/2.

Logo, as curvas C1e C2correspondem a ξ = 4 e η = 0. Fazendo essa mudan¸ca

de vari´aveis encontramos, ap´os os c´alculos usuais, que a EDP em quest˜ao fica da forma

uξη = 0.

Desse modo u(ξ, η) = φ(ξ) + ψ(η), ou ainda,

u(x, t) = φ(x + y2/2) + ψ(x − y2/2).

Vamos agora exigir que as condi¸c˜oes dadas sejam satisfeitas. Na curva C1

temos x + y2/2 = 4 e x − y2/2 = x − (4 − x) = 2x − 4, de modo que

f (x) = φ(4) + ψ(2x − 4).

Tomando 2x − 4 = α temos f (2 + α/2) = φ(4) + ψ(α) e tomando α = x − y2/2

temos

ψ(x − y2/2) = f (x/2 − y2/4 + 2) − φ(4).

Por outro lado, na curva C2 temos x − y2/2 = 0 e x + y2/2 = x + x = 2x, e

portanto

g(x) = φ(2x) + ψ(0).

Tomando 2x = 4 temos g(β/2) = φ(β) + ψ(0) e para β = x + y2/2 segue

φ(x + y2/2) = g(x/2 + y2/4) − ψ(0). Com isso

u(x, t) = f (x/2 − y2/4 + 2) + g(x/2 + y2/4) − φ(4) − ψ(0). Temos ainda a condi¸c˜ao f (2) = g(2). Das express˜oes para f (x) e g(x) temos

f (2) = φ(4) + ψ(0), g(2) = φ(4) + ψ(0). A solu¸c˜ao do problema ´e portanto

Referências

Documentos relacionados

Address GPS Coordinates Zona Industrial Pintéus Manjoeira..

Esse estudo que avaliou polióis (simples ou em mistura binária), ácidos graxos, substâncias tenso-ativas não-iônicas e compostos orgânicos não-convencionais, que poderiam

Aplicar a teoria de Semigrupos para obter a solu¸c˜ ao de sistemas governados por Equa¸c˜ oes Diferenciais Parciais. Introdu¸

Para mostrar como se distribuíram os pontos obtidos pelo Rui nos cinco jogos iniciou-se a construção de um gráfico circular, no qual já foi desenhado um setor

Em reunião com o presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, desembargador Brasilino Santos Ramos, os coordenadores-gerais do Sindjus-DF Costa Neto e Abdias Trajano,

Na verdade, vós sois santo, ó Deus do univer- so, e tudo o que criastes proclama o vosso louvor, porque, por Jesus Cristo, vosso filho e Senhor nos- so, e pela força do espírito

Paranoicos comportam-se como se o ar estivesse repleto de mensagens codificadas ridicularizando- -os ou conspirando sua destruição. Por décadas o Estado da África do Sul viveu em