• Nenhum resultado encontrado

Data do documento 24 de setembro de 2020

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Data do documento 24 de setembro de 2020"

Copied!
11
0
0

Texto

(1)

Processo 173/20.6YRPRT

Data do documento 24 de setembro de 2020

Relator

Manuel Domingos Fernandes

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Nulidade da sentença por falta de fundamentação > Liquidação em execução de sentença > Limites

SUMÁRIO

I- A nulidade da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando do artigo 607.º, nº 3 do CPCivil que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, razão pela qual só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º.

II- Não cabe ao tribunal beneficiar a parte que não prova os factos constitutivos do seu direito a ser indemnizada, condenando a outra parte, ao abrigo do artigo 609.º, nº 2, do CPCivil, em indemnização no que vier a ser liquidado, quando a mesma só não se mostra liquidada, porque a parte a quem competia, nos termos do disposto no artigo 342.º, nº 1, do CCivil, provar os factos que alegou a esse respeito, não logrou fazê-lo ou, então, porque os alegou deficientemente.

TEXTO INTEGRAL

Processo n.º 173/20.6YRPRT.P1-Apelação

Origem-Centro de Informação, Mediação e Arbitragem de Seguros

Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Miguel Baldaia 2º Adjunto Des. Jorge Seabra 5ª Secção

Sumário:

... ...

(2)

... *

I - RELATÓRIO

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: As partes:

- Reclamante-B… residente na Rua…, .., em …, Vila Verde. - Reclamada- C…, S.A. com sede na Avenida…, nº …, Lisboa. *

A Reclamante recorreu ao Centro de Informação, Mediação Provedoria e Arbitragem de Seguros solicitando a regularização do sinistro no âmbito do contrato de seguro Multirriscos, denominado “C1…”, celebrado com a Reclamada, nos termos da apólice …………, respeitante ao edifício, ocorrido em 27 de Dezembro de 2018, na sua residência, sita na Rua…, .., em …, provocado pela rotura de um cano situado na parede da casa de banho, tendo sido necessário abrir um "roço" na parede da mesma e do quarto junto à casa de banho, do qual resultou a quebra de alguns azulejos da parede, de forma a permitir a pesquisa da avaria. Para o efeito a Reclamante, considerou, que tal sinistro se encontra a coberto da apólice que subscreveu, pelo, que reclamou à Reclamada o pagamento da reparação e substituição do cano, pintura das paredes e reparação das mesmas e a substituição de toda a tijoleira que se encontra na casa de banho, assim como os azulejos do chão da casa de banho que com a obra ficarão danificados, por já não existirem e não se fabricarem no mercado azulejos e tijoleira iguais.

*

Após vistoria, a Reclamada, no relatório de peritagem, confirmou o sinistro e assumiu a responsabilidade do mesmo, enquadrando-o nas coberturas “danos por Água” e “Restauração Estética do Edifício”, tendo pago à Reclamante a quantia de 565,65€ respeitante às coberturas de Localização e Reparação de Avarias e Danos por Água.

A Reclamada não assumiu, no entanto, a substituição integral dos azulejos, assim como a tijoleira do chão, por esta não se encontrar danificada, propondo-se a indemnizar a Reclamante na quantia de 1.888,58€, âmbito da cobertura da apólice contratada “Restauração Estética do Edifício”.

*

Aberta a audiência de julgamento e frustrado ao acordo entre as partes procedeu-se à produção de prova tendo, a final sido proferida decisão que julgou a reclamação parcialmente procedente, condenando a Reclamada a pagar à Reclamante o valor de 3.000,00€ a título de indemnização, resultante da substituição de toda a cerâmica da casa de banho.

*

Não se conformando com o assim decidido, veio a Reclamante interpor recurso rematando as suas conclusões da seguinte forma:

(3)

1.Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos acima identificados, uma vez que, não se conforma a recorrente com o entendimento perfilhado na sentença em crise, no que concerne à condenação da Recorrida no pagamento do montante de €3.000,00 (três mil euros) a título de indemnização, resultante da substituição de toda a cerâmica e loiças da casa de banho, sem que este valor tenha sido fundamentado.

2. Em primeiro lugar, dir-se-á que, entende a Recorrente que a sentença que ora se recorre é nula nos termos do art.° 615.° alínea b) do CPC, por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão tomada.

3. Com efeito, face ao sinistro em causa nos autos, a ora recorrente peticionou a substituição dos azulejos das paredes e do pavimento da casa de banho e a reparação e pintura das paredes de tal divisão e do quarto, demonstrando ser necessário despender a quantia de €8.302,50 com vista a tal substituição/reparação.

4. Entendeu, contudo, o MM Juiz no âmbito da sentença que ora se recorre "julgar a reclamação parcialmente procedente, condenando a reclamada a pagar à Reclamante o valor de €3.000,00, a titulo de indemnização, resultante da substituição de toda a cerâmica da casa de banho", não constando qual o critério utilizado para chegar ao referido valor.

5. Ora, atendendo à causa de pedir e ao pedido formulados nos autos, constata-se que, na sentença da qual ora se recorre, não é feita qualquer referência em sede de fundamentação de facto e de direito, ao motivo pelo qual, não foi considerado o orçamento junto ao autos pela Recorrente, nem o motivo que subjaz e justifica o valor considerado por parte do tribunal recorrido para a condenação da Recorrida. 6. O tribunal recorrido, na prolação da sentença em mérito, pura e simplesmente, não tomou em consideração o orçamento junto aos autos, melhor referenciado na alínea n) da matéria fáctica provada, limitando-se a condenar, de forma arbitrária, a Recorrida a pagar à aqui recorrente um montante de €3.000,00, sem que resulte qualquer fundamentação ou justificação fáctica e/ou legal para a decisão adoptada.

7. Ora, o dever de fundamentar as decisões impõe-se por razões de ordem substancial- cabe ao juiz demonstrar que, da norma geral e abstracta, soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto-e de ordem prática, posto que as partes precisam de conhecer os motivos da decisão a fim de, podendo, a impugnar.

8. O dever de fundamentação das decisões judiciais resulta de imposição constitucional, nos quadros do n.° 1 do art.° 205.° da Constituição da República Portuguesa, densificando-se legalmente, desde logo, no prescrito no art.° 154.° do Cód. De Processo Civil.

9. Tal dever constitucional e legal tem por objectivo a explicitação por parte do julgador acerca dos motivos pelos quais decidiu em determinado sentido, dirimindo determinado litígio que lhe foi colocado, para que os destinatários possam entender as razões da decisão proferida e, caso o entendam, sindicá-la e reagir contra a mesma.

10. Do teor da sentença proferida, não vislumbra a Recorrente a fundamentação e/ou a base legal que norteou o critério adoptado por parte do tribunal recorrido quanto ao montante da condenação da Recorrida, sendo certo que, se encontra documentado junto aos autos o montante devido pela substituição

(4)

dos azulejos das paredes e do pavimento da casa de banho e da reparação dos tectos e paredes do quarto, tal como, aliás, consta da matéria de facto provada-alínea N], tendo ainda, sido produzida prova testemunhal em audiência de discussão e julgamento nesse sentido, a qual, corroborou o orçamento apresentado por parte da Recorrente.

11. Assim, face a tais elementos, no entender da Recorrente, a douta sentença em crise enferma da nulidade prevista na ai. b) do n° 1 do art. 615° do CPC, uma vez que, não especifica quais os fundamentos de facto e de direito que justificaram a sua decisão, devendo por isso, declarar-se nula a sentença em mérito.

12. Acresce que, tal como resulta dos factos provados, na vigência do contrato de seguro contratado, ocorreu um sinistro na habitação da Recorrente que consistiu na rotura do cano da parede da casa de banho.

13. A pesquisa da rotura obrigou à realização de um "roço" na parede da casa de banho e outro na parede do quarto, junto á casa de banho, do qual resultou a quebra de alguns azulejos da parede e chão.

14. Atendendo a esta factualidade, dúvidas inexistem de que ocorreu um evento previsto no contrato de seguro (danos por água) cuja localização/pesquisa e reparação acarretaram estragos em divisões do prédio objecto do contrato seguro e que, a Recorrida assumiu a responsabilidade do sinistro, enquadrando-o nas coberturas contratadas" Pesquisa e Localização de Avarias", Danos por água" e Restauração Estética do Edifício"- cfr Alínea E) da matéria de facto dada como provada.

15. Contudo, não pode a Recorrente concordar com o montante indemnizatório fixado pelo Tribunal Recorrido no que concerne ao sinistro em mérito.

16. Tal como resulta dos autos e já se referiu supra, a recorrente reclama da Recorrida a condenação no pagamento do montante de €8.302,50 por conta da substituição dos azulejos das paredes, do chão da casa de banho e reparação e pintura dos tectos e paredes do quarto, sendo certo que se impõe a substituição total do material cerâmico pois já não existe igual no mercado para substituir os danificados.

17. Contudo, o Tribunal recorrido, à luz da factualidade em causa nos autos considerou que a Recorrida está obrigada a substituir todas as cerâmicas da casa de banho, azulejos das paredes, tijoleiras do chão e respectivas loiças, condenando a Recorrida a pagar o montante de €3.000,00 para que ocorra tal substituição, o que não se pode aceitar.

18. Em primeiro lugar, pelas razões supra expostas, ou seja, não se retira da fundamentação da sentença proferida qual o critério adoptado por parte do MM. Juiz para alcançar tal valor, sendo a referida condenação completamente arbitrária e ausente de factualismo legal.

19. Em segundo lugar, atento o facto de tal montante se afigurar manifestamente insuficiente para que a Recorrente possa levar a cabo todas as reparações necessárias efetuar no local segurado, as quais, aliás, constam da matéria de facto dada provada na sentença ora recorrida.

20. Tal como decorre da alínea N.° dos factos provados da sentença, encontra-se junto aos autos um orçamento no montante de €8.302,50 respeitante à substituição dos azulejos das paredes, chão da casa de banho e reparação e pintura dos tectos e paredes do quarto.

21. Tal orçamento foi corroborado em audiência de discussão e julgamento pela testemunha D…, responsável pela sua elaboração e conhecedor da extensão da reparação necessária efectuar no local

(5)

segurado, pelo que, não se afigura viável a solução adoptada por parte do Tribunal recorrido ao determinar o pagamento somente da quantia de €3.000,00 a título de valor global devido pela reparação a suportar pela Recorrida.

22. Tal montante não se afigura suficiente para a Recorrente proceder à substituição dos azulejos e pavimento da casa de banho, bem como, para a reparação e pintura dos tectos e paredes do quarto. 23. Aliás, se atentarmos no orçamento junto aos autos pela Recorrida como doc. n.° 3, o qual, apresenta o montante de €8.888,58, constata-se que, no mesmo apenas é contemplado o custo devido com a substituição dos azulejos da parede do wc e a pintura do tecto e parede do quarto, sem incluir o valor de IVA que ascende a 434,37€ e perfaz tudo 2.322,5€.

24. Ora, não são apenas esses os trabalhos necessários realizar por parte da Recorrente no local segurado, uma vez que, nos termos da matéria de facto dada como provada, tem a mesma que proceder à substituição de todo o material cerâmico, composto pelos azulejos das paredes, tijoleiras do chão, loiças e a reparação de paredes e tectos.

25. Ao atentarmos no orçamento junto aos autos como doc. n.° 5 pela Recorrente, constata-se da necessidade de realizar vários trabalhos no local segurado, designadamente, retirar todas as loiças existentes na casa de banho, partir todo o pavimento e paredes de tal divisão, proceder à reconstrução de todo o piso e paredes e o fornecimento e recolocação de tijoleiras e azulejos novos na referida divisão e das loiças.

26. Assim, não é de todo aceitável que, tendo o tribunal considerado que "é legítima a pretensão da Reclamante na substituição de todas as cerâmicas da casa de banho", e atendendo aos orçamentos juntos aos autos pela Recorrente e pela Recorrida, tenha apenas considerado atribuir á Recorrente a título indemnizatório o montante de €3.000,00, o qual é manifestamente insuficiente para os trabalhos em questão.

27. Confrontando os dois orçamentos juntos aos autos, verifica-se, desde logo, que, o orçamento apresentado pela Recorrida contempla apenas os trabalhos de substituição de azulejos e pintura de paredes, sem que aí esteja prevista a substituição do pavimento do wc.

28. Para substituir o pavimento do wc no local segurado, a Recorrente terá que partir o piso existente, destruir as loiças colocadas e proceder à sua substituição por outras, o que acarreta naturalmente custos que não estão contabilizados no orçamento da recorrida e não se compaginam com o montante indemnizatório atribuído por parte do tribunal recorrido.

29. Não obstante e sem prescindir, a entender que não ficou suficientemente demonstrada a extensão dos danos sofridos pela Recorrente, deveria o tribunal recorrido ter relegado os mesmos para execução de sentença.

30. Na verdade, a considerar não ter elementos de facto concretos para determinar o valor da indemnização a pagar à Recorrente, sempre deveria o tribunal recorrido ter relegado o apuramento do seu valor para execução de sentença.

31. Em face do exposto, sempre se mostrará bem fundada a pretensão da Recorrente, devendo revogar-se a douta sentença em mérito.

(6)

seguintes do Código Civil e o disposto no artigo 1do Regime Jurídico do Contrato de Seguro previsto no DL n.° 72/2008 de 16 de Abril.

*

Devidamente notificada contra-alegou a reclamada concluindo pelo não provimento do recurso. *

Corridos os vistos legais cumpre decidir. *

II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.

*

No seguimento desta orientação são as seguintes as questões que importa apreciar:

a) - saber se a decisão proferida padece, ou não, da nulidade que lhe vem assacada; b) saber se o montante indemnizatório fixado pelo tribunal recorrido é, ou não, o correcto. *

A) -FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos:

A. A Reclamante celebrou com a Reclamada um contrato de seguros Multirriscos Habitação, denominado de “C1…”, titulado pela apólice ………., referente ao edifício, cujo local de risco se situa na Rua…, .. em …. B. Este contrato contempla, designadamente a cobertura de “Danos por água” e “Restauração Estética do Edifício”

C. No dia 27 de Dezembro de 2018 ocorreu um sinistro na habitação da Reclamada que consistiu na rotura do cano da parede da casa de banho.

D. A pesquisa da rotura obrigou à realização de um "roço" na parede da casa de banho e outro na parede do quarto, junto á casa de banho, do qual, resultou a quebra de alguns azulejos da parede.

E. A Reclamada assumiu a responsabilidade do sinistro, enquadrando-o nas coberturas contratadas “Pesquisa e Localização de Avarias”, “Danos por água” e “Restauração Estética do Edifício”.

F. A Reclamada pagou à reclamante a quantia de €565,65 respeitante às coberturas de localização e reparação de avarias e danos por água.

G. Nomeadamente a reparação e pintura da parede do quarto.

H. A Reclamada propôs-se pagar à Reclamada a substituição dos azulejos de parede e pintura do tecto e parede do quarto, apresentando o valor de €1.888,58 a título de indemnização, no âmbito da cobertura "Restauração Estética do Edifício.

(7)

I. No mercado já não existem azulejos iguais aos da casa de banho da Reclamante.

J. Para a obra de substituição dos azulejos, que obriga ao levantamento de todas as loiças sanitárias, a tijoleira do pavimento ficará danificada.

K. Esta mesma, também, já não se fabrica no mercado.

L. A Reclamante pretende a substituição dos azulejos e pavimento da casa de banho e reparação e pintura das paredes da mesma e do quarto.

M. A cobertura “Restauração Estética do Edifício” tem como limite de capital, para efeitos de indemnização o valor de 12.000,00€.

N. A Reclamante peticiona a quantia de 8.302,50€, respeitante à substituição dos azulejos e pavimento da casa de banho e reparação e pintura dos tectos e paredes do quarto, conforme orçamento, junto aos autos. *

III- O DIREITO

Como supra se referiu a primeira questão que importa apreciar e decidir consiste em:

a) - saber se a decisão proferida padece, ou não, da nulidade que lhe vem assacada.

Nas conclusão 1ª a 11ª refere a recorrente que a sentença recorrida padece da nulidade da al. b) do nº 1 do artigo 615.º.

Estriba esta conclusão, essencialmente, na circunstância de que na sentença não é feita qualquer referência em sede de fundamentação de facto e de direito, ao motivo pelo qual, não foi considerado o orçamento junto ao autos pela Recorrente, nem o motivo que subjaz e justifica o valor considerado por parte do tribunal recorrido para a condenação da Recorrida.

Nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 615.º a sentença é nula “quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.

A nulidade da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando do artigo 607.º, nº 3 que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.

Como é entendimento pacífico da doutrina, só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e/ou de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º.

A fundamentação deficiente, medíocre ou errada afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.[1]

Ora, para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e os não coloque na base da decisão[2], coisa que, manifestamente, no caso em apreço não acontece, pois que, na decisão estão descriminados os factos e nela foram aplicadas as normas jurídicas correspondentes.

Portanto, ao contrário do que afirma as recorrentes, a sentença recorrida não enferma da nulidade que lhe vem assacada e constante da alínea b) do nº 1 do artigo 615.º

Todavia, diferente deste vício, é a falta de fundamentação da decisão da matéria de facto. Como estatui o artigo 607.º, nº 3

(8)

“1. (…) 2. (…) 3. (…)

4. Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.

5 (…) 6 (…)”

Resulta deste normativo que a motivação não pode nem deve ser meramente formal, tabelar ou formatada, antes devendo expressar as verdadeiras razões que conduziram à decisão no culminar da audiência de discussão e julgamento.

O juízo probatório é a decisão judicativa pela qual se julgam provados ou não provados os factos relevantes, controvertidos e carecidos de prova, mediante a livre valoração dos meios probatórios apresentados pelas partes ou determinados oficiosamente.

Como refere Teixeira de Sousa “o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente”.[3]

Anote-se ainda o que diz Lebre de Freitas, para quem “o tribunal deve, por exemplo, explicitar porque acreditou em determinada testemunha e não em outra, porque se afastou das conclusões dum relatório pericial para se aproximar das de outro, por que razão o depoimento de uma testemunha com qualificações técnicas o convenceu mais do que um relatório pericial divergente ou por que é que, não obstante vários depoimentos produzidos sobre certo facto, não se convenceu de que ele se tivesse realmente verificado”[4].

Ou o que, também a este respeito, escreve Lopes do Rego quando refere que o juiz deve proceder à indicação dos fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, com especificação dos meios de prova e das razões ou motivos substanciais por que relevaram ou obtiveram credibilidade.[5]

Neste contexto, impondo-se, de acordo com as circunstâncias do caso concreto, que se estabeleça o fio condutor entre os meios de prova usados na aquisição da convicção (fundamentos) e a decisão da matéria de facto (resultado), fazendo a apreciação crítica daqueles, nos seus aspectos mais relevantes, a decisão encontrar-se-á viciada quando não forem observadas as regras contidas no artigo 607.º, nº 3.[6]

Todavia, apesar do juiz dever efectuar o exame crítico das provas respectivas não é falta de tal exame que basta para preencher a nulidade prevista na al. b) do artigo 615.º, essa só se verifica nos termos atrás referidos.

(9)

Por sua vez a falta de motivação no julgamento da matéria de facto determina a remessa do processo ao tribunal da 1ª instância, nas circunstâncias previstas no artigo 662.º, nº 2 al. d) ou a anulação do julgamento, ao abrigo da alínea c) do mesmo normativo, ou seja, o vício também não gera, por isso, a nulidade da decisão.

Não obstante, não se poderá dizer que, ao contrário do que defende a apelantes, a decisão exarada pelo tribunal recorrido, sobre o julgamento da matéria de facto, não esteja fundamentada e que a mesma não tenha feito a análise crítica da prova.

De facto, basta lê-la para ver que assim não é.

Com efeito, o tribunal recorrido depois de ter enumerado os meios de prova que valorou, documental e testemunhal, discorreu do seguinte modo:

“Na verdade, o orçamento apresentado pela Reclamante, que determinou o valor do pedido apresenta-se com pouca clareza e rigor, nomeadamente, não discrimina quantidade nem valor unitário dos azulejos, mão-de-obra utilizada e valores da mesma, não sendo capaz a Reclamante, na prova produzida, de descriminar tais valores-a testemunha, D…, responsável pelo orçamento não esclareceu o Tribunal destas dúvidas. Por sua vez, o depoimento da testemunha da Reclamada, Engenheira E…, na qualidade de perita e responsável pelo relatório de peritagem, quanto a esta matéria foi mais rigoroso, considerando o Tribunal exagerado o valor do orçamento apresentado pela Reclamante”.

Poder-se-á dizer-se que tal apreciação crítica é escassa e dela discordar-se, não pode é afirmar-se que ela está ausente da decisão recorrida.

*

Improcedem, desta forma, as conclusões 1ª a 11ª formuladas pela recorrente. *

A segunda questão colocada no recurso prende-se com:

b) saber se o montante indemnizatório fixado pelo tribunal recorrido é, ou não, o correcto.

Como se evidencia da decisão recorrida nela não foi valorizado o orçamento apresentado pela apelante para reparação dos danos sofridos e, salvo, o devido respeito, pensamos que bem.

Na verdade, em bom rigor, o documento nº 16 junto com a petição não se pode considerar um orçamento. Efectivamente, limita-se a discriminar, de forma sucinta, os trabalhos que é necessário realizar sem que de forma detalhada indique as quantidades de material necessário e o seu valor, a mão de obra e respectivo custo, ou seja, e numa palavra, trata-se de um orçamento em que pouco mais se indica do que um mero valor.

E repare-se que, tal como se refere na decisão recorrida, nem quem elaborou tal orçamento-a testemunha D…-foi capaz de esclarecer as dúvidas posta pelo tribunal em relação a tal documento.

Evidentemente, que tal orçamento contrasta em absoluto com a peritagem (orçamento) apresentado pela recorrida.

(10)

Desta forma considerando o tribunal que era legitima a pretensão da apelante na substituição de todas as cerâmicas da casa de banho, coisa que o orçamento da recorrida não contemplava, concluiu que o valor de € 3.000,00 era o justo para a reparação dos danos na casa de banho.

É claro que tal valor foi fixado, como se infere da decisão recorrida, pelo recurso à equidade (cfr. artigo 566.º, nº 3 do CCivil) tendo como referência o orçamento/peritagem apresentado pela recorrida.

Sob este conspecto alega a apelante que se não ficou suficientemente demonstrada a extensão dos danos sofridos deveria o tribunal recorrido ter relegado os mesmos para execução de sentença, sugerindo a aplicação da norma do artigo 609.º, nº 2 do CPCivil.

Como é sabido a liquidação em execução de sentença visa a economia processual relacionada com o tempo dos factos e o tempo da decisão. Se no momento da decisão os danos existentes não estão quantificáveis porque circunstâncias várias só permitem a sua quantificação em momento posterior, aí justifica-se a sua liquidação em execução de sentença.

Se tais danos, apenas, não estão quantificáveis por inércia da parte a quem competia a sua prova não se justifica a liquidação em execução de sentença.

Não cabe ao tribunal beneficiar a parte que não prova os factos constitutivos do seu direito a ser indemnizada, condenando a outra parte, ao abrigo do artigo 609.º, nº 2, do CPCivil, em indemnização no que vier a ser liquidado, quando a mesma só não se mostra liquidada, porque a parte a quem competia, nos termos do disposto no artigo 342.º, nº 1, do CCivil, provar os factos que alegou a esse respeito, não logrou fazê-lo, por ter alegado deficientemente os factos ou não ter conseguido prová-los.

Sob pena de se violarem as regras processuais, a condenação no que vier a ser liquidado, deve ser arredada de todas as situações em que a parte alega, e tendo oportunidade de provar, os factos necessários à procedência do seu direito, não logra prová-los ou, como acontece no caso, porque os alegou deficientemente.

A condenação no que viesse a ser liquidado, apenas, poderia ocorrer se a apelante por desconhecimento não tivesse alegado e provado quais as consequências do facto ilícito, imputado à apelada, mas não pode decretar-se quando ela não conseguiu provar, porque não alegou, essas consequências apesar de já as conhecer.

*

Improcedem, desta forma, todas as restantes conclusões formuladas pela apelante e, com elas, o respectivo recurso.

*

V- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta improcedente por não provada e, consequentemente, confirmar a decisão recorrida.

(11)

Custas pela apelante (artigo 527.º, nº 1 do CPCivil). *

Porto, 24 de Setembro de 2020. Manuel Domingos Fernandes Miguel Baldaia de Morais Jorge Seabra

____________

[1] Neste sentido, ver Alberto dos Reis, CPC Anotado, V, 140 e Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, pág. 669.

[2] Cfr. Antunes Varela, obra citada pág. 670. [3] Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 348. [4] CPC Anot., vol. II, pág. 628.

[5] Comentários ao C.P.Civil, pág. 434.

[6] Cfr. Lebre de Freitas, CPC Anot., vol. II, pág. 628.

Referências

Documentos relacionados

As metodologias empregadas para a análise de malwares são duas: a metodologia de análise dinâmica, onde são empregadas várias ferramentas capazes de executar o arquivo malicioso de

A prevalência global de enteroparasitoses foi de 36,6% (34 crianças com resultado positivo para um ou mais parasitos), ocorrendo quatro casos de biparasitismo, sendo que ,em

Parágrafo segundo – Não ocorrendo a citada homologação por responsabilidade do SESI-SP, em até 30 (trinta) dias após o prazo máximo para o pagamento das

Esta pesquisa discorre de uma situação pontual recorrente de um processo produtivo, onde se verifica as técnicas padronizadas e estudo dos indicadores em uma observação sistêmica

No código abaixo, foi atribuída a string “power” à variável do tipo string my_probe, que será usada como sonda para busca na string atribuída à variável my_string.. O

Os instrutores tiveram oportunidade de interagir com os vídeos, e a apreciação que recolhemos foi sobretudo sobre a percepção da utilidade que estes atribuem aos vídeos, bem como

Ficou com a impressão de estar na presença de um compositor ( Clique aqui para introduzir texto. ), de um guitarrista ( Clique aqui para introduzir texto. ), de um director

No capítulo 1 são clarificados conceitos-chave essenciais à contextualização do estudo efectuado, destacando autores como Conceição Lopes, John Thompson, Mcluhan, Sara Pereira e