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Liberdade para Aprender1

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Academic year: 2021

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Editorial

Liberdade para Aprender

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Tudo pode ser tomado de um homem, menos uma coisa: a última das liberdades humanas – a de escolher a sua própria atitude, sob qualquer das circunstâncias dadas, a de escolher o seu próprio caminho.

Viktor Frankl (1959)2

esta edição, de nº 40, voltamos a um tema que se destaca no panorama atual: a formação ao longo da vida - integral, livre, democrática!

O contexto do nosso trabalho é a Gerontologia Social, que pressupõe atitude interdisciplinar (Fazenda, 2001) de abertura frente às diferentes áreas do saber, que fazem interface ao abordar o tema envelhecimento e longevidade. Cada disciplina tem um saber que lhe é próprio, fundamental ao aprofundamento no desenvolvimento de pesquisas e ações profissionais. Mas, quando abordamos os temas envelhecimento e longevidade temos como foco

1 Este título foi inspirado pelo livro homônimo de Carl Roger (1973) 2 In ROGER, C. R. Liberdade para Aprender.

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o indivíduo único, em sua complexidade e subjetividade. Os termos utilizados, genericamente, levam a pressupor uma unidade ou uniformidade nos estudos e práticas gerontológicas, o que pode “mascarar” a realidade.

Evidente que os estudos que apontam a mudança no perfil demográfico, os avanços nas áreas da saúde e social são bases seguras relativas às tendências de longevidade, qualidade de vida e inserção cultural para essa população e, de modo indispensável, subsidiando a formulação de políticas adequadas ao contexto.

Trazemos aos leitores da Revista Portal de Divulgação de nº 40, um conjunto de artigos que nos apresenta a diversidade de abordagens e ações, entrecruzando disciplinas diversas, que não se sobrepõe, mas se completam. São exemplos dos vários caminhos que indicam estudos, reflexões, análises e práticas, e mais: abrem a possibilidade para autores iniciantes que ensaiam suas primeiras comunicações sistematizadas.

O leitor observará - dos passos iniciais aos estudos consolidados – os desafios que a sistematização de ideias e a escrita, baseada em pesquisa bibliográfica e na prática, as múltiplas possibilidades construtivas desse fantástico percurso da construção do saber. A divulgação desse material se faz no Portal do Envelhecimento e, nele, na Revista Portal de Divulgação, por meio eletrônico e de acesso livre.

Segundo Mariotti (1999) a palavra livre, criadora e comprometida com seu significado profundo, se insere na busca do conhecimento dirigido a uma vida plena. A liberdade, neste sentido, não é a ausência de disciplina e regras mínimas, mas a de veicular informação na busca do “bem” comum, que pressupõe o “êxito de nossa integração social” (Savater, 1998).

Assim, acreditamos que a “liberdade de aprender” se torna realidade ao divulgar conteúdos para a reflexão social sobre os temas que envolvem, entre outros, a longevidade humana.

Os saberes formais, estabelecidos, e academicamente referendados, são nossas bases, mas ousamos abrir espaços para as múltiplas vozes que compõe e formam um saber ampliado e coletivo.

“Liberdade para aprender” pressupõe uma atitude de escolha - a última das

liberdades humanas - dos assuntos que nos motivam a refletir, a subsidiar

práticas profissionais, e formar um olhar crítico à realidade. Este é o caminho para um desenvolvimento que ultrapasse as marcas etárias e, consequentemente, os preconceitos vários que ainda fazem parte da nossa cultura.

O artigo que abre esta edição é Transição demográfica, transição da estrutura

etária e envelhecimento, apresentando o clássico e necessário panorama para

nossos estudos. Com dados recentes, de modo claro e objetivo, nos fornece “o mapa” da realidade na qual atuamos e os desafios que se colocam no futuro.

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O que esses números nos falam? Quais as escolhas a serem feitas ante estes dados? Delas depende a qualidade de vida que todos, crianças, jovens e velhos, teremos ao longo da vida. Acreditamos que a divulgação promotora da conscientização sobre a realidade, papel da mídia aberta, deva ser geradora de ações sociopolíticas fundamentais nesse processo.

Entre índices e previsões estatísticas, tão necessárias, pode surgir uma velhice genérica e despersonalizada, mas de que “velho” falamos?

Do panorama geral a ação, articulação imprescindível, apresentamos os demais artigos que compõem esta edição, como Noções básicas de cirurgia

oral para o idoso, que aborda um tema já clássico nas nossas publicações: a

odontogeriatria.

Nele temos uma descrição minuciosa e extremamente didática dos diferentes problemas e as soluções que se apresentam ao profissional da área, destacando a ênfase dada pelo autor, ao cuidado com o bem estar do idoso a ser atendido.

Este aspecto do cuidado humanizado surge também em O ambiente domiciliar

e seus riscos de queda em idosos, no qual a autora destaca a importância das

atividades favorecedoras da prevenção de queda. O estudo, realizado em João Pessoa (2012), mapeia e destaca a atenção necessária, por parte dos familiares, profissionais do cuidar e também dos idosos, para o ambiente domiciliar, e das verdadeiras “armadilhas” que um lugar, aparentemente seguro e familiar, escondem. Reafirma a importância das atividades físicas e de lazer como coadjuvantes, pois os exercícios fortalecem a musculatura, melhoram a propriocepção e aumentam a flexibilidade, além de serem estimulantes para convívio social e redução de estresse.

Atividade Física no processo de envelhecimento se articula e complementa a

reflexão proposta, reafirmando que as práticas das atividades físicas contribuem “na melhoria das capacidades funcionais e saúde mental, retardando o processo de envelhecimento visando uma longevidade com qualidade, favorecendo de forma positiva a vida de qualquer indivíduo”.

Quando abordamos a temática gerontológica um cuidado deve ser tomado: - como indicado no início deste Editorial - não podemos generalizar quando o assunto envolve o desenvolvimento humano em seu ciclo vital. Não existe uma velhice ou idoso genérico. Cada indivíduo vive a vida e o envelhecimento de maneira única e, neste contexto, contemplamos as diferenças de gênero. Homens e mulheres, além das diferenças biológicas, se diferenciam em inúmeros aspectos, incluindo os modos de viver e envelhecer.

No artigo Idade do Lobo as autoras destacam o papel, ainda estereotipado, da figura masculina como o “macho provedor” utilizando como metáfora a figura do lobo. Este quando jovem é veloz, e vai a “caça”, seja de alimento ou da fêmea, com sucesso. Mas, quando fica velho o lobo se isola, sai da alcateia, e

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passa a viver só. Ainda é muito utilizada a expressão para homens que, especialmente na meia idade, retornam “à caça” em busca de mulheres mais jovens, no que, de certa forma, poderia ser afirmação de masculinidade e potência. Seria esta uma metáfora adequada ao ciclo de vida masculino? Assunto complexo que merece sempre novos estudos.

Apesar das muitas mudanças sociais, a crescente exposição do tema envelhecimento populacional, e a importância deste contingente como “capital social”, sua valorização caminha a passos lentos. As atividades intergeracionais têm sido incentivadas e valorizadas indicando a necessidade da manutenção dos vínculos familiares, mesmo considerando as mudanças da estrutura familiar atual, entre as diferentes e muitas gerações que passaram a conviver, graças à longevidade.

Os avós, e outros idosos, podem proporcionar às crianças e jovens um espaço de convívio rico em afeto e solidariedade, um contraponto a aceleração do tempo e as mudanças no seio da parentalidade, movimento que se faz,

felizmente, presente em algumas escolas de educação infantil3. Experiência na

qual se apoia a esperança do desenvolvimento de uma cultura da longevidade: uma sociedade para todos em todas as idades da vida.

Neste contexto, a sensibilização para os temas que envolvem diferentes aspectos do viver e envelhecer tem no cinema uma grande aliada. Hoje os filmes, longas, curtas e de animação, são utilizados como introdução à reflexão de modo mais “informal”, seja entre profissionais, idosos e, muitas vezes, unindo os dois públicos. Em alguns minutos – caso dos curtas metragens – várias situações são mostradas de forma compacta e atraente. Nossa experiência atesta o valor dessas atividades como “portas e janelas” que se abrem para um mundo (des) conhecido, e do qual participamos. O cinema tem o poder de “compactar emoções”, proporcionando um debate ampliado sobre diferentes temas.

O cinema é o espelho no qual “mergulhamos” em busca de nossa imagem, em tempo e espaço definido, cujos desdobramentos reflexivos são de incrível riqueza, como constatamos no artigo A Lenda dos Guardiões. Laços familiares,

amizade e a sabedoria dos idosos, que nos apresenta o filme de animação do

mesmo nome (Legend of the Guardians: The Owls of Ga'Hoole, 2010) no qual se entrelaçam aventura, ação e emoção com exuberante visual criado por computação gráfica.

Seu tema de fundo é a importância da sabedoria dos “mais experientes” do grupo (usando como metáfora, no caso, uma família de corujas). Como afirmam as autoras os laços familiares não se apoiam apenas na biologia comum “mas pelos significantes que criam os elos de sentido nas relações, sem os quais elas se esfacelam, pela perda, ou inexistência, de sentido”.

3 Ver Entre avós e netos – convívio e afeto. Por Vera Brandão. Disponível em

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As narrativas familiares quando internalizadas consolidam valores, crenças, costumes - a cultura familiar – sobre a qual se afirma a identidade e o sentindo de pertencimento, assunto retomado em Laços Familiares e Memória nos

Idosos, que aponta a importância da escuta e compartilhamento das suas

narrativas focando, neste caso, a humanização no contexto de vida institucionalizada. A autora cita Candau (2011): “Transmitir uma memória e fazer viver, assim, uma identidade não consiste, portanto, em apenas legar algo, e sim uma maneira de estar no mundo”.

Nesta perspectiva o artigo O papel do cuidador na preservação da memória do

idoso, indica a importância da escuta do cuidador como parte de atividades que

minimizem as perdas, incentivem e celebrem as narrativas. Baseada em depoimentos espontâneos de idosos, entre 68 a 88 anos participantes de uma Oficina de Memória, o trabalho indica como o discurso do cuidador, a respeito dos “esquecimentos”, pode afetar de forma negativa a autopercepção que o idoso tem de sua memória e de sua capacidade funcional. Após os bons resultados da intervenção a autora afirma que “o cuidador pode constituir-se interlocutor privilegiado na construção de uma ideia positiva acerca da memória do idoso o que, certamente, contribui para o melhor desempenho da mesma”. Na nossa experiência, nas atividades propostas aos idosos abordando o tema memória a primeira pergunta é: - Você vai falar sobre Alzheimer? Ah! Estou tão

esquecida...Tenho tanto medo! À medida que o trabalho avança percebemos

que, gradativamente, por meio das atividades propostas os participantes parecem “acordar” e relatam, confirmando o estudo acima, a melhora da capacidade de lembrar fatos recentes e relatar os do passado, que se retroalimentam. Evidente que essas intervenções não se propõem como prevenção a temida doença, mas estudos demostram que para pacientes no estágio inicial, e mesmo intermediário, as estratégias mnemônicas de ativação cerebral podem propiciar sentimentos de bem estar subjetivo o que, a nosso ver, é também importante na manutenção da autoestima e saúde para idosos que não tem essas patologias.

A busca de uma saída, ante a sensação da “perda de si”, causada pelos transtornos da memória, é abordada, metaforicamente de forma magistral, por Clarice Lispector no conto “A procura de uma dignidade” - da obra Laços de família (1960) - base para a discussão proposta no artigo Perspectiva simbólica

para a velhice: saída do estádio, com base na psicologia existencial. Quando

existe a perda referencial da Imagem na velhice, a sensação de “estar perdida, sem saída” pode ser um sinal a ser considerado por familiares e cuidadores. No conto a metáfora para esta “constatação” da velhice é a busca incessante de uma porta de saída (no caso do estádio do Maracanã) e a sensação e assim é descrita:

Ali estava, presa ao desejo fora de estação assim como o dia de verão em pleno inverno. Presa no emaranhado dos corredores do Maracanã. Presa ao segredo mortal das velhas. Só que ela não estava habituada a ter quase 70

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anos, faltava-lhe prática e não tinha a menor experiência. (1960, p. 60)

Sem saída, quase sem lembranças, perdida na realidade que a cerca. Assim sentimos o paciente de Alzheimer, como no relato da filha cuidadora em Diário

de Sempre Viva. Mudanças e caminhos no enfretamento do Alzheimer II,

elaborado e postado em seu blog no ano de 2013.

Apesar do avanço da enfermidade, o carinho da filha e o bom uso das memorias autobiográficas - de longa duração e que se “apagam” lentamente – são um comovente exemplo no enfretamento deste estágio avançado de fragilidade vivida pelo idoso e, consequentemente, por sua família.

Em meio a essa situação, ela sorri quando eu relembro fatos, que ela me descreveu anteriormente, relacionados com os seus familiares: pais e irmãos. Alegra-se quando lembrada das fugas que faziam (todos os irmãos) quando o seu pai alertava, em italiano, que era para fugir, pois a mama vinha ao encalço deles. Também, quando entoo canções que ela cantava quando eu era criança. Quando menciona estar com medo, rezamos e, com calma, ela relaxa e se aquieta até a próxima crise. Então, concluo que, até para os cuidados, temos que ter bom senso, para garantir a vida com um padrão mínimo de qualidade! E que eu encontre sempre razões para seguir na minha saga de cuidadora da minha mãe.

Nesta edição apresentamos um Dossiê, contendo quatro artigos, elaborados por alunas de mestrado em Gerontologia – PUC-SP – na disciplina semestral A

família e o idoso, ministrado pela prof.ª Dra. Ruth Gelehrter da Costa Lopes.

Neles, parte da avaliação final, os alunos devem utilizar os subsídios fornecidos pela disciplina, nos temas trabalhados durante o semestre letivo. A escrita normatizada tem como objetivo estimular a reflexão conjunta, aprimorar as análises, e incentivar a reflexão e escrita crítica na perspectiva acadêmica, na qual se insere a disciplina.

Este é um exemplo do que afirmamos no início: devemos nos apropriar de nosso conhecimento e, para tal, exercemos a livre escolha e a liberdade para aprender. Mesmo no contexto institucional, como neste caso, podemos observar a escolha individual em diferentes instâncias: do mestrado em gerontologia; da disciplina e, nela, das perspectivas que mais interessaram e tocaram a cada uma das mestrandas e, dentre estas, as que de forma coerente com os princípios formativos partilham conosco suas reflexões.

Os temas variados se entrelaçam, entre si e no contexto geral desta edição, formando um dossiê compacto, mas instigante e nele podemos vislumbrar o amplo campo que se abre na perspectiva da Gerontologia Social. São eles:

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• Rede de Suporte Social na Velhice: para além da família e dos amigos; • Programas Intergeracionais no Brasil: revisão bibliográfica;

• A Procura da mãe: expressões de demência no processo de

envelhecimento. Um estudo de caso.

Como enfatizamos no início deste editorial, para fazermos escolhas precisamos de dados reais e liberdade para aprender, conhecendo e refletindo, base para ação. Ante tantas indefinições relativas aos direitos e deveres de cada um, bases da vida social, as relativas aos direitos dos idosos ainda se confronta, apesar da jurisprudência estabelecida, com inúmeros “atalhos” à sua aplicação. Um exemplo real da possibilidade de ação efetiva, de modo a indicar a força de conhecimento gerador de ação, fecha a edição com os comentários expostos em Impossibilidade de reajuste por mudança de faixa etária de consumidor

idoso em contrato de plano de saúde.

Esperamos que a seleção dos artigos propostos seja interessante, intrigante, instigante, e que traga uma “leitura de saberes” nas possibilidades da produção dos conhecimentos que apontam, e despertem o desejo e a liberdade de aprender e buscar mudanças necessárias, renovando as esperanças e base de ações por uma sociedade justa e igualitária entre todos, para todos.

Referências

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. Interdisciplinaridade: História, Teoria e Pesquisa. São Paulo. Papirus, 2001.

MARIOTTI, H. Organizações de Aprendizagem. São Paulo: Ed. Atlas, 1999, ( 2ª edição)

ROGER, C. R. Liberdade para Aprender. Belo Horizonte M.G: InterLivros, 1973 SAVATER, F. O Valor de Educar. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

Boa Leitura!

Beltrina Côrte e Vera Brandão Editoras

Referências

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