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Análise expandida da atuação dos burocratas de nível de rua na implementação do programa de aquisição de alimentos em universidades federais

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO

Rafael Junior dos Santos Figueiredo Salgado

ANÁLISE EXPANDIDA DA ATUAÇÃO DOS BUROCRATAS DE NÍVEL DE RUA NA IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS EM

UNIVERSIDADES FEDERAIS

Natal – RN 2020

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RAFAEL JUNIOR DOS SANTOS FIGUEIREDO SALGADO

ANÁLISE EXPANDIDA DA ATUAÇÃO DOS BUROCRATAS DE NÍVEL DE RUA NA IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS EM

UNIVERSIDADES FEDERAIS

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do título de Doutor em Administração, na área de Gestão Social e Políticas Públicas.

Orientador: Washington José de Souza, Dr.

Natal – RN 2020

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RAFAEL JUNIOR DOS SANTOS FIGUEIREDO SALGADO

ANÁLISE EXPANDIDA DA ATUAÇÃO DOS BUROCRATAS DE NÍVEL DE RUA NA IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS EM

UNIVERSIDADES FEDERAIS

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do título de Doutor em Administração, na área de Gestão Social e Políticas Públicas.

Natal, 3 de julho de 2020.

Washington José de Souza, Dr. Presidente da Banca Examinadora

Marco Aurélio Marques Ferreira, Dr.

Examinador externo – Universidade Federal de Viçosa

Anatália Saraiva Martins Ramos, D.Sc.

Examinador interno – Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Mauro Lemuel de Oliveira Alexandre, D.Sc.

Examinador interno – Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Eugênio Ávila Pedroso, Dr.

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas – CCSA

Salgado, Rafael Junior dos Santos Figueiredo.

Análise expandida da atuação dos Burocratas de Nível de Rua na implementação do Programa de Aquisição de Alimentos em

Universidades Federais / Rafael Junior dos Santos Figueiredo Salgado. - Natal, 2020.

199f.: il.

Tese (Doutorado em Administração) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Programa de Pós-Graduação em Administração. Natal, RN, 2020. Orientador: Prof. Dr. Washington José de Sousa.

1. Programa de Aquisição de Alimentos - Tese. 2. Relações Intergovernamentais - Tese. 3. Modelo Lógico - Tese. 4.

Burocratas de Nível de Rua - Tese. 5. Universidades Federais - Tese. 6. Implementação - Tese. I. Sousa, Washington José de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/Biblioteca CCSA CDU 351

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Dedico a minha mãe Terezinha que mesmo sem ter tido a oportunidade de seguir seus estudos formais sempre fez questão de criar as condições necessárias para que eu e meus irmãos o fizessem.

Em especial, ao meu esposo Walmir, pelo amor, companheirismo, amizade e incentivo.

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AGRADECIMENTOS

Perseguir um sonho exige sacrifícios e determinação. Não foi fácil estar longe de casa, do marido, da família e dos amigos. Mas a felicidade de estar realizando meu sonho e as amizades construídas em Natal ajudaram a mitigar as saudades; A praia e a brisa do mar renovavam minhas energias constantemente para a longa caminhada do doutoramento. Foi um período de aprendizados, de muito estudo e de dedicação, mas também de descobertas, amizades e crescimento.

Nessa jornada agradeço à minha mãe Terezinha e meu pai Luís Eduardo pelo amor incondicional e pelo incentivo para percorrer este caminho, em especial agradeço a minha mãe por estar sempre presente, mesmo quando eu estava longe – sempre me telefonava para saber como eu estava e contar-me as novidades – e por ser um exemplo de dedicação à família.

Ao meu esposo Walmir pelo imenso amor, companheirismo, incentivo, paciência e apoio. Ter dois doutorandos em casa não é fácil, são angústias, ânsias e reflexões diárias, mas também é uma conquista conjunta que engrandece nossa trajetória enquanto casal.

Aos meus queridos “filhos” Milo, Cindy e Flor, eles viveram a pesquisa como poucos: estiveram em cima de mim enquanto eu lia e escrevia, atrapalharam minha concentração para me lembrar que a vida não é feita apenas de estudo, viajaram para o Canadá e foram companheiros inseparáveis de escrita, sempre presentes para alegrar meu dia.

As minhas avós Terezinha e Dalva, por cuidarem de mim em diferentes momentos da minha vida, agradeço pelos valores compartilhados, carinho e atenção.

Aos meus irmãos, Mariana, Rodrigo, Jesus, Silvestre, Adriano, Ruth e Tiago pelo entusiasmo, amizade e carinho. A minha sogra Sandra, sogro Waldir e cunhado Mateus e à família do Walmir, por terem me “adotado” e pelo apoio e torcida. Estendo meus agradecimentos a toda minha família. Sou muito grato por todos vocês e essa vitória não é apenas minha, mas de todos nós.

Ao meu orientador Professor Washington, exemplo a ser seguido na academia, pelo trabalho exemplar na extensão universitária, pela humildade e pelo carinho e preocupação com seus orientandos. Muito obrigado pelos ensinamentos e aprendizados, pelo apoio incondicional, autonomia, confiança e pelas leituras cuidadosas ao longo do doutorado. Não posso deixar de ressaltar o seu incrível trabalho na Incubadora Oásis junto a segmentos populacionais vulneráveis, fonte de inspiração, sinto muito orgulhoso de fazer parte dessa família.

Ao Professor Marco Aurélio, pelo apoio e confiança e pelas leituras atentas e críticas construtivas ao longo do doutorado e na banca de defesa.

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A amiga e professora Pâmela Brandão, um anjo em forma de gente. Muito obrigado por ter me recebido de braços abertos e com um abraço caloroso e apertado em Natal, pelos ensinamentos e reflexões, pelos passeios na orla de Ponta Negra e guloseimas na padaria aos domingos. Agradeço também pelas preciosas orientações no seminário e na banca de qualificação.

Agradeço também ao Professor Paulo Reis – presente no seminário doutoral e qualificação – pelas importantes contribuições para a versão final da tese. A Professora Nathalie Gravel, pelas contribuições na banca de qualificação, pela supervisão no meu estágio doutoral na Université Laval, pela acolhida no seu grupo de pesquisa e pelo apoio em minha estadia nas terras francófonas e gélidas de Québec.

Agradeço aos demais membros da banca de defesa por aceitarem participar da banca e pelas valiosas contribuições. Muito obrigado Professora Anátalia Ramos, Mauro Lemuel e Eugênio Pedrozo.

Agradeço as minhas amigas conterrâneas e companheiras nesta jornada do doutorado em Natal, Luana e Tamiris, pelo harmonioso convívio e por dividirem comigo anseios, angústias, mas também alegrias, conquistas e boas risadas.

Aos amigos do condomínio Villa Park, pela hospitalidade e por terem feito a caminhada longe de minha família mais alegre e leve.

Aos meus amigos de Viçosa, da graduação e do mestrado pelo apoio e pela torcida, especialmente por cuidarem do Walmir quando estive longe.

Aos meus colegas do doutorado, muito obrigado pelo conhecimento e experiências compartilhadas.

Aos oasianos, agradeço a partilha diária e compartilhamento de ideias e experiências. Aos amigos e colegas que conheci em Québec, de diferentes nacionalidades, alguns trilhando os mesmos caminhos que eu, outros lutando para construir uma nova vida longe da terra natal, obrigado pela acolhida e apoio.

Deixo aqui também meu reconhecimento e agradecimento a todos os professores do PPGA-UFRN, por todo o conhecimento transmitido e por contribuírem para o meu desenvolvimento enquanto pesquisador. Somado ao trabalho desses, também contei com o apoio fundamental dos funcionários do PPGA-UFRN e agradeço por terem sido sempre prestativos. Aos funcionários do PPGA-UFV, Programa que me recebeu no doutorado sanduíche nacional, em especial a minha amiga Luiza, agradeço a presteza e acolhida.

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RESUMO

SALGADO, Rafael Junior dos Santos Figueiredo. D.Sc. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Julho, 2020. Análise expandida da atuação dos burocratas de nível de rua na implementação do Programa de Aquisição de Alimentos em universidades federais. Orientador: Washington José de Souza.

É objetivo desta tese analisar resultados do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) a partir do fenômeno de compras por universidades brasileiras com base no conteúdo de chamadas públicas e desempenhos de burocratas de nível de rua. A tese está estruturada em dois artigos principais e em dois artigos nos apêndices desenvolvidos para subsidiar teoricamente e analiticamente a pesquisa. O primeiro artigo intenta avaliar a implementação do PAA-CI nas universidades federais brasileiras no intuito de verificar interlocuções entre chamadas públicas e compras efetivadas por universidades federais e os objetivos elencados no modelo lógico a partir de indicadores nele contidos. Trata-se de pesquisa qualitativa, com análise de dados secundários (chamadas públicas e respectivos resultados). O segundo texto aprofunda entendimentos empíricos do PAA-CI destinando-se a analisar desempenhos de burocratas de nível de rua na implementação do Programa com a finalidade de categorizar variáveis e aplicações de naturezas estrutural, relacional e de ação individual a partir da execução da modalidade Compra Institucional por universidades brasileiras. Origina-se em coleta de dados primários em duas universidades federais brasileiras para compor estudo de caso múltiplo. A análise dos dados, neste, contou com o auxílio do software Atlas.ti. O primeiro artigo no apêndice analisa formas de relações intergovernamentais no PAA no período 2012-2019, tomando como lente teórica formulações de Wright (1998) e Pierson (1995). O segundo artigo sistematiza premissas teóricas que dão suporte ao PAA, na modalidade Compra Institucional, por meio da metodologia do Modelo Lógico, no intuito de descrever articulações entre ações, produtos e resultados esperados da política pública e delimitar um modelo avaliativo. Tomando como base o modelo avaliativo criado a partir do marco lógico, o primeiro artigo identificou que apenas 30% (n = 63) das universidades federais brasileiras adquiriram alimentos da agricultura familiar por meio do PAA-CI até 2019. Nesse sentido, esta tese evidencia problemas relativos às chamadas públicas, como inconsistências na definição de preço dos produtos, logística e periodicidade de entrega, prejudicando a efetividade tanto do instrumento da chamada pública na aquisição pública de alimentos quanto do próprio Programa, no que se refere aos seus objetivos devidamente recuperados no modelo lógico. O segundo artigo reporta elementos comportamentais – relacionados ao cumprimento de critérios legais, com natureza

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estrutural – e discricionários, com naturezas relacional e de ação individual reveladores de autonomias de burocratas de nível de rua na implementação do PAA-CI. Constatou-se que a efetividade de políticas públicas como o PAA, elaboradas no âmbito federal, depende, em grande medida, da sua articulação e cumprimento em âmbito local tanto dos órgãos federais quantos dos entes federados. Ao comparar interpretações teóricas e a execução PAA-CI nas universidades federais, a partir dos editais das chamadas públicas e da atuação dos burocratas de nível de rua, avaliou-se desempenhos previstos no modelo lógico e delimitou-se como comportamento e decisões locais discricionárias dos burocratas podem interferir na execução e reformular políticas definidas nacionalmente. Os resultados obtidos demonstraram que a elaboração dos cardápios e, posteriormente, dos editais pelos burocratas, afeta diretamente as possibilidades de vendas dos agricultores, ou seja, a seleção dos itens constantes dos editais é decisiva para o êxito das chamadas públicas e da política. Porém, a análise não se encerra com a seleção dos projetos de venda. A execução dos contratos e as variáveis que afetam comportamento e discricionariedades dos burocratas são primordiais para analisar a destinação de recursos à agricultura familiar e a efetividade da política. A pesquisa desenvolvida é um tema da atualidade e de relevância no que concerne aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU e os resultados reportam a efetividade dos instrumentos governamentais para o fortalecimento da agricultura familiar, bem como, a aderência destas ações na realidade concreta e incorporação dos seus pressupostos pelos burocratas de nível de rua.

Palavras-chave: Programa de Aquisição de Alimentos. Relações Intergovernamentais. Modelo Lógico. Burocratas de Nível de Rua. Universidades Federais.

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ABSTRACT

SALGADO, Rafael Junior dos Santos Figueiredo. D.Sc. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, July, 2020. Expanded analysis of the role of street-level bureaucrats in implementing the Food Acquisition Program at federal universities. Adviser: Washington José de Souza.

The objective of this thesis is to analyze the results of the Food Acquisition Program (PAA) based on the phenomenon of purchases by Brazilian universities based on the content of public calls and the performance of street-level bureaucrats. The thesis is structured in two main articles and two articles in the appendices developed to theoretically and analytically support research. The first article attempts to evaluate the implementation of PAA-CI in Brazilian federal universities in order to verify the interlocutions between public calls and purchases made by federal universities and the objectives listed in the logical model from the indicators contained therein. It is qualitative research, with an analysis of secondary data (public calls and respective results). The second text deepens the empirical understandings of the PAA-CI, aiming to analyze the performance of street-level bureaucrats in the implementation of the Program with the purpose of categorizing variables and applications of a structural, relational, and individual action nature based on the execution of the Purchase modality. Institutional by Brazilian universities. It originates in primary data collection at two Brazilian federal universities to compose a multiple case study. The data analysis, in this, counted with the aid of the Atlas.ti software. The first article in the appendix analyzes forms of intergovernmental relations in the PAA in the period 2012-2019, using Wright (1998) and Pierson (1995) as the theoretical lens. The second article systematizes theoretical premises that support the PAA, in the Institutional Purchase modality, through the Logical Model methodology, in order to describe articulations between actions, products, and expected results of public policy and delimit an evaluation model. Based on the evaluation model created from the logical framework, the first article identified that only 30% (n = 63) of Brazilian federal universities purchased food from family farming through PAA-CI until 2019. In this sense, this thesis highlights problems related to public calls, such as inconsistencies in the definition of product prices, logistics, and delivery periodicity, impairing the effectiveness of both the public call instrument in public procurement of food and the Program itself, with regard to its objectives properly recovered in the logical model. The second article reports behavioral elements - related to the fulfillment of legal criteria, of a structural nature - and discretionary elements, with a relational nature and individual action that reveal the autonomy of street-level bureaucrats in the implementation of the PAA-CI. It was found that the effectiveness of public policies such

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as the PAA, elaborated at the federal level, depends, to a large extent, on their articulation and compliance at the local level, both from federal agencies and from federated entities. When comparing theoretical interpretations and PAA-CI execution in federal universities, based on public calls for proposals and the performance of street-level bureaucrats, performance predicted in the logical model was evaluated and it was defined as the discretionary behavior and local decisions of the bureaucrats can interfere with enforcement and reshape nationally defined policies. The results obtained showed that the elaboration of the menus and, later, of the notices by the bureaucrats, directly affects the sales possibilities of the farmers, that is, the selection of the items contained in the notices is decisive for the success of public calls and politics. However, the analysis does not end with the selection of sales projects. The execution of contracts and the variables that affect the bureaucrats' behavior and discretion are essential to analyze the allocation of resources to family farming and the effectiveness of the policy. The research developed is a topical and relevant topic with regard to the UN Sustainable Development Goals and the results report the effectiveness of government instruments for strengthening family farming, as well as the adherence of these actions to the concrete reality and incorporation of its assumptions by the street-level bureaucrats.

Keywords: Food Acquisition Program. Intergovernmental Relations. Logical Model. Street-level bureaucrats. Federal Universities.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 14

ARTIGO 1 – AQUISIÇÃO DE PRODUTOS DA AGRICULTURA FAMILIAR NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS PELO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) ... 25

1 INTRODUÇÃO ... 25

2 REFERENCIAL TEÓRICO ... 29

2.1. AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E SUA IMPORTÂNCIA ... 29

2.2. TRAJETÓRIA DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS ... 30

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 32

4 O PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS: UMA LEITURA NACIONAL PARA O PERÍODO 2012-2019 ... 33

5 ADEQUAÇÃO DAS CHAMADAS PÚBLICAS AO PÚBLICO E PRODUTOS DA AGRICULTURA FAMILIAR ... 42

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 52

REFERÊNCIAS ... 55

ARTIGO 2 – ANÁLISE EXPANDIDA DO DESEMPENHO DOS BUROCRATAS DE NÍVEL DE RUA NO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) ... 61

1 INTRODUÇÃO ... 61

2 ELEMENTOS PARA UMA ABORDAGEM EXPANDIDA DO PAA À LUZ DA BUROCRACIA DE NÍVEL DE RUA ... 64

3 PROCEDIMENTOS DE PESQUISA ... 71

4 IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS – COMPRA INSTITUCIONAL NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS ... 77

5 ANÁLISE EXPANDIDA DA ATUAÇÃO DOS BUROCRATAS DE NÍVEL DE RUA ... 83

5.1. Perspectiva Estrutural ... 83

5.1.1. Condições Organizacionais ... 84

5.1.2. Aderência a regras e estruturas ... 90

5.2. Perspectiva individual ... 95

5.2.1. Incentivos ... 95

5.2.2. Variáveis cognitivas ... 99

5.3. Perspectiva relacional... 109

5.3.1. Interações entre burocratas e usuários ... 110

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 118

REFERÊNCIAS ... 122

CONCLUSÃO DA TESE ... 130

REFERÊNCIAS GERAIS ... 135

APÊNDICE – ARTIGO 4 ... 141

ROTEIRO DE ENTREVISTAS (Gestores) ... 141

APÊNDICE – ARTIGO 1 ... 144

ARTIGO 1 – RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS NO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA): ANÁLISE SOB A PERSPECTIVA DO FEDERALISMO ... 144

APÊNDICE – ARTIGO 2 ... 165

ARTIGO 2 – REPRESENTAÇÃO DAS PREMISSAS TEÓRICAS DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) POR MEIO DO MODELO LÓGICO ... 165

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14 INTRODUÇÃO

Organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), o Programa Mundial de Alimentos (PMA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimam que 820 milhões de pessoas sofrem de fome e 2 bilhões sofrem de insegurança alimentar moderada ou grande em todo o mundo (FAO et al., 2019a). Na América Latina e Caribe, apesar dos avanços logrados na última década em direção ao exercício efetivo do direito à alimentação adequada e à proteção da saúde de todos os seus habitantes, a insegurança alimentar ainda afeta 187 milhões de pessoas. Ao mesmo tempo, para cada pessoa que sofre fome, mais de seis estão com sobrepeso ou obesidade. Esses dados relevam que um grande desafio da sociedade contemporânea é enfrentar o problema da desnutrição, o que requer abordagem multissetorial de políticas públicas. Por isso, há necessidade de políticas e programas voltados ao fortalecimento da agricultura familiar e à aproximação entre produção e consumo de alimentos para garantir segurança alimentar e nutricional no campo e na cidade (FAO et al., 2019b).

A inserção da agricultura familiar nos mercados públicos está relacionada ao fornecimento de gêneros alimentícios nutricionalmente saudáveis e com base ecológica sólida, sustentável. Estima-se que as redes de agricultura familiar, pautadas na produção de baixa escala, geralmente liderados por famílias ou mulheres, que incluem agricultores, criadores de gado, pastores, caçadores, coletores, pescadores e produtores urbanos e periurbanos alimentam 70% da população mundial. Na América do Sul, estima-se que estes agricultores colham 53% das calorias das colheitas do mundo consumidas por seres humanos (por exemplo, 80% de arroz e 75% de amendoim). Por outro lado, a rede de agricultores familiares usa menos de 25% recursos – incluindo terras, água, combustível fóssil – para alimentar 70% da população (ETC GROUP, 2017).

Iniciativas de compras públicas direcionadas a agricultores locais têm sido implementadas em diversos países, como Farm to School nos Estados Unidos (JOSHI; AZUMA; FEENSTRA, 2008), Farm to Cafeteria no Canadá (POWELL; WITTMAN, 2018), Purchase for Progress (P4P) na África (ANAADUMBA; GALLAT, 2014; GÁLVEZ-NOGALES; FONSECA, 2014) e Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) no Brasil, implantados em 2003 e 2009, respectivamente. O PAA e PNAE diferenciam-se de outras experiências internacionais ao prever especificamente a compra da categoria social denominada agricultura familiar. Na legislação brasileira (Lei nº 11.326/2006), agricultor familiar é aquele que pratica atividades no meio rural e atende aos seguintes critérios: i) não tenha área maior do que quatro módulos fiscais; ii) utilize

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15 predominantemente mão de obra familiar; iii) tenha percentual mínimo da renda originada de atividades econômicas do seu estabelecimento; e iv) dirija seu estabelecimento com sua família.

A adoção pelo governo brasileiro da compra institucional de alimentos da agricultura familiar pelo PAA reporta-se diretamente aos dois primeiros objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS) da ONU – combate à pobreza e à fome e segurança alimentar e agricultura sustentável. Tal Programa tornou-se internacionalmente conhecido pelo potencial de impacto que possui quando obtornou-servado a partir dos ODS e que tem mostrado resultados importantes no fortalecimento da agricultura familiar e na redução da insegurança alimentar e nutricional, além de incentivar a produção sustentável, o cooperativismo, a agroindústria familiar e o desenvolvimento local (SAMBUICHI et al., 2019).

O Programa de Aquisição de Alimentos tem o objetivo de promover acesso à alimentação e incentivar a agricultura familiar por meio da compra direta da agricultura familiar, com dispensa de licitação, e destinar os alimentos às pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional e àquelas atendidas pela rede socioassistencial, pelos equipamentos públicos de segurança alimentar e nutricional e pela rede pública e filantrópica de ensino. A ideia central é a geração de renda local e a segurança alimentar e nutricional conectando produção e consumo (SCHMITT et al., 2014). Inova, assim, ao integrar, em uma só política, elementos de política agrícola e de segurança alimentar minimizando a fome e a pobreza e, ao mesmo tempo, promovendo inclusão produtiva no campo.

A criação do PAA é considerada iniciativa inovadora em termos de objetivos, forma de implantação, modelo de gestão e marco legal, rompendo com modelos já estabelecidos (DELGADO; CONCEIÇÃO; OLIVEIRA, 2006; MÜLLER, 2007; PORTO et al., 2014). O Programa inovou ao dispensar os ritos da Lei de Licitações e Contratos para a Administração Pública (Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993) nas compras da agricultura familiar. Anteriormente, as licitações, para merenda escolar e restaurantes universitários por exemplo, eram realizadas em grandes valores, privilegiando grandes fornecedores e priorizando o fornecimento de produtos agroindustriais (MIELITZ, 2014). A referida Lei restringia a participação do agricultor familiar no mercado institucional, dada a concorrência com segmentos empresariais organizados em bases de custos de produção reduzidos e de capacidades de produção superiores (GRISA, 2012).

Desde a sua criação, o PAA apresentou expressivo crescimento, ampliando sua capilaridade nacional ao estar presente em 2.729 (49%) municípios brasileiros até 2015 (HENTZ; HESPANHOL, 2019). De acordo com dados do PAA Data (MDS, 2020), em seu auge, em 2012, o Programa chegou a atender aproximadamente 18 milhões de pessoas e 186 mil agricultores familiares, alcançando sua maior expressividade numérica em termos de recursos aplicados (R$ 839 milhões), toneladas de alimentos adquiridos e número de organizações contempladas. Apesar do crescimento desde 2003, a partir de 2013

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16 ocorreu expressivo declínio no volume de recursos investido e no número de beneficiários, chegando a apenas R$ 253 milhões em 2018 (SAMBUICHI et al., 2019). A redução nos valores investidos está relacionada a uma nova trajetória de implementação do Programa, resultado de uma atuação mais incisiva dos órgãos estatais, por vezes descontextualizadas das especificidades da agricultura familiar. A execução tornou-se mais intensa, em termos de regras formais e documentos exigidos, e a fiscalização mais energética e menos flexível (GRISA et al., 2017b; HENTZ; HESPANHOL, 2019).

Apesar da recente redução no volume de recursos investidos no Programa (SAMBUICHI et al., 2019), a criação de outros formatos e modalidades, notadamente a Compra com Doação Simultânea (CDS), executada via parceria com governos estaduais e municipais, e a Compra Institucional (PAA-CI), incrementaram as ações. O PAA-CI expandiu possibilidades ao descentralizar e permitir a estados, municípios e órgãos federais da administração pública, direta e indireta, comprar alimentos da agricultura familiar por meio de chamadas públicas, com recursos financeiros próprios, antes restrita à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) ou por meio de descentralização de recursos do Governo Federal a estados e municípios. A revisão mais recente das normas do PAA-CI fortaleceu seu potencial (Decreto nº 8.473/ 2015) ao determinar a todos os órgãos da União, que recebam recursos para compra de alimentos, a aplicação de, no mínimo, 30% para aquisições da agricultura familiar a partir de 1º de janeiro de 2016.

A criação da modalidade Compra Institucional, e posterior institucionalização da obrigatoriedade de compra de 30% da agricultura familiar pelos órgãos federais, tornou-se um marco na trajetória do PAA, revisando a legislação das aquisições públicas brasileiras em âmbito nacional, estadual e municipal e inovando em processos. Ao flexibilizar a obrigatoriedade da Lei de Licitações, cuja base é a livre concorrência, a nova legislação viabilizou participação e inserção do agricultor familiar nas compras governamentais com base em critérios de qualificação que suprimem a predominância do critério de preço mínimo.

Ao descentralizar as compras do PAA, a modalidade Compra Institucional (CI) inova ao demarcar a abertura para maior participação da sociedade civil no processo de implementação e avaliação da política. Mesmo concebida nos termos gerais na Administração Federal, a CI viabilizou ações discricionárias pelos gestores locais, abrindo possibilidades para uma cadeia de atores realizar transformações e adaptações locais para atender a diferentes realidades e contextos. A participação dos burocratas implementadores, e consequente interação com os beneficiários, tornou-se, assim, complexa e ampliou o leque de resultados (FREITAS, 2017; LOTTA, 2010a, 2014).

As compras de órgãos da administração pública federal por meio do PAA-CI chegaram a R$ 226 milhões em 2018 – frente a R$ 253 milhões das outras modalidades do PAA –, com destaque para

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17 compras pelo Ministério da Defesa (75,43%) e Ministério da Educação (MEC) (10,42%) (MDS, 2019). Entre os órgãos do MEC aptos a comprar gêneros alimentícios da agricultura familiar, destacam-se as universidades federais. Dada a capilaridade no território brasileiro, as Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN) das universidades são grandes demandantes de alimentos com aquisições convencionalmente resguardadas em processo licitatório (ASSIS, 2016). Em 2018, as universidades federais foram responsáveis por apenas 4,65% do total de compras efetivado no PAA-CI.

Apesar da baixa participação, o volume de recursos investidos e números de universidades executando o Programa tem crescido, passando de R$ 2.050 e uma instituição em 2012 para R$ 7 milhões e 10 instituições em 2019 (Tabela 1). A despeito da ampliação do PAA-CI nas universidades federais, a abrangência do Programa ainda é limitada e o valor investido ano/aluno na compra de produtos da agricultura familiar é baixo. Além disso, execução nas universidades tem apresentado oscilações e descontinuidades. O aumento na taxa de adesão ao Programa pelas universidades federais e a garantia de regularidade contribuirão, não apenas para a oferta de alimentação saudável aos comensais, mas, também, para fortalecer a agricultura familiar pelo aumento da sua participação nos mercados públicos. Pesquisas sobre a operacionalização do PAA-CI nas universidade federais (ASSIS, 2016; CUNHA, 2018; GIOMBELLI, 2018; OLIVEIRA, 2017b; PAULA, 2016; SALGADO, 2016) mostram, em geral, avaliação positiva, apontando que gerou benefícios para o agricultor –estabelecimento, produção e qualidade de vida –, para as cooperativas e associações e para beneficiários consumidores dos alimentos. Apesar dos benefícios relatados, também foram identificadas: barreiras relacionadas à escassez de mapeamento da produção e das condições estruturais das organizações da agricultura familiar; inexperiência das organizações fornecedoras; chamadas públicas que não refletem a produção local da agricultura familiar; fragilidades em estrutura física e padronização dos produtos demandados. Não há registro de investigação focando diagnóstico situacional a respeito do processo de implementação das compras locais pelo PAA-CI (SALGADO et al., 2020), o que pode ser explicado pelo fato de a lei ser relativamente recente e, no caso das universidade federais, a operacionalização se encontrar ainda em fase de amadurecimento.

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18 Tabela 1 – Recursos em R$ disponibilizados por cada instituição via Chamada Pública (2012-2019)

Instituição

Ano Total Discentes Total/Discentes

2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 UFV 7.218 15.494 60.981 83.693 13.729 4,6 UFOP 817.527 320.224 955.619 2.093.371 11.289 173,4 UFRRJ 75.100 384.810 459.910 14.256 28,8 UFES 786.780 383.826 410.992 1.581.599 23.438 60,7 UFSCar 278.872 186.368 83.490 548.730 12.697 36,9 UFSM 85.000 265.000 1.159.975 871.020 1.236.995 1.268.500 1.082.335 5.968.825 18.741 263,0 UFPel 1.464.913 596.754 2.364.674 3.118.390 520.501 8.065.231 16.198 348,2 UFPR 2.050 1.718.484 413.312 2.133.847 27.691 35,4 UFRGS 12.976.567 2.639.096 5.000.531 não consta 20.616.194 28.802 488,8 UFFS não

consta não consta não

consta não consta não consta - 7.826 UFRB 169.210 169.210 8.874 13,7 UFRN 317.148 428.383 745.532 25.534 24,4 UFCG 178.212 184.188 362.400 15.503 13,0 UFAL 1.411.778 1.411.778 26.155 51,3 UFPI 2.604.246 2.604.246 22.423 53,1 UFRAM 42.394 42.394 7.114 4,9 UFAC 2.554.275 1.423.800 3.978.075 9.708 235,6 UFPA 111.861 111.861 35.808 3,1 UFMT 100.945 100.945 19.615 1,0 Total 2.050 1.810.702 1.745.407 2.231.022 17.385.959 9.082.316 11.518.610 7.301.775 51.077.841 Fonte: Resultados da pesquisa, 2020.

Os dados da Tabela 1 e os resultados das pesquisas já realizadas tendem a indicar que sem um processo de “adequação” das normas legais aos contextos locais, o PAA-CI dificilmente obterá êxito, uma vez que as universidades federais estão espalhadas por todo território brasileiro e estão inseridas em contextos sociais, econômicos, geográficos, institucionais diversos. O primeiro gap entre as normas e o contexto pode derivar de inadequações das chamadas públicas ao público-alvo e aos objetivos da política. Entretanto, as chamadas públicas, sozinhas, não são capazes de explicar os problemas na implementação, pois, os resultados são consequências da atuação e decisões dos burocratas de nível de rua (BNR) (LIPSKY, 2019). Os BNR são apontados pela literatura como verdadeiros responsáveis pelo bom ou mau desempenho da implementação (MEYERS; VORSANGER, 2010).

Burocratas de nível de rua (street-level bureaucrats) é expressão cunhada por Michael Lipsky. O autor divulgou a expressão em livro publicado em 1980, atualizado em 2010 e traduzido para o português em 2019 pela Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) (LIPSKY, 2019). Burocratas de nível

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19 de rua caracteriza gestores públicos que prestam serviços diretamente aos usuários e cidadãos ou que monitoram serviços públicos prestados por terceiros (LIPSKY, 2019). A introdução desse conceito por Lipsky em 1980 foi vital contribuição para a emergência do tema bottom-up (HUPE, 2019). Diferentemente da abordagem top-down, que orienta análises a partir da perspectiva dos tomadores de decisão (formuladores e burocratas de alto escalão), a abordagem bottom-up institui análise a partir dos atores do nível operacional (local). O foco são as estratégias adotadas pelos vários atores na busca de seus objetivos (SABATIER, PAUL A., 1986).

A literatura de avaliação e análise de políticas públicas vem apontando a atuação dos burocratas como determinante para se compreender resultados, pelo papel que exercem na garantia da entrega de serviços públicos (LIPSKY, 2019; MAJONE; WILDAVSKY, 1984). Tummers et al. (2015) relevam que o exercício da discrição pelos profissionais de saúde, por exemplo, tem impacto positivo na implementação, porque os burocratas de nível de rua são capazes de adaptar suas decisões e procedimentos às situações específicas e necessidades de seus clientes. Ao analisar a atuação de policiais, Arnold (2015) mostra como os BNR podem ser “empreendedores de políticas públicas” que procuram desenvolver ou adotar inovações políticas destinadas a melhorar processos de implementação.

A literatura sobre a atuação de burocratas de nível de rua se desdobra em três perspectivas analíticas: (i) estrutural, relacionada à obediência dos agentes às regras formais e à influência de fatores gerenciais; (ii) de ação individual, que compreende as decisões e ações individuais a partir de cálculos racionais sobre recompensas e expectativas de sanções ; e (iii) relacional, focada na atuação dos burocratas por meio de suas relações estabelecidas com os demais atores do entorno (BONELLI et al., 2019). Da mesma forma que Bonelli et al. (2019), esta tese reconhece justaposição e compatibilidade entre as diferentes perspectivas teóricas para entender desempenhos dos burocratas e do próprio processo de implementação das políticas públicas. Desse modo, uma análise expandida das múltiplas dimensões da atuação dos burocratas de nível de rua deve caminhar pelo dilema entre comportamento (obediência ao marco legal) e discricionariedades (liberdade de escolha).

Levantamento bibliográfico exploratório na base de dados da Scentific Electronic Libray Online (SciELO) e Scientific Periodicals Electronic Library (Spell) – pelos descritores "Burocratas de nível de rua", "Burocrata de nível de rua", "Burocracia de nível de rua", "Burocratas em nível de rua", "Burocrata em nível de rua", "Burocracia em nível de rua" e respectivas traduções para o inglês – retornou 15 artigos na Scielo e três na Spell, excluídas as duplicidades, totalizando 18 usos do conceito de Lipsky (2019). Foram encontrados textos teóricos (BONELLI et al., 2019; DUTRA, 2020; EUCLYDES; SILVEIRA, 2020; FERREIRA; MEDEIROS, 2016; LIMA; D’ASCENZI, 2013; OLIVEIRA, 2012b), de atuação do judiciário (MADEIRA; GELISKI, 2019), e, de implementação de políticas públicas, em saúde (LEAL;

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20 FIGUEIREDO; NOGUEIRA-DA-SILVA, 2012; LIMA; D’ASCENZI, 2017; LOTTA, 2018), em assistência social (BUCHELY IBARRA, 2012; CORDEIRO, 2019; COSTA, 2017; COSTA et al., 2016; SÁTYRO; CUNHA, 2019), e em política habitacional (SALEJ HIGGINS; ARDILA PINTO; BRAGATO, 2016). Em termos de setor econômico e de segmento de política pública, não há publicação, nas bases pesquisadas, em agricultura familiar e segurança alimentar e nutricional.

No processo de implementação do PAA-CI, a depender do papel assumido pelos burocratas de nível de rua e das regras estabelecidas nas chamadas públicas, a compra é realizada de forma particular por cada instituição. Esse fato leva a compreender como programas, idealizados por políticos e formuladores de políticas públicas, são traduzidos e operacionalizados na prática pelos burocratas de nível de rua. Assim, em busca da identificação de fatores que interferem no alcance dos objetivos da política na implementação, esta tese questiona: Que fatores influenciam desempenhos diferenciados e descontinuidades do Programa de Aquisição de Alimentos, na modalidade Compra Institucional, nas universidades federais brasileiras? No intuito de responder a tal questionamento, a tese objetiva analisar resultados do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) a partir do fenômeno de compras por universidades brasileiras com base no conteúdo de chamadas públicas e desempenhos de burocratas de nível de rua. Em termos específicos, pretende-se:

i) Analisar a implementação do PAA-CI nas universidades federais brasileiras com base em modelo avaliativo, derivado de sistematização teórica, e do conteúdo e resultados de chamadas públicas;

ii) Analisar desempenhos de burocratas de nível de rua na implementação do PAA-CI com a finalidade de categorizar variáveis e aplicações de natureza estrutural, individual e relacional. A tese defendida é que desempenhos diferenciados na implementação do PAA-CI pelas universidades federais são explicadospela aderência das chamadas de compra a conjunturas locais e aos objetivos da política e, como consequência, derivam de comportamento e discricionariedades de burocratas de nível na operacionalização em atributos estruturais, individuais e relacionais. Apesar do interesse por estudos de formulação e implementação no campo da Administração Pública (MARQUES; SOUZA, 2016a; SOUZA, 2006), ainda é relativamente escassa a literatura sobre atuação da burocracia e desempenhos de burocratas de nível de rua na tomada de decisões quando comparada a temas como federalismo, participação social e políticas sociais (LOTTA, 2015; LOTTA; PAVEZ, 2010).

Em termos de políticas públicas para a agricultura familiar, são raros os estudos na implementação, uma vez que a ênfase incorre em efeitos, sobretudo na perspectiva econômica (BONELLI et al., 2019; FREITAS, 2017; GRISA, 2012; GRISA; SCHNEIDER, 2014; MULLER; SILVA; SCHNEIDER, 2012). No âmbito do PAA, abrangente revisão de sistemática de literatura

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21 realizada por (SALGADO, 2020a) confirmou o reduzido número de pesquisas na fase da implementação, resultado encontrado no próprio campo de análise de políticas públicas (HILL; HUPE, 2009).

O trabalho dos burocratas de nível de rua tem sido foco de diversas pesquisas em âmbito internacional (ARNOLD, 2015; LIPSKY, 2019; MAYNARD-MOODY; MUSHENO, 2000, 2003; MEYERS; VORSANGER, 2010; NOTHDURFTER; HERMANS, 2018; TUMMERS, 2012; TUMMERS et al., 2015), mas, no Brasil, o tema ainda é pouco explorado (FERREIRA, 2016; LOTTA, 2018). Pesquisas recentes, no Brasil, têm sido capitaneados por Lotta (2018a, 2010, 2014), Pires (2009), Oliveira (2012) e Ferreira (2016).

Revisão de literatura de Nothdurfter e Hermans (2018) acerca da adoção e desenvolvimento da perspectiva de nível de rua em gestão pública, política social e trabalho social identificou, nos periódicos mais conceituados do campo de administração pública, que as publicações se concentram em: (i) discrição como característica positiva ou negativa (incluindo discrição como determinante do sucesso da implementação) e BNR como empreendedor e instigador da mudança de políticas; (ii) determinantes do uso da discrição; e (iii) impacto negativo da New Public Management no trabalho e trabalhadores de nível de rua (NOTHDURFTER; HERMANS, 2018).

A presente tese assume viés inovador, no Brasil, quando pauta processo de implementação em perspectiva expandida, revelando variáveis das perspectivas estrutural, ação individual e relacional no comportamento e discricionariedades de decisão e ação no PAA. Acata, entre as premissas, que o desempenho dos implementadores tem papel central na entrega dos serviços públicos (LIPSKY, 2019; MAYNARD-MOODY; MUSHENO, 2000; MEYERS; VORSANGER, 2010). Compreender comportamento e discricionariedades no processo de tomada de decisão dos burocratas de nível de rua é exercício que preenche lacunas apontadas pela literatura no campo da implementação de políticas públicas.

Esta tese utiliza os conceitos de comportamento (no singular) e de discricionariedades (no plural). Tomamos como base Guerreiro Ramos (1989), quando distingue comportamento e ação ao falar da “síndrome comportamentalista”. Para o autor, comportamento é conduta que se baseia na racionalidade funcional amparado por imperativos exteriores, ou seja, comportamento implica conformidade a ordens exteriores. No contraponto, está a ação, quando o indivíduo toma decisões e faz escolhas porque causas finais influem no mundo em geral (e não apenas causas eficientes). É este viés de ação, pautado pelo autor, que aqui é qualificado como discricionaridades, para se referir a decisões de burocratas de nível de rua que ultrapassam a interpretação fria e calculada de instrumentos formais e que impõem padrão geral e esperado de decisão. Portanto, comportamento é utilizado para atos moldados por regras, normas, constrangimentos, padrões. Discricionariedades, em contraposição, refere-se a deliberações de agentes

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22 públicos conscientes das finalidades intrínsecas aos seus atos uma vez interessado no julgamento, em uma forma ética de conduta, em um padrão substantivo.

Os resultados aqui encontrados têm relevância prática quanto apontam para a retroalimentação do PAA, com potencial para orientar a agricultura familiar e suas organizações, universidades e outras instituições compradoras e o Estado brasileiro em ajustes no Programa e na valorização das compras públicas de alimentos, inclusive como instrumento de alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Se o debate atual das agências internacionais de desenvolvimento enaltece esses objetivos, é preciso pautar nas agendas o fomento à agricultura familiar e seu acesso aos mercados públicos de compras como estratégia endógena de reversão das condições que acentuam a insegurança alimentar e a pobreza. Nesse sentido, a avaliação da implementação do PAA-CI contribui para a busca de efetividade e eficácia no que concerne aos resultados esperados.

A origem desta tese remonta a interesse anterior de pesquisa do autor notadamente pela dissertação intitulada “Implementação do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA): a trajetória de operacionalização do PAA Institucional na Universidade Federal de Viçosa-MG” (SALGADO, 2016) defendida no Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade de Viçosa (UFV). Aquele exercício acadêmico gerou uma série de aprendizagens e questionamentos que, hoje, inspiram e subsidiam a elaboração da presente tese. Naquele momento, o foco de análise foi a operacionalização e a forma de inserção dos agricultores familiares e suas organizações no PAA-CI da UFV. A pesquisa encontrou várias limitações na operacionalização e na inserção e permanência dos agricultores familiares no mercado institucional da universidade, entre os quais, descontinuidade, inexperiência da Instituição no processo de compra, fragilidade na padronização dos produtos, entre outros.

A dissertação (SALGADO, 2016) evidenciou que, sem alteração nos mecanismos de comercialização, de incentivo à participação dos agentes locais e de formas de mobilização e de inserção dos agricultores, os gargalos identificados dificilmente seriam superados. Tal conclusão derivou-se do fato de que as regras estavam voltadas para incentivar concorrência entre as organizações (pela via do menor preço) sem mecanismo orientador para permitir a participação da sociedade civil no controle social do Programa. A literatura especializada, por sua vez, apontava incapacidades das políticas públicas para alcançarem os resultados esperados, muitas vezes em virtude de gargalos encontrados na operacionalização reforçando a necessidade de avaliação da implementação (TINÔCO; SOUZA; OLIVEIRA, 2011). Daí, adveio a constatação de que seria urgente realizar pesquisa abrangente nas chamadas públicas – para verificar a adequação ao público-alvo e resultados esperados, inclusive pelo desempenho de burocratas de nível de rua – o que aqui se dá sob a forma de dois artigos.

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23 O primeiro artigo analisa a implementação do PAA-CI nas universidades federais brasileiras com o intuito de verificar interlocuções entre chamadas públicas e compras efetivas por universidades federais e os objetivos do PAA-CI elencados no modelo lógico (Apêndice 1). A partir das dimensões apresentadas no modelo lógico do PAA-CI, é pautada a eficiência das chamadas públicas em alcançar o público pretendido, a eficácia em contribuir para maior volume de compras da agricultura familiar e maior consumo de alimentos in natura e menos processados, bem como a efetividade relativa aos efeitos da renda e organização dos agricultores familiares. Esse estudo vem preencher a lacuna de avaliação em âmbito nacional do PAA, especialmente da modalidade Compra Institucional (KAMINSKI et al., 2018; SALGADO, 2019) em seus múltiplos aspectos.

O segundo artigo analisa desempenhos de burocratas de nível de rua na implementação do PAA com a finalidade de categorizar variáveis e aplicações de natureza estrutural, individual e relacional a partir da execução da modalidade Compra Institucional por universidades federais brasileiras. Para isso, foi utilizada a abordagem de análise baseada na interação que enfatiza o processo de influência mútua entre o plano da política pública, as relações sociais e as características dos espaços locais de implementação. Assim, situa o olhar em contextos de atuação de burocratas de nível de rua, ressaltando desempenhos com vieses comportamental e discricionários. A pesquisa tem natureza qualitativa e emprega dados primários e secundários. Essa abordagem é necessária, pois, leva em conta não só aspectos legais e análise dos resultados da política pública, mas, também, atributos estruturais, individuais e relacionais, uma vez que a implementação depende do contexto social, econômico e da arena e rede de atores constituídas em cada localidade.

O artigo pautou-se na experiência de implementação do PAA-CI na Universidade Federal de Viçosa e Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Além de representarem experiências inovadoras e pioneiras de execução nos respectivos Estados, as duas instituições estão localizadas em regiões que desempenham importante função no desenvolvimento regional, especificamente dos territórios Mato Grande e Serra do Brigadeiro, que constituem bases empíricas do Projeto “Controle Social de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial: Estudos Integrados e Comparativos de Indicadores de Inclusão Social e Produtiva e de Superação da Pobreza”.

O supracitado projeto, no âmbito do Edital nº 42/2014 PGPSE – Programa de Apoio à Pós-Graduação e à Pesquisa Científica e Tecnológica em Desenvolvimento Socioeconômico no Brasil (PGPSE) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) – liderado pelo Programa de Pós-Graduação em Administração da UFRN onde ocorreu esta tese, em consórcio com a Universidade Federal de Viçosa (UFV) e a Universidade Federal do Cariri (UFCA) – financiou a pesquisa. A escolha destas instituições também se deve à familiaridade deste pesquisador, uma vez que

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24 acompanhou a implementação do PAA-CI nas duas universidades por meio de atividades de pesquisa e de extensão, permitindo acesso facilitado aos gestores.

Para subsidiar teoricamente e analiticamente a pesquisa aqui realizada, dois outros artigos foram desenvolvidos e encontram-se nos apêndices. O primeiro artigo do apêndice realiza exercício teórico de contextualização do Programa de Aquisição de Alimentos ao analisar as relações intergovernamentais no PAA no período 2012-2019, tomando como lente teórica formulações de Wright (1988) e Pierson (1995). Como percurso metodológico utilizou-se pesquisa bibliográfica e análise documental. O segundo artigo do apêndice constrói o modelo lógico do PAA, para orientação e compreensão do Programa, utilizando o modelo desenvolvido por Cassiolato e Gueresi (2015) e W.K. Kellogg Foundation (2004). O modelo lógico avança em relação ao proposto por Sambuichi et al. (2019), pois, além de apresentar um modelo mais completo para o PAA, desenvolve uma versão para a modalidade Compra Institucional, foco de análise da tese. Ademais, este estudo desenvolveu modelo avaliativo por meio de indicadores para avaliar o desempenho do PAA-CI, que pode ser utilizado para as demais modalidades e foi parcialmente avaliado no primeiro artigo da Tese.

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25 ARTIGO 1 – AQUISIÇÃO DE PRODUTOS DA AGRICULTURA FAMILIAR NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS PELO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA)

Resumo: O objetivo é avaliar o perfil de adequação das universidades federais brasileiras no que tange à aquisição de produtos da agricultura familiar pelo Programa de Aquisição de Alimentos no âmbito da modalidade Compra Institucional por meio do modelo avaliativo. Trata-se de estudo quantitativo descritivo, com análise de dados secundários (chamadas públicas e resultados) entre 2012 e 2019. A maioria das chamadas públicas priorizou a compra de organizações (em 70%) e de agricultores locais (em 52%), mas ainda há pouco incentivo para a compra de produtos orgânicos e agroecológicos e a disputa pelo menor preço (em 52%), não recomendada, e a alta proporção de produtos fracassados (em 56%) limitam o desempenho da política. A maioria das chamadas públicas demandou tanto produtos de origem vegetal (em 88%) como de origem animal (em 57%). Quando ao grau de processamento dos alimentos, os produtos in natura apareceram em 69% das CPs. Em relação à entrega dos produtos, a centralizada (em 68%) e as entregas semanais (em 22%) foram as mais descritas. As chamadas públicas apresentam debilidades, como a falta de calendário com frequência de entregas (em 48%). Esse achado desestimula a participação dos agricultores familiares menos estruturados, já que não conseguem avaliar a viabilidade econômica em participar das chamadas, ao tempo que favorece organizações com maior poder econômico e estrutura. Em virtude do caráter recente da legislação, políticas públicas de assistência técnica e ações de capacitação dos gestores públicos devem ser fomentadas de modo a conduzir burocratas a interações com as organizações locais criando e aperfeiçoamento fluxos de informações e conhecimentos e retroalimentando políticas públicas e a gestão universitária.

Palavras chave: Avaliação, Política Pública, Mercados Institucionais, Agricultura Familiar, Universidades Federais.

1 INTRODUÇÃO

Questões demográficas e alimentares estão entre os maiores desafios a serem enfrentados pela humanidade neste século XXI, especialmente nas grandes cidades e espaços urbanos. Em face desses desafios, o poder público vem despertando para o potencial dos alimentos e da alimentação como o elo de conexão entre saúde pública, meio ambiente e desenvolvimento social equitativo e sustentável (SCHNEIDER; CRUZ; MATTE, 2016). Neste contexto, destaca-se o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), iniciativa pioneira do governo federal brasileiro que adquire alimentos diretamente da agricultura familiar por meio de órgãos públicos nos níveis municipal, estadual e federal e destina-os a unidades de educação, assistência social, segurança e justiça, saúde – e, ainda, a organizações não-governamentais.

O exercício avaliativo aqui apresentado analisa o panorama da compra de alimentos provenientes da agricultura familiar nas universidades federais tomando como base conteúdos e lacunas de chamadas de compras de universidades federais brasileiras à agricultura familiar, no âmbito do PAA-CI no Brasil. O Programa de Aquisição de Alimentos é ação governamental que se insere nas políticas públicas de segurança alimentar e nutricional (SAN) e de fortalecimento da agricultura familiar instituído em 2003

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26 (Lei Federal n. 10.696). O objetivo do PAA é fomentar a comercialização de produtos oriundos da agricultura familiar via compras governamentais, o que se constitui em iniciativa recente na história do País (DIAS et al., 2013). Ao eleger a agricultura familiar como protagonista do abastecimento de mercados institucionais, o Programa se apresenta como opção estratégica na indução de uma nova dinâmica de desenvolvimento rural, desenvolvimento territorial e oportunidades aos agricultores familiares, capaz de promover inclusão social, segurança alimentar, combate à pobreza e redução de desigualdades (DIAS et al., 2013; DOS ANJOS; BECKER, 2014). O Programa contribui para a geração de renda e, complementarmente, melhoria das condições de alimentação de pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social ou em situação de insegurança alimentar. A fome e a insegurança alimentar e nutricional são temas recorrentes no Brasil e no mundo e a agricultura familiar tem papel importante na erradicação deste flagelo (FAO, 2020; PERACI; BITTENCOURT, 2010).

Grisa et al. (2017) evidenciam que o Programa apresentou reduzida execução em seus anos iniciais, seja em virtude de sua fase de experimentação ou de projetos-piloto, seja em decorrência de mudanças políticas e em sua concepção original, ou, ainda, por não ter sido inicialmente priorizado na pauta de reinvindicação das organizações da agricultura familiar. Entretanto, ganhou importante projeção nacional e internacional a partir da expansão, da exposição de resultados relacionados às dinâmicas locais e ao fortalecimento da agricultura familiar e do crescente debate em torno de possibilidades de construção social dos mercados (GRISA; SCHNEIDER, 2014).

Com a expansão do Programa e a evidência de seus resultados para o fortalecimento da agricultura familiar e da SAN, o Programa ganhou importante impulso nacional e internacional, servindo de exemplo a ser exportado para outros países. Entre as iniciativas, destaca-se o Purchase from Africans for Africa (PAA África), que reúne uma série de projetos-piloto de criação de mercados institucionais da agricultura familiar em dez países africanos. Tal Programa foi fomentado em colaboração com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e o Programa Mundial de Alimentos (PMA), conforme registram Fraundorfer (2013) e Milhorance (2013). Com apoio do governo brasileiro, vários países latino-americanos incorporaram iniciativas semelhantes ao modelo do PAA, e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), outra política pública brasileira que abre possibilidades ao fortalecimento da agricultura familiar (GRAZIANO DA SILVA; DEL GROSSI; FRANÇA, 2012).

As oportunidades advindas do PAA foram potencializadas pela inclusão da modalidade Compra Institucional (PAA-CI) em 2012, que permite aos órgãos de administração direta e indireta da União, estados, Distrito Federal e municípios a compra da agricultura familiar, com dispensa de licitação, por meio de chamada pública. Essa modalidade fornece acesso a demandas por alimentos, por exemplo, por parte de hospitais, quartéis, presídios, restaurantes universitários, refeitórios de creches, escolas

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27 filantrópicas e todo o conjunto de organizações de interesse público não-governamentais. Outra inovação importante foi trazida pelo Decreto nº 8.473, de 22 de junho de 2015, presente no Plano Safra da Agricultura Familiar 2015/2016 determinando a todos os órgãos da União, que executam recursos para compra de alimentos, a aplicação de, no mínimo, 30% para aquisições da agricultura familiar a partir de 2016. Essas ações aumentaram expressivamente a possibilidade de abrangência da compra institucional da agricultura familiar, permitindo o acesso de agricultores familiares a um mercado potencial de R$ 7 bilhões anuais (MDS, 2018). Essas iniciativas do Governo Federal têm estimulado governos estaduais a criarem seus próprios mecanismos de compras públicas, a exemplo dos estados de Minas Gerais (Lei Estadual nº 20.608/2013) e Rio Grande do Norte (Lei Estadual nº 10.536/2019), e às organizações da agricultura familiar a demandarem e construírem novos mercados públicos e privados (GRISA; SCHNEIDER, 2014).

Além da possibilidade de expansão, as modificações implantadas a partir de 2012 fortaleceram as políticas públicas para a agricultura familiar, não apenas por tornar obrigatória a utilização de no mínimo 30%, mas, também, por instituir vinculação orçamentária para tal propósito. Essa é uma inovação que diz respeito à legislação das aquisições públicas brasileiras. Se, até então, todas as compras estavam sob a obrigatoriedade de seguir preceitos legais de isonomia e concorrência, abre-se um precedente histórico para o fornecedor caracterizado como “agricultor familiar”, mediante dispensa de processo licitatório. A criação e garantia de compra da modalidade Compra Institucional, em tese, proporciona a agricultores familiares a segurança de que não mais dependerem de uma iniciativa governamental por tempo determinado, que pode acabar a qualquer instante, e que lhes traz dúvidas para fazer investimentos necessários à produção e ao fornecimento de alimentos em qualidade, quantidade e regularidade demandados por instituições (MIELITZ, 2014).

No que concerne à efetivação dessa política com abrangência local, poucas iniciativas tinham sido observadas até a obrigatoriedade legal. O modelo de compras de alimentos dominante na maior parte das organizações públicas, pautado no processo licitatório, seguia a lógica da produção em massa, caracterizada por cadeias longas de abastecimento e por concepções de qualidade padronizadas e convencionais, determinando uma relação distante entre consumo e produção (TRICHES; SCHNEIDER, 2010). Para a administração pública, o PAA-CI representa uma inovação no processo de compra de gêneros alimentícios, que se concentrava em grandes empresas/indústrias fornecedoras via aquisição por meio de processo de licitação pública e pregão eletrônico, inviabilizando a participação da agricultura familiar local e regional devido à impossibilidade de competição em condições equitativas (ASSIS, 2016).

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28 Evidenciada a importância e recentes inovações do PAA, este artigo objetiva analisar o perfil de adequação das universidades federais brasileiras às compras da agricultura familiar por meio do modelo avaliativo criado por Salgado (2020, no prelo) a partir do modelo lógico da política. Dados indicam que apenas 19 de um total de 63 universidades federais brasileiras implementaram o PAA-CI até 2019, mesmo após a entrada em vigor da Lei nº 8.473. Contudo, até o momento, poucos estudos investigaram o processo de implementação das compras locais pelo PAA na modalidade Compra Institucional (SALGADO et al., 2020), em razão de a lei ser relativamente recente e o processo de operacionalização encontrar-se ainda em fase de implementação. Não foi encontrado registro de estudo analisando a baixa execução do PAA-CI nas universidades federais e, são escassos trabalhos voltados a explorar a execução nacional do Programa por meio das chamadas públicas. A ausência de estudos em âmbito nacional decorre, em parte, da complexidade do Programa, das grandes dimensões do país e das dificuldades de se obter dados quantitativos (KAMINSKI et al., 2018). Esse estudo vem preencher a lacuna de estudos de avaliação em âmbito nacional do PAA, especialmente da modalidade Compra Institucional, de modo a avaliá-lo em seus múltiplos aspectos apontados no modelo lógico. O tema aqui abordado é, portanto, relevante nesse quesito.

Pesquisas com o viés aqui pautado disponibilizam resultados de avaliação de chamadas públicas no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), a exemplo de Baccarin et al. (2017), Ferigollo et al. (2017), Triches e Silvestri (2018) que adotam o objeto de compras públicas em âmbito municipal. Ao abordar o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), a presente pesquisa difere tanto no foco quanto na competência administrativa, considerando que os critérios de execução (inclusive na definição de valores alocados por modalidade) se concentram no Governo Federal. Além disso, a presente pesquisa no PAA trata compras públicas da agricultura familiar em escopo mais abrangente, especialmente pelo caráter censitário que adensa todas as chamadas públicas lançadas pelas universidades brasileiras entre 2012 e 2019, abarcando, portanto, todas as regiões brasileiras.

De outra forma, no âmbito do Programa de Aquisição de Alimentos, esta pesquisa é inovadora no que se refere à análise de origens e grau de processamento dos produtos, agroindustrialização e preço dos produtos, avançando ao abordar variáveis previstas em modelo lógico PAA-CI delineado por Salgado (2020, no prelo). Neste caso, estão em pauta variáveis como produção orgânica, cooperativismo e associativismo, segurança alimentar e nutricional e cultura regional no âmbito da agricultura familiar. Intenta, assim, responder à seguinte questão: em que medida as compras públicas institucionais, por universidades federais, contribuem para atingir os resultados esperados do PAA-CI previstos no modelo lógico?

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29 Para responder à questão aqui formulada, além desta introdução, o presente artigo aborda, na sequência, a importância do processo de avaliação de políticas públicas e os processos de aquisição de alimentos via PAA, focalizando na dinâmica de operacionalização da modalidade Compra Institucional. Trata-se, portanto, de exercício de contextualização. Em seguida, são descritos os dados utilizados e a metodologia adotada para realizar o presente estudo. Posteriormente, é analisado o desempenho das compras de alimentos da agricultura familiar com base em dados oficiais fornecidos pelas universidades federais, abarcando o período de 2012 a 2019, para, então, levantar componentes de desempenho da política a partir de indicadores dos resultados previstos no modelo lógico. No tópico final, estão elencados desafios e perspectivas à ampliação da compra de alimentos da agricultura familiar, por parte das universidades federais brasileiras, e indicadas possibilidades para estudos acadêmicos futuros.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1. AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E SUA IMPORTÂNCIA

Em função do caráter recente da legislação, análises da compra de alimentos da agricultura familiar nas universidades federais são pertinentes, considerando a necessidade de se acompanhar a aplicação e potenciais contribuições da política para o fortalecimento da agricultura familiar, a estimulação da utilização de alimentos regionais e a valorização dos hábitos alimentares locais promovendo segurança alimentar e nutricional como partes das diretrizes do PAA. Ademais, estudos analisando o Programa são necessários para contribuir para a sua efetividade, eficácia e contínua melhoria, além de subsidiar futuras decisões por parte dos gestores públicos e órgãos governamentais que precisam implementá-lo. A abordagem deste artigo persegue tal propósito à luz do modelo explicativo ciclo político, em que determinada política pública pode ser compreendida a partir de fases ou etapas: montagem da agenda, formação da política, tomada de decisão, implementação e avaliação (HOWLETT; PERL; RAMESH, 2012). Aborda-se aqui as fases de implementação e avaliação.

Implementação se refere à fase onde regras, rotinas e processos sociais são convertidos de intenções em ações. É na implementação que são produzidos os resultados concretos da política pública (O’TOOLE JR., 2010). Uma análise do processo de implementação pode tomar a forma de pesquisa sobre a implementação (implementation research) ou tornar-se uma pesquisa avaliativa (evaluation research) (SECCHI, 2013). Nesta pesquisa, é realizada pesquisa avaliativa, orientada para entender causas de falhas ou acertos das chamadas públicas em relação ao atendimento dos objetivos do PAA-CI previstos no modelo lógico (SALGADO, 2020, no prelo).

A avaliação de políticas públicas, entendida como a análise sistemática do processo ou dos resultados de um programa ou de uma política, especialmente programas sociais, tem ganhado

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30 importância crescente na esfera pública, nos centros de análise socioeconômica e universidades no Brasil, em decorrência da ampliação da escala e escopo da política social no país e, por conseguinte, pela necessidade de produção de informações mais específicas para o aprimoramento dos programas e ações governamentais (JANUZZI, 2011). Por intermédio de uma avaliação sistemática, contínua e eficaz, pode-se alcançar melhores resultados e propiciar utilização e controle racionais dos recursos aplicados. Pode-se também fornecer aos formuladores de políticas sociais e aos gestores de programas dados e informações importantes para o desenho de políticas mais consistentes e eficazes para a gestão pública, bem como guiar os tomadores de decisão, orientando-os quanto a quesitos como continuidade, necessidade de correções ou mesmo suspensão de uma determinada política ou programa (COSTA; CASTANHAR, 2005).

Processos de aprendizagem política e administrativa se encontram em todas as fases do ciclo político, ou seja, a análise de eficiência, eficácia e efetividade não tem que ser realizada exclusivamente no final do processo político, mas, sim, pode e deve acompanhar as diversas fases a fim de indicar possíveis adaptações permanentes e, com isso, propiciar uma reformulação contínua da política pública (FREY, 2000). Em virtude do processo recente de compras públicas da agricultura familiar pelas universidades federais, e da importância socioeconômica, se tornando uma das principais fontes de renda para o segmento (SALGADO, 2016), torna pertinente apresentar um panorama da compra de alimentos provenientes da agricultura familiar, analisando o seu cumprimento frente os objetivos e resultados esperados previstos no seu modelo lógico.

2.2. TRAJETÓRIA DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS

O Programa de Aquisição de Alimentos foi instituído pelo Art. 19 da Lei Federal n. 10.696, de 2 de julho de 2003, através da inclusão de um único artigo no projeto de lei que estava em tramitação no Congresso Nacional. Este artigo forneceu a base legal para a aquisição dos produtos diretamente dos agricultores familiares, sem necessidade de licitação, possibilitando pagamento de preço mais justo e próximo ao praticado no mercado local. Deste modo, o PAA avançou, complementou ações das políticas de segurança alimentar e nutricional, e se consolidou como um polo organizador das demandas institucionais de produtos da agricultura familiar.

Denota-se que, ao dispensar o processo licitatório para aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar, o PAA rompeu com importantes barreiras institucionais, a exemplo da Lei de Licitações e Contratos para a Administração Pública (Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993), desencadeando uma nova trajetória para a agricultura familiar, fortalecida em 2009 com as mudanças no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e a criação da Lei nº 11.947 (GRISA; SCHNEIDER,

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